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Dados sobre o setor informal no Brasil Aplicação da Resolução da 15ª Conferência Internacional de Estatísticas do Trabalho da OIT

No documento Direito ao trabalho na rua (páginas 52-58)

2 O MUNDO DO TRABALHO

3.1 O setor informal

3.1.1 Dados sobre o setor informal no Brasil Aplicação da Resolução da 15ª Conferência Internacional de Estatísticas do Trabalho da OIT

Usando recomendações da OIT, nos termos da Resolução da 15ª Conferência Internacional de Estatísticas do Trabalho sobre o setor informal, foi elaborada a Pesquisa

“Economia Informal Urbana” (Ecinf), em 2003, realizada pelo IBGE em parceria com o

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE).

Trata-se de uma pesquisa por amostra de domicílios, situados em áreas urbanas, que identificou os trabalhadores por conta própria e empregadores com até cinco empregados em, pelo menos, uma situação de trabalho. Para o IBGE, são esses atores que integram o setor informal. Assim, na verdade, embora a pesquisa se intitule como “Economia Informal

Urbana”, faz-se necessário ressaltar que ela se ocupou de levantar dados sobre o “setor informal” urbano, como está claro no documento que apresenta a metodologia adotada pela

pesquisa: “A magnitude, natureza e composição do setor informal variam entre diferentes

regiões e países de acordo com o nível de desenvolvimento e a estrutura de suas economias”.

Com base, então, nas recomendações da OIT, sobre o “setor informal”, a Ecinf considerou que:

• para delimitar o âmbito do setor informal, o ponto de partida é a unidade econômica – entendida como unidade de produção – e não o trabalhador individual

ou a ocupação por ele exercida;

• fazem parte do setor informal as unidades econômicas não-agrícolas que produzem

bens e serviços com o principal objetivo de gerar emprego e rendimento para as pessoas envolvidas, sendo excluídas aquelas unidades engajadas apenas na produção de bens e serviços para autoconsumo;

• as unidades do setor informal caracterizam-se pela produção em pequena escala, baixo nível de organização e pela quase inexistência de separação entre capital e trabalho, enquanto fatores de produção;

• a ausência de registros, embora útil para propósitos analíticos, não serve de critério para a definição do informal na medida em que o substrato da

informalidade se refere ao modo de organização e funcionamento da unidade econômica, e não ao seu status legal ou às relações que mantêm com as autoridades públicas. Havendo vários tipos de registro, esse critério não apresenta uma clara base conceitual; não se presta à comparações histórica e internacional e pode levantar resistência junto aos informantes; e

• a definição de uma unidade econômica como informal não depende do local onde é

desenvolvida a atividade produtiva, da utilização de ativos fixos, da duração das atividades das empresas (permanente, sazonal ou ocasional) e do fato de tratar-se da atividade principal ou secundária do proprietário da empresa. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2006, p. 11, grifos nossos).

Para o IBGE, informal é o empreendimento pouco organizado, não sendo a falta de registros o indicador seguro para a composição dessa definição. A Encif não analisa a população em situação de rua e também declara que não tem condições de apurar a respeito de pessoas ligadas às atividades ilegais. Sendo assim, a pesquisa se volta apenas para o conjunto de práticas econômicas aceitas socialmente e realizadas por indivíduos domiciliados. É importante também destacar que os trabalhadores domésticos integram, segundo o IBGE, o setor informal, mas não foram analisados pela Ecinf, pois tal categoria já constitui objeto da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2006).

A partir desses esclarecimentos, é possível compreender melhor os principais

resultados da Ecinf. Segundo a pesquisa, em 2003, “existiam 10.335.962 empresas informais que ocupavam 13.860.868 pessoas”. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E

ESTATÍSTICA, 2012, p. 01). Dentre estes indivíduos, estavam trabalhadores por conta própria, pequenos empregadores, empregados com e sem carteira de trabalho assinada, além dos trabalhadores não remunerados. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E

conta própria, 10% empregadores, 10% empregados sem carteira assinada, 6% trabalhadores com carteira assinada e 5% não-remunerados”. (2012, p. 08).

Em relação à Ecinf realizada em 1997, “verificou-se uma variação de 9% no número

de empresas informais, enquanto o crescimento dos postos de trabalho nelas existentes

cresceu 8% em relação à pesquisa anterior”. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA

E ESTATÍSTICA, 2012, p. 01).

O mesmo trabalho, em 2003, revela outros dados interessantes, como o que atesta que a maioria das empresas do setor informal pertence aos trabalhadores por conta própria (88%), sendo apenas 12% de pequenos empregadores. Em relação às principais atividades desenvolvidas, a pesquisa destaca o setor de comércio e reparação (33%) e a construção civil (17%). O restante ficaria a cargo de atividades ligadas à indústria de transformação e extrativa (16%). (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p.02).

Das empresas pesquisadas, 95% tinham um único proprietário e 80% apenas uma

pessoa ocupada. Segundo o IBGE (2012, p.02), “estes dados mostraram que a maior parte dos

empreendimentos continuava a ser formada por trabalhadores por conta própria que trabalhavam sozinhos, sem sócios ou ajudantes não-remunerados”.

Em relação ao local de desenvolvimento das atividades dos trabalhadores por conta própria e dos pequenos empregadores, a Ecinf revelou que 27% realizam sua atividade exclusivamente no domicílio do proprietário. Foi registrado também o alto índice de atividades desenvolvidas fora do domicílio (65%), e em 8% dos casos as atividades são realizadas no domicílio do proprietário e fora dele. De acordo com o IBGE (2012, p.2), tal

resultado se dá em virtude do “peso de atividades como comércio e construção civil. Dentre

os empreendimentos do grupo de atividade comércio e reparação, 62% estavam estabelecidos somente fora do domicílio e 12% dentro e fora do domicílio”. Desses empreendimentos do comércio e reparação que funcionam fora do domicílio do proprietário, 28% se dão em vias públicas, e em relação a esses mesmos negócios que são realizados dentro e fora do domicílio do proprietário 14% são prestados também em vias públicas. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012). Assim, é também possível inferir a expressão dos serviços informais que são praticados nos logradouros públicos de todo o país.

Outro fator interessante que a pesquisa atesta é que várias das empresas do setor informal trabalham por encomenda ou subcontrato. Segundo o IBGE (2012, p.07), estavam

nessa situação “21% das empresas [...], sendo a maior parte da indústria de transformação e

extrativa (36%), seguida pelo comércio (24%) e pela construção civil (18%). Destas, 69%

optaram por trabalhar desta forma por ter garantia de vendas ou de trabalho”. Da análise

desses dados, é possível constatar que as empresas do setor informal no momento em que trabalham por encomenda ou subcontrato estão em rede com outras empresas, que podem ser formais ou informais. Embora a pesquisa não tenha explorado essas conexões, esses dados reforçam a tese de que as mudanças operadas no mundo do trabalho em virtude da

“precarização do trabalho” geram e intensificam esses tipos de relações, que muitas vezes

escondem a verdadeira face da terceirização. Nesse sentido, ensina Viana:

outra sequela é o subemprego, quase sempre ligado à terceirização. Renascem formas extremamente cruéis de exploração do homem, como as oficinas domiciliares de Hong Kong, a exploração de crianças em países como a Índia e o Brasil, a escravidão branca no campo. Surge então outro fenômeno, a economia subterrânea, que não poupa sequer os países ricos – mesmo porque, paradoxalmente,

é também uma peça da nova máquina de produzir. (VIANA, 1999, p. 888).

Se o setor informal é uma peça ligada ao campo da formalidade, ela também não deixa de ser abastecida por desempregados. Nesse sentido, sobre as características dos proprietários de empresas, a Encif apurou que quase um terço deles admite que abriu o próprio negócio porque não encontrou emprego. A esse fator soma-se o sonho de se tornar dono do próprio negócio:

aproximadamente 31% dos proprietários indicaram o fato de não ter encontrado emprego como o motivo de ter iniciado o empreendimento, participação que era de apenas 25% em 1997. Quando se observaram apenas os proprietários do sexo masculino, verificou-se a mesma tendência. Já entre as mulheres, 32% indicaram a complementação da renda familiar como fator mais importante. Esse mesmo padrão se verificou em relação aos proprietários que eram conta própria, porém segundo a maioria dos empregadores, tanto para os homens quanto para as mulheres, o principal motivo que os levou a iniciar o negócio foi o desejo de se tornar independente. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p.10).

Em relação ao indicador idade, a pesquisa revela que a maioria dos proprietários (46%) tem entre 40 e 59 anos. Sobre a escolaridade, verificou-se que poucos possuem nível superior completo, o que ratifica a afirmação de que o desemprego atinge, fundamentalmente, os trabalhadores com menos anos de estudo:

o nível de instrução preponderante dos proprietários também era o mesmo para ambos os sexos, primeiro grau incompleto. Apenas 8% do total de proprietários tinham nível superior completo, sendo que entre as mulheres este percentual

alcançava 10%. Importante ressaltar também que entre os empregadores, a maior parte, 28%, tinha concluído o ensino médio, enquanto que entre os trabalhadores por conta própria, 40% tinham apenas o ensino fundamental incompleto. Tanto entre os homens quanto entre as mulheres, observou-se que os empregadores apresentavam maior escolaridade entre os empregadores que os trabalhadores por conta própria. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p.10).

Percebe-se, portanto, a partir dos dados da Ecinf, que se tem, hoje, um grande setor informal no Brasil. Em 2003, havia quase 14 milhões de pessoas ocupadas nesse campo. Como se verificou, trata-se de grupo no qual predominam trabalhadores mais velhos e com baixa escolaridade, o que, certamente, constitui uma série de empecilhos para que esses trabalhadores promovam a formalização de seus negócios ou sejam absorvidos pelo mercado formal de trabalho em melhores condições.

Outro dado interessante que a pesquisa levanta é de que 76% dos proprietários das

empresas do setor informal não contribuíam para o plano de previdência oficial, “seja por ter

achado o custo elevado (41% daqueles que não fizeram este tipo de previdência), ou por

desconhecer por completo as regras de aposentadoria (15%)”. (INSTITUTO BRASILEIRO

DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p. 11). Sobre este último dado, destaca-se a importância de se incrementar a disseminação de informações sobre as regras do Instituto Nacional de Seguro Social, tornando-o mais próximo desses trabalhadores. Dos que contribuíam para a previdência oficial, destacou-se a participação dos empregadores (47%) em relação aos trabalhadores por conta própria (20%). (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p. 11).

Em relação à formalização das empresas, “88% não possuíam constituição jurídica, o

que correspondia a 93% dos trabalhadores por conta própria e 56% das empresas de

empregadores”. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p.

06). A receita média das empresas, avaliada a partir da perspectiva da formalização, foi a

seguinte: “entre aquelas que possuíam constituição jurídica, 93% tinham uma receita mensal

superior a R$ 2.000,00, enquanto 72% das que não possuíam este registro tinham receita

média até R$ 1.000,00”. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA,

2012, p. 06). A pesquisa também apurou que a maioria das empresas do setor informal não é filiada a sindicato ou órgão de classe:

os indicadores de formalização mostraram que 89% das empresas do setor informal não eram filiadas a sindicato ou órgão de classe. A alta proporção de empresas sem este tipo de filiação se repete para todas as atividades, com exceção de educação, saúde e serviços sociais. Dentre as unidades produtivas que tinham constituição

jurídica (12%) prevaleciam as firmas individuais. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p.06).

Quanto às formas de levantamento de crédito, verificou-se baixo acesso. Apenas 6% das empresas do setor informal utilizaram crédito nos três meses anteriores à pesquisa, no desenvolvimento da atividade. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p. 07).

Entre aquelas que o fizeram, a principal fonte dos recursos foi: bancos, públicos ou privados (para 58% das empresas), o próprio fornecedor (16%) e amigos ou parentes (16%). Entre as empresas de conta própria esta distribuição foi: bancos, públicos ou privados (para 54% dessas empresas), o próprio fornecedor (18%) e amigos ou parentes (18%); já para as de empregadores, prevaleceram, em proporção ainda maior, os empréstimos de bancos públicos ou privados (71% dessas empresas), sendo que os empréstimos com amigos ou parentes representavam 11%, e com o próprio fornecedor 10%. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p. 07).

No que tange à renda média, a pesquisa apurou situações diferentes para empregadores, trabalhadores por conta própria e pessoas ocupadas no setor informal.

O rendimento médio de todos os trabalhos dos proprietários do setor informal era de (R$ 753,00) sendo que o dos empregadores (R$ 1.606,00) era maior que o dos conta própria (R$ 623,00). O rendimento médio do trabalho das pessoas ocupadas nas empresas do setor informal, excluindo os proprietários, foi de R$ 363,00, sendo o dos homens (R$ 378,00) superior ao das mulheres (R$ 338,00). (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2012, p. 13).

A partir desse importante levantamento sobre o setor informal, é possível afirmar que o campo abriga um expressivo número de trabalhadores, especialmente os que trabalham por conta própria que, em grande parte, optaram pela informalidade por não terem encontrado emprego. O perfil desses trabalhadores também inclui baixa escolaridade e idade superior a quarenta anos. Em geral, são pessoas que trabalham fora de seus domicílios, especialmente em atividades de comércio e reparação e construção civil. Muitas das empresas investigadas, em torno de um terço, trabalhavam por encomenda ou subcontrato, não eram formalizadas e não tinham acesso a crédito. Todo esse quadro é ainda agravado pela baixa renda que esses trabalhadores (proprietários, trabalhadores por conta própria e demais ocupados no setor) conseguem obter e pela não contribuição à previdência oficial, o que diminui as chances de algum amparo em razão de adoecimento e de uma aposentadoria digna.

Sem dúvida, o retrato do setor informal urbano brasileiro em 2003 reflete a enorme exclusão social vivenciada por muitos trabalhadores, vítimas da “precarização do trabalho”, processo ainda em constante transformação.

No documento Direito ao trabalho na rua (páginas 52-58)

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