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Linguagens arquitetônicas e espaços de disputa no processo de legitimação

seguida a decorar e embelezar o ediício em construção. O resultado desse pen- samento há de traduzir-se inevitavelmente na construção arii ciosa. (BRASIL. Ministério da Educação e Saúde, 1946, p.5-6)

O discurso de Gustavo Capanema 173, proferido quando da criação da Faculdade de

Arquitetura na Universidade do Brasil, em 1945, evidencia, de forma ora mais explícita, ora mais velada, alguns dos embates em torno da formação do campo proissional do arquiteto, ocorridos entre as décadas de 1920 e 1940.

Conforme nos relata o discurso, tratou-se de um longo processo de delimitação das competências e área de atuação do arquiteto, que passaria também pela deinição dos próprios parâmetros de legiimação da arquitetura em si. A criação da Faculdade de Arquitetura na Universidade do Brasil era o resultado de “longa campanha” empreendida pelos círculos e agremiações proissionais para a insituição de um curso de nível superior que pudesse contribuir no processo de atribuição de legiimidade ao campo proissional ao “inluir decisivamente na formação - e difusão - de conhecimentos teóricos e práicos” através de sua obra tanto educaiva quanto cultural, ou seja, tanto em sua missão de formar novos proissionais, quanto de difundir princípios para além do campo proissional. Poder-se-ia dizer que se trata de processo análogo ao que Bourdieu 174 deine como a

“transformação da função do sistema de bens simbólicos e da própria estrutura destes bens”, a acontecer de forma correlata “à consituição progressiva de um campo intelectual e arísico, ou seja, à autonomização progressiva do sistema de relações de produção, circulação e consumo de bens simbólicos” (BOURDIEU, 2007a, p.99). Tais transformações envolveriam, entre outros fatores: os processos de consituição de público, sinalizando a possibilidade de independência econômica e igurando também como princípio de legiimação do campo de produção especíico; a consituição de um corpo de produtores de bens simbólicos “cuja proissionalização faz com que passem a reconhecer exclusivamente um certo ipo de determinações, como, por exemplo, os imperaivos técnicos e as normas que deinem as condições de aceso à proissão” (BOURDIEU, 2007a, p.100); e, por im, a muliplicação e diversiicação das instâncias de consagração e reprodução desses bens simbólicos. Nesse contexto, Bourdieu ressalta o papel central representado peloensino enquanto instância tanto de reprodução - uma vez “que, por sua tarefa de inculcação, consagra como digna de ser conservada a cultura que tem o mandato de reproduzir” (BOURDIEU, 2007a, p.118) - quanto de consagração - ao dissimular o “arbitrário daquilo que inculca”, cumprindo “inevitavelmente uma função de legiimação cultural ao converter em cultura legíima […] e […] ao reproduzir, pela delimitação do que merece ser transmiido e adquirido e do que não merece, a disinção entre as obras legíimas e ilegíimas” (BOURDIEU, 2007a, p.120).

173 O que, segundo Ficher (2005), dá início à úlima etapa de separação entre arquitetos e engenheiros do ponto de vista do ensino, à medida que conigura o modelo enquanto legislação federal no qual se basearia a criação subsequente dos demais cursos de arquitetura do país.

174 Destaca-se nesse seni do a compreensão da arquitetura enquanto bem-simbólico, nos termos dei nidos por Bour- Destaca-se nesse senido a compreensão da arquitetura enquanto bem-simbólico, nos termos deinidos por Bour- dieu (1989b; 2007a) e assim apresentado por Cavalcani: “A arquitetura, tendo como matéria formas duráveis, apresenta de modo concreto em nossas cidades a produção da estéica dominante, ou aquela por ela selecionada. O reconhecimento desse domínio é colhido no coidiano das pessoas, que percebem as suas formas através de princípios de internalização, tendendo a naturalizá-las como partes de uma paisagem urbana preexistente: prédios, esilos, cores e texturas são incorpo- rados como formas já dadas, sem quesionamento de seus mecanismos de implantação” (CAVALCANTI, L., 2006, p.9).

� verdade que essa redeinição, ou, no caso dos arquitetos, deinição do campo proissional, é um fenômeno que ocorre nessas mesmas décadas não apenas na área da construção, mas também em outros campos proissionais, em parte como consequência do acelerado processo de urbanização e das mudanças sócio-políicas ocorridas no país nesses mesmos anos, que colocavam novos parâmetros para a vida social, resultando em rearranjos de ordem diversa em diferentes esferas e classes sociais (MICELI, 2001).

No entanto, o caso especíico dos arquitetos ou engenheiros-arquitetos possui contornos pariculares principalmente no que diz respeito ao processo de legiimação de seu campo de atuação especíico, uma vez que, se a engenharia conigurava proissão de grande presígio, a arquitetura era vista como aividade de menor importância, estando ainda, nesse momento, ligada de forma indissociável à construção 175 Conforme nos relata

Ficher “Seria justamente a adoção da aividade exclusiva de projeista - caracterizada como trabalho soi-disant liberal - o iinerário seguido pela classe para superar as falhas

da regulamentação quanto a sua individualidade proissional e, de quebra, valorizar-se com a aura do trabalho arísico” (FICHER, 2005, p.244). Tal processo de diferenciação e legiimação do campo proissional envolveu, portanto, amplas discussões em torno da função social do arquiteto e da própria deinição de arquitetura, mas também das especiicidades e competências do arquiteto, proissional que se colocava em um campo equidistante da técnica e da arte, trazendo o saber e a sensibilidade arísica para a técnica, campo, por deinição, da engenharia. Lembrando novamente as colocações de Bourdieu, é possível dizer que, também para esse contexto,

No momento em que se consitui um mercado da obra de arte, os escritores e aristas têm a possibilidade de airmar - por via de um paradoxo aparente - ao mesmo tempo, em suas práicas e nas representações que possuem de sua práica, a irreduibilidade da obra de arte ao estatuto de simples mercadoria, e também a singularidade da condição intelectual e arísica. (BOURDIEU, 2007a, p.103)

�, portanto, signiicaivo, que em seu discurso Gustavo Capanema mencione a especiicidade da aividade do arquiteto em relação à do engenheiro a parir de suas competências, e da concepção adotada para o objeto em si - a arquitetura -, em seu equilíbrio entre arte e técnica, conferindo legiimidade pela aura arísica ao objeto e ao produtor “dessa verdadeiramente rainha de todas as artes”. Capanema vai ainda além, conclamando à retomada da “integridade” e “pureza dessa grande arte”, e colocando-nos assim frente a um possível entendimento do campo de produção arquitetônico - enquanto campo de produção de bens simbólicos (BOURDIEU, 2007a) - “como campo das relações de concorrência pelo monopólio do exercício legíimo da violência simbólica”, igurando o campo de produção erudita como “sede de uma concorrência pela consagração propriamente cultural e pelo poder de concedê-la”; e onde “todas as relações que os agentes de produção, de reprodução e de difusão, podem estabelecer entre eles ou com 175 Ficher (2005) apresenta em sua tese trechos diversos de entrevistas realizadas com engenheiros-arquitetos politéc- Ficher (2005) apresenta em sua tese trechos diversos de entrevistas realizadas com engenheiros-arquitetos politéc- nicos que nos ajudam a recompor em parte este cenário; outra fonte de grande interesse nesse senido é a entrevista reali- zada por Angyone Costa com Raphael Galvão, arquiteto atuante no Rio de Janeiro, bastante signiicaiva dessa diferenciação e despresígio da aividade projetual (COSTA, J., 1927, p.262 et seq.).

as insituições especíicas, são mediadas pela estrutura do sistema das relações entre as instâncias com pretensões a exercer uma autoridade propriamente cultural” (BOURDIEU, 2007a, p.118). Estrutura das relações de força simbólica esta, estabelecida “em um dado momento do tempo, por intermédio de uma determinada hierarquia das áreas das obras e das competências legíimas” (BOURDIEU, 2007a, p.118).

Torna-se assim sintomáico que Gustavo Capanema deina as diferentes concepções para a arquitetura, a seu ver, existentes no período enquanto “doutrinas”, referindo-se, poderíamos dizer, a um processo igualmente longo - tanto quanto o da consituição da proissão - de construção de um campo de produção erudita para a arquitetura e de sua referida ortodoxia, uma vez que “embora o campo de produção erudita possa não estar nunca dominado por uma ortodoxia, está sempre às voltas com a questão da ortodoxia, ou seja, com a questão dos critérios que deinem o exercício legíimo de um ipo determinado de práica intelectual ou arísica” (BOURDIEU, 2007a, p.108). A esse respeito Bourdieu ressalta ainda que:

Se as relações consituivas do campo de posições culturais não revelam completamente seu senido e sua função a não ser quando referidas ao campo das relações entre as posições ocupadas por aqueles capazes de produzi- las, reproduzi-las e uilizá-las, tal ocorre por que as tomadas de posição intelectuais ou arísicas consituem, via de regra, estratégias inconscientes ou semiconscientes em meio a um jogo cujo alvo é a conquista da legiimidade cultural, ou melhor, do monopólio da produção, da reprodução e da manipulação legíimas dos bens simbólicos e do poder correlato de violência simbólica legíima. (2007a, p.169)

Era necessário, portanto, nesse cenário - novamente acompanhando as palavras de Capanema - deinir os princípios de legiimação da arquitetura por si só, distanciando-a da engenharia pelo seu ‘princípio maior’, o arísico. Era necessário, deinir o campo autônomo da arquitetura em seu equilíbrio entre arte e técnica (campo de atuação do engenheiro): a arquitetura não deveria levar a técnica a suas ‘úlimas consequências’ de maneira a confundir-se com a engenharia, nem adotar a arte de forma distante, ou sobreposta à técnica, de maneira a conigurar-se como complementar e hierarquicamente inferior à engenharia. Era necessário, consequentemente, deinir qual ‘doutrina’ deveria tornar-se ‘naturalmente hegemônica’ enquanto a única correta e justa (conforme deine nominalmente, aquela ailiada às concepções de Le Corbusier), eliminando os demais equívocos do percurso: de um lado havia a não arquitetura por caracterizar-se pela sobreposição de ornamentos decoraivos à frieza técnica da composição da engenharia - que provavelmente reunia o conjunto de ‘esilos’ que posteriormente passaram a ser deinidos como ecléicos, incluindo o neocolonial -; do outro lado havia as tentaivas modernistas ou em suas palavras modernas (note-se aí a o senido conferido a uma expressão que de fato acompanharia o seu tempo) que, embora bem intencionadas, teriam se equivocado ao conferir peso excessivo à técnica, fugindo novamente da correta concepção de arquitetura.

Tratava-se, segundo deinição de Ficher, de um processo imbricado de “estratégia de construção e aumento de presígio proissional”, de “mudança de orientação estéica (naquela conjuntura em direção ao modernismo)” e de “reforma do ensino insitucional que permiisse caracterizar um novo proissional arquiteto” (FICHER, 2005, p.246). Cavalcani, por outro lado, corrobora e complementa tal deinição:

O momento de origem de formas novas coincide, no Brasil, com a gênese de formação do campo arquitetônico, já que os arquitetos modernos conseguem consituir um discurso sobre a construção que logram impor aos seus pares, a setores intelectuais responsáveis pela políica cultural do governo e, com o reconhecimento internacional, a setores mais amplos da sociedade brasileira. Tornando-se dominantes, conseguem difundir os seus modelos construivos […]. (CAVALCANTI, 2006, p.12)

No entanto, a construção de um campo proissional autônomo, principalmente no que diz respeito a sua vertente erudita, envolveria procedimentos e estratégias diversas que passavam não só pelo domínio do ensino, mas pela consolidação de uma linguagem plásica reconhecida e construção de obras emblemáicas, e pelo poder de construção de sua própria história, apagando enfrentamentos e tornando a vitória como natural e certa desde o princípio. Destaca-se, portanto, o esforço de desnaturalização da suposta hegemonia do modernismo, mostrando não apenas não se tratar da única concepção possível e inescapável para a arquitetura, que convive no mesmo período com outras que enfrentam os mesmos problemas e questões (comuns muitas vezes não só aos arquitetos, mas aos intelectuais em geral do período), mas acima de tudo abordando tal cenário como um campo de disputas e confrontos não só de concepções e ideias, mas também por espaço em um mercado de trabalho nascente. Trata-se assim de procurar mostrar, nesse processo de desnaturalização, que a suposta hegemonia modernista não conigura uma vitória casual, mas alcançada através de estratégias diversas uilizadas não apenas pelo grupo vencedor, mas ainda, por outros não tão bem sucedidos, como armas que se colocavam naquele contexto.

Surge, destarte, a diiculdade imposta pela luidez de grupos e ideias - principalmente se olhados do ponto de vista dos personagens - que poderia nos levar à armadilha sinalizada por dois extremos: ou criar blocos deinidos em consenso em vários aspectos - o que acaba de certa maneira conigurando um problema num cenário onde aproximações acontecem e teias de relações são construídas mas estão a todo tempo se recompondo e se reariculando -, ou olhar para o personagem como igura única - o que é essencial e importaníssimo porque evidencia não só diversas dessas questões que estão em jogo, como mostra como essas teias vão se ariculando, mas nem sempre evidencia o campo de batalha como questão central. Diversos autores assinalam tal luidez (ou incoerências) de personagens e ideias que impossibilita muitas vezes a composição de grupos coesos ao longo de todo o período, indicando mais um cenário composto por redes estabelecidas por relações de ordem diversa (MELLO, 2007; CAVALCANTI, L., 2006; MICELI, 2001). Exemplo notável de tal aspecto encontra-se no relato de Cavalcani de que:

O exame dos concursos e processos de construções dos ministérios mostra, tanto do lado dos arquitetos quanto do dos ministros e assessores, pessoas de carne e osso, que se movimentam em lutas concorrenciais, agrupando-se e reagrupando-se a cada momento, dentro de limites socialmente determinados e determinantes. Aparece, então, uma história protagonizada por indivíduos, nos meandros de um Estado não-monolíico, espécie de campo de forças mulivetoriais. (CAVALCANTI, L., 2006, p.13) 176

São notáveis, ainda nesse senido, algumas das diversas posições emblemáicas assumidas por Mário de Andrade ao longo dessas décadas: a primeira consitui defesa entusiasmada do esilo proposto por Severo, encampada na Revista Ilustração Brasileira em 1921 - já citada -; enquanto a segunda consitui veemente defesa do modernismo de Warchavchik publicada no Diário Nacional, em 1930, (admiindo ser a ‘casa modernista’, no entanto, uma absoluta exceção no cenário da cidade de São Paulo de então):

Mas o que há de mais glorioso para nós é o novo esilo neocolonial, que um grupo de arquitetos nacionais e portugueses, com o Sr. Ricardo Severo à frente, procura lançar. Há já exemplares interessaníssimos e a residência do Sr. Numa de Oliveira é uma obra prima. Não me consta já ter havido no Brasil uma tentaiva de nacionalizar a arquitetura, esilizando e aproveitando os moivos que nos apresenta o nosso pequeno passado arísico e formando construções mais adaptadas ao meio. (...) O neocolonial que por aqui se discute é ininitamente mais audaz e de maior alcance. Se o público bastante educado ajudar a interessante iniciaiva, teremos ao menos para a ediicação paricular (e é o que importa) um esilo nosso, bem mais grato ao nosso olhar, hereditariamente saudoso de linhas anciãs e próprio ao nosso clima e ao nosso passado. São Paulo será a fonte dum esilo brasileiro. Estou convencido de que não, mas creio irme e gostosamente que sim. (ANDRADE, M., 1921, [s.p.]) [...] uma casa modernista, como as de Gregori Warchavchik berra junto desses bangalôs, chacrinhas neo-coloniais, pudins, marmeladas e xaropes que andam por aí. Uma casa de Warchavchik junto dum neo-colonial seja espanhol ou portuga, berra sozinha. O bangalô não berra não. Está bem calmo na sua desmandibulada inconsciência, na sua ignorância beata e beócia. Nós é que icamos envergonhados por ele, da mesma forma com que qualquer pessoa bem nascida ante as pabulagens dum novo-rico, os manejos dum arrivista, sofre em vez de rir. Reduzindo esta sensação de vergonha nossa a uma linguagem um bocado mais técnica, a gente percebe que o caso é sempre a mesma questão do ‘falso’. O néo-colonial, o bangalô, o néo-lorenino são ‘falsos’ [...]. Lhes falta aquela orgulhosa força de legiimidade que jusiica e valoriza

176 Destaca-se ainda em seni do análogo a ai rmação de Mello de que: “A incoerência do discurso e da prái ca arquite- Destaca-se ainda em senido análogo a airmação de Mello de que: “A incoerência do discurso e da práica arquite- tônica de Severo aponta para a ambivalência do engenheiro na deinição do nacional�estrangeiro, local �universal, tradicio- nal�cosmopolita, mostrando que esta era uma questão em aberto. Presente na obra de arquitetos como Heitor de Melo, Archimedes Memória (1893-1960), Francisque Cuchet, Lucio Costa (1902-1998), Victor Dubugras (1868-1933) e no discurso de intelectuais como Meno� del Picchia (1892-1988), Monteiro Lobato (1884-1948), Mario de Andrade (1893-1945), entre outros, esta ambivalência revela o quadro de intensa disputa em torno da construção da modernidade, universalidade e�ou nacionalidade arísica entre nós naquele momento.” (2006, p.85)

até os defeitos. Já nem me interesso com serem eles, na ininita maioria dos casos, falsiicações hediondas. Não é o conceito de falsiicação deturpadora de princípios arquiteturais que me preocupa agora, é a noção do faux, do que é feito pra enganar, da práica extratemporânea. Uma mulher prefere um brilhante legíimo a um falso. Nós preferimos um quadro do douanier Rousseau aos falsos que estão aparecendo dele, ou uma peça de Stravinsky a outra dum dos seus numerosos imitadores. Uma casa de Warchavchik berra junto das outras, berra orgulhosamente porque é legíima. (ANDRADE, M., 1930, [s.p.])

A primeira temáica que se evidencia nesse cenário de disputas diz respeito à, já mencionada, construção historiográica que, abordada do ponto de vista do surgimento do modernismo, assume viés triunfalista. Cabe destacar que os mesmos arquitetos e intelectuais responsáveis pela difusão e teorização do modernismo, assumiram também a defesa do patrimônio através da fundação do Serviço do Patrimônio Histórico e Arísico Nacional - SPHAN, fundado em 1936. Encontram-se assim reunidas ações em princípio contraditórias: a defesa e difusão dos ideais modernistas e o grande núcleo hegemônico na elaboração de estudos e leituras sobre a história da arquitetura brasileira. Dessa maneira, essa tradição historiográica nasce intrinsecamente ligada ao discurso modernista, assumindo suas jusiicaivas, servindo como veículo para sua legiimação e relegando a um esquecimento intencional momentos que não se inserem em uma lógica evoluiva de interpretação da história da arquitetura brasileira - cujo ponto culminante seria o surgimento do movimento moderno.

� através de tais conexões que se torna possível compreender o caráter quase milagroso da presença de Le Corbusier no Brasil para o súbito nascimento da arquitetura moderna nesse país, com a construção do Ediício do Ministério da Educação e Saúde: a igura desse famoso arquiteto, ao mesmo tempo, confere legiimidade para a defesa nacional do modernismo e visibilidade internacional à arquitetura brasileira 177; enquanto a explicação

do surgimento do modernismo pela total ruptura desobriga os novos arquitetos modernos de explicações sobre suas ligações anteriores com a arquitetura ecléica ou neocolonial - como no caso do próprio Lucio Costa. Em seus textos e relatos Lucio Costa raramente trata sobre esse período de sua carreira, e quando o faz, apenas refere-se ao ‘equívoco neocolonial’. No entanto, a questão do ‘nacional’ permeia toda a sua obra quer seja em seus projetos arquitetônicos - em que faz citações quase literais de elementos da arquitetura colonial jusiicando-os pela adequação ao meio e ao clima -, quer seja em sua intensa atuação no SPHAN 178.

Entre os diversos pontos presentes nessa construção historiográica cabe, inicialmente, destacar a ariculação entre tradição e modernidade que consituiria fator determinante para a originalidade da arquitetura modernista brasileira. Curiosa e sintomaicamente, ao contrário do que é posto pela historiograia à qual izemos referência até aqui, é exatamente a busca de raízes nacionais, vista como etapa intransponível para a modernização, que 177 A esse respeito é importante destacar, conforme ressalta Cavalcani , importância, por outro lado, para esses proi s- A esse respeito é importante destacar, conforme ressalta Cavalcani, importância, por outro lado, para esses prois- sionais Europeus da implantação de alguns dos elementos de seu ideário no Brasil que por questões diversas nunca pude- ram ser totalmente desenvolvidos em seus países de origem (CAVALCANTI, L., 2006).

deine tanto o movimento modernista, quanto o movimento neocolonial. Conforme defende Cavalcani, em ambos os casos “giravam as discussões em torno de três elementos: passado, vínculo com o Brasil e futuro. As duas correntes reivindicavam para si o primado nesses três elementos” (2006, p.48). � verdade que os debates em torno de questões referentes à nacionalidade coniguram uma temáica quase inescapável no período, não