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CAPÍTULO 3: A pesquisa de campo

3.2 A Maloca do Barro

FIGURA 9: Vista aérea ampliada da Maloca do Barro46. Foto Divulgação (FOLHA DE BOA VISTA, 17.04.2008).

Sua organização espacial encontra-se duplamente dividida: a primeira, que se inicia logo após a ponte sobre o Rio Surumu, reconhecida nos mapas políticos e geográficos, sob o nome de Vila Surumu, alcunha atribuída pelos Missionários Beneditinos, cujo desenho é semelhante à noção geral que se faz de uma vila: casas de alvenaria predominantemente coberta de telhas de barro agrupadas em lotes; áreas reservadas para uso público onde podem ser encontrados: a escola Pe. José de Anchieta, uma quadra de esportes (vide Anexo ) coberta com telhas de zinco, o Centro Comunitário que fica ao lado da casa do Coordenador Geral da Maloca, o Posto de Saúde, a Subprefeitura, o templo da Igreja Evangélica Assembléia de Deus, o escritório da Companhia de Águas e Esgotos do Estado de Roraima, um posto telefônico fechado (desativado), um centro de atendimento ao consumidor, além de dois bares que também vendem cereais.

A segunda parte que está incluída dentro da área da Maloca do Barro é aquela onde ficava a sede da Missão Consolata, onde atualmente é o Centro de Formação e Cultura Indígena Raposa-Serra do Sol. O acesso à sede da Missão se dá por uma pequena estrada de quase dois quilômetros que, em sua prorrogação, conduz à Fazenda Depósito, “propriedade” onde se cultiva arroz e que seria mais tarde palco para o maior dos enfrentamentos entre os

46 Disponível em: http://www.folhabv.com.br/noticia.php?editoria=politica&Id=38660. Acessado em: 18 de abril de 2008. A mesma imagem está contida no segundo capítulo deste trabalho à página 72 em miniatura.

grupos de índios e não índios, favoráveis e desfavoráveis à desintrusão47. É nessa mesma estrada, antes de alcançar a sede da Missão, que podem ser encontradas: a sede da Companhia de Energia Elétrica de Roraima, a antiga torre de retransmissão de TV (desativada), bem como algumas casas de alvenaria.

Pode-se entrar à sede da Missão passando primeiro por uma pequena “cancela”. Ao Passar por ela, se chega às pequenas malocas de contorno circular sem paredes nem divisórias, apenas cobertas por palha de Buriti, uma palmeira abundante na região. Seguindo, se alcança a referida sede que tem duas entradas principais com portões de ferro. A primeira entrada dá acesso ao posto de saúde da FUNAI e ao antigo hospital da Missão e o dormitório feminino do Centro de Formação e Cultura Indígena da Raposa-Serra do Sol. A segunda, que leva à sede administrativa da Missão onde fica um dormitório para os visitantes, que também abriga a família do Tuxaua Anselmo que ficou sem ter onde morar por ocasião da ação incendiária e a construção da Igreja Católica (completamente destruída). Interpreto o ataque ao templo como um ato simbólico, como dizem os opositores do modelo demarcatório contínuo, “a igreja católica é o ‘útero’ da discórdia, da segregação e divisão entre os índios”. É neste mesmo espaço da antiga Missão que fica o dormitório masculino do Centro de Formação e suas dependências (ambientes dos projetos, campo de futebol, salas de aula, biblioteca, oficinas, refeitório e cozinha), acessíveis pelo segundo portão. Por trás de toda a área do Centro de Formação encontra-se o Rio Sururu.

Sobre a origem do nome Maloca do Barro, ouvi uma explicação feita por um senhor por ocasião da primeira viagem à Maloca. Ele estava em uma “venda” próxima à saída para a rodovia estadual à beira do Rio Surumu, próxima a ponte, um senhor, a meu ver índio, cujo nome mantenho em reserva, que se encontrava no balcão. Apresentamo-nos. Conversei com ele sobre a Maloca. Ele não se referiu ao nome maloca e sim à comunidade cujo nome passou a substituir o antigo, Vila Surumu. Ele logo foi justificando que a troca ocorreu porque antes da chagada dos não índios, lá era chamado de Maloca do Barro e que agora [acho que queria se referir à demarcação da Terra Indígena] voltaria a ser chamado de Maloca do Barro.

A “arena” principal, a Maloca do Barro, apresenta as seguintes características quanto aos aspectos: organização espacial e social, atividade econômica, cotidiano, habitação e alimentação.

A comunidade está disposta em três vias principais paralelas e seis transversais, distribuídas em quadras, como se pode ver na página 72 deste trabalho. Dispõe de rede elétrica e hidráulica mantidas por um grupo gerador diesel da Companhia de Energia de Roraima – CER, apesar de passar por perto, à altura do entroncamento entre a estrada federal BR-174 e a estadual RR-202, o Linhão de Guri, rede elétrica que abastece a capital Boa Vista e os municipios de Cantá, Mucajaí e Alto Alegre. Há iluminação nos postes, quase sempre lâmpadas apagadas. Sempre ocorrem quedas de energia, o que me foi justicado pelo responsável do grupo gerador, por “causas inexplicáveis” e em determinados horários, a rede é desligada em racionalização do diesel, o que explica a falta de energia nos dois postos de saúde. A rede hidráulica chega à maioria das residências por tubulação interna que as abastece em determinados dias e horas, de água retirada de poço artesiano, o que a cerca de 10 anos atrás, segundo me informou o responsável pelo acionamento do motor, ainda vinha do próprio Rio Surumu.

As residências já diferem bastante da descrição apresentada por Coudreau, em 1987, citado por Cirino (2000), de serem em formato de cunha, oval e raramente retangular bem como por Santilli (2001) de “pequenas casas que abrigam famílias nucleares” (SANTILLI, 2001, p. 29) acompanhando o curso dos rios. A grande maioria que presenciei é retangular, com uma porta e janela na varanda. No geral, as casas estão cobertas por telhas de barro ou por telhas industrializadas (amianto). As varandas – termo empregado no lugar – quando não são em igual cobertura do mesmo tipo de telha da casa, são cobertas de palha de Buriti, palmeira abundante às margens dos rios e igarapés de todo o Estado, com inclinação para frente.

As casas e demais prédios “públicos” (vice-prefeitura, central de energia, central de águas, central de telefone, postos de saúde e escolas) são pintadas e as calçadas, enquanto vias de acesso48, feitas de “barro batido”, das quais a poeira se solta com facilidade no verão e poças de água se formam no inverno. Há cercas de varas e arames que separam umas das outras, embora haja alguns casos em que isto não ocorra, nem mesmo para formar o quintal. Adentrando essas construções de alvenaria ou de madeira, pode-se encontrar na grande maioria, uma distribuição de cômodos em: uma sala com uma mesa, cadeiras de madeira ou de ferro, uma televisão49 ou rádio; um quarto com cama ou pontos de armadores de rede que

48 Não são chamadas de ruas porque não têm nomes, embora mantenham as mesmas características daquelas. 49 Nas residências que dispõem de televisão, pode-se notar a presença de antenas parabólicas o que explico pela ausência de sinal público, apesar de haver uma torre que há cerca de 10 anos atrás, transmitia o sinal da TV RORAIMA, retransmissora da Rede Globo de Televisão.

também foram vistos na sala e em muitos outros casos, na varanda, com um móvel para guardar utensílios de uso pessoal. Espelhos foram notados em paredes. Na cozinha, uma geladeira (em poucas casas) e um fogão (quando não a lenha, a gás). No entanto, a grande maioria das famílias cozinha fora de casa, no espaço posterior da casa, o quintal. No quintal também registrei algumas plantações de tomate, pimentão e fartamente, a pimenta (didia em Wapixana), bastante utilizada na preparação da “damurida”, uma comida à base de caça e pimenta, que se come com farinha grossa. As residências possuem teto baixo, o que favorece ao aumento da sensação de calor no verão e do frio nas madrugas de inverno. Ao indagar um dos moradores como ficava a iluminação das casas quando faltava energia à noite, as pessoas com quem conversei, por exemplo, na sala de espera do Posto de Saúde, ao lado da sede da distribuidora de águas, me informaram que acendiam velas e espalhavam pelos vãos. Não percebi a existência de nenhum outro objeto como quadros de fotos, pinturas... nas paredes. Em todos os cômodos, quase sempre separados por paredes a meia altura em relação as que sustentam o telhado, notei pontos de luz elétrica. À frente das residências, muitos caimbezeiros e cajueiros. Há apenas um aparelho de telefone público (orelhão) que fica ao lado esquerdo de quem entra para a “vila”, à frente da casa onde ocorrem as assembléias e reuniões da comunidade. Há um fraco sinal de telefone celular da empresa VIVO, mas que só pode ser captado quando o usuário vai até o final da primeira fileira de casas e sobe em um pequeno monte, porque a antena encontra-se localizada no Município de Pacaraima.

Há comércios na Maloca. São três instalados em pequenos espaços, geralmente anexos às residências de seus proprietários. Vendem desde suprimentos alimentícios (feijão, arroz, açúcar, macarrão, temperos...), bombons, refrigerantes, sabonetes, sabões, produtos para limpeza doméstica, cremes dentais, escovas dentais e de cabelo, cigarros, cartões telefônicos, pilhas e artigos para o campo como cordas, venenos para formiga e botijas de gás de cozinha. Não há pontos de venda fracionada de combustível, pois a sede do município de Pacaraima no Brasil, fica a menos de uma hora de automóvel e, quem os possui, sempre tem algum depósito suplementar em casa. Até o fim da permanência em campo (novembro de 2007) apenas um vendia bebida alcoólica, pertencente a um proprietário não indígena. O espaço, também utilizado como ponto de ônibus, permanecia fechado até que alguém interessado em consumir cerveja pedisse à vizinha para abrir o bar. Deduzi que a manutenção e provisão do “quiosque” [termo empregado por um usuário que assim se referiu ao bar enquanto eu esperava pelo ônibus que me levaria para Boa Vista no fim da segunda estada em campo], eram feitos pela moradora do lado, uma vez que ela só abria o comércio quando alguém a chamava pela janela

da casa dela, provavelmente, por temer alguma represália pelo descumprimento da ordem da comunidade.

O transporte de passageiros é diário. Há Vãs que pela manhã vêm de Boa Vista retornando à tarde e uma empresa de ônibus que mantém um veículo que em um dia sai da capital às 7 horas da manhã pela BR-174 entrando na RR-202, cruzando dentro da Maloca do Barro por volta por volta das 12hs, e alcançando o destino – o município de Uiramutã às 19hs. Essa viagem é intercala: um dia o ônibus “sobe” e no outro dia, ele “desce” [expressões empregadas pelo motorista para explicar a periodicidade]. Tomei o ônibus para retornar à capital. Um transporte “caindo aos pedaços” ou “uma lata velha”, nas palavras de dois usuários que me informaram ser utilizado por garimpeiros ilegais e contrabandistas de artigos diversos adquiridos na Guiana Inglesa. Muitos possuem motos e biciplitas.

Como todas as etnias se atualizam aos contextos sociais, políticos, econômicos e culturais, a Makuxi e Wapixana habitantes da Maloca do Barro, elaboram uma organização social que responderá aos desafios surgidos no passado e no presente. Apoio-me para este olhar na compreensão e enfoque de organização social elaborados por Firth (1998) que, em 1936 publicou seu estudo “Nós, os Tikopia”, da sua viagem à Polinésia, precisamente às ilhas Salomão. Para estudar o parentesco Tikopia, ele considerou a interseção do contato entre estes e o “mundo dos brancos”, realidade distinta a que ele encontrou primeiramente em 1952 ao que ele chamou de povos seminus e que em 1966 deparou-se com o que Marcos Lana – aquele que prefaciou o livro – denominou de realidade transformacional considerando a presença marcante de membros da Igreja Anglicana nas Ilhas Salomão. Concluiu que, apesar de todo o estabelecimento de um sistema de parentesco novo, “não obstante, ainda continuam a ser assertivamente Tikopia” (FIRTH, 1998, p. 740), o que compreendo como um caso similar deste com a relação interétnica entre Makuxi e Wapixana sob o contexto de demarcação e homologação da TIRSS. Para tal empreendimento, Firth inaugura um outro caminho de apresentação dos Tikopia diferindo de Os Argonautas do Pacífico Ocidental de Malinowski. Neste ínterim, explicita primeiro como foi a sua inserção no cenário e não uma doutrinação para o leitor de como fazer uma observação participante, como se empenhou Malinowski em Os Argonautas.

Assim, Firth na referida obra, prossegue sua monografia adentrando numa fase que ele considera indispensável: a contextualização histórica e geográfica associada a uma descrição da vida na aldeia o que faz nos capítulos 2 e 3, para só então intensificar o estudo do parentesco Tikopia nos capítulos 4 a 9 e culminar na organização social nos capítulos 10 a 12.

A grande consideração que ele faz para os estudos do parentesco polinésio é a percepção do fator “casa” (paito), espaço em que vários núcleos familiares se encontram a partir de um ancestral masculino que ditará o acesso à terra considerada um bem e espaço físico para os clãs, organismos a desenvolverem cooperação econômica e sócia, política e religiosa. Baseado nesse princípio que associo à atitude de Wapixana e Makuxi em requerem não apenas o direito à permanência na TIRSS, mas também o de reconhecimento de pertencer a esta ou aquela etnia, junto a instância legal.

A sociedade local tem sua forma de organização e está composta de índios [maioria] e não índios (brancos e negros) [minoria]. Vestem-se como pessoas da sociedade envolvente: camisas de malha, calças ou bermudas em tecido de algodão ou sintético, lisas ou com estampas. Algumas delas têm aparelhos de telefone celular que recebem sinal da operadora VIVO que chega à localidade apenas nos pontos mais altos, impondo aos seus poucos usuários a necessidade de deslocamento, a fim de executar uma chamada. Esses aparelhos são afixados às bermudas e calças, podendo ser guardados também nas bolsas das mulheres (feitas em couro ou tecido industrializado, comprados no comércio de Pacaraima, no Brasil, ou em Santa Helena do Uairém, na Venezuela). As mulheres possuem cabelos lisos, bem penteados e brilhantes, sem presença de maquiagem facial. Estas, em participação nas reuniões comunitárias, ficam em lugares separados dos homens como representei no croqui n° 3 (página 140). Durante os momentos em que permaneci no centro da Maloca, percebi muitas mulheres, provavelmente mães ou irmãs mais velhas, observando as brincadeiras das crianças, talvez para saber se estavam bem. Associo isto à preocupação com os acontecimentos anteriores e às expectativas de haver alguma visita inesperada de “pessoas nocivas à comunidade”, como o dizer pintado na placa fincada na entrada da Maloca, informando a proibição delas.

O uso dessas tecnologias em nada descaracteriza a cultura. A prática de rituais festivos e religiosos ainda é visível por ocasiões especiais: recepção de pessoas queridas e esperadas pela comunidade quando dançam a Parichara; missas e cultos com cantos em língua Makuxi e Wapixana; pais e filhos mantêm o respeito no relacionamento intrafamiliar. A tecnologia na comunicação tornou-se um grande benefício social. Apesar de haver o uso do rádio- transmissor nos postos de saúde, muitas vezes o celular é usado para contactar com órgãos de locomoção ou com parentes que se encontrem internados ou ainda em casos de emergência quando, por exemplo, na ocasião em que houve ataque de pessoas mascaradas a índios que ocupavam a fazenda.

São os homens que realizam as reuniões comunitárias e são eles, quando em algumas exceções, que recebem as pessoas quando estas chegam às suas casas. Mulheres participam dando seus depoimentos, mas não presenciei alguma fazendo comentários, mesmo de uma com outra como percebi entre os homens. Quando saem para executar alguma tarefa de interesse individual (falar com alguém, ir à escola do filho a convite de um professor ou professora ou ainda para buscá-lo) ou coletivo (plantar um roçado de mandioca ou de milho ou colher algum alimento que implique força física como a mandioca, por exemplo, ou o milho), os homens estão mais ausentes das vias do que em relação às mulheres, cujas descrições assemelham-se àquelas mencionadas por Coudreau, Gillen (1963), Brett (1868), Farabee (1918), Koch-Grünberg e D. Bonaventure Barbier (1911).

Analisando relações familiares e comunitárias, percebo uma possível hierarquia política que, penso, pode ser representada no diagrama abaixo:

Essa hierarquia, no meu entendimento, extrapola o padrão: algo que vem “de cima para baixo”. O que captei na observação foi uma estrutura de poder que parte do meio para os lados e somente destes para fora da comunidade onde, aí sim, engaja-se nas estruturas verticalizadas. O maior fórum de decisão é a Reunião da Comunidade que não tem tempo certo para acontecer. Pode ser sempre que se ache necessário. Ela pode ser convocada por qualquer um dos representantes, mas aguarda o consentimento do Tuxaua que marca dia e horário. Esses representantes são escolhidos por disponibilidade de nome a quem for do interesse, se propõe e espera a aprovação do respectivo grupo, que por seu turno, terá o

Reunião da Comunidade Tuxaua Coordenador de Área Grande Assembléia dos Tuxauas Coordenador de Projetos Conselho Indígena de Roraima Representação dos Professores Representação das Mulheres Sociedade envolvente Comunidade Figura 10: Fluxogra- ma da dinâmica política na Maloca do Barro

reconhecimento da Grande Assembléia, geralmente para um período de dois anos que pode ser prorrogado ou antecipado, de acordo com o “parecer” da Grande Assembléia. A pauta é livre e aberta a qualquer pessoa da comunidade, e em alguns casos, convidados de fora. Está representada aqui em quadro maior querendo expressar a dimensão dos poderes atribuídos a ela. Seguindo pelo mesmo critério, considera-se o Tuxaua que tem a representatividade da Comunidade na Grande Assembléia dos Tuxauas e por extensão, a atribuição de responsabilidades ao Conselho Indígena de Roraima, composto por uma Presidência, uma Vice-presidência, uma Secretaria, uma Tesouraria e um coordenador para cada distrito, cuja Presidência adquire a representatividade de falar e se posicionar em nome dos seus “irmãos” e “parentes”. O Tuxaua também pode atribuir funções específicas temporárias a qualquer um dos Coordenadores a fim de providenciar uma solução para um determinado problema.

Duas Coordenações são reconhecidas em valor pela defesa de interesses coletivos: a das mulheres e dos professores. Na esfera exterior da Maloca do Barro, essas duas coordenações existem na forma de Organização: a Organização dos Professores Indígenas de Roraima – OPIR e Organização das Mulheres Indígenas de Roraima – OMIR. Estudando de onde teria se originado o modelo, fiquei sabendo que primeiramente surgiu nas malocas e só depois foi criada uma representação eleita entre os coordenadores das malocas. Esses Coordenadores com assento na Reunião da Comunidade não são apenas uma voz a representar suas coletividades. São pessoas que igualmente têm uma participação ativa no cotidiano da comunidade, sendo responsáveis por suas tarefas e incumbências.

Para dar uma amostra dessa dinâmica, apresento abaixo uma transcrição feita do diário de campo em que se pode notar, também, a pauta da Reunião em que estive presente.

“Então, segui a pé até a sede da Maloca [sempre quando me refiro ao ‘centro da Maloca’ entendo que não se trata apenas de um ponto geográfico de referência. Ali, naquele pequeno tipiri, sob duas árvores e um pequeno alpendre, pulsa a vida e a energia da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol], conforme a seguinte representação rabiscada no diário de campo”.

“Entrei com o Tuxaua que fez minha recepção. Sentei no último banco e fiquei a observar e ouvir. Nada mais. O Coordenador Geral ia chamando aqueles que pediam para falar e, assim, davam o que o próprio chamava de depoimento. Em vestimenta e oralidade, todos tinham simplicidade [numa nomenclatura de valor, chamaria também de humildade]. Vi bem ali, o que é tomar decisões e ter vez e voz como é dito no discurso popular”.

“Não anotei textualmente as falas ali expostas. Queria minimizar as interferências causadas pela minha presença, ao contrário do que eu fiz à vista dos alunos, quando me posicionei atrás, efetuando minhas anotações no fundo da sala. Fui ouvindo as falas dos