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2.3 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO SIR ROGER SCRUTON

2.3.4 Sobre o internacionalismo

Em razão da sua natureza, o conservadorismo não vê com bons olhos o internacionalismo, pois deposita pouca confiança nas tentativas praticadas para controlar o legislativo e o governo a partir de um lugar que não esteja dentro de suas próprias fronteiras. Reconhece a sua importância, desde que o processo político se fundamente no consentimento dos indivíduos e que seus direitos sejam respeitados. Para isso, a oposição, a livre manifestação de opiniões provocadoras e as regras de solução conciliatória deverão pressupor uma identidade comum. (Scruton, 2015)

Os Estados, por serem soberanos, devem manter relações entre si através de um sistema de direitos e deveres, obrigações e responsabilidades, propondo acordos voluntários que possuam força de lei. Para que isto aconteça, além da soberania, os Estados também devem estar dispostos a ceder sua autonomia para as entidades responsáveis pela manutenção dos acordos internacionais. Porém, atualmente, o internacionalismo não está ocorrendo como deveria pois houve uma distorção na agenda de compromissos que alteraram os propósitos da ONU, da União Europeia e do Tribunal Europeu de Direitos Humanos.

Os tempos mudaram, demonstrando a necessidade de uma nova avaliação dessas organizações e do resultado de suas atuações.

Se hoje, o Tratado de Roma fosse interpretado da mesma forma como foi, quando da sua assinatura, sua funcionalidade representaria a manifestação de vontade da soberania dos seus signatários. “Pois, se a autonomia individual é uma precondição do livre mercado, então a soberania nacional é uma precondição do livre-comércio.” (Scruton, 2015, p. 169)

Da forma como hoje é entendido, o Tratado extrapola a interpretação convencional dos tratados, transformando-se em uma sujeição irreversível, que mais se assemelha a um casamento do que a um contrato.

“Quando a regulação pode penetrar no núcleo dos concorrentes econômicos, eliminando os costumes que fazem de cada indivíduo o que ele é, então o que temos não é o livre-comércio entre nações soberanas, mas a abolição das nações e, portanto, do comércio entre elas. Talvez fosse isso o que Jean Monnet4 pretendia; mas não foi dessa maneira que o projeto europeu foi vendido à população.” Scruton (2015, p. 170)

Através da máquina administradora da União Europeia, um pais que tem sua economia paralisada em razão do alto custo das leis trabalhistas, pode transferir este custo impondo-as aos seus competidores, assim como, um país pode tentar influenciar os administradores do bloco a criarem leis que favoreçam as suas instituições financeiras em prejuízo de suas concorrentes estrangeiras. Isso ocorre de forma continua na União Europeia, haja vista que não está mais transparente se o comercio estre os Estados-nação europeus é beneficiado ou prejudicado pelo regime regulatório. A vida econômica na Europa está, comprovadamente, cada vez mais subjugada pelo centro, fazendo com que diminua sua competitividade em relação ao mundo.

Contudo, Scruton (2015) faz uma análise sobre como seria se as nações da Europa fossem capazes de recuperar as soberanias. Como seria esta relação? Existem duas visões a respeito das relações internacionais defendidas pelas elites políticas: a nacional, aonde os políticos devem trabalhar para manter a lei, a ordem, a paz, a liberdade e a segurança, dentro de seus limites territoriais; o poder

4O consultor econômico e político francês Jean Monnet dedicou a sua vida à causa da integração europeia, tendo

ameaçador de qualquer Estado estrangeiro deve ser enfrentado com a força, proporcional a necessidade, assim como, o uso de tratados e convenções propiciará um bom relacionamento, desde que, não enfraqueça ou comprometa a soberania nacional de cada Estado.

Já na política transnacional as desavenças entre Estados não podem ser impedidas pelo uso da força, mas somente podem ser resolvidas, como um litigio entre indivíduos, através de uma sentença judicial. Para que isto ocorra é necessário que as nações se submetam a uma jurisdição comum e sua aplicabilidade aconteceria através de sanções. Este último era o princípio de Kant. Porém, o que hoje ocorre com a política transnacional em muito se difere da proposta kantiana que era a união dos estados através de um tratado composto por governos republicanos soberanos. (Scruton, 2015)

Esta diferenciação se dá em razão de que a proposta kantiana era, segundo Scruton (2015) de uma separação de Estados vizinhos, unidos através de uma união federativa que não prevenisse o surgimento de discórdias, caso contrário, a união dos Estados se tornaria uma potência.

“[...] se as democracias servem para proteger-nos das crescentes ameaças de que são alvo, por isso é mais necessário do que nunca adotar a perspectiva nacional em vez de transnacional. A globalização, a facilidade para viajar e a remoção das barreiras à imigração mudaram a natureza da ameaça. Não modificaram, todavia, a resposta eficaz contra ela que, como Clausewitz nos ensinou, está em desarmar o inimigo para que assim possamos impor nossa vontade.” (Scruton, 2015, p. 178)

Para Scruton (2015) os internacionalistas que se identificam como “cidadãos do mundo” tem uma visão tão cosmopolita que dispensam de uma forma consciente as antigas lealdades nacionais que vinculam as pessoas a seu país. Pode ser que esta visão garanta uma maior segurança do que aquela que defende o não envolvimento direto. Ou seja, o nacionalismo, embora tenha sido usado como uma declaração beligerante de alguns países contra seus vizinhos, sendo uma força destrutiva da política na Europa, por outro lado estabeleceu um vínculo afetivo nacional, contribuindo para uma atuação pacifica no cenário internacional.