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3. EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE

3.3 Matemática e Tecnologia

Skovsmose ao dissertar sobre as aplicações da Matemática traz a seguinte ilustração:

Nós não estamos acostumados a pensar em um caixa de supermercado como usando Matemática. Entretanto, a leitura automática do código de barra e o pagamento por cartão de crédito pressupõem que um gigantesco aparato matemático esteja em operação. A leitura de código de barra baseia-se em um dispositivo técnico complicado sustentado pela Matemática, que pode estar ligado a uma movimentação automática de estoque. O uso de cartão de crédito inclui grande quantidade de comunicação eletrônica e é aplicação da Matemática na política de segurança. A Matemática está condensada em programas e pacotes instalados em computadores, prontos para serem usados. (SKOVSMOSE, 2007, p. 48)

A Matemática instala-se e acomoda-se em “embalagens” tecnológicas das mais variadas. Os mais diversos tipos de algoritmos que viabilizam ou descrevem o funcionamento de um artefato tecnológico, de um modo ou de outro, são permeados em sua elaboração por conhecimentos matemáticos. Como afirma Skovsmose, a Matemática está em toda parte assim como os computadores, o autor enfatiza ainda que “‘haver Matemática em toda parte’ e ‘haver computadores em toda parte’ referem-se ao mesmo fato” (SKOVSMOSE, 2007, p. 115), qual seja: Matemática e computação são atividades inter-relacionadas.

Em outro texto afirma que:

A Matemática é o sustentáculo lógico do processamento da informação, e o processamento matemático é também a base para as atuais aplicações da tecnologia da informação. De fato, todas as aplicações de um computador podem ser vistas como uma aplicação de um modelo matemático simples ou complexo. (SKOVSMOSE, 2008, p. 77)

Atribuir à Matemática o status de sustentáculo lógico do processamento da informação e enxergá-la como base para as atuais aplicações da tecnologia da informação implica incorporá-la ao conhecimento tecnológico. Utilizo esse termo no mesmo sentido de Skovsmose (2008) ao definir que “o conceito de ‘conhecimento tecnológico’, se refere à competência necessária ao desenvolvimento e à aplicação de uma determinada tecnologia”.

Esta relação existente entre Matemática e tecnologia, atribui à Matemática uma dimensão política que se explicita diante da percepção do papel desempenhado pela

tecnologia na sociedade atual, tal dimensão também foi constatada na seção anterior. Para evidenciar esse papel podemos recorrer à abordagem expressa por Kenski:

Na atualidade, o surgimento de um novo tipo de sociedade tecnológica é determinado principalmente pelos avanços das tecnologias digitais de comunicação e informação e pela microeletrônica. Essas novas tecnologias – assim consideradas em relação às tecnologias anteriormente existentes –, quando disseminadas socialmente, alteram as qualificações profissionais e a maneira como as pessoas vivem cotidianamente, trabalham, informam-se e se comunicam com outras pessoas e com todo o mundo. (KENSKI, 2008, p. 22)

Ao refletir sobre as considerações da autora, percebemos que o modelo atual de sociedade é determinado pelos avanços das tecnologias digitais. Entretanto, como citado anteriormente, tais avanços são impulsionados pelo desenvolvimento da Matemática. Evidencia-se assim uma relação transitiva entre sociedade, tecnologia e Matemática. Nesse sentido Skovsmose argumenta:

Obviamente, enfocar o papel da Matemática como parte de um desenvolvimento tecnológico pressupõe que a Matemática esteja “fazendo algo” pela sociedade. Usarei a formulação de que a Matemática está formatando a sociedade, ou que a Matemática tem um poder de formatação. A Matemática é vista como um princípio básico do design tecnológico. (SKOVSMOSE, 2008, p. 99)

Cabe ressaltar que esse aspecto político e social da Matemática, enfatizado por suas aplicações à tecnologia não é recente, tampouco se limita ao desenvolvimento tecnológico, mas transcende esta dimensão e se estabelece na gênesis da forma de vida humana caracterizada por seu poder de raciocínio modelado pelo pensamento matemático, nesse sentido, D’Ambrosio argumenta que:

A Matemática é, desde os gregos, uma disciplina de foco nos sistemas educacionais, e tem sido a forma de pensamento mais estável da tradição mediterrânea que perdura até os nossos dias como manifestação cultural que se impôs, incontestada, às demais formas. Enquanto nenhuma religião se universalizou, [...], a Matemática se universalizou, deslocando todos os demais modos de quantificar de medir, de ordenar, de inferir e servindo de base, se impondo como o modo de pensamento lógico e racional que passou a identificar a própria espécie. Do Homo sapiens se fez recentemente uma transição para o Homo rationalis. Este último é identificado pela sua capacidade de utilizar Matemática, uma mesma Matemática para toda humanidade e, desde Platão, esse tem sido o filtro utilizado para selecionar lideranças. (D’Ambrosio, 1990, p. 10)

Na citação anterior D’Ambrosio afirma que a capacidade de utilizar a Matemática tem sido o filtro utilizado para selecionar lideranças, esta seleção pode ser entendida também

como exclusão no sentido de determinar quem pertence ou não pertence a uma classe social dominante, nesse mesmo sentido, Skovsmose (2007) destaca que a Educação Matemática serve a uma função social de promover uma estratificação que pode deixar marcas nos estudantes. Essa estratificação é responsável pela formação de dois grupos - aqueles que conseguirão acesso ao poder e prestigio e aqueles que não conseguirão – o autor reforça esse pensamento citando Volmink.

Matemática não é somente um mistério impenetrável para muitos, mas também, mais do que qualquer outra matéria, foi lançada no papel de um juiz ‘objetivo’, a fim de decidir quem, na sociedade, ‘pode’ e quem não ‘pode’. E, dessa forma, serve como a ‘porteira’ que deixa ou não passar pela porta de entrada dos que participarão na decisão produtora de processos da sociedade. Negar algum acesso à participação em Matemática é também determinar, a priori, quem irá adiante e quem ficará para trás. (VOLMINK, 1994, p. 51-52 apud SKOVSMOSE, 2007, p. 66)

As concepções acima delineadas mostram que existe em certa medida uma dependência Matemática para o desenvolvimento social e tecnológico. Diante deste papel desempenhado pela Matemática torna-se necessário refletir sobre a Educação Matemática, no sentido de procurar estratégias que ampliam seu campo de atuação com o objetivo de incorporar mecanismos capazes de expandir a percepção do aluno para que se conscientize em relação à importância do aprendizado matemático e suas aplicações ao desenvolvimento tecnológico.

Nesse sentido, nas Orientações Curriculares para o Ensino médio encontramos:

Não se pode negar o impacto provocado pela tecnologia de informação e comunicação na configuração da sociedade atual. Por um lado, tem-se a inserção dessa tecnologia no dia-a-dia da sociedade, a exigir indivíduos com capacitação para bem usá-la; por outro lado, tem-se nessa mesma tecnologia um recurso que pode subsidiar o processo de aprendizagem da Matemática. É importante contemplar uma formação escolar nesses dois sentidos, ou seja, a Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática. (BRASIL, 2006, p. 87)

O discurso do MEC destaca um importante aspecto da nossa problemática de estudo: a Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática. Este é o cerne da questão que quero tratar nestas considerações. Penso que negligenciar este elemento pode limitar o desenvolvimento do aluno, no sentido de que ele passa a enxergar o aprendizado em Matemática como um objetivo fim, quando na verdade esse aprendizado tem sentido amplo, que é o de entender a sociedade, as ciências e as

tecnologias desenvolvidas por esta sociedade. Enfim, a Matemática deve ser ensinada com o objetivo de possibilitar o entendimento do mundo em que vivemos.

Entretanto, há que se considerar aquilo que Skovsmose chamou de paradoxo da razão. Esse paradoxo estabelece uma contradição entre desenvolvimento cientifico/tecnológico e comportamento humano, o autor considera que a ciência e, também a Matemática, operam como agente duplo, servindo tanto ao bem como ao mal. Se por um lado, vivemos em um momento histórico sem precedentes, em que o desenvolvimento científico e tecnológico alcançou níveis jamais vistos em toda história da humanidade, por outro lado, vivemos uma época que evidencia um comportamento humano desprezível:

Meios sem precedentes de destruição em massa, de insegurança, novas doenças terríveis, fome injustificável, abuso de droga, e decadência moral igualada somente pela destruição ambiental. Muitos desses paradoxos têm a ver com a ausência de reflexões e considerações dos valores acadêmicos, particularmente nas disciplinas cientificas, tanto na pesquisa, como na educação. Muitos dos meios de alcançar essas maravilhas e também esses horrores da ciência e da tecnologia têm a haver com os avanços da Matemática (D’AMBROSIO, 1994 apud SKOVSMOSE, 2007, p 141)

Reformulando as palavras de Lévy (2008a), poder-se-ia dizer que a Matemática não é nem boa, nem má, nem neutra, mas que comporta condições necessárias, mas não suficientes para o estabelecimento do paradoxo da razão.

Por um lado, nosso conhecimento da natureza e do desenvolvimento de novas poderosas tecnologias baseadas no conhecimento ultrapassam qualquer expectativa possível, e, por outro, testemunhamos um “comportamento humano indigno” diretamente originado nesse conhecimento da natureza e nesse conhecimento com base em tecnologias . O progresso cientifico não traz simplesmente “maravilhas”. É também, acompanhado por “horrores”. [...] As ações sociotecnológicas fundamentadas pela Matemática são paradoxais por natureza, no sentido de que mesmo quando podem ser fundamentadas nas competências Matemáticas, suas qualidades “progressivas” são questionáveis. Nenhuma qualidade intrínseca da Matemática assegura que a Matemática em ação leve a “maravilhas”. (SKOVSMOAE, 2007, p. 142)

Com isso queremos dizer que entendemos que a Matemática não constitui por si só uma panacéia para os problemas sociais e tecnológicos, talvez este remédio venha a ser o desenvolvimento de uma nova sociedade, com ideais, políticas, ciências e tecnologias distintas da sociedade atual, em que as relações pessoais, a solidariedade, a vida humana esteja em primeiro plano. Contudo, mesmo aceitando a impossibilidade de tal reconstrução, podemos dizer que a educação pode ser um princípio ativo importante em um antídoto que visa ao menos a amenização dos sintomas percebidos em uma sociedade autodestrutiva.

Poderíamos, ainda que utopicamente, estabelecer assim como ADORNO o fez no texto “Educação Após Auschwitz”, algumas missões para a educação, tais como: Impedir um novo Auschwitz, ou ainda impedir um novo Apartheid, uma nova Ditadura, um novo Muro de Berlim. Enfim, parafraseando Adorno, a exigência de evitar um comportamento humano indigno é a primeira de todas para a educação.

4 MODELO VETORIAL PARA RECUPERAÇÃO DE INFORMAÇÃO

Já foi dito neste trabalho que vivemos em uma sociedade denominada sociedade informacional, entretanto há que se considerar que a necessidade de conhecimentos não é um privilégio da sociedade contemporânea, o homem necessita e sempre necessitou de conhecimentos para sobreviver. Nesta perspectiva, um aspecto importante a destacar é que a obtenção de conhecimentos é precedido pela aquisição de informações, fato que historicamente tem levado o homem a construir artefatos capazes de armazená-las.

Em um primeiro momento podemos citar a própria fala como um modo de transmissão de informações, este momento é caracterizado pelo que Lévy chamou de oralidade primária. O homem evoluiu, inventou a escrita e passou a gravar suas informações em tábuas de argila, posteriormente em pergaminhos e este evoluiu para o livro no formato do códex. Com a invenção da prensa, os livros passaram a ser impressos em grande escala, posteriormente, as inovações tecnológicas possibilitaram novas formas de armazenamento e transmissão de informações.

Paralelamente ao desenvolvimento dos meios de armazenagem de informações, foram sendo desenvolvidos mecanismos que possibilitam a recuperação de tais informações. As bibliotecas, por exemplo, desenvolveram fichas catalográfica, na qual cada novo item é catalogado baseado em informações sobre o que a obra (livro, revista, fita vhs, DVD etc.) trata. Cada obra é analisada individualmente afim de se determinar do que se trata, esta abordagem é geralmente conhecida como indexação manual.

Existe ainda em uma biblioteca a figura do bibliotecário, este conforme afirmam Berry e Browne (2005), com sua experiência, sabe que passar alguns minutos com um usuário, ouvindo, perguntando, questionando, pode levá-lo a indicar corretamente a este usuário o recurso adequado (livros, revistas, CDs etc.) que irão suprir satisfatoriamente a informação desejada.

No entanto, no mundo digital, esta figura do bibliotecário não existe. Alternativas que levem a resultados semelhantes estão sendo desenvolvidas por meio da inteligência artificial, mas ainda existe um longo caminho a ser percorrido. Este é um problema, pois a Internet possibilita a qualquer um inserir dados de diversos tipos na rede, ocasionando um crescimento incomparável e sem precedentes do volume de dados disponíveis para consulta. Outro fato importante destacado por Berry e Browne (2005), é que o foco da nova tecnologia tem sido mais o processamento e digitalização de informações, que podem ser textos, figuras, imagens,

ou áudio, do que na necessidade de organização dessas informações. Esta situação segundo os autores gerou, o que os especialistas chamam de tsunami de dados.

A fim de manipular de forma eficiente as informações contidas nesta avalanche de dados, que ocorrem em ambientes de informações automatizadas, novas técnicas se tornam necessárias. Com este objetivo, profissionais da área de informática têm desenvolvido um conjunto de ferramentas baseadas em modelagem Matemática, que visam a aprimorar o desempenho dos “buscadores” de informações. Tais profissionais situam-se na chamada área de Recuperação de Informação (RI) ou Informação Retrieval, que se ocupa com a representação, armazenagem, organização recuperação das informações.

A seguir, mostraremos como a Matemática pode ser útil ao desenvolvimento de mecanismos para a recuperação de informações.