• Nenhum resultado encontrado

As influências da tradição do pensamento conservador inglês para a saída do Reino Unido da União Europeia

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "As influências da tradição do pensamento conservador inglês para a saída do Reino Unido da União Europeia"

Copied!
88
0
0

Texto

(1)

ROSANA MARIA CLARO

AS INFLUÊNCIAS DA TRADIÇÃO DO PENSAMENTO CONSERVADOR INGLÊS PARA A SAÍDA DO REINO UNIDO DA UNIÃO EUROPÉIA

Florianópolis 2017

(2)

ROSANA MARIA CLARO

AS INFLUÊNCIAS DA TRADIÇÃO DO PENSAMENTO CONSERVADOR INGLÊS PARA A SAÍDA DO REINO UNIDO DA UNIÃO EUROPÉIA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Paulo Roberto Ferreira, MSc.

Florianópolis 2017

(3)

ROSANA MARIA CLARO

AS INFLUÊNCIAS DA TRADIÇÃO DO PENSAMENTO CONSERVADOR INGLÊS PARA A SAÍDA DO REINO UNIDO DA UNIÃO EUROPEIA

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais em sua forma final pelo Curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 13 de novembro de 2017.

______________________________________________________ Professor e orientador: Prof. Paulo Roberto Ferreira, MSc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. José Baltazar Salgueirinho Osório de Andrade Guerra, Dr.

Universidade do Sul de Santa Catarina

Prof. Rafael de Miranda Santos, Dr. Universidade do Sul de Santa Catarina

(4)

Dedico esta monografia a meu esposo, Silvio Antônio Erné, como uma orgulhosa e agradecida retribuição a toda colaboração que recebi ao longo desta trajetória e ao incentivo para poder continuá-la.

(5)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os professores por terem transmitido a mim o tesouro do conhecimento que ninguém nos tira.

Agradeço a meu dedicado orientador, Prof. Paulo Roberto Ferreira, pela singular oportunidade que recebi em ser sua orientanda, por trabalharmos juntos em pesquisa e, fundamentalmente, pela incursão ao maravilhoso universo filosófico das teorias.

Agradeço a meu filho pelo apoio recebido e, principalmente, pela maravilhosa oportunidade de ser sua mãe.

Agradeço a meu esposo Silvio por todo apoio que recebi ao longo dessa trajetória. Muitas vezes difícil, muitas vezes quase impossível, mas nunca solitária.

(6)

“O grau de estima que se atribui a uma profissão torna-se, geralmente, a medida da estima que os homens que a exercem têm de si mesmos.”

(7)

RESUMO

Este trabalho se dedica a estudar a influência do pensamento conservador como contribuição para a saída do Reino Unido da União Europeia. O BREXIT como ficou conhecido. Em 23 de junho de 2016, devido as insatisfações dos britânicos em relação ao comando de Bruxelas, assim como a exigência de uma maior autonomia externa, o primeiro ministro britânico, David Cameron, realizou um referendo aonde seria decidido sobre a saída ou não do Reino Unido do bloco europeu. Em uma vitória apertada, os britânicos decidiram por não mais fazer parte da União Europeia. Em razão deste fato histórico, o presente trabalho se propõe a estudar o pensamento conservador como um fator relevante que contribuiu para este resultado. Para isso, houve um mergulho na literatura conservadora, escrita por mestres como Burke, Oakeshott e outros, que nos mostraram o significado da palavra liberdade baseada na defesa da manutenção da autonomia dos Estados, do livre comércio, dos costumes e das tradições. Em um segundo momento foram estudados os fatos históricos referente a integração regional, política e economia do Reino Unido e da União Europeia: razões para ficar e razões para sair. Finalmente, no terceiro momento, o encontro do pensamento dos mestres conservadores com os fatos históricos narrados e sua influência para o BREXIT.

(8)

ABSTRACT

This term paper is dedicated in the study of the conservative thought influence as a contribution in the exit of the United Kingdom from The European Union. The BREXIT as it is most known. On 23 June, 2016, due the British people dissatisfaction with regard to the Brussels command, as well as the demand of a bigger outer autonomy, the first British minister, David Cameron, held a referendum where it would be decided the exit or not of the United Kingdom from the European Bloc. In a narrow victory, the British decided not to be in part of the European union anymore. Due to this historical fact, this term paper has the purpose to study the british conservative thought as a relevant factor that contributed to this result. In this regard, there was a dive in the rich conservative literature written by masters such as Burke, Oakeshott and others, which ones show us the meaning of freedom based in the defense of the states autonomy maintenance, free trade, costumes and traditions. In a second moment, the historical fact in regard to the regional integration were studied, also the politics and the United kingdom and European Union economy: reason to stay and to exit. Finally, in the third moment, the thought meeting of the conservative masters with the narrated historical facts and its influence in the BREXIT.

(9)

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Dados Gerais - Reino Unido ... 51 Quadro 2 - Adesões à União Europeia ... 56 Quadro 3 - Participação no orçamento europeu ... 62

(10)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Estrutura Política da União Europeia ... 58

Figura 2 - Votos Referendo ... 64

Figura 3- Distribuição de votos ... 64

(11)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

1.1EXPOSIÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA ... 12

1.2 OBJETIVOS ... 13 1.2.1 Objetivo Geral ... 13 1.2.2 Objetivos Específicos ... 13 1.3 JUSTIFICATIVA ... 13 1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 14 2 O PENSAMENTO CONSERVADOR ... 15

2.1 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO EDMUND BURKE... 15

2.1.1 Críticas a Revolução Francesa ... 18

2.1.2 A monarquia defendida pela Constituição ... 19

2.1.3 Práticas revolucionárias ... 20

2.1.4 A baixeza dos homens ... 23

2.2 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO MICHAEL JOSEPH OAKESHOTT ... 25

2.3 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO SIR ROGER SCRUTON ... 34

2.3.1 Começando do início ... 34

2.3.2 Do contrato social ... 36

2.3.3 Considerações a respeito do liberalismo ... 37

2.3.4 Sobre o internacionalismo ... 40

2.3.5 Sobre o conservadorismo ... 42

2.3.6 Defendendo a liberdade ... 44

2.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PENSAMENTO CONSERVADOR ... 45

3 OS FATOS QUE IMPACTARAM A OPINIÃO EUROPEIA CULMINANDO NA SAÍDA DO REINO UNIDO DA UNIÃO EUROPEIA ... 51

3.1 A COMPOSIÇÃO DO REINO UNIDO, SUA CONSTITUIÇÃO, FORMAÇÃO POLÍTICA, PARTIDOS HEGEMÔNICOS... 51

3.1.1 Dados Gerais ... 51

3.1.2 Sobre a Constituição Inglesa ... 52

3.1.3 A formação politica ... 54

3.2 A INTEGRAÇÃO REGIONAL DA UNIÃO EUROPEIA ... 55

(12)

3.3 A SUPRANACIONALIDADE DA UNIÃO EUROPEIA ... 58

3.4 A ATUAÇÃO DO REINO UNIDO COMO MEMBRO DA UNIÃO EUROPEIA ... 60

3.5 BREXIT – LEAVE OR REMAIN ... 63

3.6 A SAIDA ... 63

3.6.1 Os motivos para a permanência do Reino Unido na União Europeia... 65

3.6.2 Os motivos para a saída do Reino Unido da União Europeia ... 69

4 O ENCONTRO DO PENSAMENTO CONSERVADOR INGLES COMO RESPOSTA ÀS INSATISFAÇÕES DO REINO UNIDO JUNTO A UNIÃO EUROPEIA ... 76 4.1 BURKE E O BREXIT ... 76 4.2 OAKESHOTT E O BREXIT ... 77 4.3 SCRUTON E O BREXIT... 79 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 82 REFERÊNCIAS ... 84

(13)

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho se propõe, inicialmente, a estudar o pensamento conservador através de seus principais mestres, Edmund Burke, Michael Oakeshott e Roger Scruton. Após, estudaremos a União Europeia, sua formação, estrutura e importância para a Europa, assim como as características políticas e comerciais do Reino Unido. Em seguida, faremos um levantamento dos fatos identificados que levaram o Reino Unido, através do referendo, a decidir pela saída da União Europeia, e finalmente, identificaremos as influências do pensamento conservador na decisão que resultou no pelo BREXIT.

1.1EXPOSIÇÃO DO TEMA E DO PROBLEMA

Em 2016, o primeiro ministro do Reino Unido, David Cameron, Líder do Partido Conservador, realizou um referendo onde seria decidido a permanência ou não do Reino Unido no bloco. Mesmo com o acordo realizado com o comando de Bruxelas que atendia a várias exigências para sua permanência, o resultado do referendo foi pela saída do Reino Unido do bloco europeu.

Entender o BREXIT pressupõe conhecer o contexto histórico do Reino Unido, sua relação com a União Europeia do ponto de visto político e econômico, sua presença parcial marcada pela manutenção de sua moeda, sua não inclusão no Tratado de Schengen, assim como sua postura diante da crise migratória. Para tanto, faz-se necessário conhecer o pensamento conservador e a sua influência nas decisões que culminaram com a saída do Reino Unido do bloco.

Portanto, buscou-se reunir informações com o propósito de responder a seguinte pergunta de pesquisa: Quais foram as influências da tradição do pensamento conservador inglês para a saída do Reino Unido da União Europeia?

(14)

1.2 OBJETIVOS

1.2.1 Objetivo Geral

Analisar as influências da tradição do pensamento conservador inglês e suas consequências para a saída do Reino Unido da União Europeia.

1.2.2 Objetivos Específicos

a) Estudar a escola do pensamento conservador inglês através de seus mestres; b) Conhecer os fatos que impactaram a opinião pública culminando na saída do

Reino Unido da União Europeia;

c) Identificar o encontro do pensamento conservador inglês como resposta às insatisfações do Reino Unido junto à União Europeia.

1.3 JUSTIFICATIVA

O trabalho proposto é importante para a sociedade porque busca entender, através da análise da saída do Reino Unido da União Europeia, as bases da teoria do pensamento conservador e identificar que todos nós somos, de alguma maneira, conservadores, pelo menos em relação ao que estimamos. Esta identificação nos permite compreender que há, em toda a sociedade uma disposição conservadora e que, através dela, irá sendo desenhada uma nova ordem baseada em princípios e valores que emergem quando os fundamentos da sociedade se encontram ameaçados.

Para o comércio internacional este trabalho se torna importante pois irá identificar uma nova tendência de acordos comerciais com o Reino Unido e sua posição no contexto global.

Por último, este tema é de grande importância para o Curso de Relações Internacionais pois irá oferecer aos acadêmicos o conhecimento sobre a tradição do pensamento conservador inglês e suas influências para o BREXIT e para os novos rumos da sociedade atual.

(15)

1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa é qualitativa e de base exploratória. O levantamento dos dados e informações para estudo será feito através do método bibliográfico.

No que tange ao cumprimento do objetivo específico de estudar a escola do pensamento conservador inglês através dos conceitos de Edmund Burke, Michael Oakeshott e Roger Scruton, as fontes utilizadas serão aquelas disponíveis em livros e artigos referentes ao tema a ser abordado. Os resultados serão dispostos em forma de textos que compilarão as ideias e pensamentos do conservadorismo inglês. O objetivo específico de conhecer os fatos que impactaram a opinião pública culminando na saída do Reino Unido da União Europeia será realizado através de pesquisas em sites oficiais, jornais, revistas e trabalhos acadêmicos que permitirá a elaboração de uma análise qualitativa do contexto atual.

Por fim, a identificação do encontro do pensamento conservador como resposta às insatisfações do Reino Unido junto a União Europeia. A busca de uma compreensão mais profunda a respeito das bases do conservadorismo e a sua relevante influência nas decisões que culminaram no BREXIT. Esta identificação será baseada no estudo dos objetivos específicos acima citados.

Este trabalho não se propõe a um posicionamento a favor do BREXIT ou tampouco uma posição contrária a União Europeia. Muito pelo contrário; reconhece na integração do bloco a superação de grandes dificuldades políticas, econômicas e sociais; os elevados níveis de desenvolvimento; o fortalecimento das instituições; da manutenção da paz entre Estados; da expansão da sua produção, e principalmente, da democratização do bem-estar social e de ser a única possibilidade atual de atenuar o sofrimento de milhares de migrantes que fogem das regiões de miséria e conflito.

Portanto, a motivação da escolha do tema surgiu a partir da curiosidade da autora em conhecer a tradição político-filosófica do pensamento conservador e o quanto a robustez destas tradições influenciaram a decisão dos britânicos a ponto de conduzi-los a uma mudança rumo ao desconhecido.

(16)

2 O PENSAMENTO CONSERVADOR

Por paradoxal que possa parecer, a defesa da importância dos partidos políticos, como objeto principal para a aplicação de ações conjuntas na vida pública da época moderna, começou por um conservador. O que nos diz que, ao contrário do que muitos pensam, o pensamento conservador é a seu modo, moderno.

Portanto, temos a pergunta: o que é o pensamento conservador? A resposta para esta pergunta, ou melhor, as inúmeras respostas para essa pergunta, e seu entendimento, estarão presentes na tentativa de expor o seu significado através da imersão feita ao acervo literário a que tivemos acesso. Conservar é isto: manter para libertar. Manter as tradições respeitando as raízes, respeitar o passado para conhecer o presente.

Ou, como tão bem sintetizado nas palavras de Oakeshott (2009): “Ser conservador é preferir o familiar ao desconhecido, o tentado ao não tentado, o fato ao mistério, o real ao possível, o limitado ao ilimitado, o próximo ao distante, o suficiente ao superabundante, o conveniente ao perfeito, a felicidade presente à utópica”.

2.1 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO EDMUND BURKE

Edmund Burke nasceu em janeiro de 1729 na cidade de Dublin, na Irlanda, na época, uma colônia inglesa. Seu pai, era um advogado protestante, e sua mãe, descendente de uma velha família católica. Burke optou pelo protestantismo e, embora tivesse uma ligação profunda com a religião, foi sempre muito tolerante com as diferentes seitas. Em 1750, foi para Londres com o objetivo de se preparar para a carreira de advogado, matriculando-se assim num curso de direito no Middle Temple. Seu primeiro contato direto com a política se deu através de William Gerard Hamilton, um parlamentar que, em 1761, foi nomeado primeiro-secretário do governador da Irlanda e que convidou Burke para acompanhá-lo como secretário particular. Sua entrada na Câmara dos Comuns se dá em 1766 como deputado por Wendover e, em 1774 troca a deputação pela cidade de Bristol e, após, decidiu-se por assegurar seu lugar no Parlamento através da representação do distrito de Malton, cadeira que conservou até encerrar sua carreira parlamentar em 1794. Burke morreu em 9 de julho de 1797. (Kinzo, 2011, P. 16)

(17)

Burke é considerado o fundador do conservadorismo moderno. Este título lhe é atribuído mais pelas formulações teóricas contrárias à Revolução Francesa, movimento ocorrido na França, mas com repercussões em toda a Europa, do que propriamente com sua atuação como político da época, embora tenha sido uma presença atuante como membro do Parlamento britânico.

Foi no período de ascensão ao trono de Jorge III que Burke viveu seu período mais intenso de vida política. Jorge III, ao longo de seu governo, tentou resgatar os poderes da monarquia, perdidos na Revolução Gloriosa de 16881. Por esta razão, Burke se apresenta como um defensor do regime parlamentar e da ordem constitucional inglesa, opondo-se, ferrenhamente, as indicações ao Parlamento através de favores pessoais. Burke era defensor de a escolha ministerial ser realizada apenas através do Parlamento. É através de Burke, que vemos, pela primeira vez, a defesa dos partidos políticos, ocorrida através da autonomia parlamentar.

A Revolução Francesa foi para Burke, uma afronta à solidez dos princípios da liberdade. Foi em oposição ao pronunciamento do reverendo Richard Price, dissidente protestante britânico, responsável pela proposta de uma revisão liberal das questões morais da época, que Burke escreve suas Reflexões sobre a Revolução em França.

Sua obra é composta por um compendio de cartas, discursos parlamentares e panfletos, escritos de uma maneira assistemática, tornando sua interpretação um tanto controversa. (Kinzo, 2011)

Esta ausência de uma estruturação na elaboração de suas reflexões faz parecer, que não há uma consistência teórica e doutrinária. Isto ocorre porque Burke possuía uma infensa posição ao pensamento abstrato. Ou seja, o subjetivismo não pode ser aplicado na solução dos problemas políticos reais. Para Burke, a liberdade e a igualdade eram pensamentos abstratos, e, por esta razão, não poderiam nortear a Revolução. Interessante destacar que, mesmo possuindo posições concretas e defendendo que somente a solidez dos fatos possa basilar uma revolução, Burke admitia a existência de uma realidade superior essencial a qualquer ação. Em razão

1

também conhecida como Segunda Revolução Inglesa, a Revolução Gloriosa foi um movimento revolucionário de caráter pacífico, ocorrido na Inglaterra entre os anos de 1688 e 1689. Foi através desta revolução que ocorreu a troca do absolutismo monárquico pela monarquia parlamentar na Inglaterra.

(18)

disto, percebeu-se uma grande influência da religião presente em suas teorias. (Kinzo, 2011)

Para Burke o Universo é uma criação divina e o Estado e a sociedade faz parte deste Universo de uma forma natural. Dentro desta formação encontra-se o homem, pois este é parte integrante da natureza e, por esta razão, está subordinado às leis eternas, que, por sua vez, criam as convenções sociais necessárias para o convívio do homem na sociedade.

Portanto, a dependência que existe do homem para com o homem necessita de um ordenamento baseado em valores morais e confiança mutua. Desta forma, o homem cria os princípios reguladores necessários à formação de uma sociedade e a possibilidade de fazer parte dela. (Kinzo, 2011)

Podemos assinalar três pontos importantes da concepção de Burke quanto a natureza da sociedade e do Estado: primeiro: a sociedade possui uma essência moral, composta por um sistema de mútuas expectativas, deveres e direitos sociais. Segundo: que o homem possui uma natureza social e que a desigualdade faz parte dessa natureza. A sociedade é composta por diferentes classes e, portanto, a igualdade, tanto política, social ou econômica, vem de encontro a esta natureza. Logo, a ideia de igualdade proposta pela Revolução Francesa opõe-se a “desigualdade da sociedade”, que é uma coisa natural. Em terceiro lugar, Deus legou ao homem a organização denominada de Estado. E é graças à sociedade e ao Estado que o homem realiza suas potencialidades. (Kinzo, 2011)

Outra convicção presente no pensamento político de Burke era a defesa da Constituição inglesa, pois esta alicerçava todo o seu pensamento conservador que, por sua vez, se baseava em três premissas a saber: a constituição representava o pacto social pela qual uma sociedade é criada e aonde todos os indivíduos devem obedece-la, haja vista tratar-se de um contrato voluntário; a constituição representa a expressão das velhas tradições pois contém, em sua essência, a sabedoria de Deus manifestando-se através do trabalho do homem ao longo da história; a constituição representava a garantia do equilíbrio entre a Coroa e o Parlamento, pois dava a monarquia a representação de uma instituição que fortalecia o dever “natural” de obediência e reverência, assim como dava ao Parlamento o controle contra os abusos da monarquia. (Kinzo, 2011)

(19)

Burke foi um feroz oponente contra a denominada “camarilha do rei Jorge III” e contra o imperialismo britânico que ocorria na América, Irlanda e Índia. Defendia a tolerância religiosa, a economia de mercado e as ideias liberais do partido Whig2, recebendo, portanto, a melhor definição, como sendo um liberal conservador. (Kinzo, 2011)

2.1.1 Críticas a Revolução Francesa

Reflexões sobre a Revolução em França originou-se de uma primeira carta, escrita em outubro de 1789, em resposta a um jovem fidalgo francês que tinha interesse em conhecer a opinião de Burke a respeito dos fatos que estavam ocorrendo na França, naquela época. Burke inicia, então, seus primeiros escritos manifestando suas considerações sobre a revolução francesa. (Kinzo, 2011)

BURKE (1997) critica o movimento revolucionário francês comparando-o a um liquido em efervescência. Para que se faça um julgamento acerca dos resultados, é necessário que antes este liquido se acalme. Portanto, antes de se dar felicitações à alguém por um bem recebido, é necessário que se saiba se realmente a pessoa o tenha recebido como um bem. Em outras palavras, Burke demonstra ceticismo em relação a nova liberdade e como esta se harmoniza com o governo e com todas as demais instituições; o exército, a igreja, a administração pública, os valores morais, enfim, tudo o que representa uma sociedade. Para o autor, esta harmonia estará bem representada desde que os valores de liberdade sejam atendidos dentro de uma ordem estabelecida, pois se esta vier a faltar, a liberdade deixará de ser um benefício e perderá a sua durabilidade em um curto espaço de tempo.

Sobre o efeito da liberdade adquirida através da Revolução Francesa e de seus idealizadores, Burke (1997) manifesta cautela ao dizer:

2

Partido político de Inglaterra, constituído nos anos 70-80 do século XVII. O partido dos whigs exprimia os interesses dos meios financeiros e da burguesia mercantil, assim como de uma parte da aristocracia aburguesada. Os whigs originaram o partido liberal.

(20)

O efeito da liberdade é de permitir aos homens aquilo que lhes agrada: vejamos, pois, o que lhes será agradável fazer antes de nos arriscarmos a cumprimentos que muito cedo, talvez, devam ser convertidos em pêsames. A prudência nos ditaria tal conduta se tratasse de indivíduos separados e isolados: mas quando os homens agem em corpo, a liberdade chama-se poder. (Burke, 1997, p. 51 grifo nosso)

Preocupado com as ideias revolucionárias francesas e suas repercussões para com a sociedade inglesa assim como para toda a sociedade europeia, Burke assim se manifesta:

Tudo parece fora do normal neste estranho caos de leviandade e ferocidade, onde todos os crimes aparecem ao lado de todas as loucuras. Diante do espetáculo desta monstruosa tragicomédia, os mais opostos sentimentos se sucedem em nós e, algumas vezes, se confundem. Nós passamos do desprezo à indignação, do riso às lágrimas, da arrogância ao horror. (Burke, 1997, p. 52)

2.1.2 A monarquia defendida pela Constituição

Burke (1997) defende a legitimidade da monarquia somente através da linha sucessória, e, por esta razão, contrapõe-se aos argumentos da sociedade da Revolução, grupo formado por intelectuais ingleses de menor expressão, que defendem a ideia de que o rei deveria ser escolhido também pelos seus súditos, sendo considerado assim, o soberano do mundo. Esta Sociedade da Revolução a que se refere Burke defende que o povo adquiriu, graças aos princípios revolucionários, três direitos fundamentais inseparáveis e que são expressos da seguinte forma: Escolha de seus próprios governantes; depô-los por indignidade e estabelecer um governo para si próprios.

Segundo Burke (1997), em seus esclarecimentos ao fidalgo francês a respeito das bases do pensamento da sociedade da Revolução, da qual apoia a Revolução Francesa, Burke menciona o equívoco praticado ao fazerem referência a Revolução Gloriosa de 1688 onde foi criado a “Declaração de Direitos”. Esta Declaração, pilar da Constituição Inglesa, permeada de sabedoria, moderação e prudência e elaborada por grandes estadistas, não se refere, em momento algum, que caberá ao povo a escolha de seus próprios governantes e que, tão pouco, poderão depô-los por indignidade e estabelecer um governo para si próprios.

Após alguns anos, foi discutida novamente, no Parlamento, a questão de se saber onde fixar a Coroa e como garantir no futuro as liberdades do povo. Mais

(21)

uma vez, através dos princípios da Declaração de Direitos, ficou ratificada a sucessão real pela via hereditária. Para Burke (1997), conforme a própria constituição, a deposição de um rei somente poderá ser feita mediante uma guerra, pois, de outra forma, isso jamais poderia ocorrer. Para Burke (1997, p. 66, grifo nosso): “As leis não podem se fazer escutar por entre o barulho das armas, e os

tribunais caem por terra com a paz que eles não são capazes de manter.”

Em relação ao segundo princípio, que trata da deposição do rei por indignidade, Burke (1997, p. 64) afirma: “Não há governo que possa subsistir, ainda que por um instante, se fosse possível derrubá-lo por algo tão elástico e tão mal definido quanto a opinião que se possa ter a respeito de sua indignidade.”

Com estas palavras, Burke (1997) demonstra o quanto é relativo o critério de deposição por indignidade e, portanto não deve ser usado. Afirma também que uma revolução, certa ou errada, deverá ser o último recurso a ser adotado para solucionar uma questão política.

Quanto ao terceiro princípio, que trata da criação de um novo governo, Burke (1997) evoca a Revolução Gloriosa de 1688, que deu origem a monarquia constitucional inglesa. Para ele, desrespeitar os princípios da Constituição, alicerçada na Revolução, seria desrespeitar o legado deixado pelos antepassados ingleses. E que as novas reformas, quando se fizessem acontecer, fossem alicerçadas na experiência, no legado político e na autoridade.

Na continuidade de suas críticas quanto as mudanças políticas, Burke (1997, p. 69, grifo nosso) ressalta:

O espírito de inovação é, em geral, resultado de um caráter egoísta e de perspectivas restritas. Tais indivíduos se preocupam muito pouco com sua posteridade, que não levará em nenhuma conta as lições de seus antepassados. Aliás, o povo da Inglaterra sabe muito bem que a ideia de herança fornece meios seguros de conservar e transmitir, sem excluir os meios de melhorar. Ela deixa a liberdade de adquirir; mas fixa aquilo que se adquire. Um Estado que se inspira nestas máximas incorpora, como em uma espécie de bem de família, todas as vantagens que ele se proporciona; ele cria uma espécie de usufruto eterno.

2.1.3 Práticas revolucionárias

Em uma crítica a Revolução, Burke (1997) diz que os franceses poderiam ter aproveitado o exemplo ocorrido na Inglaterra e dado à França uma dignidade semelhante ao que foi dada a Inglaterra e que, ao invés de promover uma revolução,

(22)

os franceses deveriam ter aperfeiçoado sua constituição, ao invés de tê-la degradado por não a terem usufruído.

Para Burke (1997) os franceses tinham os elementos necessários para o aprimoramento de sua Constituição, pois havia as combinações e oposições necessárias, ou seja, o antagonismo político que poderia levar os franceses ao caminho da solução de seus problemas sem que fosse necessário lançar mão de uma revolução onde, uma vez ocorrida, tornaram as deliberações uma necessidade e não uma escolha. Ou seja, as diferenças, consideradas pelos franceses como uma falha na sua Constituição, são, para os ingleses, razões para reflexões a todas as resoluções precipitadas. E que, se os franceses tivessem se subjugado a uma verdadeira monarquia, não haveria uma diversidade de membros e de interesses impedindo que se separassem e se distanciassem de seus objetivos.

O autor ressalta que o resultado da conduta adotada pela França não poderia ser mais desastrosa e ineficaz, pois ao desprezarem seus antecessores, desprezaram a si mesmos. Nesta concepção, devido à forma como conduziu a sua revolução, a França pagou um preço muito mais alto em razão das calamidades ocorridas do que pagaram outras nações. A figura da igreja, por exemplo, jamais poderia ter sido vilipendiada, pois esta representava a estrutura moral de uma nação; tampouco seu rei poderia ter sido destituído e, muito menos ter sido dado ao povo liberdades totais.

Todos os outros povos estabeleceram a liberdade civil sobre costumes mais severos, sobre uma moralidade mais austera e mais viril; a França, ao contrário, quando destruiu os impositivos da autoridade real, redobrou a licença de costumes totalmente dissolutos, de opiniões e de práticas insolentemente irreligiosas, e estendeu a todas as classes da sociedade [...]todas as funestas corrupções que geralmente eram taras apenas de ricos e poderosos. Este é um dos novos princípios de igualdade na França. (BURKE, 1997, p. 73).

Burke (1997), critica veementemente a postura dos revolucionários diante do monarca. Este que, na visão de Burke, somente o bem queria a seu povo. No entanto, o resultado encontrado desta revolução foi o castigo no seu próprio sucesso: leis não cumpridas, desmantelamento da monarquia e da igreja, a indústria aniquilada e a retração do comércio. E o pior, o povo empobrecido e a anarquia civil e militar transformada na nova constituição da França.

Para o autor, o resultado disso tudo foi a destruição de uma sociedade que não encontrou resistência. A destituição da monarquia foi realizada de uma

(23)

forma como nunca havia sido vista. As leis deixaram de ser cumpridas pois seus tribunais foram destituídos, a indústria foi aniquilada e o comercio encontrou o seu declínio. As instituições foram destruídas e, no entanto, o povo continuou empobrecido. No entanto, para BURKE (1997), os resultados alcançados, ou seja, a destruição e o caos, não foram exclusivamente resultados de uma guerra, pois, o mesmo resultado aconteceria em uma época de paz, haja vista que os homens que fizeram a revolução pertenciam a um conselho composto por indivíduos temerários e ignorantes.

Elas são o resultado do exercício de uma autoridade presunçosa e inconsiderada porque nada a pode resistir e nada pode fazê-lo. Os homens cujos crimes dispersaram tantos tesouros preciosos, os que abusaram dos bens públicos[...] com tanta prodigalidade e barbárie, encontraram, em seu caminho, pouca ou quase nenhuma oposição. [...] Sua crueldade não foi nem mesmo a miserável reação do medo; ela foi o efeito da perfeita segurança em que se achavam quando autorizaram traições, roubos, rapinas, assassinatos, massacres e incêndios sobre toda a extensão do país esgotado. Mas, desde o princípio, a causa de tudo o que aconteceu foi bem evidente. (Burke, 2009, P. 74)

Ao conhecer os indivíduos que assumiram o Terceiro Estado3, Burke (1997), faz uma análise da relação entre as qualificações destes senhores e sua relação com o poder político. Observa ele que, na sua grande maioria, esta reunião de homens se dá por profissionais de ínfimas jurisdições locais, procuradores do campo, fomentadores e líderes de pequenas guerras de vilas. Embora houvesse algumas exceções, faltava a esse grupo a presença de homens notáveis que deram a seu país contribuições advindas de seus brilhantes conhecimentos, prudência e integridade.

Portanto, para Burke (1997), não se poderia estranhar que estes mesmos homens, ao receber em suas mãos um poder que não estavam acostumados, e que também não corriam o risco de perder nenhuma reputação, pois não as tinham, não soubessem administrar um Estado com a habilidade que os cargos assim os exigiam.

Também não era de se esperar que ao retornar para suas insignificantes atividades laborativas, no final de seus mandatos, esses mesmos homens aceitassem com parcimônia o retorno aos seus anonimatos, sem nenhuma

(24)

beligerância, afinal, esta perda representava não só a ausência de poder político, mas também a quebra de seus egos narcísicos.

Burke (1997), embora defensor da igreja, também promove críticas ao Clero e sua participação na reestruturação do Estado. Foram enviados à Paris vigários de vilas, ou seja, eclesiásticos de muita pouca experiência nos assuntos políticos e que, ao invés de serem possuidores de uma postura mais relevante e conciliadora, aliaram-se aos homens do Terceiro Estado para também se beneficiar.

Este peso preponderante somado à força dos numerosos corpos de chicaneiros que tinham assento nas fileiras do Terceiro Estado, resultou neste momento de ignorância, temeridade, presunção e sede de pilhagem, ao qual nada foi capaz de resistir. (Burke, 1997, p. 79)

Para a nobreza, o autor também lança severas críticas ao dizer que estes, quando viram seus pedidos não atendidos por aquele que sempre todas as vontades lhes satisfizeram, tonaram-se mesquinhos e vingativos, assumindo uma postura de avareza e partindo em defesa apenas, dos seus próprios interesses.

2.1.4 A baixeza dos homens

Segundo Burke (1997), a revolução na França era vista como um movimento que, além de aviltar a dignidade e a importância do Estado, serviu também para promover indivíduos de pouco valor. O escritor evoca a lembrança de outras revoluções, em que ocorreram mudanças no poder do Estado, criaram-se novos líderes, porém, não destruíram o país; davam um novo ordenamento jurídico. Burke (1997) aponta como autores da revolução anárquica os “intermediários judeus”, os quais seriam agitadores e usurpadores e que, subversivamente, promoviam a desordem do Estado.

“A circulação fraudulenta de um papel depreciado” representava o dinheiro que circulava na forma de papel e que era manipulada pelos comerciantes judeus, uma nova classe social que ascendia “os homens de negócios”. (Burke, 1997, p. 80)

A ideia era de que a dignidade e o nobre orgulho não seriam praticados senão pela nobreza. Os comerciantes assemelhavam-se aos charlatões, aos palhaços e aos usuários das oportunidades imediatistas. Tais categorias sociais que

(25)

tentavam se igualar a nobreza nunca se igualariam. Era necessário que a sociedade tivesse diferentes classes de cidadãos e que algumas delas se sobrepusessem às outras. Os que tentaram nivelar a sociedade, apenas acabaram pervertendo a ordem social e natural das coisas. Cita, especificamente, as corporações de alfaiates, cabeleireiros, operários, carpinteiros como categorias servis que não poderiam ser elevadas à condição de participação no governo. O Estado não deveria oprimir tais categorias, porém, o Estado seria oprimido se fosse permitido que tais categorias chegassem a governa-lo. Chamá-los ao poder, imaginando combater a desigualdade, estaria apenas colocando-o na contramão da ordem natural das coisas. (Burke, 1997).

Burke (1997) admite a possibilidade de que uma “democracia pura”, absoluta, seja claramente desejável. Também afirmava que, assim como a democracia absoluta, a monarquia absoluta não poderia ser posta (qualificada) como forma legitima de governo. Na opinião do autor, a chamada democracia pura se tornaria facilmente “uma ignóbil e malévola oligarquia” , e que esta democracia não seria uma forma sadia de república, mas sim uma forma de promover a degenerescência e a corrupção.

Burke (1997) evoca Aristóteles ao dizer que este já fazia referências ao fato de que a “democracia apresenta, em muitos aspectos, uma grande semelhança com a tirania”. Para o autor, em uma democracia, a maioria dos cidadãos, quando ungidos de poder, é capaz de fazer valer suas vontades sobre a minoria, praticando as mais vis opressões, fazendo com que ocorra, com frequência, grandes divisões. Esta dominação exercida sobre a minoria se estenderia sobre um número maior de indivíduos e seria conduzida com maior severidade do que, de modo geral, poderia ser esperado no caso de dominação de uma coroa. Nos casos dos governos da chamada maioria, as perseguições seriam muito mais implacáveis. Como se tivessem uma maior atuação sádica, com requintes de crueldade persecutória.

Concluindo seu pensamento, reconhece que a Assembleia é merecedora de algum elogio ao dizer:

“Os que tudo destroem não poderão deixar de destruir algum abuso que existisse, da mesma forma, os que fazem tudo novo não podem deixar de fazer algum bem.” (Burke, 1997, p. 221)

Porém, salienta que, para que recebam crédito pelo que usurparam ou perdão pelos crimes que cometeram, deveriam afirmar que tais mudanças jamais

(26)

ocorreriam sem a necessidade imperiosa de uma revolução. O que, para Burke, seria totalmente desnecessário, haja vista que, muitos pontos já haviam sido concedidos, voluntariamente pelo rei quando da reunião dos Estados-gerais. Portanto, para Burke (1997), as melhorias que foram alcançadas pelo resultado da Revolução são superficiais, porém, os erros cometidos por ela, estes sim são fundamentais. (Burke, 1997)

2.2 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO MICHAEL JOSEPH

OAKESHOTT

Michael Joseph Oakeshott nasceu em 11 de dezembro de 1901, em Chelsfield, um bairro na região sudeste de Londres, onde residiam algumas personalidades de destaque da sociedade londrina da época, sendo Oakeshott considerado uma delas. Durante os anos de 1920 a 1930, frequentou a Gonville and Caius College de Cambridge. Fez lá sua formação acadêmica em história e filosofia.

Durante a década de 1930 seus trabalhos revelavam críticas ao nazismo e ao marxismo. Em 1947 trocou de universidade e passou a lecionar em Oxford. De um modo geral manteve-se sempre como um intelectual e nunca atuou como político.

Esse desinteresse pela política cotidiana, aliado a difícil compreensão de alguns de seus textos ao leitor comum, contribuiu para a aparente confusão de definições sobre o seu modo de pensar. A importante contribuição teórica de Oakeshott, que abrange as décadas de 1930 a 1980, apresenta oscilações tanto em conteúdo quanto em consistência, transitando entre o campo liberal e o conservador, por vezes de forma indistinta. Ainda na época de Margareth Hilda Thatcher, Michael Oakeshott, professor aposentado desde 1969 da London School of Economics, era um personagem de destaque na intelectualidade inglesa. A primeira-ministra teria proposto a Rainha Elizabeth II que homenageasse Michael Oakeshott com a condecoração da Ordem dos Companheiros de Honra, para recompensá-lo pelos seus trabalhos no terreno das Ciências Humanas e das Artes; porém, ele teria se negado a receber esta homenagem da nobreza. Assim como era admirado por ser uma liderança do conservadorismo britânico era admirado também por ter posicionamentos filosóficos que criticavam a ordem nobiliárquica. Oakeshott faleceu em 19 de dezembro de 1990, em Acton, Reino Unido. (Britannica.com)

(27)

Inicialmente, para se obter um entendimento acerca dos diversos trabalhos produzidos por Michael Oakeshott no âmbito da filosofia e em outras diversas áreas, faz-se necessário lembrar, ainda que brevemente, a realidade da sociedade anglo-saxônica, na primeira metade do século XX, especialmente ao que se refere ao antagonismo que prevalecia entre o pensamento liberal e o pensamento conservador. Somente considerando as divergências da época é que será possível observar a originalidade e a força das palavras de Oakeshott presentes em sua rica produção teórica que abrange as décadas de 1930 a 1980.

As diversas disputas políticas ocorridas entre os séculos XX e XXI marginalizaram o termo conservador de forma pejorativa e confusa, atribuindo-lhe características que não compõem, necessariamente, seu quadro de referências. As definições e entendimentos de conservador passaram por transformações profundas desde que Edmund Burke fez nascer esta nova concepção política filosófica, tomando as mais variadas formas nos novos e diferentes conflitos de interesses que foram surgindo ao longo do tempo.

Na concepção popular, a tendência é igualar conservadorismo à chamada direita política. Esta tendência de reduzir os conceitos a uma forma simplista mais confunde do que esclarece, pois reúne, inadvertidamente, no mesmo grupo, tradicionalistas medievais e ateus; pró-mercado e intervencionistas; fanáticos e moderados; moralistas e céticos; liberais e conservadores; democratas e autoritários.

Portanto, é importante saber que Oakeshott era um cidadão britânico que pensava e falava a partir da Grã-Bretanha; ou seja, sua identificação com o sentimento de conservação esta alicerçada em terreno sólido, diferente das regiões subdesenvolvidas do mundo, que convivem, historicamente, com a opressão, a corrupção, a pobreza e a miséria e desejam mudanças radicais imediatas e a qualquer preço, pois geralmente pouco ou nada ainda tem a perder.

É relevante a lembrança de que o surgimento e a aprovação de mudanças sociais, muitas vezes de modo acelerado – fenômeno marcante no século XX – provocava também desagrados. Qualquer proposta que tivesse uma certa dose de risco de provocar mudanças radicais, parecia ser um empreendimento arriscado, já que as inovações podem, sabidamente, tanto produzir ganhos quanto podem produzir perdas. Os ganhos geralmente são tidos apenas como possíveis: portanto, o ônus da prova das possibilidades de sucesso, acabava recaindo geralmente nos

(28)

inovadores. Quanto mais radicais as mudanças, maior o risco, menor a previsibilidade. (Cardoso, 2009)

As questões enfrentadas naquela época poderiam ser agrupadas em quatro temas: dois deles se dirigem a problemas de ordem moral e religiosa; corrosão dos valores morais e a defesa do resgate do cristianismo. Os outros dois se voltam para questões de ordem política e econômica que se referem as diferenças naturais entre os homens que passam a ter um discurso contra o movimento operário e, paralelamente, um discurso anticientífico e antimoderno, relativo ao progresso tecnológico da evolução industrial, a qual passa a alterar as estruturas sociais conhecidas (leis trabalhistas) e ameaça arrastar os seres humanos para um futuro imprevisível. Assim, o conservadorismo ainda que fortemente vigente no século XX, se tornou cada vez mais liberal, principalmente após a II Guerra Mundial. Nesta mudança do conservadorismo tradicional para um conservadorismo mais liberal foi que ocorreram as grandes contribuições de Oakeshott. (Cardoso, 2015)

Inicialmente, Oakeshott (2009) esclarece que ele particularmente não compartilha da crença geral de que é possível deduzir os princípios gerais que caracterizam ou esclareçam o que significa a expressão “conduta conservadora”.

Admite a possibilidade de que a análise da denominada “conduta conservadora” seja uma tarefa que não esteja no domínio popular (ideias gerais) e que, portanto, tenha havido dificuldades (resistências) em aceitá-la. Esclarece também, que a conduta conservadora não deveria ser qualificada como “menos idônea”, que qualquer outra conduta. Seu propósito não seria discutir estas variáveis anteriormente citadas, mas ofertar uma análise que não seja uma “crença” e nem tampouco uma “doutrina”, mas apenas uma forma de ser e estar.

Ser conservador significaria uma “inclinação a pensar e a comportar-se

de determinada forma; é preferir certas formas de conduta e certas condições das circunstâncias humanas a outras; é dispor-se a tomar determinadas decisões”. (OAKESHOTT, 2009, grifo nosso)

Portanto, o objetivo de Oakeshott (2009) é interpretar esta atitude tal como ela se apresenta no seu caráter contemporâneo, em vez de a transpor para a língua dos princípios gerais.

Distinguir as caracteristicas gerais desta atitude não é tarefa difícil, embora elas tenham sido constantemente confundidas. Baseado nesta justificativa, Oakeshott (2009) cita como características de um conservador a inclinação ao uso e

(29)

valorização daquilo que já possui ao invés de sair em busca de outra coisa; deleitar-se mais com o predeleitar-sente do que o passado ou o futuro, pois é no predeleitar-sente que encontra a familiaridade; a certeza de que a prática da reflexão produz uma gratidão adequada ao disponível e, por esta razão, valoriza o reconhecimento de uma

herança do passado sem que haja uma idolatria pelo que já se foi. (Oakeshott, 2009) A conduta conservadora, dependendo da estabilidade da situação

presente, assumirá uma tendência. Se a situação presente for estável, pouco atrativa e oferecer pouco ou nada que possa ser desfrutado, a tendência da conduta conservadora será frágil ou até inexistente. Porém, se a situação presente for instável, a conduta conservadora será mais pronunciada, buscará situações que proporcionem apoio, principalmente quando houverem riscos iminentes de perdas. Observa-se que tais condutas conservadoras são mais frequentes em pessoas com mais experiência.

Segundo o autor, o conservadorismo do idoso seria mais perceptível não porque os velhos sejam mais sensíveis às perdas que os mais jovens, mas porque seriam mais conscientes dos recursos que necessitam para sobreviverem e como fariam na ausência desses recursos. (Oakeshott, 2009)

Diante de uma visão conservadora, Oakeshott (2009) caracteriza as mudanças como alterações da vida que temos que sofrer, temos que nos acomodar e nos submetermos a elas; e as inovações seriam aquelas que poderíamos planejar e executar, ou não.

Segundo o entendimento do autor, a disposição conservadora, pela sua característica de usufruir o que está presente e disponível, gera união e afeto entre as pessoas. Também a mesma disposição conservadora, por ser predominantemente avessa às mudanças, tende a ser qualificada como se fosse sempre uma forma de depravação dos costumes vigentes. (Oakeshott, 2009)

Para Oakeshott (2009) as perdas abruptas e decorrentes de importantes mudanças, tornam difícil a resignação pelas características do modelo conservador, pois ocorrerá grande dificuldade em substituir o objeto perdido por algo que não tenha a mesma afinidade que mantinha com o anterior.

Cita como exemplo de sua tese de substituição compensatória de perdas, o fato de ser mantido na denominação dos novos objetos, os mesmos nomes dos objetos perdidos. Exemplo seria o povo Maçai (tribo africana da Tanzânia e do Quênia). Quando foram transferidos da sua pátria original para uma reserva no

(30)

Quênia, levaram com eles os nomes das suas colinas, planícies e rios para o novo local. (Oakeshott, 2009)

As mudanças seriam, pois, sempre um motivo de sofrimento para uma pessoa com motivações conservadoras.

Com relação à inovação, o modelo conservador posiciona-se como um não ardente inovador, tendendo a possuir uma postura cautelosa. Prefere conviver com as coisas como elas são e não o preocupa a ausência de inovações, pelo simples fato de serem inovadoras. Tende a analisar as propostas inovadoras duas vezes antes de aceitá-las. Mesmo nas situações onde a inovação seja um melhoramento, um progresso, é sempre avaliado também o quanto é possível avaliar as reais vantagens, para evitar se lançar na possibilidade de ocorrer um resultado pior. (Oakeshott, 2009)

As conclusões sobre as características do conservador são sintetizadas da seguinte maneira: Em primeiro lugar, a inovação implica numa perda certa e em um ganho possível (provável). Deve, portanto, o inovador demonstrar o que se pode esperar de benefícios com a mudança; em segundo lugar, prevalece a crença que quanto mais a inovação se assemelhar a uma modalidade de crescimento intimamente compreendida e não uma imposição externa, menos oportunidades haverá de que, no resultado, predominem as perdas; Em terceiro lugar, prefere as inovações pequenas e limitadas às grandes e indefinidas. Isto decorre do entendimento de que a inovação é uma reação a algum defeito específico, como algo que visa corrigir ou compensar um desequilíbrio; ao invés de ser concebido como um melhoramento geral das circunstâncias humanas, que terá como objetivo alcançar uma perfeição que talvez não ocorra; em quarto lugar, prefere o passo lento ao rápido. Além disso, tende a parar para observar as consequências atuais e fazer os ajustamentos necessários; em quinto lugar, valoriza a oportunidade da ocasião. As inovações também devem ter uma ocasião favorável para se manifestarem. Esta oportunidade mais favorável para a inovação ocorreria quando a inovação se limitasse àquilo que se propõe. Dessa forma haveria menores probabilidades de consequências indesejadas ou incontroláveis.

“A atitude conservadora é, então, quente e positiva no que toca ao gozo das coisas e correspondentemente fria e crítica relativamente à mudança e à inovação: estas duas inclinações apoiam-se e explicam-se mutuamente. [...] O que os outros veem como timidez, ele qualifica como prudência racional; o que os outros interpretam como sendo inatividade, para ele constitui uma

(31)

inclinação para desfrutar em vez de explorar. E uma pessoa cautelosa e tende a indicar a sua aprovação ou desaprovação não de forma categórica, mas prudente.” (Oakeshott, 2009, p. 8, grifo nosso)

Sobre o tema da Natureza Humana, Oakeshott (2009) faz algumas considerações demonstrando a tendência humana à inércia e sua fácil adaptabilidade a chamada Lei do Menor Esforço, que, na realidade, representa uma tendência humana de viver pelo chamado Princípio do Prazer, e que é, por sua vez, uma tentativa de reviver uma condição semelhante aos primeiros anos de vida, senão, mais regressivamente da vida intrauterina, onde tudo é provido gratuitamente e onde não há sequer desprazer térmico. É, possivelmente, a origem da concepção do Paraíso. (Oakeshott, 2009)

Pensa-se comumente que esta atitude conservadora está profundamente enraizada naquilo que se chama “natureza humana”. A mudança é cansativa, a inovação exige esforço, e os seres humanos (ou pelo menos, assim se diz), são mais aptos para serem ociosos que para serem ativos. Se encontrarem uma forma suficientemente satisfatória de viver a sua vida, não estarão dispostos a procurar problemas. São, por natureza, apreensivos relativamente ao desconhecido e preferem a segurança ao perigo. São inovadores reticentes e aceitam a mudança não por gostarem dela, mas (como Rochefoucald disse que aceitam a morte), por não poderem evitá-la. A mudança gera mais tristeza que alegria; o paraíso corresponde ao sonho de um mundo tão perfeito como imutável. Logicamente, quem interpreta a natureza desta forma está de acordo quando diz que esta atitude não é única: sustenta, simplesmente, que é extremamente forte, talvez a mais forte de todas as propensões do homem. E, nesta medida, há algo que deve ser dito a favor desta crença: as circunstâncias humanas seriam, seguramente, muito diferentes do que são se não houvesse um grande ingrediente de conservadorismo nas preferências humanas. (Oakeshott, 2009, p. 9)

Oakeshott (2009) reconhece, também, a tendência de fascínio pelo novo como uma característica humana que interfere nos fatores sociais e políticos e, em oposição, uma outra característica do ser humano que é o impulso de apreciar e preservar. Reconhece que esta, em oposição àquela, representa uma atitude conservadora que funciona como um obstáculo necessário, não como uma alternativa verosímil, mas sim como um guardião que preserva aquilo que o ser humano ainda não está apto a destruir, e que denominamos como “as boas coisas da vida”.

Oakeshott (2009) cita alguns exemplos em que a atitude conservadora é decisiva, senão a única capaz de prevalecer. Faz referência as atividades em que o objetivo é o usufruto recente e não um benefício, um prêmio ou um resultado para além da experiência em si. Por exemplo, a atitude conservadora entre os membros

(32)

de um time que discute a importância da observação das regras estabelecidas no decurso da competição.

A atitude conservadora também seria comum nas relações de amizade em que não se busca nenhum benefício. Elas se sustentam pelo que são e não pelo que proporcionam. As verdadeiras amizades se sustentariam não pelo que poderia um obter do outro, mas pelo prazer de como passam o tempo juntos ou fazem coisas juntos. A relação de amigos seria sentimental, não utilitária; o vínculo seria de familiaridade e não de utilidade; portanto, a atitude implícita seria conservadora. (Oakeshott, 2009)

Sobre o tema da disposição conservadora na política, Oakeshott (2009) comenta o aspecto histórico de que o conservador teria uma atitude conservadora porque haveria influências das crenças religiosas. Dentre elas, haveria a crença na existência de uma lei natural, que seria obtida através da experiência humana e sua relação com uma ordem providencial, a qual, por sua vez, seria o reflexo de um objetivo divino presente na natureza e na história da humanidade. A esta Ordem Providencial a humanidade deveria se adaptar. O afastamento desta ordem, desta norma divina, significaria a injustiça e a calamidade. Esta atitude conservadora estaria também associada a uma crença no valor absoluto da personalidade humana.

Isto posta esclarece que estas interpretações sofrem de um grave defeito, pois, para Oakeshott (2009) uma atitude conservadora na política em nada tem a ver com a religião e, tão pouco com nenhuma lei natural. O que pesa é a nossa atual forma de vida, segundo o qual o fato de governar é apenas uma atividade limitada e específica, necessitando utilizar-se do bom uso das regras gerais de conduta, que devem ser entendidas como instrumentos que permitam as pessoas a buscar a sua melhor maneira de viver. Portanto, é algo sobre o qual é conveniente ser conservador.

Quanto ao desenvolvimento do raciocínio a respeito da condição humana, OAKESHOTT (2009) partiu do entendimento de que possuímos uma tendência a nos apaixonar pelos nossos próprios interesses, confirmando-se o princípio de que temos preferências individuais. Cada um de nós, portanto, tende a seguir seu próprio caminho, segundo seus projetos. Não haveria nenhum projeto tão estranho que não se consiga encontrar alguém que o realize, nem nenhum empreendimento tão insensato que ninguém o execute. Alguns sonham com novos e melhores mundos;

(33)

outros preferem caminhos conhecidos ou até a inércia. Alguns lamentam a rapidez da mudança, outros a apreciam, mas todos a reconhecem, mais cedo ou mais tarde.

“Por vezes, cansamo-nos e adormecemos; é um alivio olhar para a vitrina de uma loja e não encontrar nada que ambicionemos; agradecemos a fealdade simplesmente porque repele a atenção. Mas, na maioria dos casos, ansiamos a felicidade através da busca da satisfação dos desejos que surgem inesgotavelmente”. (Oakeshott, 2009, p. 19)

Quanto às relações humanas, elas são um agrupamento sem fim de emoções (amor, ódio, inveja, amizade) e de objetivos (trabalho, interesses, projetos) divergentes e convergentes, dependendo dos interesses. Portanto, a capacidade de conviver com esta miríade de encontros e desencontros é o que permite ao homem fazer parte de uma sociedade; é a sua capacidade de adaptar suas atividades as dos outros para alcançarem, juntos ou separados, os mesmos objetivos.

“Fazemos acordos, construímos expectativas acerca da conduta dos outros; aprovamos, somos indiferentes e desaprovamos”. (Oakeshott, 2009, p. 19)

Para OAKESHOTT (2009) a razão pela qual isso é assim não tem a menor importância. Em momentos passados, situações diferentes se apresentaram e não haviam tantas opiniões sobre estas situações. Portanto, o que leva o homem a portar-se de determinada forma é a sua tradição de ser como é. É, simplesmente a capacidade imutável do homem de fazer suas próprias escolhas.

Em relação à política, o autor faz uma distinção entre como deveria ser o modo conservador de governar e o modo conservador de fazer política e qual seria o papel dos indivíduos em ambas as situações.

“A função do governo não reside em impor outras crenças e atividades aos seus súditos, da mesma forma que não deve protege-los nem educá-los; nem em fazê-los melhores ou mais felizes de outra forma; nem em comandá-los ou estimulá-los a ação; nem guiá-los nem coordenar as suas atividades de modo a que não se produza nenhuma ocasião de conflito. A função do governo consiste, simplesmente, em governar. Esta é uma atividade especifica e limitada, facilmente corruptível quando combinada com outras e, dadas as circunstâncias, indispensável. A imagem do governante deve ser a de um árbitro cuja função consiste em aplicar as regras do jogo, ou a de um moderador que dirige um debate sem participar dele.” Oakeshott (2009, p. 21)

Portanto, ao governo se atribui a principal função de dirimir conflitos provenientes de crenças e atividades opostas umas às outras; fazer e preservar a paz sem impor proibições às escolhas ou as diversidades presentes; manter-se no seu exercício sem conduzir tudo a uma uniformidade, a não ser diante da aplicação

(34)

de regras gerais de condução a todos os indivíduos de modo igual. (Oakeshott, 2009)

“Em síntese, os segredos do bom governo provêm do protocolo, não da religião ou da filosofia; no gozo de um comportamento ordeiro e pacífico, não na busca da verdade ou da perfeição.” (Oakeshott, 2009, p. 22)

Com relação às inovações e à postura do governo quanto a estas, Oakeshott (2009) manifesta-se dizendo que o conservador se mantem à distância das inovações que tem como objetivo, apenas a satisfação de situações hipotéticas. Para isso, o conservador prefere aguardar a confirmação das circunstâncias que justifiquem a existência de uma nova regra a modificá-las. Ao conservador caberá o ceticismo dirigido aos governantes que propõem mudanças que vão além das necessidades apresentadas; daqueles que desejam poderes extraordinários para realizar grandes mudanças; desconfia dos projetos que apresentem palavras como “o bem público” ou a “justiça social” e daqueles que se autodenominam “salvadores da sociedade”, pois nada lhe parece mais inútil do que envergar uma aparente armadura e procurar dragões para matar. Portanto, para o conservador, nada será mais adequado do que utilizar a prudência e a sensatez para o ato de governar.

“Agora, a atitude conservadora relativamente a política reflete uma opinião completamente diferente da atividade de governar. O conservador entende que a função do governo não consiste em alimentar paixões e dar-lhe novos objetivos com que possam alimentar-se, mas sim em introduzir um ingrediente de moderação nas atividades de pessoas demasiado apaixonadas; limitar, desencorajar, pacificar e reconciliar; não atiçar o fogo do desejo, mas sufocá-lo. E tudo isto não porque a paixão seja um vício e a moderação uma virtude, mas porque a moderação é indispensável se quiser evitar que homens apaixonados sejam aprisionados por conflitos que os frustrem mutuamente”. Oakeshott (2009, p. 23)

Para Oakeshott (2009) o conservadorismo na política representa a observação de quando a atividade se inclina para o empreendimento de alguma coisa, então, o contrapeso necessário será outra classe de atividade inclinada à limitação, porque inevitavelmente a parte beneficiada se corrompe quando o poder dado à política é utilizado para impulsionar os projetos relevantes para alguém. “Um árbitro que é ao mesmo tempo um dos jogadores não é um árbitro; as regras acerca das quais não somos conservadores não são regras, mas incitamentos à desordem; a união entre sonhos e governo gera tirania.” Oakeshott (2009, p. 27)

(35)

Com relação aos jovens na política, Oakeshott (2009) expõe que a atitude adolescente é extremamente temerária e experimental. Para o autor, quando se é jovem, desconhece-se as implicações decorrentes de correr riscos, e nada parece mais atrativo do que isto. É temerário e desaconselhável conceder aos adolescentes e adultos muito jovens a governabilidade que se espera de um governante. Baseado neste conceito, finaliza sua obra com o seguinte comentário a respeito dos jovens, quando se refere a possibilidade deles atuarem na vida política:

“Os tempos de juventude de toda a gente são um sonho, uma loucura deliciosa, um doce solipsismo. Nesse tempo, nada tem uma forma fixa, um preço fixo; tudo é possível e vive-se numa felicidade a crédito. Não há obrigações a respeitar, não há contas a fazer. Nada há que se especifique de antemão; cada coisa é o que se pode fazer dela. O mundo é um espelho em que procuramos o reflexo dos nossos próprios desejos. A tentação das emoções violentas é irresistível. Quando somos jovens, não estamos dispostos a fazer concessões ao mundo; […]Não sabemos distinguir aquilo de que gostamos de aquilo que valorizamos verdadeiramente; a urgência é a nossa escala de valores; e é nos difícil compreender que o aborrecido não é necessariamente desprezivel.” (Oakeshott, 2009, p.28, grifo nosso)

2.3 O PENSAMENTO CONSERVADOR SEGUNDO SIR ROGER SCRUTON

Sir Roger Scruton nasceu em 27 de fevereiro de 1944 em Lincolnshire, Reino Unido. É escritor, filósofo e comentarista público. Ele se especializou em estética com especial atenção à música e a arquitetura. Participa de debates políticos e culturais contemporâneos do ponto de vista de um pensador conservador e é conhecido como um poderoso polêmico. Além de ter escrito mais de quarenta obras sobre os mais diversos temas, Scruton escreveu tambem amplamente na imprensa sobre questões políticas e culturais. (SCRUTON, 2017)

2.3.1 Começando do início

Desde que o homem passou a viver em uma sociedade e para poder compô-la, passou a atender as necessidades de criar vínculos com as pessoas. E esses vínculos, perfeitamente coordenados entre si e que formam nossa sociedade, são o respeito às leis, a nacionalidade e a vizinhança.

Para podermos viver nesta sociedade, desfrutando de um ambiente de liberdade e com a possibilidade de buscarmos nossos objetivos por conta própria,

(36)

necessitamos que estes vínculos sejam, para nós importantes. Os mercados, por exemplo, para que possam interagir, necessitam, além de sua ordem, da confiança entre os integrantes, e isto somente ocorrerá através de uma atitude de responsabilidade sobre os atos praticados em ambos os lados. Ou seja, “a ordem econômica depende da ordem moral”. (SCRUTON, 2015, p. 37)

Em uma explanação sobre os níveis de entendimento que o homem possui de si mesmo e da sociedade – o instintivo e o pessoal, Scruton (2015) demonstra que o instintivo se refere a situações de nossa vida a qual não temos controle, como o medo do escuro, o impulso ao apego materno e assim por diante, já o pessoal é atribuído a culpa, vergonha, o amor pela beleza, o senso de justiça. Este é atribuído a sentimentos que emergem da própria razão refletindo as relações interpessoais necessárias para a existência da convivência em uma sociedade. Nos dois instintos estão presentes a capacidade de realizar sacrifícios; no primeiro, em razão da existência do sentimento inconsciente de posse; no segundo no senso de responsabilidade que relaciona o indivíduo com a sua forma moral de viver.

Com relação a comunidade, Scruton (2015) se refere a ela através da valorização dos oikos (palavra grega que significa casa ou família), que não significa somente o lar, mas as pessoas que as compõem, ou seja, é o lugar que chamamos de “nosso”. E, as virtudes nela encontradas, como altruísmo, respeito ao próximo e ser respeitado, o senso de responsabilidade, ou seja, as características de nossa natureza humana que nos torna guardiães de nossa herança comum, surgem através de nosso crescimento como pessoas que somos através de ilhas de

valores. E é sobre isto que trata o conservadorismo: a formação de uma

comunidade baseada em valores intrínsecos que o homem transmite através de seu legado.

Em relação à tradição, Scruton (2015, p. 40) diz:

As tradições sociais importantes não são costumes arbitrários que devem sobreviver ou não no mundo moderno. São formas de conhecimento. Contém os resquícios de muitas tentativas e erros conforme as pessoas tentam ajustar a própria conduta à das demais.

Para Scruton (2015) falar sobre o tema “tradição” não é discutir sobre convenções ou ideias dogmáticas, mas sim dar às perguntas respostas implícitas que se encontram incorporadas nas práticas sociais. Ou seja, usando uma expressão de Burke, a tradição é mais uma “predisposição”, um sentimento, que se

(37)

encontra em nossa razão e que a acionamos quando se torna necessário. Não raciocinamos sobre os fatos que se apresentam quando evocamos a tradição de algo. Sentimos. E é justamente esse sentimento, guardado em um nível inconsciente, que acionamos quando nos vemos diante de situações como as instituições de caridade, o sentimento de pertencer a uma família, e todo o arcabouço de grupos sociais a que pertencemos.

Scruton (2015) vai mais além quando fala sobre tradição. Esta não representa um conhecimento teórico acerca dos fatos e das verdades, tampouco um conhecimento técnico comum. A tradição é um conjunto de conhecimentos, adquiridos ao longo da vida, que o indivíduo lança mão quando se vê diante de situações que exigem uma resposta positiva. O adequado comportamento do indivíduo perante a sociedade, a família, a igreja; as boas maneiras, a caridade. Este conhecimento não é transmitido somente pelo ensinamento. O indivíduo o aprende por osmose e, quem não o adquire, é qualificado como um indivíduo que desconhece esses valores intrínsecos.

2.3.2 Do contrato social

Para SCRUTON (2015) o contrato social é um acordo manifesto ou implícito, vinculado a tudo aquilo que os cidadãos sensatos possam consentir. É, portanto, o resultado da razão e da ordem política.

Como exemplo, cita o contrato existente entre duas pessoas a respeito de uma determinada coisa. Ambos possuem o livre arbítrio para tomar suas decisões. Se ele existe é porque ambos concordaram. Se houver uma quebra deste contrato, haverá consequentemente um prejuízo para ambos, pois se trata do não reconhecimento de uma escolha racional fundamentada e amparada por um contrato. Por esta razão, se transportarmos as obrigações dos indivíduos para com o Estado como se fosse um contrato social firmado entre as partes, este seria justificado em termos consentidos por todos os seres racionais. Os contratos são paradigmas de obrigações auto escolhidas, que não estão pautadas pela coerção ou imposição.

Referências

Documentos relacionados

Este seguro prevê e regula a inclusão, automática dos cônjuges dos Segurados Principais que estejam em perfeitas condições de saúde, na qualidade de Segurados

Os estudos originais encontrados entre janeiro de 2007 e dezembro de 2017 foram selecionados de acordo com os seguintes critérios de inclusão: obtenção de valores de

O teste de tetrazólio é resultado de muitas pesquisas e sua aplicação em embriões zigóticos para estudo da viabilidade de sementes de coqueiro é importante por possibilitar

A solução, inicialmente vermelha tornou-se gradativamente marrom, e o sólido marrom escuro obtido foi filtrado, lavado várias vezes com etanol, éter etílico anidro e

[r]

FROM TO Le Havre Antwerp London Hamburg Santos Paranaguá Itapoá Montevideo Buenos Aires.. Until end of

23 Level 5 Level 4 Level 3 Level 2 Level 1 Level 0 Remote Gateway Services Patch Management AV Server Application Mirror Web Services Operations Application Server

• Sempre que determinada a anulação total ou parcial de impostos, direitos e outras imposições aduaneiras pagos, deve ser emitida uma nota de crédito pelo Director de Área Fiscal,