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Legislação sindical e classes trabalhadoras no Brasil: a persistência do corporativismo

Logo em seguida à chegada de Getúlio Vargas ao poder, a 3 de no- vembro de 1930, foi criado ainda naquele ano o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC). Nas palavras do novo Presidente, era o «Ministério da Revolução». A partir de então uma série de leis foram cria- das procurando fortalecer o binômio regulação/nacionalismo. Como sa- bemos, as principais leis aprovadas pelo governo foram incorporadas à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), sob o regime do Estado Novo em 1943. Sobre a CLT e seu impacto na configuração política e de orga-

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5Os pequenos esforços que conhecemos são: José Luiz Werneck da Silva, org., O Feixe e o Prisma: Uma Revisão do Estado Novo (Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1991); Francisco Car- los Palomanes Martinho e António Costa Pinto, orgs., O Corporativismo em Português: Es- tado, Política e Sociedade no Salazarismo e no Varguismo (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007). De qualquer forma, nos dois casos, é necessário ressaltar que não se trata exata- mente de pesquisas comparativas, mas publicações resultantes de eventos acadêmicos.

6Howard Wiarda, «O corporativismo em Portugal e no mundo moderno», in Estado, Regimes e Revoluções. Estudos em Homenagem a Manuel de Lucena, orgs. Carlos Gaspar, Fátima Patricarca e Luís Salgado de Matos (Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2012), 263.

7Marc Bloch, «História comparada e a Europa», in História e Historiadores (Lisboa: Teo-

rema, 1995), 109-174.

nização do mundo do trabalho, falaremos adiante. Na medida em que as novas leis publicadas a partir de 1930 forem citadas indicaremos de que forma elas se inserem na CLT.

A primeira delas foi a chamada «lei dos 2/3», de 12 de dezembro de 1930, que proibia a presença de mais de um terço de trabalhadores es- trangeiros em qualquer empresa.8Uma lei, portanto, de teor nacionalista

com o propósito de garantir uma presença maior de trabalhadores «na- cionais» no mercado de trabalho.

No ano seguinte, 1931, o governo provisório deu continuidade ao pro- cesso de elaboração das leis voltadas ao universo trabalhista. Através do decreto-lei n.° 19 770 determinou o reconhecimento dos sindicatos pelo MTIC: um único sindicato teria o monopólio de representação de toda uma categoria de trabalhadores em uma mesma localidade geográfico- -administrativa. Um mínimo de três sindicatos poderia criar uma federa- ção e um mínimo de cinco federações poderia criar uma confederação. Coerente com o princípio nacionalista, o governo determinava que pelo menos 2/3 dos membros filiados ao sindicato deveriam ser nacionais.9

No caso das entidades patronais, entretanto, ainda que obedecendo à criação das entidades sob a tutela corporativa, permitiu-se a manutenção de suas associações criadas nas décadas anteriores à implantação do cor- porativismo. Criava-se, assim, uma espécie de dupla representação para o patronato.10

8Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Título III: Das normas especiais de Tutela do Trabalho. Ca- pítulo II: Da Nacionalização do Trabalho, Art. 354.º A proporcionalidade será de dois terços de empregados brasileiros, podendo, entretanto, ser fixada proporcianalidade in- ferior, em antenção às circunstâncias especiais de cada atividade, mediante ato do Poder Executivo, e depois de devidamente apurada pelo Departamento Nacional do Trabalho e pelo Serviço de Estatística de Previdência e Trabalho a insuficiência do número de bra- sileiros na atividade a que se tratar. Parágrafo único. A proporcianalidade é obrigatória não só em relação à totalidade do quadro de empregados, com as exceções desta lei, como ainda em relação à correspondente folha de salário.

9Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação das

Leis do Trabalho, Brasil, Título V: Da Organização Sindical. Capítulo II: Da Nacionaliza- ção do Trabalho, Art. 516.º Não será reconhecido mais de um sindicato representativo de mesma categoria econômica ou profissional ou profissão liberal, numa dada base territorial; Art. 533.º Constituem associações sindicais de grau superior as federações e confederações organizadas nos termos desta lei. Art. 534.º É facultativo aos sindicatos quando em número não inferior a cinco representando um número de atividades ou profissões idênticas, si- mulares ou conexos, organizarem-se em federação. Art. 535.º As confederações organizar- se-ão com o mínimo de três federações e terão sede na Capital da República.

10Ângela de Castro Gomes, «Os paradoxos e os mitos: o corporativismo faz 60 anos»,

in Análise e Conjuntura. Seminário 60 Anos da Revolução de 1930 (Belo Horizonte, 1992), 51-63.

O ano de 1932 foi marcado por importantes crises e realinhamentos na composição política do governo provisório. O levante político-militar de São Paulo, que exigia a convocação de uma Assembleia Constituinte, impôs ao Presidente a redefinição de seu campo de alianças. Este processo, de de- puração das elites governistas, foi contínuo e de certa forma ininterrupto até o golpe do Estado Novo em 1937.11Entretanto, a despeito de crises e

realinhamentos, o governo não deixou de adotar medidas destinadas aos trabalhadores. Naquele mesmo ano foi criada a Carteira de Trabalho. Atra- vés dela, uma série de normas foi sendo adotada a fim de melhor definir a natureza do trabalho no país. Em primeiro lugar, o trabalho de menores foi proibido para crianças com idade inferior a 14 anos. Estabeleceu-se tam- bém a carga horária de 8 horas para a indústria e comércio e a proibição do trabalho noturno para menores. O trabalho feminino foi regulado, garan- tindo igualdade salarial e proteção à gestante.12Este conjunto de normas

com vistas à regulamentação do trabalho contou com uma permanente rea- ção das classes empresariais através de seus órgãos de classe. Acostumado a uma situação de pouco ou nenhum controle legislativo, ao patronato bra- sileiro custou a aceitar o conjunto grande de restrições com os quais seria obrigado a conviver.13Visto desta forma, não parece correta a perspetiva de

alguns analistas para quem a Revolução de 1930 teve como significado a aliança do Estado com a burguesia para promover a modernização «pelo alto» do capitalismo brasileiro.14As alianças eram circunstanciais e nem

sempre obedeciam a critérios «de classe» tão evidentes.

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11Dulce Pandolfi, «Os anos 1930: as incertezas do regime», in O Brasil Republicano. 3: O Tempo da Experiência Democrática: da Democratização de 1945 ao Golpe Civil-Militar de 1964, Jorge Ferreira e Lucília de Almeida Neves Delgado (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003), 15.

12Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Título II: Das Normas Gerais de Tutela do Trabalho. Art. 13.º É adotada no território nacional a carteira profissional, para as pessoas maiores de dezoito anos, sem distinção de sexo, e que será obrigatória para o exercício de qualquer emprego ou prestação de serviços remunerados. Parágrafo único. Excetuam-se da obriga- toriedade as profissões cujos regulamentos cogitem a expedição de carteira especial própria; Art. 58.º A duração normal do trabalho para os empregados em qualquer atividade privada não excederá de oito horas, desde que não seja fixado expressamente outro limite. Títu - lo III. Das Normas Especiais de Tutela do Trabalho. Capítulo III. Da Proteção do Trabalho da Mulher (com um total de 29 artigos). Capítulo IV. Da Proteção do Trabalho do Menor (com um total de 39 artigos).

13Ângela de Castro Gomes, Burguesia e Trabalho. Política e Legislação Social no Brasil (1917-1937) (Rio de Janeiro: Campus, 1979), 199-252.

14Luis Werneck Vianna, Liberalismo e Sindicato no Brasil (Rio de Janeiro: Paz e Terra,

1978); Ângela de Castro Gomes e Marieta de Moraes Ferreira, «Estudos sobre sindica- lismo e movimento operário. Resenha de algumas tendências», Boletim Informativo Bi- bliográfico de Ciências Sociais, n.° 3 (1978): 9-24.

A partir de 1933 o governo deu início a sua política previdenciária. Com a criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP) em subs- tituição às Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP) o Estado passava a ter ingerência direta sobre a aposentadoria dos trabalhadores. Ao todo sete institutos, cada qual representando um ramo da economia, foram criados para este fim: IAPM: Instituto de Aposentadoria dos Marítimos (1933); IAPC: Instituto de Aposentadoria dos Comerciários e IAPB: Ins- tituto de Aposentadoria dos Bancários (1934); IAPI: Instituto de Apo- sentadoria dos Industriários (1936); IAPETEC: Instituto de Aposenta- doria e Pensões dos Empregados em Transportes e Cargas e IAPEE: Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Empregados de Estiva (1937); IPASE: Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado (1938).15A política de Estado para a questão previdenciária adotava, ini-

cialmente, uma perspetiva descentralizadora, embora sob controle pú- blico. A unificação da previdência social no Brasil viria apenas com o re- gime civil-militar brasileiro e mais particularmente com a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social, no dizer de Ângela de Castro Gomes, o «Ministério da Revolução de 1964».16No entanto, é

digno de nota que desde a década de 1940 o governo já elaborava proje- tos com vistas à unificação previdenciária.17

Outro instrumento determinante no novo corpo legislativo que se criava foi a Justiça do Trabalho: aprovada pela Constituição de 1934 e formalizada em lei a partir de 1.° de maio de 1941 ela resultou na insta- lação de comissões mistas de conciliação com três representantes de em- pregadores e três de empregados sob a coordenação de um bacharel em Direito. A Justiça do Trabalho, além de julgar, tinha também poder nor- mativo, ou seja, a prerrogativa de criar normas e regras que regulam as relações e a organização do trabalho. A grande novidade advinda com a Justiça do Trabalho foi a criação da figura do juiz classista. Sem necessi- dade de diploma, os juízes classistas eram indicados por seus pares, com

15Maria Celina D’Araújo, «Estado, classes trabalhadoras e políticas sociais», in O Brasil Republicano: 2: o tempo do nacional-estatismo: do início da década de 1930 ao apogeu do Estado Novo, orgs. Jorge Ferreira, Jorge e Lucília de Almeida Neves Delgado (Rio de Janeiro: Ci- vilização Brasileira, 2003), 234-235.

16Ângela de Castro Gomes, «Abertura política e controle sindical: trabalho e traba-

lhadores no Arquivo Ernesto Geisel», in Dossiê Geisel, orgs. Maria Celina d’Araújo e Celso Castro (Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002), 135.

17GV c 1944.09.00/1, FGV/CPDoc, cartão de João Carlos Vital a Getúlio Vargas en-

caminhando relatório dos trabalhos da comissão encarregada de estudar a reorganização da previdência social brasileira.

mandato vitalício para representá-los junto à Justiça do Trabalho.18Na

medida em que, em geral, o juiz classista era na maioria dos casos um ex-dirigente sindical, o reconhecimento da estrutura corporativa pelos sindicalistas se tornava cada vez mais forte.19

A Constituição de 1934, entretanto, impôs alguns reveses para o go- verno. O principal deles veio através do decreto-lei n.° 24 694 que deter- minava uma pluralidade sindical desde que o sindicato agrupasse pelo menos 1/3 da categoria que pretendia representar. Limitava a intervenção estatal nos sindicatos ao máximo de seis meses, ainda que mantivesse a prerrogativa do reconhecimento da entidade por parte do Estado. Para o governo, a possibilidade de mais de um sindicato por base territorial inviabilizava o projeto desenhado desde a criação do Ministério do Tra- balho. A consagração do pluralismo foi uma vitória da Igreja com o apoio do patronato, além de segmentos ligados aos interesses privados e que se opuseram desde o início à legislação trabalhista.20Embora jamais

a pluralidade tenha sido de facto posta em prática, ela representou um incômodo constante para o regime, superado apenas com a Constituição do Estado Novo em 1937.

A imposição da ditadura estado-novista abriu espaço para uma série de debates a respeito da natureza do regime que a partir daquele momento nascia. As interpretações mais correntes indicam uma nítida influência do fascismo italiano e sua Carta del Lavoro. Seguindo tal perspectiva de análise, alguns autores apontam para o facto de que a vitória das experiências ita- liana e alemã contribuiu para o nascimento de regimes semelhantes na América Latina.21Outros, em perspetiva diversa, indicam a influência do

positivismo autoritário e modernizador, ideologia predominante no Rio Grande do Sul e determinante na formação política de Getúlio Vargas e de seus companheiros de armas que depuseram o governo da I República.22

Independentemente de influências externas ou pretéritas, é inegável que a

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18Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Título VIII: Da Justiça do Trabalho. Art. 643.º Os dissídios oriundos das relações entre empregadores e empregados reguladas na legislação social serão dirimidos pela Justiça do Trabalho, de acordo com o presente título e na forma es- tabelecida pelo processo judiciário do trabalho. Art. 647.º Cada Junta de Conciliação e Julgamento terá a seguinte composição: a) um presidente; b) dois vogais, sendo um re- presentante dos empregadores e outro das empregados.

19Maria Celina d’Araújo, «Estado, classes trabalhadoras»..., 232.

20Ângela de Castro Gomes, A Invenção do Trabalhismo (São Paulo: Vértice; Rio de Ja-

neiro: IUPERJ, 1988, 189.

21Maria Helena Rolim Capelato, O Estado Novo: o que Trouxe de Novo?, 109. 22Alfredo Bosi, «A arqueologia do Estado-providência», in Dialética da Colonização

(São Paulo: Companhia das Letras, 1992), 273-307. 07 Vaga Corporativa Cap. 7.qxp_Layout 1 11/04/16 12:11 Page 178

opção pela centralização já podia ser verificada desde o início dos 30 e tem o seu coroamento com o golpe de 10 de novembro de 1937.

Os esforços em favor da continuidade, sem evidentemente descarac- terizar a rutura estabelecida com um golpe de Estado, entre os períodos pré e pós-37 são evidentes. O decreto-lei n.° 1402 de 1939, por exemplo, restabelece a unidade sindical, ou seja, o monopólio de representação através do sindicato único por categoria profissional. O decreto ainda proibia as greves e dava ao Estado o direito de controlar as contas, as eleições e as atividades administrativas dos sindicatos.23O «desvio» ocor-

rido em 1934 estava reparado.

O conjunto de leis aprovado pelo governo do Estado Novo ganhava, para além do aparato repressivo e de controle, um elemento adicional. A partir de 1938 o Dia do Trabalho passou a fazer parte do calendário de comemorações oficiais do regime. Naquele ano o presidente Getúlio Vargas anunciou a regulamentação da lei do salário mínimo, além de prometer sempre «presentear» os trabalhadores naquela data com uma nova legislação que os beneficiasse. Foi a partir daquele ano que se deu a adoção de uma política de enaltecimento da figura do Presidente, cha- mado a partir de então «pai dos pobres».24Uma das razões para a eficiên-

cia da política de propaganda e mobilização do regime, principalmente durante o Estado Novo, foi seu sucesso na condução econômica. Entre 1933 e 1939 a taxa de crescimento da produção agrícola e industrial no país foi de 11%. O início da Guerra provocou um declínio produtivo para 3,9% quando comparamos o período citado com os anos que vão de 1939 a 1942. Contudo, a partir daquele ano, o crescimento agrícola e industrial chegou à marca de 9,4%. Também no regime do Estado Novo assistimos aos dois maiores exemplos da modernização industrial brasi- leira: a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, e o início dos projetos para a construção da Companhia Vale do Rio Doce.25Assim, «a política industrial do governo Vargas tornou-se logo

uma das mais importantes estratégias para o desenvolvimento brasileiro no período de 1930 a 1945».26

23Estados Unidos do Brasil, Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Art. 516. Não será reconhecido mais de um sindicato repre- sentativo de mesma categoria econômica ou profissional, ou profissão liberal, em uma mesma base territorial.

24Ângela de Castro Gomes, A Invenção..., 237-246.

25Maria Antonieta Leopoldi, «Estratégias de ação empresarial em conjunturas de mu-

dança política», in Repensando o Estado Novo, org. Dulce Pandolfi (Rio de Janeiro: Editora FGV, 1999), 122-123.

Em 1939 o 1.º de maio passou a ser comemorado no estádio de São Ja- nuário, do Clube de Regatas Vasco da Gama, adquirindo contornos ritua- lísticos que se mantiveram até o fim do Estado Novo.27Naquele ano, uma

nova lei de sindicalização, a Lei Orgânica de Sindicalização Profissional, foi decretada. Seu objetivo era fazer com que toda a vida associativa pro- fissional no Brasil gravitasse em torno do Ministério do Trabalho.28Os es-

tatutos dos sindicatos passavam a ser uniformizados pelo Departamento Nacional do Trabalho, havendo apenas pequenos espaços em branco para o preenchimento de nome, endereço e demais dados de identificação da entidade sindical. A movimentação financeira do sindicato também era controlada, sendo seus gastos submetidos à aprovação do Ministério.29

Em 1940, mais uma vez no Estádio de São Januário, era aprovada, através do decreto-lei n.° 2162, a criação do salário mínimo, devendo o mesmo ser suficiente para as despesas mínimas do trabalhador e sua fa- mília.30O mesmo, contudo, foi mal recebido pelas classes empresariais,

para quem, de acordo com a lógica do mercado, o Estado não deveria ser o definidor do valor do salário.31

No ano seguinte, o governo aprovou uma medida que fortalecia a es- trutura dos sindicatos prescindindo da participação efetiva de seus mem- bros. Trata-se do imposto sindical, contribuição compulsória de um dia de trabalho de cada trabalhador, sindicalizado ou não, para o sindicato de sua categoria. O imposto recolhido pelo Ministério do Trabalho era repassado aos sindicatos, federações e confederações para gastarem de acordo com as determinações legais. A distribuição do montante era rea- lizada de acordo com a seguinte proporcionalidade: 5% para as confe- derações, 15% para as federações, 60% para os sindicatos e 20% para o Fundo Social do Ministério do Trabalho. Assim, a existência do sindicato como organismo de representação dos trabalhadores, com dotação or- çamentária para seu sustento, era determinada pelo poder público. A adesão ao sindicato era uma escolha do indivíduo.32

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27Ângela de Castro Gomes, A Invenção..., 235-236.

28Marcelo Badaró Mattos, O Sindicalismo Brasileiro Após 1930 (Rio de Janeiro: Jorge

Zahar, 2003), 19.

29Maria Celina d’Araújo, «Estado, classes trabalhadoras»..., 227.

30Estados Unidos do Brasil. Diário Oficial, 9 de agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Título II. Das Normas Gerais de Tutela do Trabalho. Capí- tulo III. Do Salário Mínimo (com um total de 52 artigos). Vianna, Luiz Werneck, Libe- ralismo e Sindicato no Brasil, 235.

31Maria Celina d’Araújo, «Estado, classes trabalhadoras»..., 235.

32Estados Unidos do Brasil, Diário Oficial, 9 de Agosto de 1943. CLT – Consolidação

das Leis do Trabalho, Brasil, Título V. Da Organização Sindical. Capítulo III. Do Imposto Sindical (com um total de 32 artigos).

No dia 1.° de maio de 1943 foi aprovada a lei que simbolizou durante todo o século XXno Brasil a legislação trabalhista inaugurada por Vargas:

a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Tratava-se não exatamente de uma nova lei, mas da junção de todas as leis referentes ao mundo do trabalho criadas pelo governo desde 1930. A CLT estabeleceu oito ramos de atividades, cada uma com uma confederação de trabalhadores e outra de empresários: comércio; indústria; transporte marítimo, fluvial e aéreo; transporte terrestre; comunicação e publicidade; crédito; educação e cul- tura; profissões liberais. No plano municipal haveria os sindicatos, no plano estadual as federações, no plano federal as confederações e na ponta o Ministério do Trabalho, regulador de toda a rede organizativa.33

A racionalidade administrativa do governo Vargas, e do Estado Novo em particular, deve ser compreendida a partir da leitura que seus princi- pais quadros faziam a respeito do papel a ser desempenhado em uma so- ciedade moderna por representantes e representados. A relação entre Es- tado e corporativismo no Brasil implicou em uma interpretação própria dos alcances e limites dos direitos individuais e dos direitos coletivos. Para os arquitetos do Estado Novo estava se consolidando no país uma nova forma de democracia, a democracia social, onde os direitos dos indi- víduos estariam constrangidos pelos direitos coletivos. O cidadão neste novo modelo de organização do Estado era identificado através de seu trabalho e da posse de direitos sociais e não mais por sua condição de indivíduo e posse dos direitos civis ou políticos. Assim, no Estado Novo, «os direitos do trabalho tornaram-se o centro definidor da cidadania no Brasil».34A estrutura vertical do sindicalismo brasileiro, onde o Estado

através do Ministério do Trabalho colocava-se ponta da pirâmide, obe- decia a este preceito.

Outro aspeto para o qual devemos chamar a atenção diz respeito à ação do regime ao longo da década de 1940 tendo em vista a necessidade de preservação de suas políticas mais importantes, notadamente a traba- lhista, em um sistema democrático. Quando da instituição do Estado