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Capítulo I – Para que alfabetizar adultos em 1920?

2. A instrução paulista durante a Primeira República

2.3. João Chrysostomo Bueno dos Reis Junior, 1912 a

Realizou-se um levantamento nos anuários de ensino publicados durante a gestão de João Chrysostomo Bueno dos Reis Junior na Diretoria Geral de Instrução

noturnos neste período, as quais contribuíram para a compreensão da organização e das demandas exigidas por esta modalidade de ensino.

Segundo o Annuario de Ensino do Estado de São Paulode 1911-1912, havia vinte

escolas noturnas e dois cursos noturnos na capital, com a matrícula de 1.671 alunos e freqüência média de 39 alunos. No relatório consta que as Escolas Noturnas atendiam adultos e indivíduos maiores de 14 anos e deviam ser confiadas aos “professores mais distinctos, mais bem orientados”, pois o ensino deveria ser proveitoso e útil àqueles que já haviam trabalhado de 8 a 10 horas durante o dia e, mesmo exaustos, ainda tinham interesse em estudar.

ESCOLAS NOCTURNAS

Si a regencia proficua de escolas singulares para a infancia exige tirocino e preparo do professor, as nocturnas, em maxima parte frequentadas por alunos ou por individuos maiores de 14 annos, não devem absolutamente ser confiadas senão aos professores mais distinctos, mais bem orientados.

Quem durante o dia luta pela vida, volta á tarde da oficina ou da fabrica para casa, janta ás pressas e se dirige para a escola, tem direito de encontrar ahi o professor competente, dedicado, capaz de indenizal- o do sacrificio que fez com lição proveitosa, de immediata utilidade na vida pratica.

Quem corre á escola nocturna depois de ter suportado 8 ou 10 longas horas de penoso trabalho, exausto de forças, revela tão alta somma de boa vontade, tanto desejo de apprender, tanto amor ao estudo, que bem merece ter como guia o mais esforçado, o mais distincto professor.

A nomeação para escola nocturna, pensam os inspectores escolares, devera ser premio conferido a professores de largo tirocinio e que tivessem alcançado os mais brilhantes resultados na regencia de suas respectivas classes.

Si a escola não satisfaz de modo completo aos alumnos, si lhes não offerece noções práticas de que possam logo tirar proveito, si os não prepara afim de poderem com mais probabilidade de victoria lutar pela vida, a deserção é certa.

O periodo de aulas nocturnas, officialmente de duas horas e meia, não é de facto, nem póde ser mais de duas horas. Deve portanto esse tempo ser bem aproveitado e só aproveital-o-á convenientemente o professor que reunir a um solido preparo, orientação segura e estiver compenetrado do alto serviço que presta á sociedade (Annuario de

Ensino do Estado de São Paulode 1911-1912, p. 38-39).

O Annuario de Ensino de 1913 retoma as orientações fornecidas no anuário anterior, enfatizando que as escolas noturnas devem ser confiadas aos professores mais experientes e bem orientados, os quais serão nomeados para lecionar nestas classes

como uma forma de prêmio diante dos “mais brilhantes resultados na regencia de suas respectivas classes” (Annuario de Ensino do Estado de São Paulode 1913, p. XXI).

O Annuario de Ensino de 1914 foi a primeira fonte localizada nesta pesquisa que traz a diferenciação entre as escolas e os cursos noturnos. Os cursos noturnos eram regidos por professores das escolas diurnas que recebiam “uma gratificação de cem mil réis mensais”. As escolas noturnas eram regidas por professores que só exerciam esse cargo, funcionavam num período de duas horas e meia e os professores recebiam “duzentos e cincoenta mil réis mensaes, tanto quanto ganham os professores diurnos de escolas de séde de municipio, que trabalham cinco horas” (Annuario de Ensino do Estado de São Paulode 1913, p. 41).

Apesar de trabalharem em melhores condições, os inspetores escolares verificaram, em suas visitas, que as escolas noturnas iniciavam às aulas de fato às 19 horas. Desta forma, os professores das escolas noturnas estariam sendo mais bem remunerados, por menos horas de trabalho, além de terem a disposição o dia livre para exercerem outra atividade. Diante destas regalias, esperava-se do professor “pontualidade, dedicação e ensino proficuo”.

Contudo, enquanto alguns professores dedicados “se compenetram em seus deveres, tornam o ensino de imediata utilidade á vida pratica dos moços, que lhes ouvem as lições”, há outros que apenas exerciam esse ofício como “ganha-pão”, às custas das “horas de repouso roubadas ao operário que procura aprender” (Annuario de Ensino do Estado de São Paulode 1913, p.41-42).

Mesmo diante da situação insatisfatória, João Chrysostomo Bueno dos Reis Junior é a favor das escolas noturnas e afirma que as mesmas deveriam ser intensamente fiscalizadas para que seus respectivos professores cumprissem seus deveres. O Diretor da Instrução Pública também defende o fim dos cursos noturnos, pois os mesmos não atingiam os objetivos de sua criação, pois seus professores, também encarregados dos cursos diurnos, não possuem disponibilidade para ocuparem-se com interesse e dedicação de seus alunos à noite.

O relatório publicado no Annuario de Ensino de 1917 reforça a utilidade das escolas noturnas para as classes operárias e afirma que as mesmas precisam ser reformadas quanto às exigências de matrículas e horário de aulas:

Parece-me exaggerada a matricula minima de 50 alumnos para essas escolas, principalmente tratando-se de escolas do interior. Os horários

estabelecidos concorrem para afastar em vez de attrahir alumnos. Quem trabalha em serviço até ás cinco horas da tarde não póde sentir- se com disposição para frequentar aulas a começar ás seis horas e meia, como exige o regulamento (Annuario de Ensino do Estado de

São Paulode 1917, p. 11).

O Reis Junior reitera a crítica já exposta no anuário anterior, sobre “inutilidade” dos cursos noturnos, os quais deveriam desaparecer por completo para serem substituídos por escolas noturnas. O relatório traz também o número de escolas e cursos noturnos providos na capital e no interior do estado de São Paulo em 1917. Na capital funcionavam 47 estabelecimentos de ensino noturnos (9 escolas isoladas, 2 cursos noturnos e 36 escolas agrupadas), onde foram matriculados 3.976 alunos. No interior funcionavam 92 estabelecimentos de ensino dessa categoria (79 escolas isoladas e cursos noturnos e 13 escolas agrupadas), que receberam a matrícula de 3.787 alunos.

Nesta exposição dos Annuarios de Ensino publicados entre 1912 a 1916, durante a gestão de João Chrysostomo Bueno dos Reis Junior como Diretor Geral de Instrução Pública, destaca-se a importante distinção entre escolas e cursos noturnos. Nestes documentos verifica-se a crescente reivindicação de fechamento dos cursos noturnos em favor da abertura de escolas noturnas, uma vez que aqueles são considerados um desperdício de investimento, pois não possuíam estrutura para funcionamento e nem produziam os resultados desejados.

O Annuario de 1912 declarou a existência de 22 estabelecimentos de ensino noturno na capital, com a matrícula de 1.671 alunos. O Annuario de 1917 registrou o funcionamento de 47 estabelecimentos de ensino noturnos na capital, com a matrícula 3.976 alunos e 92 estabelecimentos de ensino noturno em funcionamento no interior com a matrícula de 3.787 alunos.

Por estes dados, é possível constatar uma expansão de vagas para esta modalidade de ensino. Apesar disso, houve uma procura muito pequena para matrículas no ensino noturno, em relação ao número de estabelecimentos criados. Considerando que a gestão de Reis Júnior aconteceu durante o levante grevista dos anos 10, pode-se inferir que o governo republicano acreditava na educação como uma estratégia de controle das massas, principalmente dos imigrantes que compunham majoritariamente o operariado paulista. Contudo, é perceptível a resistência desse público às iniciativas educacionais públicas, expressa pela ausência de matrículas em proporção ao aumento de vagas.