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INDÍGENAS, FAZENDEIROS E GARIMPEIROS

Foto 9 JOAQUIM NUNES ROCHA

2.1 INDÍGENAS, FAZENDEIROS E GARIMPEIROS

A atual Mesorregião Sudeste de Mato Grosso é formada por quatro microrregiões, a saber: a de Alto Araguaia, a de Primavera do Leste, a de Rondonópolis e a de Tesouro, formando um território de 71.887,201 km², onde vive uma população de 526.445 habitantes, segundo estimativas do IBGE, de 2012. À história dos municípios dessa região se une também a história de dois outros municípios, um situado na barra do Rio Garças com o Araguaia, Barra do Garças, e o outro situado ao norte desse município, também às margens do Rio Araguaia, Araguaiana, os quais pertencem à Microrregião Médio-Araguaia e fazem parte da Mesorregião Nordeste de Mato Grosso.

A sorte da maior parte dos municípios que compõem a região, a saber: Alto Araguaia, Alto Garças e Alto Taquari, da Microrregião de Alto Araguaia; Campo Verde e Primavera do Leste, da Microrregião de Primavera do Leste; Dom Aquino, Itiquira, Jaciara, Juscimeira, Pedra Preta, Rondonópolis, São José do Povo, São Pedro da Cipa, da Microrregião de Rondonópolis; e Araguainha, General Carneiro, Guiratinga, Pontal do Araguaia, Ponte Branca, Poxoréu, Ribeirãozinho, Tesouro e Torixoréu, da Microrregião do Tesouro, em algum momento se cruzou, ao longo do século XX, seja pelos próprios ritos do povoamento, seja pelos desmembramentos territoriais, para a criação de circunscrições municipais, como, por exemplo Rondonópolis, Primavera do Leste e Dom Aquino, que constituíram seus territórios desmembrando-se total ou parcialmente de Poxoréu, e também por causa das descobertas das jazidas diamantíferas nos tributários do Rio Garças, que levaram à conquista do território habitado pelo povo Bororo desde meados do século XVIII.

Trata-se, portanto, de uma história relativamente recente, isto é, construída ao longo do século XX e início do XXI, mas, como veremos a seguir, ainda no período imperial ela já era motivo de disputa entre Mato Grosso e Goiás. Porém, uma série de eventos contribuiu para que, ao longo do século passado, a região sobressaísse pela produção diamantífera e, em um primeiro momento, pela prática da pecuária extensiva, e, num segundo momento, pela cultura mais desenvolvida do agronegócio, principalmente a partir dos anos de 1960, quando as ondas migratórias provenientes principalmente da Região Sul do Brasil, abriram as fronteiras agrícolas de Mato Grosso para o Brasil e para o mundo, e, atualmente, já está dando

passos significativos rumo à industrialização.

Muito contribuiu para o desenvolvimento das microrregiões de Primavera do Leste e Rondonópolis a ação do Governo Federal que, nos finais da década de 1960 e durante a década de 1980, ampliou a malha rodoviária do Brasil, integrando a Região Centro-Oeste e, em especial, Mato Grosso, às Regiões Norte, Sul e Sudeste do País. Assim, a Microrregião de Primavera do Leste foi beneficiada, ainda na década de 1980, com a pavimentação da antiga Estrada Cuiabá-Goiás, que foi aberta no século XVIII, atualmente conhecida como BR-070, que liga Cáceres, na fronteira com a Bolívia, a Brasília; a Microrregião de Alto Araguaia e a de Rondonópolis foram beneficiadas, na década de 1960, com a BR-364, que liga Goiás ao Acre; e a Microrregião de Rondonópolis foi beneficiada, nesse mesmo período, com a BR- 364 e com a BR-163, que liga o Pará e Mato Grosso às Regiões Sul e Sudeste do Brasil. Estas duas últimas rodovias, em certo sentido, já haviam sido abertas ainda nos períodos colonial e imperial, com a finalidade de facilitar a comunicação e o escoamento da produção aurífera entre Cuiabá e Goiás e entre Cuiabá e São Paulo.

As notícias que se têm dessa porção de terra situada entre Mato Grosso e Goiás, tendo como limite o Rio Araguaia, testemunham que, desde a descoberta do ouro, nas proximidades de Cuiabá e em outras regiões do estado, os colonizadores passaram a ter uma preocupação quase que exclusiva com a manutenção das fronteiras com os espanhóis e com a produção do ouro para abastecer os cofres da Coroa Portuguesa. A preocupação com o atual sudeste mato- grossense é mais recente, por não se tratar de uma fronteira externa, como o era a região sul de Mato Grosso desde as primeiras incursões bandeirantes de conquista do oeste brasileiro e que levaram à Guerra do Paraguai, entre 1864 e 1870.

Em especial a Microrregião do Tesouro rememora o povoamento garimpeiro, cuja história começou ainda nos primórdios do século XX, quando os fazendeiros deram início às conquistas do Vale dos Coroados, nome dado ao povo Bororo, que fugiram para a região quando das incursões bandeirantes do século XVIII, que culminaram na descoberta do ouro que levaram à fundação de Cuiabá, em 1719. Durante o período colonial e posteriormente no período imperial, e mesmo no início do século XX, os indígenas fizeram oposição ao trânsito de tropeiros e de exploradores por esse território. As taperas de babaçu que se ergueram desde a Serra de São Vicente, próximas de Cuiabá, até a margem oeste do Rio Araguaia, possibilitaram a fundação de municípios de herança garimpeira, como Poxoréu, Barra do Garças, Guiratinga, Torixoréu, Dom Aquino, General Carneiro e Tesouro, além de vilas que não se desenvolveram a ponto de serem transformadas em circunscrições municipais e cujo

povoamento foi favorecido principalmente em decorrência da descoberta dos diamantes a partir das incursões financiadas pelos fazendeiros, desde 1902.

Nesse ano, o fazendeiro João José de Morais, mais conhecido como Cajango, proveniente de Minas Gerais, em decorrência das informações colhidas entre os indígenas sobre a existência de pedras nas barrancas do Rio das Garças, às quais eles denominavam de tori cuiege, ou seja, pedra que brilha como as estrelas, deu início às primeiras prospecções do diamante nos afluentes do Rio Garças. De posse das informações obtidas dos indígenas e também da comparação entre a formação da terra de sua fazenda com o solo das regiões diamantinas de Minas Gerais, Cajango financiou a prospecção de diamantes na barra do Rio Caçununga com o Rio Garças, sob o comando de Feliciano Cezilos dos Santos e sua esposa Joana Francisca de Jesus. Entre os garimpeiros encontravam-se José Luiz, Zelino, Chico Preto, Angelo Italiano, Manezinho Cuiabano e um bororo.

Essa descoberta fez com que os primeiros fazendeiros que se instalaram na região também passassem a fazer inversões de recursos em novas prospecções de novas jazidas diamantíferas. Assim, por exemplo, o goiano Antônio Cândido de Carvalho, desde de 1902, a partir de sua fazenda sediada nas margens do Rio Itiquira, ao sul da província diamantina do Garças e Araguaia, também se envolveu com o garimpo ao financiar as expedições que alcançaram a região onde atualmente se encontra instalado o município de Poxoréu. A expedição por ele financiada começou em 1903, sob a liderança de João Airenas Teixeira, que passou a procurar pelo diamante nos afluentes do Rio São Lourenço. Tendo chegado ao vale do Rio das Pombas, mesmo não tendo descoberto diamante, voltou ao local de onde partiu acreditando na existência dele.

Em relação ao município de Poxoréu, as descobertas que justificaram a implantação das primeiras povoações na região somente se deram a partir da década de 1920. Mais exatamente em 1924, os garimpeiros descobriram diamantes nas cabeceiras do rio São Lourenço. Foi, então, fundada a Vila de São Pedro, que recebeu esse nome devido à descoberta das primeiras gemas de diamantes na localidade no dia 29 de junho. Em pouco tempo, devido à sua indescritível prodigalidade, a vila que se ergueu nas proximidades das catras (Cfr. Anexo 1) que se abriram na localidade chegou a abrigar mais de três mil pessoas. Formaram-se, logo em seguida, os povoados de Pombas, dos Sete e do Alcantilado, nas proximidades da Vila de São Pedro.

A maioria dos catadores de diamantes do Garças e Araguaia era formada por nordestinos, mormente por baianos. No entanto logo se juntaram outros aventureiros vindos

de todas as partes do Brasil. O segundo maior contingente de migrantes foi formado pelos maranhenses, que anteriormente se dedicavam à extração da borracha na Amazônia mato- grossense. Os primeiros catadores de diamantes financiados por Cajango, por exemplo, eram seringueiros que estavam de passagem pela região em direção ao Estado do Pará. A descoberta do diamante fez com que também outros contingentes de maranhenses se juntassem aos outros migrantes que se espalharam pelas diversas áreas de extração do Garças e Araguaia. Na região de Poxoréu, enquanto a Vila São Pedro era formada em sua maioria por baianos, o garimpo do Alcantilado, por exemplo, era em sua maioria formado por migrantes advenientes do Maranhão.

Esses financiamentos de expedições exploradoras de diamante por parte dos fazendeiros e a implantação de fazendas tanto ao norte quanto ao sul do Vale dos Coroados, aliados aos problemas internos que se foram criando dentro do território diamantino, possibilitaram a fundação de Poxoréu, já nos estertores do conflito armado entre as facções de Morberck e Carvalhinho pela liderança da região. A descoberta do diamante nas cercanias do sopé do Morro da Mesa foi obra de Doroteu Sodré, também conhecido como Maroto Sodré, em 1926, enquanto, com seu irmão Barbosinha, e seus companheiros, João Dourado, Joaquim Prateado e Peito Roxo, fugiam da violência que culminou na chacina dos maranhenses, ocorrida na Vila do Alcantilado, em 1924, na zona de influência da Vila de São Pedro e do recrutamento compulsório de garimpeiros nas lutas que colocaram frente a frente os coronéis José Morbeck e Carvalhinho, em sua disputa pelo controle da zona diamantífera do Garças e Araguaia.