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A inversão operada pelo legislador, com atribuição da primazia ao critério material sobre o critério orgânico; a técnica da segmentação do Código em módulos

No documento O Novo Cdigo do Procedimento Administrativo (páginas 40-42)

ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ∗

2. ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO

2.1. A inversão operada pelo legislador, com atribuição da primazia ao critério material sobre o critério orgânico; a técnica da segmentação do Código em módulos

(re)agregáveis

Tendo presentes os traços caraterísticos do art.º 2.º, que se acaba de enunciar, evidencia-se a «volta de 180 graus» operada na matéria em apreço pelo novo Código: é agora atribuída a primazia ao critério material ou objetivo de Administração Pública sobre o critério orgânico ou subjetivo, critério este de que, num primeiro momento, se aparenta prescindir, com inversão da ordem estabelecida no regime anterior.

Em consonância com o disposto no art.º 2.º, o mesmo elemento orgânico desaparece das definições de ato e regulamento administrativo. Assim, em vez de “(…) consideram-se atos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que, ao abrigo de normas de direito administrativo…” (art.º 120.º do CPA de 91), segundo o atual art.º 148.º “(…) consideram-se atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes administrativos…”. Em termos idênticos, a novel definição de regulamento administrativo constante do art.º 135.º do Código de 2015 oblitera por seu turno o dito elemento subjetivo: “(…) consideram-se regulamentos administrativos as normas jurídicas gerais e abstratas que, no exercício de poderes administrativos…”.

A técnica adotada pelo novo Código para determinar o seu âmbito de aplicação é, nesta linha, também assaz distinta da seguida pelo Código de 91: o legislador resolveu agora «economizar» no número de normativos e conceitos utilizados, segmentando o diploma em cinco módulos ou conjuntos supostamente estanques e/ou autonomizáveis (o módulo dos princípios gerais, o conjunto transversal a todo o Código das normas concretizadoras de preceitos constitucionais, e os módulos da organização, procedimento e atividade administrativa), com operações de desagregação e reagregação desses conjuntos ou módulos para efeitos de delimitação dos âmbitos subjetivo e objetivo de aplicação do Código.

Anote-se, entrementes, uma primeira dificuldade: correspondendo à partida os três blocos de disposições aplicáveis às entidades exteriores à Administração (princípios gerais, procedimento

e atividade) a três das quatro partes do Código (respetivamente às partes I, III e IV), a verdade é que nem sempre coincide o conteúdo dos preceitos localizados em cada uma das referidas partes com as genéricas epígrafes destas. A relativa clareza desta separação de campos de aplicação do Código fica pois algo prejudicada por assentar, além do mais, na distinção entre normas relativas à organização, ao procedimento e à atividade administrativas, que, em muitos casos, é difícil de estabelecer.

Por ter consciência disso mesmo, presumimos, o legislador, em vez de convocar no n.º1 do art.º 2.º, qua tale, as Partes I, III e IV do Código, prefere referir-se, genericamente, aos conjuntos de disposições respeitantes (e por esta ordem) aos princípios gerais, ao procedimento e à atividade administrativa (com exceção do disposto no n.º 3, onde manda aplicar a parte II do Código, e não uma designação alternativa indicativa do respetivo conteúdo – com independência da inserção sistemática –, como, por exemplo, «as disposições de organização e funcionamento dos órgãos administrativos»).

À laia de exemplo dessa falta de uma integral correspondência entre o conteúdo dos normativos e a epígrafe das partes em que o Código divide e onde aqueles especificamente se localizam, temos o art.º 41.º («Apresentação de requerimento a órgão incompetente»): não obstante situar-se na parte II, diz respeito também ao procedimento, devendo por isso aplicar- se não apenas aos órgãos administrativos, mas igualmente (e ainda que porventura com algum limite, em termos designadamente de pertinência mínima do objeto do requerimento com o poder ou função delegada) às demais entidades a quem o n.º1 do art.º 2 manda aplicar as disposições relativas aos princípios gerais, ao procedimento e à atividade administrativa.

Voltando à técnica «modular» seguida pelo novo Código, com operações de agregação e desagregação, começa logo o n.º 1 do artigo 2.º por dispor que o Código, na esmagadora maioria das suas disposições (apenas se exceciona a Parte II – «Dos órgãos da Administração Pública»), se passará a aplicar, em detrimento designadamente do direito privado, a todas as entidades, independentemente da sua natureza (nomeadamente pública ou privada), sempre que exerçam poderes públicos de cariz administrativo ou desenvolvam uma atividade

Sublinhe-se que a primeira e mais óbvia delimitação do âmbito subjetivo de aplicação do Código – a integral aplicação deste à Administração Pública em sentido organizativo no desempenho da atividade (materialmente) administrativa por norma desenvolvida pelas pessoas coletivas públicas que a integram – só se alcança com uma forçada operação de soma a que o intérprete é conduzido pela leitura conjugada de dois distintos normativos (a saber, do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 2.º)…

Através da utilização dos dois critérios fixados na parte final do n.º 1 do art.º 2.º (exercício de poderes públicos ou atuação regulada por disposições de direito administrativo), apresentados em termos complementares/alternativos (no sentido de que, faltando o primeiro pressuposto, mas se verifique de todo o modo o segundo, se aplicarão igualmente as disposições do Código na sua esmagadora maioria), pretende o legislador abranger toda a atividade material e funcionalmente administrativa independentemente da natureza dos entes que a exerçam, com o intuito de a submeter por sistema ao Código (quando menos à grande maioria das suas disposições).

Ou seja, com eles (critérios) se intenta alcançar não só a atividade desenvolvida em regra pelos órgãos da Administração Pública (atividade de gestão pública), mas também (e, na aparência, algo indistintamente) o exercício de poderes públicos de autoridade de cariz administrativo e, mais latamente, de parcelas da função administrativa (que poderão ser consideradas poderes públicos em sentido amplo), exercício esse levado a cabo por entidades exteriores à Administração – quer, de um lado, por outros órgãos do Estado não enquadrados no poder executivo, quer, de outro lado, por entidades privadas enquanto concessionárias ou delegatárias de poderes e funções públicas.

2.2. O critério material da conduta adotada no exercício de poderes públicos (de

No documento O Novo Cdigo do Procedimento Administrativo (páginas 40-42)

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