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Leo Amaral Penna descreve, em outras palávras, este difícil equilíbrio:

"Não havia necessidade porque era pura técnica. Apenas

O

seguinte: o· diretor, sendo diretor da Eletrobrás, nos seus

contatos com as subsidiárias, ele tem que ser ... Ele não pode

ser um puro profissional da engenharia. Ele precisa discutir e

negociar e conversar profissionalmente. Não sei se me enten­

dem. Quer dizer, engenheiros, responsáveis por obras públi.

cas, precisam ter também entendimentos políticos, com p

maiúsculo. Repito: políticos com P maiúsculo.

De

maneira que

foi

a única diferença. Na Caeeb, eu vivia numa empresa

particular, eu tive funções e

contatos

profissionais, de política

profissional, com p maiúsculo. Sabe que em inglês existem

duas palavras parecidas; uma delas é

politics,

que é política com p minúsculo, que existe a cântaros no Brasil, e outra é policy. Quer dizer, as empresas de eletricidade tinham que se entender no que concerne à

policy

de desenvolvimento e de expansão." (penna, Leo Amaral. Depoimento (1988). Rio de Janeiro, CPDOCj Centro da Memória da Eletricidade no Bra­ sil, 1988. p. 275 e 276.)

Uma breve exploração do acervo permite, assim, qualificar e precisar alguns processos já bastante examinados pela historiografia brasileira, mostrando a importância da experiência empresarial estrangeira para a conformação do setor elétrico estatal e os mais variados mecanismos de negociação política postos em funcionamen­ to para garantir a separação da empresa estatal com respeito à administração direta. Estas entrevistas mostram a importãncia dos decisores técnicos na constituição e na reprodução do isolamento com respeito à administração pública tradicional. O

insulamento burocrá­

tico

não podia ser o simples resultado da decisão unilateral do agente político.

Petrobrás

A trajetória da Petrobrás é bem diversa daquela seguida pelo setor elétrico. A criação da empresa foi o resultado de uma ampla campa­

nha popular em favor do monopólio estatal do petróleo que culminou em 1953, e sua estrutura agregou imediatamente unidades indus­ triais já sob o controle da União.

Do ponto de vista, portanto, da experiência técnica e administra­ tiva, o panorama era mais complexo. Em alguns campos a experiên­ cia anterior, em termos técnicos e gerenciais, era virtualmente nula. Em outros, os técnicos existentes já haviam sido formados pelas organizações estatais que precederam a existência da Petrobrás, sobretudo na área do refino e exploração. A contribuição privada limitar-se-ia ao setor de distribuição. Do ponto de vista do desem­ penho da empresa, el"a impossível estar mais exposta à controvérsia pública. O seu Sucesso ou fracasso constituiria o teste político defini­ tivo tanto para as correntes nacionalistas, quanto para seus oposi­ tores liberais. Assim, ao lado das questões relativas à proteção da empresa dos interesses políticos, os problemas administrativos e de expertise técnica assumiam grande importância.

A entrevista de Antonio Seabra Moggi, antigo funcionário do CNP, diretor dos órgãos de pesquisa e treinamento da Petrobrás por

mais de duas décadas, presidente de subsidiárias da empresa en1 Nova York, revela, de uma maneira bast.ante especial, vários aspec­

tos importantes sobre estes temas.

No seu prilneiro momento, as atividades da empresa estavam fortemente marcadas pelo caráter de "segurança nacional" que a can1panha popular lhe havia impingido. Dessa forma, seja por moti­ vos políticos, seja pela carência de pessoal técnico, a presença de militares na administração superior e no corpo técnico da empresa foi significativa. Essa opção foi tomada como sinal de sucesso da estratégia de insulamento da Petrobrás. Antonio Moggi discorre acerca das vantagens e dos efeitos dessa prática sobre os propósitos orígínais da organízação:

"Esse princípio sofreu várias modificações. Prinleiro por força dos próprios presidentes que foram nomeados para a Petro­ brás. Todos eles, até recentemente, eram de origem militar e tinhanl UIna visão adnIinistrativa vertical. Esse vezo militar, que se aprende na Escola Militar - a disciplina militar de cima para baixo, a hierarquia, a predominância do comando e não do consenso -, levou a uma administração verlicalizacla e deturpou um pouco o plano original, que era de UIna admi­

nistração urn pouco luais horizontalizada, com os departamen­ tos funcionando. Isso provocou, com o decorrer do tempo ... No início não provocou muita deturpação, porque os diretores também existiam a curto prazo. A vida média de uma diretória da Petrobrás era de um ano e quatro meses: a vida média. Os diretores e presidentes eram substituídos a curtíssiIno prazo. E sempre havia um militar à testa, pois existia a idéia de que o militar estaria eqüidistante das facções políticas, o que seria uma blindagem para proteger a empresa dos apetites dos partidos políticos. Isso funcionou até certo tempo. Infeliz­ mente, os presidentes civis vieram em ocasiões muito contur­ badas." (Moggi, Anronio Seabra. Depoimento (1988). Rio de Janeiro, CPDOGlPetrobrás, 1988. p. 53-4.)

Em sua visão, a centralização das decisões veio a determinar os próp:rios rumos da evolução institucional da empresa:

"Se por um lado a presença de um militar trouxe esse mara­ vilhoso escudo contras as ingerências político-partidárias, ela de fato provocou uma visão organizacional completamente antagônica àquela idéia, que tinha

o

Hélio Beltrão, de uma

estrutura organizacional horizontal, em que se teria uma empresa com uma diretoria executiva subordinada a um con­ selho de administração para a grande po1ític�, mas essa dire­ toria executiva nào seria executiva no sentido da rotina coti­ diana. Ela seria uma diretoria para decisões intennediárias entre o conselho e o primeiro escalão de fato executivo, que seria o das superintendências dos departamentos, por uma razão muito simples: o receio de que as multinacionais conse­ guissem quebrar o monopólio do petróleo) se elas se transfor­ massem em subsidiárias. A primeira idéia era ter a Petrobrás como uma holding conl várias subsidiárias - de exploração,

produção, industrial etc. -, mas isso não foi feito. Foram

criados os departamentos e só posteriormente as subsidiárias, nas áreas não-monopolísticas. As areas monopolísticas fica­ ram na nlão da empresa propriamente dita, através de seus departamentos que deverianl funcionar executivamente, ope­ racionahnente, com poderes delegados da diretoria executiva, que passaria a fazer uma supervisão de caráter mais geral, mais global.

Isso não ocorreu, porque o militar é levado a pensar verti­ calmente. A organização militar é vertical ( ... ) Mas isso trouxe uma concentração na empresa durante muito teUlpO e um endeusamento do presidente, que passou a ser uma espécie de

figura máxima, quase Uln oráculo."(Moggi, Antonio Seabl"a.

1988,

p.

1 12

e

1 13.)

Assim, a visão geralmente otimista sobre o processo de separação de determinadas áreas da atuação estatal das práticas da adminis­ tração direta pode ser qualificada, justamente em função de seus agentes. Vejamos como essa avaliação pode ser estendida também a casos específicos, como foi a administração, na fase de construção e nos primeiros anos de operação, da refinaria de Cubatão

(1951·54):

"Digamos assim: os militares tinham o poder, mas não tinham o conhecin1ento; os técnicos tinham o conhecimento, mas não

tinham o poder; e os estrangeiros tinham o know-/ww e com

isso tinham algum poder, porque não transmitiam esse know­

/WW e queriam ser sempre chamados para resolver os proble­ mas da refinaria, como chamamos um técnico de televisão para consertá-la, porque não sabemos fazê-lo nós mesmos. Tinha que haver um jeito de reunir os técnicos estrangeiros e nacionais c dar a estes condições de fazer perguntas inteli-

gentes - saber o que pedir - e conseguir que os técIÚcoS

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