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3.5 Rotinas de Gestão da Inovação

3.5.1 Mapeamento e Prospecção de Oportunidades Tecnológicas

Esse processo se refere à análise do cenário interno e externo identificando sinais de oportunidades e ameaças relacionadas a oferta. Dentro das empresas existem dois sistemas que atuam na realização dessas atividades: sistema gerencial e sistema técnico. O sistema gerencial é responsável pela análise da concorrência, do mercado e por observar as mudanças tecnológicas de longo prazo. Nesse sistema se encontram líderes nas áreas de Marketing, unidades de negócios e a própria liderança sênior da empresa. O sistema técnico é composto pelas equipes responsáveis pela prestação dos serviços e desenvolvimento de projetos internos, sendo responsável por acompanhar e observar as mudanças tecnológicas, e em alguns casos também a concorrência e o mercado.

Todas as empresas realizam este tipo de atividade, porém não de maneira estruturada, mas como parte do dia a dia de suas funções e das atividades relacionadas ao planejamento estratégico das unidades de negócios e da organização. As principais fontes de informação utilizadas para esse mapeamento são:

 Serviços de inteligência competitiva e tecnológica, como Gartner, IDC e relatórios de associações, como ABES e BRASSCOM23

 Eventos de negócios e técnicos nacionais e internacionais

 Fornecedores de tecnologias (Google, Microsoft) e de pacotes customizáveis (IBM, BMC, Oracle)

Benchmark com as empresas do setor

Internet

Três práticas realizadas pelas empresas ‘B INT’, ‘F DEV’ e ‘H DEV’ merecem destaque. As empresas ‘B INT’ e ‘F DEV’ utilizam mecanismos de comunicação para divulgar tendências tecnológicas ao mercado. A empresa ‘F DEV’ publica semestralmente um informativo a clientes e parceiros. A empresa ‘B INT’ desenvolveu um estudo de tendências tecnológicas brasileiras, através de pesquisa com clientes e especialistas internos, a fim de

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Apenas a empresa ‘C MOV’ indicou utilizar outro sistema de informações, no caso o sistema de informações oferecido pela TechCrunch, empresa de mídia que foca em startups, produtos para Internet e notícias sobre novas tecnologias.

consolidar as tendências tecnológicas em que empresas brasileiras estão investindo recursos. Esse estudo foi utilizado como elemento de marketing da empresa, mas também como instrumento de comunicação das atividades de mapeamento tecnológico para equipes comerciais e técnicas. Essas práticas fazem com que a empresa tenha que consolidar os conhecimentos adquiridos de maneira dispersa pelos colaboradores em um relatório, que serve de instrumento de comunicação interna e externa.

A empresa ‘H DEV’ é a única que apresentou uma rotina institucionalizada para mapeamento tecnológico que torna essa atividade uma responsabilidade compartilhada por toda a empresa. O mapeamento tecnológico é feito acompanhando radares de tendências tecnológicas, publicados por empresas que ditam tecnologia, e analisando informações a fim de criar um radar tecnológico próprio. Essa prática possui como vantagem promover a reflexão em todas as equipes, criando por fim uma visão compartilhada que é utilizada para direcionar as atividades comerciais e os esforços de aquisição de competências em novas tecnologias.

Mudanças de tecnologia vêm da equipe. A gente acompanha os radares de algumas empresas que ditam tecnologia, como a ThoughtWorks, Inc. É uma empresa que dita tecnologia. Ela tem pessoas pelo mundo que fazem um radar de tecnologia e falam as tecnologias quentes e as que não são quentes. Dentro da empresa a gente tem um radar tecnológico. As equipes se reúnem e cada equipe faz seu radar. A gente faz as equipes pensarem nisso. As equipes têm seu radar de tecnologia e depois a gente consolida no radar da empresa. Elas pesquisam na Internet, informalmente (Empresa H_DEV, 2015).

Nenhuma das empresas desenvolve internamente algum tipo de prospecção tecnológica ou monitoramento tecnológico, considerando estudos de cenários futuros, busca de patentes ou busca de artigos científicos a fim de identificar tendências tecnológicas. Segundo Salavisa, Sousa e Fontes (2012) o setor evoluiu dependendo de atividades outras que as relacionadas a pesquisa científica. Apesar de algumas empresas desenvolverem inovações em opções tecnológicas, em nenhuma delas foram identificadas evidências de desenvolvimento de tecnologias com alto nível de sofisticação voltadas para o mercado global24. As tecnologias desenvolvidas, mesmo quando se baseiam em conceitos sofisticados como análise avançada de dados (Big Data) ou aprendizado de máquina (Machine learning), se voltam a oportunidades em nichos específicos e dependem do alinhamento das soluções às necessidades do mercado. Ênfase nos aspectos mercadológicos e fatores como falta de

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Como, por exemplo, a plataforma Watson desenvolvida pela IBM, envolvendo capacidades de processamento de linguagem natural, avaliação e geração de hipóteses e aprendizagem dinâmica (IBM, 2016)

ambição, de capacidades e de recursos para o desenvolvimento de inovações de maior sofisticação tecnológica podem justificar essa limitação. Nesse ponto as empresas se dividem em quatro grupos.

O primeiro grupo, composto pelas empresas ‘D DEV’, ‘E INT’ e ‘H DEV’, é formado por empresas de desenvolvimento de software sob medida e integração de sistemas que não possuem o desenvolvimento de opções tecnológicas próprias como parte da estratégia. A orientação estratégica das empresas acaba circunscrevendo as competências necessárias ao conjunto de tecnologias desenvolvidas por terceiros, restando às empresas identificar oportunidades para a aplicação dessas tecnologias. Conhecimento mercadológico, estabelecimento de parcerias com fornecedores e acompanhamento da evolução das tecnologias são elementos-chave na estratégia dessas empresas.

A gente fica muito atento aos roadmaps dos produtos dos fabricantes. Os roadmaps indicam muita coisa que é estratégica para eles. Por mais que a gente tente ser agnóstico, a gente é muito ligado ainda aos produtos que eles vendem. A gente tem que acompanhar as tendências dos fabricantes. Por exemplo, qual é o grande modelo hoje em dia? Ir para a nuvem. É uma quebra de paradigma, em relação a você ter um modelo em que eu faço a solução, com o pessoal de infraestrutura entregando a infraestrutura e depois desenvolvendo. Hoje em dia a parte de infraestrutura praticamente desaparece. Se eu vender SaaS, desenvolvimento desaparece. Se eu vender PaaS, ainda tem. Se eu vender IaaS, ainda tem um pouquinho de infraestrutura, mas bem menos. Então eu tenho que entender este modelo. Todo o portfólio agora da Microsoft, da IBM, da Oracle, está caminhando para a nuvem. O que eu faço da minha área de infraestrutura? (Empresa E_INT, 2015).

O segundo grupo é formado pelas empresas ‘A DEV’ e ‘B INT’, empresas que, dado o seu porte, poderiam buscar o desenvolvimento de inovações mais ousadas, mas que ainda não possuem as capacidades para o desenvolvimento dessas inovações. As duas empresas se desenvolveram apoiadas na prestação de serviços com tecnologias de terceiros, sendo recente a criação de tecnologia própria25.

O que a gente está tentando fazer é transformar a unidade de Belo Horizonte em uma área de produtos. Hoje como é pontual, não tem volume para ser a área inteira. Esse produto tem um time fixo. Essa iniciativa, no âmbito organizacional, já é uma inovação. A gente está colocando as pessoas para trabalhar em um modelo no qual elas nunca trabalharam. É um desafio grande. A gente está aprendendo na prática porque a visão sempre foi de desenvolver para um cliente e acabou (Empresa B_INT, 2015).

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A empresa ‘A DEV’ lançou seu primeiro produto em 2014 (Empresa A_DEV, 2015) e a empresa ‘B INT’ desenvolveu seu primeiro produto em 2015 (Empresa B_INT, 2015).

O terceiro grupo é formado pelas empresas de médio porte ‘F DEV’, ‘G DEV’, ‘I INT’ e ‘J INT’, que assim como as empresas ‘A DEV’ e ‘B INT’ estão começando a desenvolver tecnologias próprias. Além de limitações nas capacidades de inovação, também enfrentam a limitação de recursos, apesar desse último ponto não ser algumas vezes reconhecido como restritivo.

Como a empresa tem uma capacidade limitada de investimento não dá para montar uma equipe como o Google faz: “Você tem X horas para pensar e trazer ideias”. Infelizmente a nossa capacidade de investimento não dá para tanto (Empresa F_DEV, 2015).

Fui influenciado por Babson [College]. Eles dizem que excesso de dinheiro é o principal inimigo da inovação. Você vai andar na direção errada por muito tempo até acabar o dinheiro. A gente leva isto muito a sério. A gente trabalha com pouco dinheiro. Se a gente achar que uma ideia vai escalar, a gente vai investir. [...]. Não diria que dinheiro é o nosso problema. Não é ele que está nos impedindo de ser mais ou menos bem-sucedido. Eu acho que é nossa capacidade de enxergar algo de escala disruptiva, exponencial (Empresa J_INT, 2015).

O quarto grupo é composto pela empresa ‘C MOV’, que assim como as demais empresas está amadurecendo suas capacidades de inovação sistemática, porém se distingue por apresentar a ambição e os recursos para o desenvolvimento de inovações26. A ausência de práticas de prospecção tecnológica se explica pela estratégia da empresa, que se baseia na criação de um ecossistema de serviços integrando serviços móveis a serviços reais e no desenvolvimento de aplicativos para dispositivos móveis. Mais do que conhecimentos tecnológicos, essa estratégia requer conhecimentos mercadológicos para identificar oportunidades e garantir o alinhamento das soluções às necessidades dos clientes.

O processo de mapeamento de oportunidades tecnológicas está presente nas empresas, sendo realizado por equipes gerenciais e técnicas e apoiado em informações obtidas a partir de sistemas de inteligência competitiva e tecnológica, fornecedores, eventos, empresas do setor e Internet. Como todas as empresas desenvolvem soluções com base em tecnologias de terceiros, o mapeamento de oportunidades tecnológicas é fundamental para a identificação das tendências que apresentam oportunidades e ameaças no médio e longo prazo, permitindo ajustar a estratégia da empresa e direcionar os esforços de aquisição de competências. Práticas de prospecção tecnológica não estão institucionalizadas nas empresas. Fatores como (i) ênfase nos aspectos mercadológicos dos serviços, (ii) falta de ambição para o desenvolvimento de

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A empresa recebeu aportes de fundos nacionais e internacionais e se preparava para lançar uma nova rodada de investimentos em 2015 (FELITTI, 2015; Empresa C_MOV, 2015).

soluções de maior sofisticação tecnológica, (iii) falta de capacidades de inovação dado o caráter recente das iniciativas, e (iv) falta de recursos são razões que explicam essa característica.