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a influência do movimento estudantil na vida dos ex-militantes

No documento gisleneedwigesdelacerda (páginas 37-41)

5 Centelha era uma tendência existente em BH e que se vinculou, em 1977, ao Estratégia de Juiz de Fora,

Na seção anterior vimos os motivos que levaram à participação destes sujeitos na política estudantil e que muito nos revelam sobre suas ações dentro do ME. Porém, a vivência que tiveram dentro do Movimento Estudantil também influênciou em suas vidas. Considerando que em grande parte, os militantes do ME entrevistados, hoje são pessoas de vida pública com participação política, acredito ser relevante compreender em que medida a militância estudantil lançou bases para uma atuação atual na política em seus diversos âmbitos. Neste subitem, apresento como estes sujeitos interpretam a influência que a militância estudantil teve em sua vida posterior à universidade.

Desta forma, o objetivo deste subitem é motivar uma reflexão sobre como a participação na militância estudantil neste período influenciou pessoalmente estes entrevistados que se colocaram totalmente abertos a compartilhar suas memórias sobre este período de suas vidas. Dos onze entrevistados, apenas dois, o que representa 18,2%, se declaram, hoje, sem uma participação política direta. Contudo, confessam a influência do ME em outros pontos de suas vidas, como a consciência política. 81,8% dos entrevistados possuem um intenso envolvimento político atual, em sindicatos, partidos políticos, como vereador, como representantes de órgãos federais, secretário de governo, entre outros. Percebemos que a participação como militante no ME gerou interesse pela atuação política e que muitos ex-militantes do período pesquisado são hoje pessoas de destaque neste meio.

Ao questionar os entrevistados sobre o grau de influência que a atuação no Movimento Estudantil teve em suas vidas após a saída da Universidade, a avaliação dos mesmos foi unânime, definindo-a como muito importante. Porém, nem todos conseguiram precisar em quê exatamente se deu essa contribuição. Ressaltaram, entretanto, entre essas definições, que a experiência adquirida naqueles anos foi importante para sua visão e/ou participação política atual, para suas escolhas profissionais e pela oportunidade que tiveram de conhecer outras realidades em diferentes locais do país. Destacaram as peculiaridades que aqueles anos representaram em suas vidas, anos marcantes da juventude, aliados às formações acadêmica, intelectual e política recebidas, bem como de amores e amizades firmados.

Destaco abaixo alguns fragmentos das falas dos militantes no tocante a este assunto, respondendo à pergunta: você considera que o Movimento Estudantil contribuiu de alguma forma para a sua vida atual?6

Nossa, demais! Demais, mas demais mesmo. Eu acho que não é aquilo que “o que seria de mim se não fosse o Movimento Estudantil”. Provavelmente, eu tenho até dúvida sobre o quanto que eu teria gostado do curso de História e me transformado numa

pesquisadora, assim, porque foi através do contato com o Movimento Estudantil e política, descobrindo o marxismo, que eu comecei, mesmo as matérias chatas do curso de História, (...) a pensar assim, sempre há uma versão marxista, eu mesma comecei a achar que tinha aquele desafio de levar pra sala de aula uma versão alternativa pro professor. Então isso era desafiante intelectualmente, era muito desafiante. (...). Do ponto de vista dos relacionamentos assim, uma coisa muito legal, que eu lidava com pessoas das mais diferentes classes sociais e grupos, viajando pelo Brasil e conhecendo grupos, gente do meu grupo e de outros grupos pelo Brasil afora. Viajava pra representar a LIBELU num lugar, em outro (...). Então, foi uma coisa muito legal, todos esses lados da minha vida pessoal, fiz amizades que continuam meus amigos até hoje, foi muito bom. (Beatriz Domingues, entrevista de pesquisa).

Para Beatriz Domingues, que atualmente não possui participação político-partidária nem sindical, a contribuição deixada pelo Movimento Estudantil está na consciência política que julga ter adquirido em função de sua participação no mesmo. Além disso, esse envolvimento serviu como estimulo à busca de um aprofundamento teórico no curso de História, durante o tempo de universitária.

Rafael Pimenta, assim como Beatriz Domingues, reconhece que o movimento estudantil teve influência significativa na escolha de sua profissão atual e no bom desempenho da profissão em função da oratória, que foi aperfeiçoada durante os anos no Movimento Estudantil.

Com toda certeza. Eu fazia Engenharia, e não conseguia passar naquelas matérias de cálculo difíceis. Eu falei “eu não vou conseguir formar em Engenharia”. Aí eu pensei “bom, eu quero escolher uma profissão, que eu trabalhe profissionalmente, mas eu possa atuar no meio político”. Fiz Direito. Aí fiz vestibular pra Direito. E acho que acertei, porque eu gosto muito de política, tanto que até, você me viu aí o ano passado7 , mas posso trabalhar profissionalmente com aquilo que eu concordo, com aquilo que eu acho que seja certo e tal. Aí, cada um tem seu padrão de certo ou errado, né. Então, sem dúvida, o Movimento Estudantil me ensinou muito. Me ensinou relacionamento com as pessoas, me ensinou falar, pensar, raciocinar. (...) A rapidez de raciocínio que você aprende a ter pra poder responder a uma fala que alguém faz ali na hora e tem setecentas pessoas no anfiteatro. Lotado, duro de gente, gente sentada nos corredores, em tudo que é lugar, você não via o chão. Se você não tiver uma rapidez de raciocínio e capacidade de convencimento, você vai levar uma vaia, que estudante não tem conversa. Não respondeu leva vaia. Então, imagina, na minha profissão, advogado, que você tem que fazer defesa oral, tem que ser capaz de responder a colocação que o outro faz. Então é um aprendizado danado. É um aprendizado de vida também. Conhecer tantas cidades brasileiras com a UNE, você não faz ideia. Eu conheci vários estados do Brasil. (Rafael Pimenta, entrevista de pesquisa).

As experiências de viagens e o contato com pessoas de vários lugares do país foram fatos destacados como frutos de sua participação no ME, colocados como um aprendizado de vida por Rafael Pimenta, o que também aparece em outras falas. Contudo, sobre a influência do ME na vida profissional, Marco Aurélio Crocco também destaca em sua entrevista.

Sem dúvida. Eu acho que eu me tornei um bom professor pela experiência do Movimento Estudantil, eu acho que eu tenho uma oratória boa e parte disto foi

adquirido no movimento estudantil (...). Então o Movimento Estudantil foi importante, foi importante pro processo de formação enquanto homem; acho que essas coisas são importantes (Marco Aurélio Crocco, entrevista de pesquisa).

Marco Aurélio Crocco, que hoje não tem qualquer participação política partidária ou em movimentos sociais, apesar de seu envolvimento em campanha para reitor da UFMG na época da realização desta entrevista, revela que sua participação no ME, além de lhe dar subsídios para uma boa oratória enquanto professor, propiciou-lhe consciência política e formação humana.

A influência na escolha da profissão não foi um fato isolado. Flávio Bitarelo também destaca esse ponto, atribuindo a decisão pela sua militância estudantil. “A própria opção acadêmica que eu fiz, de Ciências Sociais, foi disso, quando eu me organizei politicamente eu disse “eu quero fazer Ciência Sociais”, sabendo que eu ia ter uma enorme dificuldade no mercado de trabalho”. (Flávio Bitarelo, entrevista de pesquisa).

A formação teórica e a preparação humana também não foram considerações isoladas. Jorge Sanglard atribui ao Movimento Estudantil, através de inúmeros cursos feitos na época, a oportunidade de um aprofundamento teórico.

Foi importante do ponto de vista da formação e da preparação. Nós somos de uma época onde você tinha que se preparar, tinha que estudar muito. Como liderança do Movimento você tinha que estar preparado. Nós não tínhamos férias praticamente, nossas férias eram estudando com professores da Faculdade de Economia da UFMG, o curso básico de Economia em dois meses, em dezembro e janeiro, basicamente, e em julho a gente passava lá no DCE fazendo cursos para melhorar a qualidade do entendimento da conjuntura. (Jorge Sanglard, entrevista de pesquisa).

A influência do Movimento Estudantil também foi citada no modo de pensar e de fazer política atualmente. Reginaldo Arcuri destaca que considera como ideal seu modo de formulação política nos anos de estudante e que esta o acompanha até os dias atuais.

Tudo o que eu penso hoje, a forma de agir vem desse período. Tudo. Pra mim eu acho que a forma continua sendo o que veio dali. (...) Eu se fosse tentar definir pra mim mesmo o que era a base da formulação do nosso pensamento, era uma coisa nessa linha. Quer dizer, é muito mais importante você compreender realmente como a realidade funciona, se você quer mudar a realidade, do que idealizar como a realidade deveria funcionar, para que sua hipótese da mudança da realidade funcionasse, que é uma forma muito prática de fazer política. Quer dizer, você chega muito bem num determinado momento com uma construção teórica muito boa, mas não funciona na prática, porque a vida é muito mais complicada, as pessoas são muito mais complexas (...). Quer dizer, você tem que jogar com a realidade da forma que ela é. (Reginaldo Arcuri, entrevista de pesquisa).

Marcus Pestana assim como Reginaldo Arcuri, vê que a essência de sua ação política tem origem nesse período de militância estudantil, que após anos, mesmo com o amadurecimento, essa essência permanece em sua vida como motivação e base de suas ações.

Ah, claro, muita (influência), até hoje. Eu sou fruto do movimento estudantil. Eu amadureci, eu tenho mais experiência, tenho mais vida, mais anos de estrada, mas a essência é a mesma, o espírito, o aprendizado, embora eu seja muito crítico, como eu disse, eu prefiro aquela ambiente que o ambiente atual. (Marcus Pestana).

Sendo assim, percebemos que a militância estudantil exerce uma influência sobre os que por ela passam, deixando presentes elementos que levam a um envolvimento direto ou indireto com a política atual. Destarte, estes sujeitos que aqui apresentei, dividiram lembranças de um período que consideram marcante em suas vidas. Resgataram emoções diversas, amigos conquistados, uma vida marcada fortemente pelo período de atuação no ME. Assim, partilharam de sua própria memória e se tornaram a mais rica fonte desta pesquisa.

2.4 O contexto do processo de luta democrática e o papel dos movimentos sociais

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