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RELATO QUALITATIVO

No documento RelatorioUNFPAPopePolPub (páginas 150-155)

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LivEira

Professora adjunta do Departamento de Ciências Econômicas e pesquisadora do Cedeplar, UFMG

Estimar os efeitos sociais e econômicos das mudanças na estrutura etária da população na América Latina é uma questão emergente na análise demográfica que enseja uma linha de pesquisa extremamente promissora. Em particular, a comparação entre México e Brasil deve trazer novas contribuições sobre o dividendo demográfico, avançando em termos metodológicos e substantivos, com novas evidências e perspectivas de análise sobre a realidade latino-americana. A maior parte da literatura existente sobre o dividendo demográfico adotou um foco global ou concentrou sua atenção sobre a Ásia, África, Taiwan e Irlanda. Até o momento, além de pouca atenção ter sido devotada à experiência da América

Latina, México e Brasil têm as maiores populações da América Latina, o que adiciona uma significância maior a estes casos, na medida em que resultados de pesquisas, nestes países, podem se desdobrar como informações para políticas nestes e em outros países.

O dividendo demográfico, ou “janela de oportunidades”, pode ser conceituado como um fenômeno de potencialidade para a sociedade em termos econômicos, decorrente das conseqüências diretas do declínio da fecundidade sobre a estrutura etária durante e imediatamente após a transição demográfica. As mudanças na estrutura etária tendem a trazer conseqüências sobre o crescimento econômico e a estrutura de gastos públicos. O aproveitamento desta potencialidade depende de vários aspectos, tais como as condições econômicas e institucionais de Estado, de operação do setor financeiro e de comportamento da família, entre outras, posto que a realização deste dividendo não é mecanicamente determinada pelas condições demográficas. Neste sentido é que se coloca a relevância da discussão do dividendo demográfico, tendo em vista o planejamento das políticas de Estado que incorporem o componente populacional, visando ao desenvolvimento econômico e social de cada país. É exatamente sobre a relevância desta discussão, no contexto da análise comparativa entre Brasil e México, que os palestrantes convidados para esta sessão discorrem. Sob a coordenação de Ralph Hackert, Joseph Potter, Eduardo Rios-Neto e Octavio Mojarro apresentam suas perspectivas. A similar evolução demográfica destes dois países, a despeito de diferentes processos políticos, constituem uma motivação tema desta sessão.

Joseph Potter é o primeiro palestrante e apresenta uma pesquisa conjunta coordenada por ele e conduzida pelo Cedeplar, pelo Colégio de México, pelo CONAPO (Conselho Nacional de População do México) e pela Universidade do Texas, com o apoio financeiro da Fundação MacArthur, comparativa entre México e Brasil, que tem o objetivo de discutir implicações do dividendo demográfico. Segundo Potter, no caso do México, o fenômeno do dividendo demográfico está incorporado nos discursos e nos planos do Governo. O argumento colocado em debate é a idéia de um dividendo, considerando a situação atual dos países que têm experimentado uma importante queda da fecundidade na América Latina, somente com a implementação de uma série de políticas. Contudo, o discurso sobre políticas que acompanha a discussão do dividendo ainda é considerado fraco. Tanto no caso mexicano, onde a discussão do tema está mais avançada, como no caso brasileiro, há todo um campo amplo para pensar sobre quais são as políticas relacionadas ao dividendo. Potter questiona até onde a análise da distribuição por idades entra no desenho das políticas e quais são os espaços ainda abertos para políticas compensatórias. Nesta linha, seria necessária uma avaliação do pensamento, da lógica e das perspectivas de políticas. Adicionalmente, os dados empíricos para México e Brasil também constituem um potencial de análise da mudança na estrutura etária, não somente no nível nacional, mas no nível local, o que implica em incorporar a migração, não necessariamente para os efeitos sobre educação, mas com relação ao mercado de trabalho, fortemente afetado por ela. A vantagem de ir ao nível local é a multiplicação das observações e também a decomposição do fenômeno. A variação adicional vem do fato de que a transição da fecundidade ocorreu em diferentes momentos e com diferentes ritmos nas diferentes partes de cada país.

O segundo palestrante, Eduardo Rios-Neto, discorre, em sua apresentação, sobre o bônus demográfico no Brasil, enfatizando a discussão sobre a estrutura etária. Mostrando dados de projeções demográfica, demonstra a queda na razão de dependência dos jovens, que foi mais acentuada entre 1980 e 2000 e tende a ser menos acentuada até 2020. Por outro lado, há um aumento na taxa de envelhecimento, medido pela razão de dependência dos idosos, que é mais acentuada a partir de 2020. Neste sentido, com o declínio do peso dos jovens, o aumento dos idosos determina o formato tradicional em forma de U para a razão de dependência total. Avançando na discussão sobre o dividendo demográfico no Brasil de hoje, o palestrante argumenta que não se trata mais de uma discussão sobre política pública de controle da fecundidade, que já passou pelo processo de declínio acentuado, e neste sentido, o debate sobre uma perspectiva controlista da fecundidade seria irrelevante na perspectiva contemporânea. No momento atual, são mais importantes as conseqüências da dinâmica populacional sobre a estrutura etária e, conseqüentemente, nas políticas públicas, do que de um planejamento da dinâmica populacional via planejamento familiar. Tomando a dinâmica da estrutura etária futura como resultante da dinâmica demográfica já determinada, o palestrante aponta duas alternativas para se incorporar a população nas políticas públicas: (i) ignorar as mudanças e não aproveitar as janelas de oportunidades disponibilizadas; ou (ii) tentar entender a dinâmica da estrutura etária, avaliando em que medida esta é condicionante para a formulação de uma política de desenvolvimento com planejamento social.

São então mencionados, pelo palestrante, no Brasil exemplos de indicadores educacionais, de trabalho, de mercado de casamento que foram e continuam sendo afetados, em adição às estratégias e objetivos explícitos das políticas públicas vigente, pelo bônus demográfico, que implica no decréscimo da participação relativa da população em alguns grupos etários e no aumento da participação relativa de outros. Colocando diversas evidências e tendências, destaca a possibilidade singular de se desenvolver políticas intencionais para o combate de problemas identificados a partir da decomposição das mudanças da estrutura etária. São apresentados exemplos para a melhoria da qualidade educacional, comparando a importância da escolaridade da mãe e do nível de pobreza familiar. Finalmente, para iluminar a questão do dividendo demográfico, o palestrante apresenta a estimativa de um modelo de convergência de renda. Seus resultados indicam que variações de pequenos intervalos na razão População em Idade Ativa /População Total geram um significativo crescimento na renda per capita, o que sugere um altíssimo dividendo demográfico. Postas as evidências, a perspectiva apontada é a da discussão centrada nos efeitos de uma transição demográfica já existente, e o que a estrutura etária pode causar de restrição e de incentivo a políticas sociais inclusivas e igualitárias

O terceiro palestrante, Octavio Mojarro, muda um pouco a tônica da sessão, apresentando aspectos mais institucionais da política populacional no México. São apresentadas algumas evidências sobre a transição demográfica no México, processo apontado como similar ao ocorrido no Brasil. É muito enfatizada, em sua apresentação, a continuidade das desigualdades internas, geográficas no México, no que se refere à fecundidade e à mortalidade infantil, a despeito do avançado estágio do processo médio de transição demográfica no país. Segundo Mojarro, metade

da população do México vive na pobreza, sobretudo nas áreas rurais e em famílias numerosas. Neste sentido, coloca-se uma questão relevante para a política mexicana, a transformação da realidade destas crianças para que não se reproduza em idades avançadas. E é neste ponto que o conceito de janela de oportunidade é colocado: houve uma queda da fecundidade, que foi benéfica, mas agora é o momento em que isto tem maior importância. Especificando um pouco mais a discussão, o palestrante menciona dados sobre o aumento da escolaridade no México e suas implicações em termos de melhores oportunidades de competir no mercado de trabalho e em melhores condições, combinados à redução do tamanho das coortes ingressantes na força de trabalho. Evidências adicionais são apresentadas, relativas à redução da informalidade no mercado de trabalho mexicano e sua relação com a mudança na estrutura etária do país, com reflexos sobre os salários dos trabalhadores. Conectado a este ponto, é apresentado um exercício de simulação de necessidade de crescimento do país para sustentar as condições do mercado de trabalho.

Quanto à análise institucional do México, o palestrante apresenta como exemplo o Programa Nacional de Población, que é nacional, mas articulado com os estados e municípios. Também cita o Plan Nacional de Desarrollo, que incorpora o discurso de que a transição demográfica condiciona outras transições e põe como exemplo, a taxa de crescimento e a oportunidade que a economia tem para aproveitar o bônus demográfico. Contudo, o discurso contrasta com a política efetiva. Embora seja proposto um desenvolvimento social amplo, baseado no desenvolvimento humano através da educação e da saúde, não fica clara a perspectiva demográfica. Para o palestrante, a política populacional pode contribuir para encerrar o círculo vicioso entre o atraso demográfico e o atraso social, melhorar a distribuição de renda, aprofundar uma cultura demográfica mais sólida e modificar a legislação. O palestrante finaliza sua apresentação, argumentando que foi gerada uma consciência pública e política sobre o bônus demográfico, incorporada nos discursos dos políticos mexicanos. Embora haja uma clareza quanto às políticas para elevação do capital humano, não há tal clareza quanto aos mecanismos do mercado de trabalho que possibilitam que uma pessoa se incorpore no emprego formal, e, subseqüentemente, quais políticas devam ser seguidas. Neste sentido, aponta como fundamental buscar estratégias para realizar o bônus demográfico nas instâncias que operacionalizam os pressupostos.

Concluindo, um importante ponto a ser considerado na discussão é a necessidade de se obter evidências sobre os efeitos da estrutura etária enfocando as variações locais – dentro de um país – da estrutura etária e seus resultados econômicos e sociais. Grande parte da literatura existente sobre o tema explora evidências internacionais, que estão sujeitas a críticas de que há, entre os países, diferenças não observadas em fatores importantes ou erros de mensuração em termos de variáveis chaves. Neste sentido, explorar e combinar dados dentro das unidades nacionais oferece uma maneira alternativa de identificar os efeitos da estrutura etária, porque controla, naturalmente, por várias potenciais fontes de heterogeneidade e erros de mensuração. Além da conexão com o foco local, outras questões importantes a serem trazidas ao debate são: (i) os movimentos internos das pessoas, que podem diluir os efeitos das políticas adotadas em um local, e (ii) a equidade de gênero e a distribuição do dividendo demográfico entre homens e mulheres, ou seja, a

de participação na força de trabalho variam entre homens e mulheres. Finalmente é fundamental ir além da análise do efeito da estrutura etária sobre a renda e buscar desvendar os mecanismos de educação e participação na força de trabalho, que são subjacentes a esta relação. A agenda so bre o dividendo demográfico deve passar pela identificação de pontos de estrangulamento e oportunidades geradas pela dinâmica presente e futura da estrutura etária.

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Professora do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP e membro da CNPD

Antes de iniciarmos as apresentações, queria falar sobre a Mesa e, principalmente, sobre essa última discussão levantada aqui sobre a questão, a importância da saúde reprodutiva na população. Para nós, é muito importante fechar este seminário com essa questão. É uma honra estar aqui hoje, comemorando os dez anos da CNPD e coordenando essa mesa.

Foi uma imensa felicidade ter visto ontem a professora Elza Berquó ser homenageada. Esse é um momento que vou guardar nos meus tesouros de memórias, porque ela não é apenas uma fonte de inspiração para todos nós. Sua visão política tem-nos guiado nessa questão dos direitos sexuais e reprodutivos. Ela tem uma contribuição imensa do ponto de vista acadêmico e do ponto de vista político. Sinto imensamente que ela não esteja aqui, porque nessa pauta de saúde reprodutiva, dentro da Demografia e dos estudos populacionais, ela tem uma contribuição muito grande para dar.

Nessa Mesa temos três mulheres que nos falarão de situações em relação à

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