• Nenhum resultado encontrado

LEI DE ASSISTÊNCIA AOS ALIENADOS (DECRETO DE Nº 1.132 DE 22 DE

Conforme relata Brito (2004, p.70), o Decreto de nº 1.132 de 22 de dezembro de 190324 foi a primeira lei nacional que abordou a situação dos alienados, reorganizando a assistência a eles prestada.

Composto de 23 artigos, tratou dos motivos que determinam a internação e dos procedimentos necessários para realizá-la e para a guarda dos bens dos alienados, assim como regulou a possibilidade de alta e a necessidade de inspeção dos asilos por comissão a mando do ministro da justiça. Proibiu que fossem mantidos alienados em cadeias públicas, estabeleceu condições básicas para o funcionamento de asilos, além de questões mais

24

O Decreto completo está disponível em: < http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto- 1132-22-dezembro-1903-585004-publicacaooriginal-107902-pl.html>. Acesso em: 23 de nov. 2015.

específicas, como o pagamento das diárias pelos doentes, a composição do Hospício Nacional no Rio de Janeiro e das colônias de alienados. Determinou penalidades no caso de descumprimento da lei.

Brito aponta haver diversas semelhanças entre o Decreto 1.132/1903 e a lei francesa de 1838, a qual foi considerada referência na regulação acerca dos alienados.

Nina Rodrigues ([1933?], p. 180), escrevendo em 1901, ou seja, dois anos antes do Decreto 1.132/1903, comenta não haver, até então, fiscalização legal alguma dos estabelecimentos de tratamento. Comenta ter existido uma lei de assistência médico-legal, mas que esta era aplicável apenas ao Hospício Nacional de Alienados do Rio de Janeiro e que foi criada mais para libertar a direção do estabelecimento das agressões da imprensa e de caráter político, do que por consideração aos interesses dos reclusos.

Acreditamos que a lei a que Nina Rodrigues se refere é o Decreto de nº 206 A de 15 de fevereiro de 1890. Este é mencionado por Juliano Moreira (1905, p. 739) como tendo sido editado pouco depois da proclamação da República, quando, depois de uma requisição ministerial para o internamento de um alienado ficar sem resposta, o ministro Aristides Lobo se convenceu da necessidade de uma lei a qual prestasse assistência aos alienados.

Juliano Moreira relata que, no início da República, foi criado o Decreto de nº 142 A de 11 de janeiro de 1890, o qual desvinculou a Santa Casa de Misericórdia do Asilo Dom Pedro II, que, neste momento, passou a se chamar Hospício Nacional de Alienados. Logo depois, foi criado o referido Decreto 206 A de 15 de fevereiro de 1890, o qual determinou novas diretrizes para o Hospício Nacional e as Colônias da Ilha do Governador, criando a denominada “Assistência Medico Legal dos Alienados”.

Nina Rodrigues ([1933?], p. 181) afirma, contudo, que a grande verdade é que não existiu assistência médico-legal de alienados nesse período. Ressalta que o Hospício Nacional de Alienados, o Asilo de Alienados de São Paulo e o Hospício de Recife seriam exceções, mas que os demais estabelecimentos do País, assim como o da Bahia, seriam um atestado da incompetência e da criminosa indiferença dos governos locais. Descreve-os como simples depósitos de loucos, que disputariam o calabouço das casas de detenção, e afirma que o único propósito de tais estabelecimentos seria remover os loucos das vistas do público, em uma atestação criminosa da desídia dos governos.

Assevera Nina Rodrigues que as formalidades no procedimento de internação seriam somente as que figuram nos regulamentos internos dos estabelecimentos, quando sequer existiam. Assim, o procedimento de internação dependia inteiramente da direção do estabelecimento. Nina Rodrigues aduz, ainda, que, mesmo quando existiam formalidades,

estas não eram observadas. Cita o exemplo do Asilo da Bahia, que, para o internamento voluntário, requisitava dois atestados médicos e o consentimento do Provedor da Santa Casa, mas que, na prática, o atestado do médico assistente era subscrito por um médico qualquer que, na maioria das vezes, nem conhecia o doente.

Assim, Nina Rodrigues apresenta como vergonhosa a situação do país acerca dos alienados, que eram mantidos em péssimas condições, havendo também notoriamente o aprisionamento, em instituições, de pessoas que lá não deveriam estar, em verdadeiro crime de sequestração ilegal, como no caso de Luiza Alcover25.

Desse modo, é esta situação, aparentemente, que o Decreto de nº 1.132 de 22 de dezembro de 1903 se propôs a modificar, com o regulamento nacional da matéria. De fato, como supracitado, o decreto pacificou diversas questões procedimentais, mas ainda teve diversos pontos polêmicos. Como aduz Brito (2004, p. 70-71), logo no artigo 1º, é demonstrado que a internação era determinada por questões de segurança pública, e nenhuma relação tinha com o bem estar do alienado.

O exame médico, por exemplo, passou a ser exigido, mas seu papel era secundário na determinação da internação, de modo que podia ser realizado após a pessoa já ter sido internada. Brito relata que o artigo 2º do Decreto estabeleceu duas formas de solicitação de internação, a pública e a particular. No caso da requerida por autoridade pública, a alienação podia ser comprovada pela exposição de fatos e o atestado médico era apresentado “sempre que possível”. Já, no caso da internação feita por particulares, era feita a exigência de dois pareceres médicos, com até 15 dias entre o exame e a data de requerimento.

Outro aspecto relevante foi o tratado no artigo 5º, relativo à reclamação por novo exame de sanidade. Afinal, era feita a previsão de requerimento de novo exame, mas a lei não abordou por quem podia ser feita ou que garantias a pessoa teria no cumprimento do novo exame. Além disso, a lei, em seus artigos 6º e 7º, previu o término da interdição apenas quando solicitada por quem a requisitou, não abordando a participação do doente no processo

25“o e o aso de D. Luiza Al o e , o e tou: E de outu o de , o D . Midosi de Mo aes, edico da

casa de Saude de São Sebastião, no Rio de Janeiro, foi detido na ocasião em que, acompanhado de dois enfermeiros, procurava introduzir á força num carro, a D. Luiza Alcover com quem vivia. A lucta provocou a intervenção de visinhos e da policia. Processado por crime de sequestração illegal (Arts. 181 e 182 do Codigo Penal), o Dr. Midosi foi absolvido pelo jury. Mas, quaisquer que tivessem sido as retratações finaes da paciente, as declarações do director da Casa de Saude, Dr. Pereira da Cunha, deixam a impressão de que os estabelecimentos, destinados, no Brasil, á cura de alienados, reclamam fiscalização oficial. A doente já tinha estado um mez na Casa de Saude e o director apenas havia diagnosticado chloro-anemia com predominância dos phenomenos nervosos e sanidade mental perfeita, quando dias depois foi solicitada a readmissão da paciente por um acesso de loucura furiosa evidentemente inexistente. Do caso, se há de concluir, pois que, no Brasil, um méedico director da Casa de Saude para alienados póde sequestrar impunemente a quem assim lhe ap ou e , si as i u sta ias fo tuitas a isso ão se opuse e . RODRIGUE“, [ ?], p. 180)

de alta. Assim, é dada grande importância à atuação médica para a determinação acerca de o doente representar, ou não, perigo social.

O decreto não chega a tratar especificamente da questão da internação de toxicômanos, a qual é abordada, posteriormente, nos Decretos nº 4.294 de 6 de julho de 1921 e nº 14.969 de 2 de setembro de 1921, os quais são abordados no tópico seguinte.

3.6 DECRETOS DE Nº 4.294 DE 6 DE JULHO DE 1921 E Nº 14.969 DE 2 DE