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Nesta seção analiso a orientação estratégica das empresas em relação à inovação, ou seja, até que ponto as empresas realmente definem a inovação como um compromisso e estão dispostas a investir em iniciativas de inovação aceitando os riscos envolvidos. Freeman (1982) menciona que toda classificação de estratégias é de alguma forma arbitrária, pois as empresas possuem características de diversos tipos, diferentes ao longo do tempo e nas diferentes unidades da empresa, porém se mostra útil para a conceitualização. Tendo isso em mente, a orientação estratégica das empresas foi analisada, segundo a tipologia de Miles e Snow (1978), considerando o discurso da empresa, iniciativas de inovação e comentários sobre pressão recebida pela equipe vinda de outras áreas da empresa. O Quadro 3-3 apresenta as características de orientação estratégica, comprometimento da alta gestão e tolerância a risco identificadas nas empresas da amostra.

Quadro 3-3 Orientação estratégica das empresas da amostra

Empresa Orientação Estratégica Comprometimento da Alta Gestão Tolerância a Risco

A DEV Analista Alto Baixo

B INT Analista Alto Baixo

C MOV Prospectivo Alto Alto

D DEV Analista Alto Baixo

E INT Analista Alto Baixo

F DEV Analista Médio Baixo

G DEV Analista Alto Baixo

H DEV Analista Médio Baixo

I INT Defensivo Alto Baixo

J INT Analista Alto Baixo

Fonte: Elaboração própria com base nas entrevistas realizadas.

Dentre as empresas, apenas a empresa ‘C MOV’ apresenta caráter prospectivo, com iniciativas explorando oportunidades e projetos buscando abertura de novos negócios alinhados à sua estratégia. A empresa ‘C MOV’ possui internamente uma divisão entre

negócios maduros e em desenvolvimento, que se reflete em divisão física dos escritórios, equipes e perfis profissionais, mostrando características de organizações ambidestras (TUSHMAN & O'REILLY, 1996). A empresa cresceu inicialmente com base em uma plataforma de envio de mensagens SMS desenvolvida internamente (novo serviço), tendo como mercado grandes operadoras de telefonia. Além da tecnologia desenvolvida, seu crescimento foi também resultado de uma estratégia ofensiva de fusões e aquisições, com o objetivo de criar uma empresa brasileira líder nesse segmento (nova organização da indústria)16. Essa unidade representa ainda hoje parcela significativa do faturamento, suportando outras iniciativas da empresa.

Com o advento dos smartphones, a empresa identificou uma ameaça ao seu mercado tradicional, decidindo desenvolver negócios visando os novos dispositivos, tendo como objetivo o mercado global. Para isso foi criada uma equipe inicialmente com 70 profissionais dedicados à criação de aplicativos móveis, testando ideias e aprimorando serviços após testá-los no mercado. Em dois anos foram desenvolvidos 40 aplicativos, dos quais um deles foi bem-sucedido, tendo sido aprimorado e posteriormente lançado em diversos países do mundo (EMPRESA C_MOV, 2015; FELITTI, 2015).

Todas as áreas estão envolvidas na inovação. Inovação é um valor, o valor é tomar risco. A gente precisa que as pessoas tomem risco e inovem o tempo inteiro. Se elas acham que podem fazer algo melhor, simplesmente vão lá e façam. A gente está o tempo inteiro testando coisas pequenas e rápidas. Quando algo dá certo, a gente coloca mais dinheiro e escala. Nossa forma de ver isto é enxuta, no sentido de “Faça as coisas rápidas e baratas e faça várias tentativas”. A gente não fez o aplicativo X e acertou com a visão do presidente, o que a gente fez foi testar 15, 20 produtos diferentes. A gente fez todos eles em uma, duas semanas e colocamos no ar. Vimos o que o cliente pensava. Pegamos os dados, mexemos novamente em uma semana. Vimos o que o cliente pensava. Então todo mundo tem que inovar, tomar risco, errar e aprender. Até a gente acertar alguma coisa que tem potencial e então, escalar (EMPRESA C_MOV, 2015).

A missão da empresa é “ser a melhor e maior empresa de produtos e serviços móveis do mundo”. A empresa definiu como meta crescer 10 vezes até 2020, chegando a um faturamento de R$ 10 bilhões. Para isso, foi criada uma cultura com valorização da felicidade do funcionário e foco em resultados. Horário flexível, comida à vontade, sala de descanso, jogos, sessões de cinema, eventos promovidos pela empresa mensalmente e incentivo e apoio à capacitação focam a felicidade do funcionário. Reuniões anuais de alinhamento apresentando a visão de futuro da empresa e de tecnologias, objetivos e metas claras, reuniões

16

No período de 2007 a 2010 a empresa passou por uma fusão e 3 aquisições passando da 10ª posição no mercado para a liderança, com 40% de participação no mercado.

mensais de acompanhamento de todas as iniciativas e transparência na comunicação dos resultados enfatizam o foco nos resultados, estabelecendo uma forte pressão corporativa. Aqueles que apresentam resultados recebem recompensas financeiras e maior visibilidade dentro da empresa. Um sistema gerencial disponibiliza informações para todos os funcionários sobre os objetivos de toda a empresa e o status de cada um deles. Monitores, posicionados de maneira estratégica, apresentam resultados financeiros e de projetos. Mensalmente os funcionários recebem relatórios sobre a situação da empresa, os principais objetivos e resultados. Segundo o seu presidente e fundador, a empresa cresceu muito nos últimos anos, investindo em inovação e tomando riscos. Agora a empresa precisa que seus funcionários pensem grande e desenvolvam projetos que permitam que a empresa se consolide como uma empresa global (EMPRESA C_MOV, 2015; STANFORD UNIVERSITY, 2015; STANFORD UNIVERSITY, 2015).

A empresa ‘I INT’ foi a que apresentou uma estratégia defensiva. A empresa nasceu a partir de uma inovação tecnológica para um nicho de mercado e se aprofundou neste nicho, garantindo domínio. Com o tempo passou a focar em questões operacionais e parou de inovar. Apesar dessa estratégia, considero que o comprometimento da alta gestão é alto pois, mesmo com baixa tolerância ao risco, a empresa decidiu romper com essa estratégia defensiva, criando em 2015 uma área dedicada à inovação. Como a empresa possui baixa tolerância a risco e foco em operações, a nova área foi implementada como uma organização separada, inclusive em outra localidade física, possibilitando seu desenvolvimento com menos pressões corporativas. Com essa reorganização, a direção da empresa busca estabelecer uma organização ambidestra, onde a empresa principal se mantém focada no negócio corrente, enquanto a nova organização explora o desenvolvimento de inovações e abertura de novos mercados (TUSHMAN & O'REILLY, 1996).

As demais empresas apresentam uma estratégia analista, são proativas em buscar oportunidades e avaliar tendências do mercado, porém também buscam maximizar os negócios presentes. Na maioria dos casos o comprometimento da alta gestão com a inovação é alto, o que se reflete na criação de áreas específicas para inovação, porém a tolerância a riscos é baixa, limitando o tipo de iniciativas de inovação empreendidas. A empresa ‘J INT’, por exemplo, se preocupa em desenvolver inovações que tenham sinergia direta com os negócios existentes e que não os canibalize (Empresa J_INT, 2015). A empresa ‘E INT’ menciona a necessidade de criar um caminho de transição do negócio atual para o negócio futuro e

sempre desenvolver inovações tendo um cliente inicial patrocinando o projeto (Empresa E_INT, 2015).

Apesar das empresas apresentarem um discurso de inovação, a orientação estratégica corrobora a percepção de que a ambição e as capacidades das empresas no desenvolvimento de inovações são limitadas, restringindo os projetos a iniciativas de caráter incremental, que visam alcançar vantagem competitiva no mercado de atuação e, eventualmente, abrir novos mercados através da identificação de oportunidades em nichos de mercado.