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PARTE II – DO NOVO CONTEXTO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E OS

4. O NOVO PANORAMA DO DIREITO DO TRABALHO

4.3 A livre circulação de trabalhadores e o trabalho para além das fronteiras

Com o desenvolvimento da atividade internacional por parte das empresas, um dos principais efeitos é o surgimento de Blocos de Integração Econômica entre os diversos países (sejam com fins estritamente comerciais, seja com pretensões comunitárias), e, com eles, a circulação de trabalhadores para além das fronteiras nacionais, dando nova dimensão à problemática trabalhista. Em verdade, a livre circulação de trabalhadores é um dos princípios que decorre, como corolário lógico, das liberdades fundamentais em que se estrutura um verdadeiro processo de integração econômica122: a livre circulação de mercadorias (que enseja a eliminação gradativa ou total das tarifas aduaneiras, bem como a manutenção de uma tarifa externa comum); a liberdade de estabelecimento; a livre circulação de trabalhadores (que estaria dentro de uma liberdade maior – a liberdade de circulação de pessoas); a liberdade de circulação de capitais; a liberdade de concorrência (que traria a reboque a liberdade de circulação de serviços).

É necessário, pois, compreender adequadamente a dimensão de aplicabilidade da expressão “liberdade de circulação”. Roberto Norris123, tomando como ponto de partida a experiência da União Européia, que se preocupou com o tratamento da situação dos trabalhadores migrantes desde o Tratado de Roma de 1958, entende que a livre circulação encontra-se caracterizada no deslocamento das pessoas que exercem uma atividade produtiva, gerando, além de uma série de obrigações para estas pessoas, certos direitos que se caracterizam pela sua natureza propriamente laboral e instrumental, pressupondo o direito do trabalhador de deixar seu país para exercer um emprego em outro Estado da mesma Comunidade e, num segundo momento, a possibilidade de residir no país em que exerce sua atividade. Por outro lado, o direito Comunitário não pode se opor a que um Estado-membro efetue controles em seu território; ademais, existem, ainda, os problemas relativos aos limites razoáveis do estabelecimento de padrões de tratamento diferenciado entre trabalhadores nacionais e estrangeiros, bem como a

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Cf. BELTRAN, Ari Possidonio. Os impactos da integração econômica no direito do trabalho: globalização e

direitos sociais. São Paulo: LTr, 1998. p. 254.

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NORRIS, Roberto. Contratos coletivos supranacionais do trabalho e a internacionalização das relações

amplitude de entendimento do que configuraria um “trabalhador” (apenas trabalho subordinado?; apenas trabalho por tempo indeterminado?).

É de difícil fixação, pelo que se percebe, a abrangência da expressão “livre circulação de trabalhadores”. Cabe, então, a análise de algumas disposições acerca da matéria: o posicionamento da OIT; o posicionamento dentro da Comunidade Européia e do Tratado de Maastricht; o posicionamento dentro do Mercosul.

Sob o ponto de vista da OIT, já no preâmbulo de sua constituição está definido como um dos seus objetivos a proteção dos interesses dos trabalhadores ocupados no estrangeiro. Ademais, apesar de existirem outras Convenções/Recomendações da OIT que tratam da matéria, a Convenção 97 (de 1949), define o trabalhador migrante como “toda pessoa que emigra de um país a outro para ocupar um emprego que não haverá de exercer por sua própria conta, e inclui a qualquer pessoa normalmente admitida como trabalhador migrante”, não se aplicando este Convenção aos trabalhadores fronteiriços, às entradas de curto período, aos artistas, aos profissionais liberais e à gente do mar. Determina, outrossim, a referida Convenção, a aplicação do princípio da não-discriminação. A Convenção 151 (de 1975), por sua vez, estabelece o necessário tratamento igualitário entre os trabalhadores nacionais e os estrangeiros.

O que se verifica na Comunidade Européia, por sua vez, é que, com o passar do tempo e o desenvolvimento da idéia de integração/comunitarismo, os países integrantes foram delegando poderes aos órgãos comunitários. Dentro da CEE, três foram as etapas de desenvolvimento de circulação de trabalhadores: 1 – primeiramente, a preferência pelo trabalhador nacional; 2 – num segundo momento, a preferência foi substituída pelo critério temporal: se a vaga de trabalho não fosse preenchida em determinado lapso temporal por um nacional, poderia ser destinada a um trabalhador estrangeiro; 3 – por fim, surge a figura do trabalhador comunitário, permitindo que o trabalhador estrangeiro ocupasse, sem limitações temporais, o posto vago. Cabe ressaltar que essas liberdades não são plenas, já que restrições ligadas a questões de ordem pública, segurança nacional, reconhecimento de diplomas, dentre outras, ainda existem. Ademais, cabe o registro de que o alargamento da União Européia determina, também, dificuldades no livre trânsito de pessoas.

Também o Tratado de Maastricht, em seu artigo 8-A, estabeleceu direito de livre circulação e residência no território dos Estados-membros, com sujeição às limitações e condições previstas no próprio Tratado.

No Mercosul, não se verificou, em princípio, uma preocupação com a circulação de trabalhadores (já que, ao menos inicialmente, as pretensões do bloco eram de cooperação econômica) ; a necessidade de tratamento de diversas questões sociais não poderia, contudo, ser ignorada pelos países integrantes do Mercosul, inclusive porque a liberdade de circulação de trabalhadores representa uma liberdade fundamental prevista no Tratado de Assunção. Com o objetivo de atender também a essas aspirações de cunho social, o Protocolo Adicional de Brasília criou o Subgrupo no 11, dedicado às relações laborais, emprego e seguridade social. A grande problemática do Mercosul, todavia, é a inexistência de órgão supranacionais de natureza decisória, desvinculados da administração dos países que o integram.

Pelo que se percebe, é cada vez maior a movimentação de trabalhadores para além das fronteiras nacionais, determinando um novo panorama nas relações trabalhistas e a necessidade de um novo modelo de sindicalismo.

4.4. O duelo entre o protecionismo embasado na causa operária e o chamado “dumping