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A utilização do requisito altura, como fator discriminador para ingresso em cargos públicos, torna-se legítimo se comprovada sua pertinência em razão da natureza do cargo ou emprego oferecido, assim como ocorre com outros fatores discriminatórios, já analisados no presente capítulo, como por exemplo, a imposição do limite de idade.

O limite de altura imposto aos candidatos que pleiteiam uma vaga nos quadros da Administração varia de um Estado para outro. Em alguns Estados, é exigido o limite de 1,60 para mulheres e 1,65 para homens. Em outros, o limite é de 1,60 para ambos os sexos. O que se questiona é: Uma pessoa de baixa estatura, porém aprovada em todas as tapas do concurso público, inclusive as provas de capacidade física, pode ser julgada incapaz para exercer a função de agente público?

Normalmente, questiona-se o respeito ao princípio da isonomia, bem como aos princípios da razoabilidade e da reserva legal. A propósito do tema, é oportuno conferir as seguintes ementas proferidas por pelo TJSC:

ADMINISTRATIVO - CONCURSO PÚBLICO - GUARDA MUNICIPAL - LIMITE DE ALTURA - EXIGÊNCIA CARENTE DE AMPARO LEGAL A exigência de requisitos específicos, como altura mínima para o ingresso nos quadros da guarda municipal, sem previsão em lei, configura ato violador de direito líquido e certo. O fato de a norma regulamentadora ter sido publicada em data posterior ao edital não afasta a ilegalidade do critério estabelecido no certame em curso.63

O mesmo tribunal, em outra oportunidade, divergiu deste posicionamento, desconsiderando a ausência de previsão legal e admitindo o limite de altura previsto apenas do edital do concurso público:

MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - SARGENTO DA POLÍCIA MILITAR - LIMITE DE ALTURA PREVISTO NO EDITAL - INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E RAZOABILIDADE - AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. A exigência constante de Edital de Concurso para ingresso na carreira de Policial

63 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Apelação cível em mandado de

segurança 2005.033009-4. Relator Des. Luiz César Medeiros. 29 de novembro de 2005. Disponível em: <http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/PesquisaAvancada.do>. Acesso em: 15 out. 2008.

Militar de estatura mínima, para o sexo feminino, de 1,60m (um metro e sessenta centímetros) não configura ofensa ao princípio isonômico previsto na Carta Política em vigor, uma vez que, em determinados casos, o requisito está relacionado com a indispensabilidade de apresentação de qualidades específicas por parte dos concorrentes, as quais possam acarretar o melhor desempenho das funções, em virtude da natureza do cargo.64

Em exame no STJ, tal decisão foi reformada, entendendo o tribunal superior a ilegalidade da exigência de altura mínima sem previsão legal:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. NATUREZA PREVENTIVA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR DE SANTA CATARINA. ALTURA MÍNIMA. EXIGÊNCIA EDITALÍCIA SEM AMPARO LEGAL. OCORRÊNCIA. ILEGALIDADE RECONHECIDA.65

Nesta decisão, é oportuna a transcrição de trecho do voto proferido pela relatora, em razão dos fundamentos adotados:

De outra parte, é certo que a vedação à exigência de idade, sexo, altura, em sede concurso público, não é absoluta, em face das peculiaridades inerentes ao cargo em disputa; todavia, segundo orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, é imprescindível que o critério discriminatório esteja expressamente previsto em lei.

Nessa esteira, é de ser reconhecida a ilegalidade da exigência de altura mínima para o ingresso na carreira da polícia militar do Estado de Santa Catarina, em razão da evidente falta de respaldo legal, uma vez que o art. 11 da Lei Estadual n.º 6.218⁄83 – Estatuto da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina – se refere apenas à exigência genérica de ‘capacidade física’, o que é insuficiente para viabilizar a adoção do mencionado critério discriminatório. (grifo nosso)66

No mesmo sentido posicionou-se o referido órgão julgador em outra oportunidade:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO – POLICIAL MILITAR – EXIGÊNCIA CONTIDA NO EDITAL – ALTURA MÍNIMA DE 1, 60m – PRETENDIDO RECONHECIMENTO DE ILEGALIDADE – PLEITO MANDAMENTAL DENEGADO – PRETENDIDA REFORMA – IMPROVIMENTO.67

64 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Mandado de Segurança

2004.011220-3. Relator Volvei Carlin, 11 de maio de 2005. Disponível em:

<http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/PesquisaAvancada.do>. Acesso em: 15 out. 2008.

65 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso ordinário em mandado de segurança 20637/SC. Relatora.

Min. Laurita Vaz, 16 de fevereiro de 2006. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=concurso+p%FAblico++altura&&b=ACOR&p=tr ue&t=&l=10&i=4>. Acesso em: 29 out. 2008.

66 Ibid.

67 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso ordinário em mandado de segurança 13820/PI. Relator

Min. Paulo Medina, 11 de abril de 2006. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=concurso+p%FAblico++altura&&b=ACOR&p=tr ue&t=&l=10&i=2>. Acesso em: 29 out. 2008.

Em relação à mesma decisão, destaca-se trecho do voto proferido pelo relator do processo:

Creio que capacidade física diverge de compleição física. No primeiro termo, por mais dilargado que se queira, descabe ver “estatura”, “altura”, que se enquadrariam na segunda expressão, ausente nos textos legais.

Acerta o Tribunal a quo, quando afirma ser inadmissível o ingresso de anões na carreira militar. Isso porque a eles falta capacidade física, causada pela precariedade de sua compleição. Já com relação às pessoas baixas não é possível o mesmo raciocínio, pois a estrutura física destas não implica, necessariamente, em falta de capacidade, que pode ser aferida em testes objetivos.

[...]

Assim, entendo descabida a exigência de altura, por inexistir previsão legal para tanto, seja em termos específicos, seja por meio de expressão mais ampla, que permita igual entendimento.68

O STF também teve a oportunidade de manifestar-se sobre o tema, onde julgou ilegal a exigência do limite de altura sem amparo legal, bem como quando incompatível com a natureza do cargo, como exposto a seguir:

CONCURSO PÚBLICO - ALTURA MÍNIMA - INEXISTÊNCIA DE LEI. Longe fica de vulnerar a Constituição Federal pronunciamento no sentido da inexigibilidade de altura mínima para habilitação em concurso público quando esta for prevista estritamente no edital, e não em lei em sentido formal e material. AGRAVO - ARTIGO 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - MULTA. Se o agravo é manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do artigo 557 do Código de Processo Civil, arcando a parte com o ônus decorrente da litigância de má-fé.69

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLICIAL MILITAR. ALTURA MÍNIMA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. 1. Somente lei formal pode impor condições para o preenchimento de cargos, empregos ou funções públicas. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.70

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO PÚBLICO. ESCRIVÃO DE POLÍCIA. REQUISITO. ALTURA MÍNIMA. I. - Em se tratando de concurso público para escrivão de polícia, é irrelevante a exigência de altura mínima, em virtude das atribuições do cargo. Precedentes. II. - Não se admite o exame de cláusulas de edital em sede extraordinária. Precedentes. III. - Agravo não provido.71

68 BRASIL, loc. cit. 69

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental no agravo de instrumento 598715/DF. Relator Min. Marco Aurélio, DF, 01 de abril de 2008. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp>. Acesso em: 29 out. 2008.

70 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental no agravo de instrumento 627586/BA. Relator

Min. Eros Grau, DF, 27 de outubro de 2007. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp>. Acesso em: 29 out. 2008.

71 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental no agravo de instrumento 384050/MS. Relator

Min. Carlos Veloso, DF, 09 de setembro de 2003. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=concurso+publico+altura&pagina=2 &base=baseAcordaos>. Acesso em: 29 out. 2008.

Considerando o tema limite de altura, nota-se que o entendimento dominante dos tribunais figura no sentido de que na ausência de previsão legal, torna-se inadmissível a exigência de tal requisito para ingresso nos cargos públicos, atentando contra o princípio da legalidade.

Observa-se que a jurisprudência privou-se de discutir a complexidade da situação e concluir até que ponto pessoas saudáveis e normais, porém de baixa estatura, seriam incapazes de desempenhar determinadas funções, como as de policial militar, por exemplo. Os tribunais, em sua maioria, reservam-se apenas a observar a formalidade de existência ou não de lei específica, disciplinando o requisito ora estudado.