• Nenhum resultado encontrado

JUVENTUDE E SEXUALIDADE w iLza v iLLELa

No documento RelatorioUNFPAPopePolPub (páginas 166-173)

Pesquisadora do Instituto de Saúde e membro do GT Gênero e Saúde, Abrasco

Diferentemente das colegas que me precederam, não apresentarei resultado de nenhuma pesquisa específica. No texto básico também evitei isso porque sou médica

e, ao mostrar número para demógrafo, o risco de errar é enorme. Então, preferi trazer algumas reflexões, claro que baseadas em alguns números e apresentarei as fontes de dados, porque são fontes que vocês conhecem. São as minhas reflexões sobre números conhecidos por todos.

Fundamentalmente, para pensarmos a questão da experiência sexual dos jovens, usei várias informações deste relatório do IPEA, “O Retrato de uma Nação”, que é maravilhoso. Alguns dados são referentes aos trabalhos que Suzana Cavenaghi tem desenvolvido com a professora Elza Berquó relativos à gravidez entre jovens e alguns dados dessa pesquisa sobre comportamento sexual que foi realizada pelo Cebrap, também coordenada pela doutora Elza Berquó, cujos resultados ainda não estão publicados. Sobre o contexto de dados, fui ajudada por uma jovem. A idéia é que pudéssemos, então, tratar essas duas frases, que são postas hoje completamente como senso comum. Quem trabalha com investigação sabe disso – muito freqüentemente, na medida que tem alguma assertiva que cai no senso comum, fazemos pesquisas que confirmam o que já sabíamos. É como se estivéssemos com a ideologia embaçando nosso olho. Então, acabamos fazendo investigações para saber o que já se sabia. É como espero conversar com vocês a respeito dessas duas frases.

A primeira é que a gravidez na adolescência é um grave problema de saúde e a segunda é que os jovens representam hoje um grupo especialmente vulnerável à infecção pelo HIV.

Conceitos e terminologia

A primeira questão a ser proposta é a seguinte: se formos pensar tanto a questão da gravidez quanto da vulnerabilidade ao HIV, temos de pensar primeiro o termo adolescente. Tanto este quanto o termo jovem, envolve um conjunto enorme de pessoas que têm pouquíssimo em comum. Nem a questão de fazerem parte de um mesmo contingente etário, já que existe uma enorme discussão sobre os limites do que é juventude.

Tem uma certa lenda – lenda da Organização Mundial de Saúde - OMS – que se costuma chamar de juventude as pessoas compreendidas entre 15 e 24 anos, como se fossem semelhantes. Eu, por exemplo, tenho filhos que já foram crescendo e sempre pergunto, ontem mesmo perguntei a um garoto que tem 22: “você é o que: jovem, adolescente ou adulto?”. Ele disse: “sou jovem.” E seu irmão, que tem 24 anos, mas é casado, trabalha e é formado?” “Ele é adulto”. “E uma menina de 16?” “É adolescente”. “E se ela já estiver trabalhando e tiver um filho?” “Ela é uma adulta.” O que ele fala, digamos que seja um senso comum um pouco mais verdadeiro e menos fantasioso do que a frase anterior.

Na hora que se diz que adolescente é uma coisa só, que juventude é uma coisa só, temos antes de olhar o que é isso. E lembrar que temos uma enorme desigualdade racial. Essa desigualdade racial, junto com desigualdades regionais e de renda, determinam contextos culturais e oportunidades completamente distintas. Por exemplo, um garoto de 24 anos do interior que provavelmente se casou aos vinte com uma garota de 18 e tem filhos, eles não vivenciam aquela história como se fossem precoces. Eles não têm outra oportunidade de vida. Não adianta continuar estudando, não tem como a família sustentar um menino pobre que não entra no

mercado de trabalho. Se ele tem de trabalhar, vira adulto, se vira adulto se casa e tem filhos.

A primeira questão para começarmos a desconstruir a idéia de gravidez na adolescência como um grande problema de saúde ou da infecção pelo HIV como um grande problema também para jovens, é pensar, primeiro, que “adolescente” e “jovem” querem dizer quase nada, na medida que são tão genéricos que não se tornam específicos para coisa nenhuma. A segunda questão está ligada à vulnerabilidade.

Juventude, adolescência e globalização

A globalização é o consumo de tudo, cada vez mais rápido, inclusive de idéias. A idéia da vulnerabilidade, foi uma grande força para pensar políticas frente à AIDS e hoje em dia está completamente esvaziada da sua radicalidade política, na medida em que também se usa a idéia de vulnerabilidade como se fosse risco, fala-se de populações vulneráveis como populações de risco. A força da idéia de vulnerabilidade, a força de incorporar a dimensão do social e retirar a idéia de que o risco de qualquer prática sexual - pode ser um risco de AIDS, DSTU, gravidez – não está determinado apenas por um desejo individual. É que as práticas sexuais são determinadas pelo contexto social, que dá um significado aos atos sexuais. Essa era uma coisa importante na idéia de vulnerabilidade, que já se esvaziou. E se quisermos recuperar aquela assertiva de que os jovens são vulneráveis ao HIV, temos de recuperar a idéia de vulnerabilidade, com a força política com que ela foi construída.

Problematizando ainda essa idéia de juventude e adolescente e pensando na globalização, a idéia da juventude, primeiro, é uma coisa recente, que tem uma construção histórica. Ou seja, ninguém nasceu jovem, nem essa idéia de juventude nasceu desde que o mundo é mundo. Ela é bastante recente, é do século XX, posterior à invenção da infância, que é do século XIX. De qualquer maneira, a idéia de jovem que circula, dando significado às práticas, ações e modos de vida, é uma idéia que não tem nada a ver com idade. Tem a ver com estilo de vida, como ideal, todos querem ser jovens, não é à toa que fazemos plástica, esticamos, malhamos, fazemos ginásticas. Enfim, tem-se uma valorização da idéia da juventude que tem a ver com estética, estilo de vida. Uma idéia extremamente positivada. Todos os anúncios de televisão usam pessoas que têm um estereótipo de juventude e que, inclusive, envolvem a idéia da prática sexual. A juventude envolve a idéia do acesso à sexualidade e a uma responsabilidade que, não necessariamente, quer dizer não ter filhos ou usar camisinha. É muito mais a responsabilidade, se for pego, na fala de um garoto, “a minha mina, vou sair com minha mina, vou proteger minha mina”, enfim, essa responsabilidade de que ser jovem é ser quase adulto. É imponderado, ousado, corajoso, no caso dos meninos, são protetores em relação às meninas, embora não necessariamente a proteção signifique o uso de preservativo. O que quero dizer é que há uma idéia extremamente positivada, bastante hegemônica, embora não seja homogênea. Quer dizer, o que é bom em ser jovem variará um pouco dependendo do poder aquisitivo, já que também a idéia de juventude é super- relacionada à idéia da sociedade globalizada de consumo. Ser jovem tem de consumir uma certa roupa, uma música não sei das quantas, tem de se divertir num lugar “x”. Ou seja, a identidade do jovem também tem a ver com o padrão de consumo, o

que faz com que tal garoto pobre que não consegue comprar aquela roupa e aquele tênis e não quer virar bandido para poder comprar a roupa e o tênis, porque todos sabem que parte dessa pequena delinqüência dos meninos pobres é para roupa, tênis e balada. Assalta aqui, para ir para a balada ali, gastar o que ganhou. Acaba que sobra das insígnias positivas de ser jovem o acesso à sexualidade.

No caso da sexualidade desprotegida, já que a coragem, a ousadia, a idéia de vulnerabilidade faz parte dessa configuração de juventude. Por exemplo, quando olhamos o uso de preservativo entre jovens, a taxa é maior quanto mais alta a classe social do garoto. Claro, primeiro ele se percebe mais vulnerável e, segundo, que tem projeto. Prevenir-se hoje tem uma idéia do amanhã. Quanto menos se tem projeto, mais a prevenção não faz sentido e mais se tentará reforçar a auto- estima dentro das insígnias que são possíveis. Então, se não se pode usar insígnia da roupa do jovem, terá de usar insígnia da ousadia ou da sexualidade que são outras insígnias e que não custam dinheiro.

Primeiro se inventou a infância na passagem do século XVIII para o século XIX; do século XIX para o século XX, mas marcadamente ao longo do século XX se inventou a juventude e, apenas na metade do século XX se inventou a idéia da adolescência. E, cada vez mais, se vai criando intervalos entre a infância e a idade adulta e, depois pegamos o hormônio para justificar. Mas, na verdade, a razão disso tem a ver com o tema do envelhecimento da população, do mercado de trabalho cada vez mais complexo, mais restrito, que exige melhor qualificação etc. E, com esta postergação para a entrada no mercado de trabalho e, também, o acesso à contracepção, tem-se mais tempo e acaba-se criando um intervalo mesmo. Ser adulto é caracterizado pelo casar, constituir família e trabalhar; mas se não tem emprego, as mulheres não querem ter filhos tão cedo, cria-se um intervalo que é preenchido com estas idéias que são sempre relacionadas ao consumo. A diferença é que, se a idéia da juventude é extremamente positivada e relacionada ao consumo de coisas, a idéia da adolescente é completamente negativada e relacionada a um outro tipo de consumo. Gostamos de falar que adolescente é aborrecente, “entrou na crise de adolescência”. É quase como se fosse um consumo, não tanto de bens materiais, mas de psicologização, de medicalização – cada vez mais se cria termos de especialidades médicas. Hebiatria é o ramo da medicina especializada em adolescente. É quase como se fosse um consumo de cultura, mas também de consumo, já que se criou um intervalo para que aquele cidadão comece a produzir. Mas, mesmo que ele não produza tem de estar consumindo já que isto é uma das marcas da globalização. Então, cria-se a idéia do adolescente. O que se pode pensar de positivo e negativo, é, por exemplo, a abordagem da questão da gravidez.

Primeiro, o que dá para dizer sobre a especificidade do adolescente é que não se misture com jovens – para a Organização Mundial de Saúde, adolescente vai de 10 a 19 anos, mas os jovens vão de 15 a 24 anos, há um imbróglio entre 15 e 20 anos que é igual. A menina ou menino, que está com 16 anos, prefere se ver como jovens e este pode escolher engravidar, tem autonomia sobre sua sexualidade.

Segundo esta última pesquisa de comportamento sexual, 52% dos jovens iniciam sua vida sexual antes dos 16 anos, quer dizer, nesta faixa que seria de adolescência mesmo. Claro que ninguém quer se identificar muito com esta idéia de ser adolescente porque tem uma conotação do ser problemático, do chato. Por

outro lado, é nesta faixa etária que, de fato, existe uma questão mais delicada em relação à gravidez. É uma faixa etária que tem tido um aumento proporcional das gestações.

Gravidez na adolescência

Como Suzana Cavenaghi tem mostrado, não são todas as moças entre 10 e 14 anos que engravidam por igual. As meninas nesta faixa etária que têm engravidado são as meninas muito pobres, que estão fora da escola. As meninas que engravidam já estão fora da escola. Não têm projeto, são muito pobres, muitas já estão trabalhando segundo o relatório do IPEA. Há um contingente enorme destas meninas pobres que saem da escola e não entram no mercado de trabalho, é um percentual grande, elas não fazem nada e vão ter filho. Até porque a maternidade é altamente valorizada, inclusive como identidade. Eu não diria todas nós, mas a maioria de nós pode não casar, pode ter um emprego, mas será mãe de um filho só – os demógrafos falam isso. Há uma redução no número de filhos, mas as mulheres continuam tendo filhos. Na verdade, poderia haver um outro deslocamento demográfico, mas o conjunto de mulheres que querem ter filhos é cada vez menor. Mas continua um conjunto grande de mulheres que querem ter filhos, mas que apenas reduzem o número. A importância da idéia da maternidade é muito grande. De tal maneira que uma garota de 15 anos que está fora da escola, não quer ou não consegue trabalhar, às vezes não consegue e às vezes não quer porque o tipo de emprego é bastante duro. Muitas vezes, trabalhar como doméstica pela comida, por um salário irrisório que em nada se combina com o estereótipo de jovem consumidor. Neste contexto, ter um filho é muito bom, confere uma identidade, ela deixa de ser uma adolescente e vira uma jovem mãe. Esta é uma questão importante. Outra questão importante é que toda vez que se fala de gravidez, fala-se da menina. O trabalho do IPEA, e também o da Unesco, têm sido consistentes em mostrar que se tem um percentual destas meninas entre 15 e 19 anos que são mães porque tinham um namorado mais velho e casaram. Isso não é inesperado, nem precoce, nem indesejado. É uma trajetória de vida. Há um percentual delas cujo parceiro é um garoto como elas e, aparentemente, para o menino é mais pesado ser pai jovem porque terá de trabalhar. Então, o abandono escolar é maior entre os meninos de menos de 18 anos que viram pais e assumem a paternidade – nem todos assumem –, mas, os que assumem, vão trabalhar como forma de assumir a paternidade. Isto é muito importante como identidade, como projeto de vida. Há os analfabetos funcionais que moram no interior e têm chances pequenas no mercado de trabalho. Na fuga da anomia, a paternidade pode ser uma estratégia para estes meninos, para os quais há pouquíssimas intervenções, pouquíssimas discussões e preocupações por parte do Poder Público. Quando se fala em gravidez, fala-se da menina. Se há problema de contracepção de homem e mulher adultos, imagine entre jovens pobres da periferia ou de zonas rurais. As meninas, por exemplo as de 10 a 14 anos e que têm filhos, são meninas de área rural ou da periferia dos grandes centros, em particular periferia das cidades de São Paulo e Rio de Janeiro – onde, segundo alguns relatos, há até pressões dos traficantes sobre essas meninas. Para uma menina pobre ter um filho de um traficante é uma garantia de sobrevivência, mas o período de união é, provavelmente, muito curto. A menina que está próxima

do tráfico é capturada, meio que roubada pelo tráfico, e não tem muita chance de escolha. Mas ela, necessariamente, não impõe resistência como o garoto – o traficante é sempre um garoto de 22 anos que será morto até os 25 anos. Ao ter um filho do traficante, ela tem uma certa pensão de vida. É horrível, achamos que não há magnitude, mas é bom lembrar que a magnitude dessas meninas que têm filhos entre 10 e 14 anos e ficam estéreis é pequena. É impactante, porque é. O número delas não é tão grande, mas acaba sendo um número que importa nessas estatísticas de gravidez entre meninas.

DST/AIDS entre adolescentes

Já falamos da vulnerabilidade que, na gravidez, é absolutamente consistente, pois a gravidez só é problema para as meninas pobres e rurais. Isso se repete exatamente igual na questão de AIDS. Na questão de AIDS já temos uma delicadeza, só temos dados da doença quando há uma infecção e se torna AIDS. Ou seja, até ser notificado, pode haver um intervalo entre 5 a 10 anos. Portanto, quando vemos as estatísticas mostrando os aumentos dos casos de AIDS entre pessoas de 10 a 19 anos, não temos a menor idéia do que aconteceu. Pode ter acontecido que algumas destas pessoas tenham tido uma relação aos 18 anos com autonomia e sem uso de camisinha, pode ser que tenha havido violência sexual aos 10 anos e a AIDS apareceu aos 18 anos.

Há tecnologia, há formas para estudar e ter uma idéia bastante precisa de quando houve infecção, há testes laboratoriais para isso, mas isto esbarra em questões éticas, por um lado, e financeiras por outro. De qualquer maneira, quando fazemos escândalo com a questão da DST e da AIDS entre jovens, é bom lembrar que estamos falando de uma coisa que não sabemos. DST é uma coisa e AIDS é outra. Sífilis pega de uma maneira, cura de uma maneira, tem um sintoma e tratamento, que é completamente diferente de HIV.

A primeira questão é a seguinte: quando se pensa em prevenção, falamos num sacolão de DST-AIDS. O financiamento das ações nas escolas é fundamentalmente de programas de AIDS – 96% das escolas de 2° grau prefere que haja alguma atividade de prevenção de DST-AIDS com algum suporte de programas municipais ou estaduais de AIDS, embora não se saiba bem a qualidade destes programas e nem que sejam feitos por professores treinados. De qualquer maneira, o que chama a atenção é que toda ação de prevenção de AIDS está dentro da escola e temos um contingente grande de jovens fora da escola. Esta pesquisa recente do Cebrap sobre comportamento sexual poderá mostrar isso. Quando se compara o período 1998-2005, por exemplo, se há aumento consistente no uso de condom, o tempo todo, menos entre jovens analfabetos ou analfabetos funcionais. Para todos os indicadores de conhecimento e práticas sexuais seguras, para os meninos e homens negros, quer dizer, a população negra do sexo masculino é a que se testa cada vez menos – se compararmos 1998 com 2005, tem-se uma redução no número de testagens anti-HIV entre homens negros, uma redução do nível de conhecimento sobre HIV-AIDS e uma estabilização no uso de camisinha em patamar baixíssimo, 20%, aproximadamente.

Há, então, vários indicadores de conhecimentos sobre DST-AIDS, de uso de condom na primeira relação sexual. Observa-se uma melhora, entre 1998 e 2005,

só entre a população escolarizada. Existe uma população importante de meninos e meninas fora da escola, apesar de toda a ampliação de escolaridade entre ação e matrícula. Tem ainda essa questão do analfabetismo funcional dos meninos que entram na escola, ficam três anos, não aprendem nada, um dia saem, tentam fazer supletivo. Ficam mais um ano, não aprendem nada, enfim, tem-se uma parcela importante desses jovens para os quais, na verdade, não há nenhuma ação importante de prevenção. Conta a criatividade que se tinha, há cinco anos atrás, quando todos estavam assustados com a questão das DST/AIDS. Para os jovens, embora não haja nenhum aumento expressivo da infecção ou do que se consegue aproximar de infecção, que são os caso de AIDS nos últimos anos (não houve nenhum aumento expressivo na infecção entre população jovem), mas há uns cinco ou seis anos atrás houve uma certa histeria que fomentou muitas ações interessantes, criativas e produtivas e que se estagnaram.

Se olharmos hoje, até porque as agências internacionais deslocaram-se um pouco para a questão da violência, não menos importante, as ações para a juventude relacionadas às DST/AIDS e à prevenção de gravidez já não dão o menor Ibope. Todos ficaram de “saco cheio”: aquela palestra igual, aquele folheto igual, nenhum garoto faz. Sempre meu espaço empírico é minha casa. Estava pensando neste texto e perguntei ao meu filho: “se tivesse hoje uma palestra sobre AIDS na universidade, você iria?” “Claro que não.” “Sobre gravidez na adolescência?” “Claro que não.” “E sobre violência?” “Ah, tá!” Violência está na agenda, claro.”

Quero fechar a minha fala trazendo a questão da violência. Para algumas de nós, que trabalhamos com saúde sexual e reprodutiva, a violência chegou – no Brasil e no mundo inteiro – de maneira muito forte. Insisto na idéia de que o tema é importante; contudo, não conseguimos fazer a ponte direito. Quem trabalha com saúde sexual e reprodutiva acabou trabalhando com violência sexual, mas a magnitude da violência sexual é pequena perto da magnitude da violência doméstica e da violência urbana. Por outro lado, os efeitos na capacidade de proteção sexual são exatamente os mesmos. Uma menina que apanha em casa, que é violada no corpo, mesmo não sexualmente, tem menos chance de solicitar sexo seguro. Tanto quanto um menino, que apanha em casa, terá mais chance de bater, de ser violento e violentador de sua parceira de qualquer maneira, inviabilizando o diálogo.

Para pensarmos a questão da gravidez, do sexo seguro em geral, tanto faz, tanto para gravidez quanto para AIDS: temos de trazer a questão da violência para a agenda. Talvez tivéssemos de fazer hoje um grande esforço para tentar juntar mais essas agendas e ver um pouco mais as pontes. Muitos jovens, quando são violentados – isso é bastante freqüente; são violentados dentro de casa, pelo irmão mais velho, por um tio, etc. – no momento exato do ato sexual, muitas vezes, entre o horror e o medo, esses jovens têm desejos, prazer, tesão, e por isso ficam na dúvida se provocaram ou não provocaram a violência. É uma confusão enorme e temos tido

No documento RelatorioUNFPAPopePolPub (páginas 166-173)