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Mandado de segurança coletivo

4. AS AÇÕES COLETIVAS

4.6. Tutela jurisdicional coletiva

4.6.1. Ações coletivas mais comuns

4.6.1.3 Mandado de segurança coletivo

O mandado de segurança está disciplinado no artigo 5º, incisos LXIX e LXX da Constituição Federal. Hely Lopes Meirelles o define como um remédio constitucional disponível às pessoas físicas ou jurídicas, órgão com

214“Quando o autor preferir, a citação dos beneficiários far-se-á por edital com o prazo de 30 (trinta) dias

afixado na sede do juízo e publicado três vezes no jornal oficial do Distrito Federal, ou da Capital do Estado ou Território que seja ajuizada a ação.”

capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para proteção de direito líquido e certo, seja ele individual ou coletivo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, não amparado por habeas corpus.216

Nelson Nery adverte para o fato de que “O MSC nada mais é do

que a possibilidade de impetrar-se o MS tradicional por meio de tutela jurisdicional coletiva. O adjetivo “coletivo” se refere à forma de exercer-se a prestação mandamental e não à pretensão deduzida em si mesma. O MSC se presta à tutela de direito difuso, coletivo ou individual. O que é coletivo não é o mérito, o objeto, o direito pleiteado por meio do MSC, mas sim a ação”.217

Com efeito, o mandado de segurança individual não constitui uma novidade em nosso ordenamento jurídico.218 Todavia, a Constituição Federal de 88 inovou ao tratar do mandado de segurança coletivo em seu artigo 5º, LXX, que dispõe:

“O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; e b)organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados”.

A Constituição Federal trata apenas dos requisitos do mandado de segurança individual. Nada fala dos requisitos do mandado de segurança coletivo, pelo que conclui-se que os requisitos sejam os mesmos. São eles: 1) o direito deve ser líquido e certo, que pode ser interpretado como o direito susceptível de demonstração mediante prova pré-constituída; 2) que não se trate de ilegalidade ou abusividade referentes ao direito de ir e vir – tutelados por

216MEIRELLES, Hely Lopes. op. cit., p. 3.

217NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. op. cit., p. 28.

218“O mandado de segurança foi previsto, pela primeira vez, na Constituição de 1934, desapareceu na Constituição de 1937 e voltou na Constituição de 1946. Ele surgiu como decorrência do desenvolvimento da doutrina brasileira do habeas corpus. Quando a Emenda de 1926 restringiu o uso dessa medida às hipóteses de ofensa ao direito de locomoção, os doutrinadores passaram a procurar outro instituto para proteger os demais direitos. Sob inspiração dos writs do direito norte americano e do juicio de amparo do direito mexicano, institui-se o mandado de segurança”. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 636.

habeas corpus – ou direito à informação devido às pessoas - amparados por

habeas data; 3) que o ato seja abusivo e ilegal e que a autoridade coatora esteja no exercício da Administração Pública; 4) que haja lesão ou ameaça de lesão a direito.

Por ato de autoridade, Hely Lopes Meirelles entende como “toda

manifestação ou omissão do Poder Público ou de seus delegados no desempenho de suas funções ou a pretexto de exercê-las. Por autoridade entenda-se pessoa física investida de poder de decisão dentro da esfera de competência que lhe é atribuída pela norma legal”.219

O artigo 1º, § 1º, da Lei 1.533 considera autoridade, para efeitos dessa lei, “os representantes ou órgãos dos Partidos Políticos e os

representantes ou administradores das entidades autárquicas e das pessoas naturais ou jurídicas com funções delegadas do poder público somente no que entender com essas funções”.

O mandado de segurança, regulado no ordenamento pátrio genericamente pela Lei 1.533, de 31/12/1951 e por outras que também dele cuidam, como a Lei 4.358/64 e 8.427/92, é remédio constitucional indicado para coibir que o Poder Público, por meio de seus agentes, cometa ilegalidades ou abuso de poder violando direito líquido e certo individual e coletivo. É cabível, portanto, contra o Poder Público ou quem lhe faça as vezes.220 Seu rito é

sumaríssimo especial, pois independe de produção probatória.

219MEIRELLES, Hely Lopes. op. cit., p. 9.

220Maria Sylvia Zanella Di Pietro leciona: “Com relação às entidades particulares, cabe mandado de segurança quando atuem por delegação e nos limites da delegação; quando exerçam atividades que nada têm a ver com essa delegação, não cabe mandado de segurança. Além disso, se exercerem atividades autorizadas, com base no poder de polícia do Estado, que não se inserem entre as atividades próprias do Poder Público, também não cabe essa medida. É o que ocorre com os serviços de táxi, hospitais particulares, estabelecimentos bancários, companhias de seguro”. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 637.

Impetra-se o mandado de segurança contra a autoridade coatora e não contra a pessoa jurídica. Na hipótese de atos complexos e compostos, onde haja mais de uma autoridade, todas deverão ser citadas.221

De acordo com a Constituição Federal, artigo 5º, LXX, são legitimados para propor mandado de segurança coletivo:

“a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, em defesa dos interesses de seus membros associados”.

A alínea “a” do artigo 5º, LXX, confere legitimidade aos partidos políticos para propositura do mandado de segurança coletivo. Todavia, impõe como condição o fato de ter o impetrante representação no Congresso Nacional, de modo que aqueles que não a tenham são partes manifestamente ilegítimas. Tal questão não suscita controvérsia na doutrina.

Na alínea “b” do dispositivo constitucional é conferida a legitimidade a organizações sindicais, entidades de classe ou associações. Chama a atenção que o legislador tenha condicionado a legitimidade dessas entidades ao fato de estarem constituídas há pelo menos um ano e que estejam defendendo interesses de seus filiados/associados.

Inexiste consenso na doutrina acerca do alcance da legitimidade no mandado de segurança coletivo. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, por exemplo, entende que o constituinte legitimou tanto o partido político, quanto as organizações sindicais, entidades de classe ou associações, mas por ter desmembrado a legitimidade em duas alíneas, quis conferir abrangência diferente à atuação dos legitimados: enquanto o partido político teria legitimidade para defender interesses que extrapolavam os dos seus associados,

os legitimados da alínea “b” somente a teriam em defesa de seus associados ou membros.222

Ada Pellegrini Grinover pensa diferente. Para ela, uma interpretação restritiva de direitos somente aos membros ou associados dos sindicatos e associações estaria em descompasso com a amplitude do mandado de segurança coletivo. Por essa interpretação, o dispositivo em comento seria letra morta, já que estaria absorvido pelo disposto no artigo 8º, III e 5º, XXI, ambos da Constituição Federal. A única interpretação em harmonia com estes mencionados dispositivos é que para as citadas hipóteses do artigo 5º, XXI e 8º, III, da Constituição Federal, as normas específicas cuidam de interesses da categoria ou de seus membros, ao passo que para a via do mandado de segurança não haveria essa restrição.223

A legitimidade pode ser do tipo ordinária, hipótese em que os legitimados estão em juízo na defesa de seus interesses institucionais ou ocorrer substituição processual, hipótese em que os legitimados vão a juízo na defesa de apenas alguns de seus associados e fora dos seus interesses institucionais. Nesse sentido é a lição de Ada Pellegrini Grinover.224 Todavia, a questão não é pacífica na doutrina. Alguns autores entendem que se trata de hipótese de substituição processual.225

222DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 651.

223GRINOVER, Ada Pellegrini. Mandado de segurança coletivo: legitimação, objeto e coisa julgada. Revista de

Processo, São Paulo, v. 15, n. 58, p. 78-79, abr./jun. 1990.

224“A questão há de ser examinada à luz dos princípios gerais do processo, podendo-se falar, em muitos casos, em substituição processual, decorrente de legitimação extraordinária conferida pelo texto constitucional (art. 6º do Código de Processo Penal). Vale lembrar, contudo, a moderna tendência doutrinária que vê na legitimação de entidades que ajam na defesa de interesses institucionais uma verdadeira legitimação ordinária (v. Vincenzo Vigoriti, Carlos Barbosa Moreira, Kazuo Watanabe e a autora desse estudo. De modo que, caso a caso, dever- se-á verificar se a entidade age na defesa de seus interesses institucionais – proteção ao meio ambiente, aos consumidores, aos contribuintes, por exemplo, e, neste caso, a legitimação seria ordinária; ou se atua no interesse de alguns de seus filiados, membros ou associados, que não seja comum a todos, nem esteja compreendido em seus objetivos institucionais: neste caso, sim, haveria uma verdadeira substituição processual”. GRINOVER, Ada Pellegrini. Mandado de segurança coletivo: legitimação, objeto e coisa julgada,

cit., p. 77.

Parte da doutrina entendia que era necessária autorização expressa dos associados ou filiados para que pudessem ser defendidos judicialmente via

mandamus. É que o artigo 5º, XXI, da Constituição Federal prescreve que “as

entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente”,

Ada Pellegrini Grinover, entretanto, discorda da referida autorização. No seu entendimento, com o qual concordamos, a regra para legitimação vem expressa no artigo 5º, LXX, e lá não há nenhuma disposição acerca de tal necessidade, de modo que não cabe ao intérprete criar obstáculos para o acesso à justiça que constitucionalmente inexistem.226

Releva notar, mais uma vez, que o artigo 82, § 1º, do CDC prescreve:

“o requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas no art. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou relevância do bem jurídico a ser protegido”.

Assim, o requisito de pré-constituição não é absoluto, podendo ele, em razão do interesse social ou da relevância do bem jurídico a ser protegido, ser dispensado.

A segurança, que pode ser concedida pelo Judiciário, irá determinar que a autoridade coatora faça ou deixe de fazer determinado ato administrativo. Trata-se, portanto, de sentença mandamental.227

226“Seja como for, uma coisa é clara: o intérprete, assim como o futuro legislador, não podem estabelecer outros obstáculos à legitimação, que não os decorrentes da Constituição. Por isso é que não temos dúvida em afirmar que, para o ajuizamento do mandado de segurança coletivo, nem os partidos políticos, nem as organizações sindicais, nem as entidades de classe e nem mesmo as associações legalmente constituídas necessitam daquela autorização expressa a que alude o inciso XXI do artigo 5º da Constituição para outras ações, que não a segurança coletiva”. GRINOVER, Ada Pellegrini. Mandado de segurança coletivo: legitimação, objeto e coisa julgada, cit., p. 77.

227“A sentença é mandamental porque contém uma ordem dirigida à autoridade coatora, e é de execução imediata, cumprindo-se por ofício do juiz, transmitido por oficial de Justiça ou pelo Correio, conforme artigo 11 da Lei nº 1.533/51. Apenas no caso de pagamento de vantagens pecuniárias ao servidor público, com base na Lei nº 5.021/66, o mandado de segurança comporta liquidação por cálculo do contador”. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 646.

O mandado de segurança tem natureza jurídica de ação civil de rito sumário especial sendo que, pela via coletiva, podem ser tutelados interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Distingue-se das outras ações porque tem objeto e procedimento próprios, aplicando-se somente subsidiariamente o Código de Processo Civil.

As principais diferenças entre o mandado de segurança individual e coletivo consistem na legitimidade e no alcance da coisa julgada, que foram inquestionavelmente ampliadas pela Constituição Cidadã e pela aplicação das normas processuais contidas no CDC e na Lei de Ação Civil Pública.

É coletivo o mandado de segurança interposto por partidos políticos, associações e sindicatos, nos termos estabelecidos no dispositivo constitucional e não aquele impetrado por várias pessoas em eventual litisconsórcio ativo. Ao mandado de segurança coletivo aplicam-se as regras da chamada jurisdição civil coletiva (CDC + LACP).

Também não é cabível mandado de segurança para corrigir lesão decorrente de lei em tese (súmula 266 do STF); contra despacho ou decisão judicial que tenha recurso próprio ou possa ser modificados por via de correição; contra ato disciplinar, salvo quando praticado por autoridade incompetente ou quando observadas as formalidades essenciais e contra ato administrativo passível de recurso com efeito suspensivo, independentemente de caução.228

O prazo para interposição do mandado de segurança é de 120 dias, contados da ciência pelo interessado do ato impugnado (artigo 18 da Lei nº 1.533/51).229 Nelson e Rosa Nery entendem que o referido artigo é

228DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 641-645.

229“Quanto ao início do prazo (dies a quo), é preciso distinguir:: 1) se o mandado é interposto contra ato lesivo já praticado, o prazo começa a correr a partir da ciência do ato; nenhuma conseqüência terá a interposição de recurso administrativo sem efeito suspensivo, porque o ato já está causando lesão e, em conseqüência, o prazo de decadência já está correndo; mas se o recurso tem efeito suspensivo, o prazo começa a correr quando decidido o último recurso ou quando se esgotar o prazo para recorrer administrativamente; 2) se o mandado é interposto contra omissão, duas hipóteses devem ser distinguidas: se a Administração está sujeita a prazo para

inconstitucional, já que o legislador constituinte não estipulou nenhum requisito temporal ao exercício do mandado de segurança”.230 Todavia, o Supremo Tribunal Federal, por meio da Súmula 632, fixou entendimento de que é constitucional a lei que fixa prazo de decadência para o mandado de segurança.

praticar o ato, esgotado esse prazo, começam a correr os 120 dias para impetração da segurança, conforme decisão do STF, in RTJ 53/637; se a Administração não está sujeita a prazo legal para a prática do ato, não se cogita de decadência para o mandado de segurança, por inexistência de um termo a quo; enquanto persistir a omissão, é cabível o mandado”. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 650.

230“A LMS 18 é inconstitucional. O MS, sendo ação constitucional, tem seus requisitos e limites estabelecidos apenas no texto constitucional (CF 5º LXIX e LXX), que não remeteu seu regime jurídico à lei federal. Ao legislador ordinário é reservado somente o poder regulamentar, fixando contornos procedimentais para seu exercício. Não pode criar requisitos e limites não previstos na CF. A norma sob comentário, porque restringe o exercício do direito fundamental previsto na CF, é inconstitucional. O impetrante pode impetrar MS mesmo depois de passado o prazo mencionado na LMS 18”. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. op. cit., p. 1644.