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4. TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA POR MEIO DO LICENCIAMENTO DE

4.1 LICENCIAMENTO DE TECNOLOGIA UNIVERSITÁRIA

A proteção de inventos por meio de patentes precede o licenciamento de tecnologia de forma que a patente configura-se como um ativo de seu titular. De acordo com Macedo e Barbosa (2000), a tecnologia patenteada pode ser usada, usufruída, alugada ou vendida a exemplo de outros ativos, havendo a possibilidade de transferir os direitos de exploração da patente integralmente ou parcialmente. No Brasil, o INPI é a autoridade a quem compete a averbação de contratos de transferência de tecnologia, passando o contrato, desta maneira, a produzir efeitos perante terceiros. Entretanto, observa-se que esse procedimento não é prática comum, não obstando, por sua vez, a existência de contratos diretos entre os interessados (INPI, 2006).

Para Macedo e Barbosa (2000, p.47), o licenciamento de tecnologia é a negociação mais usual dentre as alternativas para as patentes. Denomina-se licença “a permissão concedida pelo titular a terceiros, para que estes usem total ou parcialmente os direitos de sua patente ou de um pedido”. No que se refere à transferência de tecnologia, por ser clara e distinta, e explicitamente regulada por lei, a patente pode ser considerada como um adequado objeto para transferir conhecimentos técnicos necessários à produção de determinada mercadoria.

Nessa direção, vale ressaltar o caráter meio que o patenteamento nas universidades deve assumir, pois tal processo é caro e só tem razão de ser com objetivo de que a invenção a ser protegida seja explorada comercialmente; caso contrário se tornará apenas motivo de orgulho para seus inventores e de admiração por parte de seus pares (STAL; FUJINO, 2002). Assim, deve ficar claro que o papel da propriedade intelectual para as universidades públicas, especialmente da proteção por meio de patentes, é distinto em relação às empresas que patenteiam, via de regra, para obter monopólio de exploração do mercado. Por outro lado, as universidades não patenteiam para si, mas buscam proteger, codificar o conhecimento e tornar a invenção viável economicamente (GRAFF; HEIMAN; ZILBERMAN, 2002).

De acordo com Souza Neto e Stal (1998 apud CHAGAS, 2004), a universidade, de posse de propriedade intelectual, pode seguir três possibilidades:

• Concessão de opção para uma licença – onde o patrocinador pode optar por licença de exploração futura;

• Concessão de uma licença – onde o contrato de pesquisa já define a concessão de licença para o patrocinador;

• Direito de primeira recusa – na decisão do patrocinador de decidir pela licença depois, em não havendo acordo com a universidade nesse período determinado, a universidade poderá negociar com outras instituições a propriedade intelectual.

Mais precisamente, há diversos tipos de licenças que a universidade pode conceder, tais como: a) licença não-exclusiva – livre do pagamento de royalties com ou sem direito de sublicenciamento; b) licença exclusiva - com pagamento de royalties em área específica podendo a empresa sublicenciar; c) licença exclusiva - com pagamento de royalties podendo sublicenciar; e d) licença exclusiva sem pagamento de royalties, incluindo direito de sublicenciar.

Os acordos de licenciamento de tecnologia universitária, com exceção dos relativos a softwares e materiais reagentes, invariavelmente incluem entradas e royalties como forma de remuneração. Muitos acordos de licenciamento também incluem cláusulas de pesquisa contratada e, crescentemente, também tratam de equidade na distribuição de rendimentos (JENSEN; THURSBY, 2001).

No contexto do licenciamento universitário observa-se a indefinição de muitos aspectos fundamentais relacionados à gestão da propriedade intelectual. Há diferentes entendimentos por parte de universidades acerca do uso da Lei 8.666/93 que prevê o processo licitatório para comercialização de tecnologia originada exclusivamente com recursos públicos. Em alguns casos, a pesquisa realizada dentro da universidade encontra gargalos de financiamento, bem como de meios físicos para sua continuidade. Esta etapa de pesquisa em que a tecnologia ainda é bastante incipiente exige o estímulo da exclusividade de exploração da tecnologia futuramente pela empresa que aplicou recursos para seu desenvolvimento (STAL; FUJINO, 2005).

De acordo com o grau de importância para a empresa quanto à exploração monopolista da tecnologia no mercado, ou devido à estratégia de não revelar seus processos e produtos em patentes, as empresas nem sempre se sentem atraídas por tecnologias patenteadas por universidades. Em pesquisa realizada nos Estados Unidos juntamente com 182 empresas foram investigadas as razões que justificavam o desinteresse dessas empresas em licenciar tecnologias de universidades (THURSBY; THURSBY, 2000 apud GRAFF; HEIMAN; ZILBERMAN, 2002).

Os aspectos mais fortes para o desestímulo das empresas constatados foram: 1) tecnologias pouco desenvolvidas; 2) pesquisas pouco relevantes para seus negócios; 3) desestímulo devido a burocracia e limitações impostas; 4) políticas de licenciamento e desejo

de acadêmicos em publicar; e 5) conflitos de natureza cultural como a complexidade universitária que atravanca negócios e a inexperiência de órgãos de apoio.

Ressalta-se que o licenciamento de tecnologia ou transferência de tecnologia constitui-se, conforme alertam Santos e Solleiro (2004, p.797), em um processo caracterizado pela especificidade, em que quase toda a transação é diferente: “cada tecnologia é diferente, seja pelo estágio de desenvolvimento em que se encontra, seja pelo setor industrial a que se aplica”. Ainda, as relações com os inventores são distintas em cada caso, assim como a proteção da propriedade intelectual e as relações com os licenciantes também o são.

Um dos desafios enfrentados pelas organizações que gerenciam o licenciamento de tecnologia está na etapa diretamente anterior. A atribuição de valor monetário a uma dada tecnologia, ou valoração tecnológica representa uma tarefa altamente complexa, qual seja a de buscar parâmetros corretos para toda e qualquer decisão a ser tomada acerca da propriedade intelectual e negócios oriundos dela. A primeira razão para valoração tecnológica é, em síntese, a transformação da propriedade intelectual em produto, sendo que é propositado mensurar os investimentos e expectativas de retorno cabíveis a cada parte envolvida no desenvolvimento de inovações. Em suma, a valoração de tecnologia auxilia o titular a tomar decisões sobre a forma mais eficaz de comercializar a tecnologia em função dos custos da utilização, da proteção, venda e troca desse ativo no mercado (OMPI, 2003).

Entre as diversas razões para mensurar e precificar a propriedade intelectual no contexto universitário, pode-se destacar: a concessão de licenças; compra e venda de ativos de propriedade intelectual, elemento de apoio em caso de litígio, redução de custos de patentes com baixas expectativas de retorno e atração de investidores e acionistas.

A LES-BRASIL, Grupo Brasileiro que compõe a Licensing Executives Society

International (LESI) discutiu, em 2004, acerca dessa problemática em evento, onde foram

apresentadas três perspectivas básicas para precificação da tecnologia, são elas:

1) avaliação econômica de todos os contratos associados àquela marca e produto;

2) análise do investimento em termos de quanto se gasta com o produto e marca, incluindo gastos com mídia; e

3) análise da percepção do mercado sobre o produto e marca, buscando constatar vantagens competitivas frente ao início de um novo negócio (REINACH, 2005).

Ainda, a valoração tecnológica em tudo se relaciona com um acordo de licenciamento de tecnologia que seja satisfatório para ambos participantes, de modo que uma boa avaliação da propriedade intelectual pode ajudar um eventual licenciante que deseje

comparar as condições financeiras de um acordo de concessão de licença proposto por um determinado provedor de tecnologia com os de outros provedores, além de se assegurar que vale a pena licenciar tecnologia ao invés de desenvolvê-la.

O processo de transferência de tecnologia por meio específico de patentes foi pouco explorado no âmbito brasileiro ainda, até porque tal prática não se configurava como comum, haja vista que mesmo o patenteamento de tecnologias pela universidade, etapa anterior de onde parte o processo de licenciamento, não ocorria de forma expressiva. Todavia, alguns trabalhos internacionais levados a cabo por estudiosos do tema, especialmente nos EUA, tratam de descrever tal processo.

Os passos para transferência e comercialização de tecnologia são basicamente os mesmos para todas as universidades (CARLSSON; FRIDH, 2002). De maneira bastante simples e preliminar, a menção de etapas do processo de transferência de tecnologia definido pela AUTM (2003) se resume a três passos básicos:

1) realização de invenções;

2) patentear a invenção concomitantemente à publicação da pesquisa acadêmica; e

3) licenciar os direitos das invenções para a indústria para desenvolvimento e comercialização.

O processo de transferência de tecnologia de forma não detalhada se expressa à luz da proposição de diversos autores conforme demonstrado abaixo na figura 4.1 (PARKER; ZILBERMAN; CASTILLO, 1998; ROGERS; TAKEGAMI; YIN, 2001; THURSBY; JENSEN; THURSBY, 2001). Gastos em Pesquisa Emprego e Riqueza

Figura 4.1 - Processo de transferência de tecnologia universitária. Fonte: Adaptado de Friedman e Silberman (2002).

Invenções e Descobertas Depósitos de Patentes Licenças de Tecnologias Licenças de Tecnologias Produção Receitas Receitas de Licenças Empresas Start-ups

Esse processo assinalado tem foco na geração de invenções e comercialização de resultados de pesquisa por meio do licenciamento de patentes e criação de empresas, valendo lembrar que outros mecanismos de transferência de tecnologia têm processos específicos e não estão englobados nesse esquema de referência.

A explicativa que segue o modelo esclarece que, a partir do surgimento de uma invenção, segue-se o depósito da patente e então as licenças de tecnologia executadas por contratos de transferência de tecnologia. Esses contratos prevêem a medida da produção da tecnologia no âmbito da indústria e a percepção de royalties entre outros detalhes. A transferência de tecnologia poderá ser para empresas incumbentes ou start-ups, gerando emprego e riqueza.

Carlsson e Fridh (2002) também estudaram o processo de transferência de tecnologia e complementam com maiores detalhes do processo a partir do interesse de uma empresa em comercializar a tecnologia patenteada. Objetivando licença de exploração de patente, o processo de licenciamento geralmente segue os seguintes estágios:

a) Acordo de Confidencialidade entre empresa interessada e universidade para que se possa

discutir a tecnologia;

b) Plano de Negócios apresentado pela empresa onde são explicitadas suas intenções para

com a tecnologia bem como sua capacidade de utilizá-la seguindo pré-determinações;

c) Minuta do Termo de Licença, a qual constitui-se no passo mais importante do processo,

onde são discutidos aspectos econômicos-chave da tecnologia a ser comercializada;

d) Acordo de Licença, que consolida em um mesmo documento os interesses de ambas

organizações em todos os aspectos. Tipicamente, tais acordos são personalizados para cada caso e pode ser construído tanto em poucas semanas como em alguns anos (CARLSSON; FRIDH, 2002).

Assim, seguindo esse caminho mais comum, universidades e instituições de pesquisa gerenciam seu portfólio de patentes através de procedimentos internos à instituição que vão desde a decisão de patentear até a percepção e utilização de receitas advindas de

royalties. Uma vez que uma instituição de pesquisa possui um portfólio de patentes, é preciso

buscar interessados para licenciar tais tecnologias. O papel da patente na universidade não é visto como monopólio de produção como no caso da empresa, mas é efetivamente um canal de comercialização de novas tecnologias (GRAFF; HEIMAN; ZILBERMAN, 2002).

Considerando o alto grau de customização dos processos de licenciamento e a complexidade inerente a gestão da propriedade intelectual, existem nas universidades estruturas que visam apoiá-los no gerenciamento da transferência de tecnologia. O papel

dessas organizações, como elas se organizam, seus objetivos e modo de operação são objeto da próxima seção.