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A literatura sobre o iniciante na carreira docente é pouco expressiva, especialmente, no tocante às investigações sobre os dilemas e dificuldades vivenciadas nessa fase. Esse enfoque destinado à fase inicial da docência tem ocorrido por ser essa etapa apontada como “[...] um período muito importante da história profissional do professor, determinando inclusive seu futuro e sua relação com o trabalho” (Tardif, 2002, p. 84). Geralmente, o início da carreira constitui um período marcado por tensões, desafios, expectativas, além da aprendizagem profissional e pessoal. Pesquisas revelam que esse período é considerado pelo professor, como um dos piores da vida profissional docente (HUBERMAM, 1995).

Indicando o pensamento do professor, como objeto de pesquisa, seus valores, suas concepções, seus saberes, suas histórias de vida, suas crenças, conhecimentos, seus anseios e dificuldades, essas pesquisas oferecem lugar de destaque ao professor em relação à própria profissão.

A inserção à docência é o momento muito importante, em que ocorre a passagem de estudante a professor, que teve início nas atividades de estágio e prática de ensino. Para Marcelo (1999, p. 113), “os primeiros anos de ensino são especialmente importantes porque os professores devem fazer a transição de estudantes para professores e, por isso, surgem dúvidas, tensões […]”.

Ao mesmo tempo em que o início à docência é relevante, por outro, é uma fase complexa, em que o professor terá de lidar com as demandas que são peculiares à sua condição profissional, como organizar a sala, ministrar conteúdos, conciliar conflitos, administrar seus medos, angústia e anseios.

Observamos que existem distinções referentes ao tempo de carreira ou ciclo de vida profissional. Hubermam (1995) considera que essa fase estende-se até o terceiro ano de profissão. Já para Cavaco (1995), essa fase perdura até o quarto ano do início de docência. Tardif (2002) afirma que o período inicial abrange até o sétimo ano, a partir do início da docência.

No início da carreira docente, o professor percebe-se confrontado com o choque da realidade. Este choque está relacionado com o embate existente entre a realidade e o ideal dos iniciantes. Durante a formação inicial, os estudantes idealizam a carreira docente, criam um cenário e ao se deparar com a realidade da sala de aula, chocam-se e decepcionam-se. Tardif (2002) denomina esse momento como sendo choque de transição, em que o aluno deixa de ser aluno e torna-se professor.

Na concepção de Huberman (1995), a entrada na carreira é marcada por dois sentimentos que tomam conta do professor iniciante, o de “sobrevivência” e o da “descoberta”. A “sobrevivência” está relacionada ao “choque com a realidade”, definido por Veenman (1984 apud Esteves, 1995, p. 108), como “o colapso das ideias missionárias forjadas durante o curso de formação de professores, em virtude da dura realidade da vida quotidiana na sala de aula”. Nessa etapa, a ”descoberta” também se faz presente através do entusiasmo, da experimentação,

da responsabilidade, do sentimento de fazer parte de um grupo profissional. Segundo dados da literatura, Huberman (1995) explica que alguns docentes podem apresentar apenas um desses pontos como dominante. Outros podem vivê-los paralelamente e aí a “descoberta” permite suportar o “choque com a realidade”. Para o autor, a “exploração”, “(...) consiste em fazer uma opção provisória, em proceder a uma investigação dos contornos da profissão, experimentando um ou mais papéis”, seria comum aos diferentes perfis (HUBERMAN, 1995, p. 37).

Ao avaliar o ciclo de vida profissional de professores do ensino secundário, Huberman (1995, p. 38) ressalta que “para alguns, esse processo pode parecer linear, mas, para outros, há patamares, regressões, becos sem saída, momentos de arranque, descontinuidades”. Para explicar esses ciclos o autor aponta as cinco fases que distinguiu na carreira docente: exploração, estabilização, dinamismo, conservadorismo e desinvestimento.

Baseado no estudo de Huberman (1995), os dados do quadro a seguir sintetizam cada uma das fases de vida dos professores e o tempo aproximado de duração de cada fase.

Quadro 4. Fases que caracterizam a carreira docente

FASE NOME PERÍODO CARACTERÍSTICA

01 Exploração 2 ou 3 anos iniciais

Experiência papéis e avalia sua competência.

02 Estabilização 4 e 6 anos

Compromete-se definitivamente com a profissão escolhida,

assumindo a identidade profissional.

03 Dinamismo 7 e 25 anos

Salienta suas qualidades profissionais adotando um estilo

pessoal.

04 Conservadorismo 25 e 35 anos Lamenta sua vida profissional, há um distanciamento afetivo. 05 Desinvestimento 35 e 40 anos Faz um balanço do passado

profissional.

O trabalho do autor supracitado expõe, assim, tendências gerais no ciclo de vida de professores que permitem uma sequência de fases cuja ordem obedece ao tempo de carreira, não sendo necessariamente conhecida pela mesma ordem e nem por todos os membros de uma profissão.

O estudo tem como foco a primeira fase, conforme a classificação de Huberman (1995), ou seja, a fase da exploração que envolve os três primeiros anos de docência.

Cavaco (1995 apud Souza, 2009, p. 35) também contribui para o debate sobre a fase inicial à docência. A autora pesquisou o desenvolver da vida pessoal e profissional de diversos docentes e também revelou que na fala desses docentes essa experiência é sempre apresentada com “grande riqueza de detalhes, expressividade e proximidade emotiva”. A autora divulga que determinados esquemas de ação desse primeiro momento permanecem e são utilizados em confrontos. Ela também assegura que os equívocos, a incerteza, a obrigação de pertencimento baliza essa fase. Nas suas palavras:

O início da atividade profissional é, para todos os indivíduos, um período contraditório. Se, por um lado, o ter encontrado um lugar, um espaço na vida ativa, corresponde à confirmação da idade adulta, ao reconhecimento do valor da participação pessoal no universo do trabalho, à perspectiva da construção da autonomia, por outro, as estruturas ocupacionais raramente correspondem à identidade vocacional definida nos bancos da escola, ou através das diferentes atividades socioculturais, ou modelada pelas expectativas familiares. Assim, é no jogo de procura de conciliação, entre aspirações e projetos e as estruturas profissionais, que o jovem professor tem de procurar o seu próprio equilíbrio dinâmico, reajustar, mantendo, o sonho que dá sentido aos seus esforços (CAVACO, 1995, apud Souza, 2009, p. 162-

163).

Isso quer dizer que esse é um período marcado, pela contradição, de um lado a felicidade por ter alcançado um lugar no universo do trabalho, a escola; por outro lado, o iniciante precisa manter-se equilibrado no jogo da carreira docente.

Garcia (1999) considera que o início da carreira docente é ao mesmo tempo uma realidade que choca o professor, mas, que também possibilita intensas aprendizagens. Para o autor citado, é um período de conflitos e

aprendizagens, que exige que o professor adquira conhecimentos profissionais e que também deve manter-se particularmente equilibrado.

Tardif (2002) compartilha que esse é realmente um período que choca e que as aprendizagens são marcantes, mas, ressalta que por mais que o iniciante tenha frequentado o espaço escolar por período superior a 16 anos, como aluno, é necessário aprender assuntos que se referem ao estar do outro lado, como professor. Quais são as condições iniciais da carreira docente? Conforme Cavaco (1992 apud Joton, 2011, p. 47), no tocante à entrada na carreira os professores evidenciam que:

[...] são, em geral, de insegurança, de instabilidade, de sobrevivência. Tornam-se geradoras de ansiedade, opressivas, alienantes, multiplicadoras de receios e desconfianças, opondo-se às necessidades reais de um desenvolvimento vocacional harmonioso. Mantêm-se esbatidas no arquivo da memória e podem ser reatualizadas ao longo do percurso profissional nos períodos de questionamento, de tensão, de procura de reajustamento na vida (CAVACO, 1992, apud JOTON, 2011, p.

47).

Apoiando-se em Veenman (1984), Joton (2011, p. 47) afirma que o professor ao adentrar na carreira docente confronta-se com muitas dificuldades: a indisciplina na sala de aula, motivação e avaliação dos seus alunos, relacionamento com os pais dos alunos. E também destaca que durante sua formação, o iniciante não foi devidamente preparado “para enfrentar a dura realidade da sala de aula”.

A autora observa que além dos fatores que dificultam a inserção, os docentes novatos terão de lidar com as questões referentes à interação com seus colegas, muitas vezes, sem poder contar com o auxílio dos professores mais gabaritados. Considera que a acolhida é fundamental, pois o professor iniciante precisa de suporte e almeja ser querido pelo grupo.

Apontando o choque com a realidade, Cunha (2012) destaca que os professores iniciantes, ao ingressarem na carreira, são “jogados ao léo”, sem que haja uma preocupação com a construção de sua profissionalidade ou, até mesmo, um acompanhamento de seu cotidiano no universo da sala de aula.

A autora apoiando-se em Marcelo Garcia (2009), evidencia que a iniciação à docência é um período marcado pelas tensões e aprendizagens intensivas, em contextos comumente desconhecidos e, os professores iniciantes devem adquirir conhecimentos profissionais, além de obter certo equilíbrio.

Nessa direção, Cunha (2012) salienta que o iniciante pode cometer cinco erros que podem levá-lo a desistir da carreira docente. Estes erros referem-se: cobranças que responsabilizam os novos professores pelos alunos com maiores dificuldades de aprendizagem; que lhes sobrecarregam com atividades extracurriculares; colocam para ensinar disciplinas diferentes de suas formações; não contemplam apoios administrativos e pedagógicos para eles e fazem com que se sintam isolados de seus pares.

Cunha (2012, p. 5) pontua que essa situação é facilmente encontrada nas escolas brasileiras, onde pode-se “acrescentar as baixas remunerações e o pouco prestígio social” que alcança a profissão e atropela o iniciante, “inclusive pelas manifestações docentes”.

É importante destacar que essa é uma fase em que o professor iniciante deposita em sua prática as experiências que possui sobre a docência e o que ele idealiza sobre como será seu desempenho como docente, o que muito vezes, o leva a desistir da profissão.

Nessa direção, Tardif e Raymond (2000, p. 217) acenam para a necessidade de sabe conviver no espaço escolar, “saber como viver numa escola é tão importante quanto saber ensinar na sala de aula”. Para os autores supracitados, essa etapa compreende o período entre 3 ou 5 primeiros anos na carreira docente.

De acordo com Tardif e Raymond (2000, p. 226) o início da carreira docente demanda dos professores a apropriação de saberes exclusivos da escola, suas práticas, princípios e normas. Ressaltam também a complexidade existente no processo de entrada na docência e a “socialização profissional do professor”, pois é nessa etapa que os “reajustes em função das realidades do trabalho” serão realizados.

Mariano (2006) também estudou o início da carreira docente. Baseado nos estudos de Huberman (1995); Veenman (1988); Tardif (2002) e Cavaco (1995), destaca que o início da docência é interpretado pela literatura como sendo uma ação contínua e formada pelas seguintes fases: pré-formação, formação inicial, iniciação à docência e formação docente.

De acordo com os autores que dão suporte a esse capítulo, chega-se à conclusão que o processo de formação docente é contínuo, no qual os professores iniciantes estão em constante formação. As condições de trabalho encontradas pelos professores no local de trabalho, o suporte que recebem e as relações favoráveis ou não, vão tornar esse momento de adaptação mais fácil ou mais difícil.

C

APÍTULO

5

ANÁLISE DE DADOS

Neste capítulo, serão apresentados os resultados dos dados obtidos por meio das análises das entrevistas. A escolha dos eixos utilizados para analisar as falas dos professores foi definida, após a leitura dos dados, e também em conformidade com os objetivos da pesquisa.

Apresentando como base as transcrições das entrevistas dos professores iniciantes da disciplina de História nas séries finais do Ensino Fundamental, iniciou-se a análise dos dados coletados. Foram consideradas as sinalizações de Lüdke; André (1986):

A tarefa de análise implica, num primeiro momento, a organização de todo o material, dividindo-o em partes e procurando identificar nele tendências e padrões relevantes. Num segundo momento, essas tendências e padrões são reavaliados, buscando-se relações e inferências num nível de abstração mais elevado

(LÜDKE; ANDRE, 1986 p. 48).

A fim de expandir uma análise interpretativa, foram apresentadas as dificuldades encontradas pelos professores e as estratégias utilizadas para atender aos desafios pedagógicos. Assim, foram organizadas as seguintes categorias: a entrada na carreira, os sentimentos, choque com a realidade, dificuldades e desafios no trabalho docente, socialização profissional do professor

iniciante, e a relação com os professores face à Grade Curricular de História e ao Projeto Político - Pedagógico da Unidade Escolar.