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Nota introdutória

No documento O Novo Cdigo do Procedimento Administrativo (páginas 125-128)

BIBLIOGRAFIA SUMÁRIA

I. Nota introdutória

1. A consagração da figura da conferência procedimental representa, sem qualquer hesitação,

uma das novidades mais salientes do novo Código do Procedimento Administrativo (doravante “CPA”). Conhecida, desde há muito, no ordenamento jurídico italiano, a conferência procedimental – que, entre nós, começou por nascer no domínio da legislação especial1

surge agora claramente prevista nos artigos 77.º a 81.º, que se encontram sistematicamente

* Corresponde ao texto publicado na obra Comentários ao novo Código do Procedimento Administrativo (coordenação de CARLA AMADO GOMES, ANA FERNANDA NEVES e TIAGO SERRÃO), Volume I, 3.ª edição, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2016, pp. 655-681. Constituiu também a base para a comunicação apresentada pelo autor na Ação de Formação do CEJ “Código de Procedimento Administrativo”, realizada nos dias 6 e 7 de novembro de 2014.

O presente estudo corresponde ao resultado escrito de três reflexões (complementares) que, em diferentes momentos no tempo, efectuei sobre o tema em apreço. A primeira aconteceu em 2 de Julho de 2013, na conferência anual da área de prática de Direito Público, da PLMJ – Sociedade de Advogados, RL, organizada pelo Dr. RUI MACHETE e pelo Mestre PEDRO MELO. A segunda ocorreu em 8 de Outubro de 2013, a convite da Professora Doutora CARLA AMADO GOMES, no contexto de uma aula da disciplina de Ordenamento Jurídico-Administrativo, do mestrado profissionalizante em Direito Administrativo, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. A terceira teve lugar no Centro de Estudos Judiciários, em 6 de Novembro de 2014, a convite da Desembargadora ANA CELESTE CARVALHO, no âmbito de uma acção de formação dedicada ao (novo) Código do Procedimento Administrativo. Aproveito o ensejo para agradecer, também por esta via, a gentileza dos convites que me foram dirigidos para participar em tais eventos. À Professora Doutora CARLA AMADO GOMES agradeço, ainda, a leitura amiga do presente estudo.

** Assistente Convidado da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Investigador do Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito de Lisboa. Advogado.

1 Na legislação especial em vigor, atente-se, designadamente, na previsão da conferência procedimental (i) no

Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (cfr. os artigos 39.º, n.º 3, 75.º-C, n.º 3, 100.º, n.º 5 e 109.º,

n.º 5), (ii) no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (cfr. o artigo 13.º-A, n.os 7 a 9 e n.os 11 a 14, relevando

ainda a Portaria n.º 349/2008, de 5 de Maio), (iii) no Regime Jurídico da Reabilitação Urbana (cfr. o artigo 27.º), (iv) no Regime Jurídico do Sistema de Indústria Responsável (cfr. o artigo 22.º) e, mais recentemente, sempre a título meramente exemplificativo, (v) no Regime de Regularização e de Alteração e ou Ampliação de Estabelecimentos e Explorações de (determinadas) Actividades (cfr. o artigo 9.º).

inseridos no Capítulo III (intitulado, justamente, “Da conferência procedimental”) do Título I (“Regime comum”) da Parte III (“Do procedimento administrativo”) do novo CPA2.

A introdução da figura da conferência procedimental no diploma que, em termos gerais, regula o agir administrativo é, naturalmente, de saudar3. Com efeito, constatava-se uma lacuna que

importava colmatar, mormente atentas razões de simplificação e celeridade administrativas que se fazem sentir, de modo particularmente visível, em procedimentos complexos, cujos interesses envolvidos são muito variados. Conforme se verá em detalhe, o tratamento que o legislador do novo CPA conferiu à figura pode não ter sido o mais desenvolvido4 e pode,

inclusivamente, num ou noutro ponto, gerar diversas dúvidas interpretativas e de aplicação prática5, mas, independentemente de tais considerações, a verdade é que a consagração da

conferência procedimental representa, por si só, um passo significativo, no contexto de uma

2 Na doutrina portuguesa, merece especial destaque o pioneiro e marcante estudo de MARTA PORTOCARRERO, Modelos

de Simplificação Administrativa – A Conferência Procedimental e a Concentração de Competências e Procedimentos no Direito Administrativo, Publicações Universidade Católica, Porto, 2001, que não deixará de ser devidamente citado no presente artigo.

3 Neste sentido, vide, no contexto do anteprojecto do novo CPA (anteriormente denominado projecto de revisão do

CPA), FREITAS DO AMARAL, “Breves notas sobre o projecto de revisão do Código do Procedimento Administrativo”, in

Direito&Política, n.º 4, Julho / Outubro de 2013, p. 150, VASCO PEREIRA DA SILVA, “Primeiro comentário acerca do

projecto de revisão do CPA (a recordar um texto de Steinbeck)”, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 101, Setembro / Outubro de 2013, p. 86 (embora este último Autor confesse que preferia “uma lógica mais italiana” e critique, de modo veemente, a opção de previsão “de conferências procedimentais destinadas à prática de «actos reguladores»”) e ainda ISABEL CELESTE M.FONSECA, “A revisão do Código do Procedimento Administrativo: pontos

(mais) fortes e pontos (mais) fracos”, in Anuário Publicista da Escola de Direito da Universidade do Minho, Tomo II, Ano de 2013 – Ética e Direito, Braga, 2014, p. 62. A inovação em presença foi, inclusivamente, destacada no plano

político (cfr. PAULA TEIXEIRA DA CRUZ, “Discurso da Ministra”, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 100, Julho /

Agosto de 2013, p. 7).

Enaltecendo a novidade em alusão no domínio do novo CPA, vide, ISABEL CELESTE M.FONSECA, “O procedimento

administrativo no (novo) CPA: dúvidas sobre a sua subalternização perante o acto e o processo”, in Questões Actuais de Direito Local, n.º 5, Associação de Estudos de Direito Regional e Local, Janeiro / Março de 2015, p. 32 e JOÃO DIOGO CARVALHO DA COSTA, “As Conferências Procedimentais no Novo Código do Procedimento Administrativo”,

in O Novo Código do Procedimento Administrativo – Para o Professor Doutor António Cândido de Oliveira uma oferta singela dos jovens investigadores de Direito Público da Escola de Direito da Universidade do Minho

(coordenação de ISABEL CELESTE M.FONSECA), Elsa Minho e NEDip – Núcleo de Estudos de Direito Ius Pubblicum, Braga,

2015, pp. 253 e 270.

4 Neste sentido, por reporte ao anteprojecto do novo CPA, vide FREITAS DO AMARAL, “A revisão do CPA: balanço e

perspectivas”, in Projecto de Revisão do Código do Procedimento Administrativo (coordenação de RUI MACHETE,LUÍS

SOUSA FÁBRICA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS), e-book, Universidade Católica Editora, 2013, p. 138.

5 Concordamos, assim, com A

NDRÉ SALGADO DE MATOS, que, por relação ao referido anteprojecto, assinala a elevada

tecnicidade do regime jurídico das conferências procedimentais e, paralelamente, não deixa de fazer menção à sua complexidade que poderá consubstanciar um entrave à operacionalização da figura em presença (cfr. “Comentários ao projecto de revisão do Código do Procedimento Administrativo”, in Direito&Política, n.º 4, Julho / Outubro de 2013, p. 137). O regime em apreço revela-se, assim, “muito mais ambicioso e complexo” do que aquele que vigora,

desde logo, no direito do urbanismo português (cfr. ANDRÉ SALGADO DE MATOS, “O projecto de revisão do Código do

Procedimento Administrativo: uma revolução legislativa anunciada e as suas consequências”, in Projecto de Revisão do Código do Procedimento Administrativo [coordenação de RUI MACHETE,LUÍS SOUSA FÁBRICA e ANDRÉ SALGADO DE

MATOS], e-book, Universidade Católica Editora, 2013, p. 28 e ainda, com interesse quanto a este ponto, p. 45).

Administração Pública cuja actuação se pretende mais eficiente, mais económica e, por fim, mais célere6.

De um prisma formal, é ainda de aplaudir, vivamente, a nomenclatura adoptada – “conferência

procedimental” –, ao invés da expressão de cunho italiano, “conferência de serviços”

(escolhida pelo legislador, na maioria dos diplomas de direito administrativo especial, onde a figura já era conhecida), porquanto quem conferencia, no contexto de um ou de diversos procedimentos conexos, são os órgãos administrativos e não os serviços7. Bem andou, assim, o

legislador ao optar pela expressão “conferência procedimental” que se evidencia preferível, por se afigurar mais rigorosa, de um ponto de vista técnico-jurídico.

Posto isto, importa analisar o regime jurídico da conferência procedimental, tal qual se encontra estabelecido nos supra assinalados preceitos legais. Examinaremos, antes de tudo, as modalidades de conferência procedimental, seguindo-se o estudo da instituição de tal mecanismo, da sua realização, da audiência dos interessados, da audiência pública e, por fim, do respectivo terminus. Todavia, não nos limitaremos a promover uma mera descrição acrítica do aludido quadro jurídico. Conforme se antecipou, revela-se imprescindível problematizar algumas das soluções normativas adoptadas. O fito do nosso trabalho é, por isso, essencialmente um: contribuir para a compreensão da figura da conferência procedimental, nos termos em que passou a estar prevista no novo CPA e antecipar algumas questões que, com elevada probabilidade, se irão colocar aos operadores jurídicos que, com regularidade, lidam com a codificação em exame.

É o que faremos no imediato, seguindo o iter supra descrito (que se encontra em total sintonia com a sistemática do novo CPA), não sem antes se referir, sempre em jeito introdutório, que a relevância do regime jurídico (de índole geral) que iremos examinar transcende, em assinalável medida, o domínio das conferências procedimentais que, por via do mesmo regime, poderão passar a ser instituídas. A prova do que acabou de se afirmar resulta, à saciedade, do artigo

6 Sustentando, igualmente no contexto dos trabalhos preparatórios do novo CPA, que o legislador poderia ter sido

mais ousado “na busca de soluções que introduzam agilidade, simplicidade e celeridade na decisão administrativa e que minimizem os excessos de intervenções de pessoas colectivas públicas e órgãos administrativos diferentes num mesmo procedimento”, vide JOÃO TIAGO SILVEIRA, “A decisão administrativa no anteprojecto de revisão do Código do Procedimento Administrativo”, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 100, Julho /Agosto de 2013, p. 117.

7 É o que se afirma, de modo inequívoco, no ponto 11 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, que

aprovou o novo CPA. Na doutrina, manifestando preferência pela expressão “conferência procedimental”, vide MARTA PORTOCARRERO, Modelos de Simplificação Administrativa…, p. 65 e ss., referindo, na p. 66, que se trata de “um

termo mais abrangente e neutral, e que faz referência ao seu «habitat» – o procedimento”. No contexto do

anteprojecto do novo CPA, vide FAUSTO DE QUADROS, “As principais inovações do projecto do CPA”, in Cadernos de

Justiça Administrativa, n.º 100, Julho /Agosto de 2013, p. 132.

4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, onde se estabelece, expressamente, a aplicação imediata de um conjunto substancial de soluções normativas, constantes do novo CPA, em matéria de conferências procedimentais, “ao procedimento previsto no Sistema de

Indústria Responsável, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 169/2012, de 1 de agosto”8.

Note-se, todavia, que essa aplicação, no domínio da legislação especial em apreço, deve ser feita nos exactos termos estabelecidos nos demais números do artigo 4.º do aludido diploma legal.

Mas a relevância do regime jurídico estabelecido no novo CPA, em matéria de conferências procedimentais, é ainda mais ampla. Com efeito, enquanto disposições normativas de cariz geral, não deixarão, seguramente, de ser convocadas, a título subsidiário, sempre que o legislador preveja (ou venha a prever) a figura noutros diplomas de índole especial. Importa, também por este motivo, conhecer e reflectir sobre o inovatório regime jurídico que o CPA estabelece em matéria de conferências procedimentais, o que faremos, sem mais delongas, nas linhas que se seguem.

No documento O Novo Cdigo do Procedimento Administrativo (páginas 125-128)

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