• Nenhum resultado encontrado

MUDANÇAS NO DISCURSO POLÍTICO

Foto 9 JOAQUIM NUNES ROCHA

5.4 MUDANÇAS NO DISCURSO POLÍTICO

O sistema eleitoral que se foi formatando desde 1946 e passou pelas reformas partidárias de 1965 e de 1979, juntamente com as transformações econômicas ocorridas nos municípios vizinhos de Poxoréu, tornou possível a substituição da família Rocha na administração municipal, mas ainda não foi capaz de derrotar o modelo coronelista garimpeiro vigente no município, que apenas foi transferido para a oposição, mas esta passou a reproduzir, com atores diferentes, o mesmo modelo anterior. No entanto, a eleição do ano 2000 pode ser considerada como o marco mais significativo da mudança que ainda está por ser operacionalizada na política municipal e, por conseguinte, no próprio modelo econômico, baseado ainda na criação extensiva de gado, mas já com a parte norte do município, que vive sob a zona de influência de Primavera do Leste, despontando como grande produtora de grãos. Nesse ano, a administração municipal passou a ser capitaneada por um grupo que se apresentava como não alinhado ao modelo anterior, vigente desde as primeiras eleições ocorridas no município, em 1947. Porém, como mostraremos nos próximos parágrafos, esse foi apenas o início de um longo processo, pois o grupo que assumiu a administração municipal surgiu de um racha no partido de sustentação da família Rocha, que, no ano 2000, estava filiada ao PTB. O aconteceu depois, seguiu o mesmo padrão instituído há 54 anos, na primeira eleição municipal, quando os adversários dessa família foram consagrados nas urnas. O prefeito eleito teve que enfrentar intensas batalhas no tribunal eleitoral que contestavam os resultados das urnas.

No contexto das disputas, na sua maioria por acusações de compra de votos, houve diversas manifestações populares de apoio ao grupo vencedor. Contudo, o resultado das urnas era inconteste. Segundo os dados do TER-MT, o prefeito eleito, Antônio Rodrigues da Silva, do PMDB, tinha vencido o representante da família Rocha, Lindberg Ribeiro Nunes Rocha, do PTB, tendo recebido 6.912 votos contra 4.192 votos. Comparando-se os resultados obtidos pelo partido vencedor em 2000 com o pleito de 1996, quando Lindberg Ribeiro Nunes Rocha resultou eleito para um quarto mandato, já era possível perceber que ele não fora derrotado naquela eleição porque a oposição entrou na disputa dividida. Em 1996, Lindberg Ribeiro Nunes Rocha enfrentou três candidatos da oposição, conforme a tabela abaixo:

Para derrotar a família Rocha, portanto, foi necessária uma série de coligações que se concretizaram para a eleição do ano 2000. Na eleição desse ano, apresentaram-se para a disputa apenas dois partidos, o PTB e o PMDB. Na eleição de 1996, esses mesmos partidos realizaram as seguintes coligações:

Quanto à representação na Câmara Municipal, o prefeito eleito teve que enfrentar um legislativo para o qual a sua coligação não elegeu a maioria dos vereadores. Na eleição de 1996, o legislativo ficou representado por 4 vereadores do PDT, 2 do PSDB, 2 do PMDB, 1 do PL e o partido do prefeito eleito, o PTB, elegeu apenas 1 vereador e o outro partido da coligação PTB/PFL elegeu 2 vereadores.

Essa eleição, por si só lançou as bases para as mudanças que ocorreriam na eleição do ano 2000. O único vereador eleito pelo PTB em 1996, Antônio Rodrigues da Silva, mais conhecido como Tonho do Domingos Velho, mesmo tendo sido eleito para a Presidência da Câmara e pertencer ao mesmo partido de Lindberg Ribeiro Nunes Rocha, rompeu com o prefeito na legislatura de 1996 a 2000, filiou-se ao PMDB, e, para a eleição do ano 2000, se apresentou como candidato da oposição não só ao prefeito, mas a todo o sistema que imperou no município a partir de 1947.

Para a eleição desse ano, os partidos apresentaram apenas dois candidatos, a saber: Lindberg Ribeiro Nunes Rocha, que tentava a reeleição, que o levaria a um quinto mandato, numa coligação entre PPB, PPS, PSDB e PTB, cujo lema era “Continuidade de Progresso”, e Antônio Rodrigues da Silva, que capitaneava a coligação PFL, PMDB e PT, sob o lema URP, ou seja: “União pela Recuperação de Poxoréu”. Como é possível observar, pela tabela acima, o PFL abandonou a coligação de 1996 com Lindberg Ribeiro Nunes Rocha para apoiar Antônio Rodrigues da Silva. O resultado da eleição foi 6.912 votos para Antônio Rodrigues da Silva contra 4.160 votos para Lindberg Ribeiro Nunes Rocha. Se comparados com os resultados da eleição de 1996, na qual quatro partidos tinham lançado candidatos para o pleito, caso a oposição tivesse se unido já teria derrotado a família Rocha naquela ocasião, pois os três partidos de oposição atingiram 7.842 dos votos válidos, contra 3.868, de Lindberg Ribeiro Nunes Rocha.

Diante dos resultados dessas duas eleições, surgem outros dados que mostram o descontentamento da população em relação à situação do município. Em 1996, os habilitados para votar perfaziam um total de 15.625 eleitores. Os resultados das urnas mostraram que foram considerados válidos apenas 88,56% dos votos, dos quais houve ainda 7,49% de votos brancos e 2,81 de votos nulos, numa eleição para a qual compareceram apenas 76,10% dos eleitores. A abstenção, nesse pleito foi, portanto, da ordem de 23,90%.

Para a eleição do ano 2000, houve uma mudança significativa nesses dados. O número de habilitados para votar caiu para 14.564 eleitores, mas aumentou a participação dos mesmos no pleito, pois o índice de abstenção caiu de 23,90%, em 1996, para 18,84%, no ano 2000, e o comparecimento às urnas subiu de 76,10%, em 1996, para 81,16%, na eleição seguinte. No ano 2000, também caiu o índice dos votos brancos, para 0,99%, e dos votos nulos, para 5,34%.

Várias hipóteses podem ser levantadas para explicar a mudança de comportamento dos eleitores da eleição de 1996 para a de 2000. Em parte, a abstenção ocorrida em 1996 pode ter sido motivada pela migração dos eleitores para os municípios vizinhos. Esses dados podem ser comprovados, segundo dados do IBGE (2000), pelo significativo decréscimo de 12,12% da população do município, entre 1991 e 2000. No entanto, o resultado da eleição do ano 2000 aponta para um aumento também significativo do comparecimento dos eleitores para a eleição, na ordem de 81,16%, ou seja, 5,06% a mais do que na eleição de 1996.

Esses dados devem ser compreendidos dentro do amplo espectro das transformações que ocorreram nas últimas décadas nas circunvizinhanças de Poxoréu, com fortes investimentos na agricultura voltada não somente para o mercado interno, mas também para o mercado externo. O discurso político dos partidos que se aliaram à família Rocha apontava para a manutenção do mesmo modelo vigente sob a tutela dos coronéis do garimpo, a saber: “Continuidade de progresso”. Esse era o discurso característico do imobilismo dos políticos, que ainda viviam dos efeitos da renda dos garimpos que tinham encontrado a sua exaustão ainda na década de 1980. Era como se o projeto iniciado em 1947 houvesse encontrado a sua formatação final e a gestão da família Rocha tivesse levado o município a um modelo satisfatório de crescimento econômico e desenvolvimento social.

Por outro lado, o discurso político da oposição, apresentado para a eleição do ano 2000, apontava para outra direção: “União para a Recuperação de Poxoréu”. A vitória da oposição, com um discurso que apontava para uma direção oposta à dos coronéis, em certo sentido, atraiu os eleitores para a possibilidade de transformar a própria estrutura política, econômica e social do município. Esse discurso encontrou eco na população por algumas razões peculiares, como, por exemplo, o fato de muitos migrantes terem retornado ao município apenas para votar e terem trazido consigo as esperanças de que o voto na oposição poderia avalizar algumas mudanças significativas para Poxoréu. Contudo, há também outro elemento que deve ser levado em consideração: embora parcela considerável da população tenha vivido, nos anos de 1980, quando foram descobertas novas jazidas diamantíferas em algumas partes próximas ao distrito-sede, a própria extração do diamante, naquela ocasião, já era feita mediante técnicas que poderiam ser consideradas mais modernas e inclusive mantidas por empresários não pertencentes ao antigo círculo dos capangueiros e fornecedores das décadas áureas de produção mineral. Além disso, devido à instrução dos filhos dos garimpeiros, os descendentes dos antigos migrantes não tinham mais compromissos com os antigos patrões ou coronéis da região.