• Nenhum resultado encontrado

A RELAÇÃO TRANSITIVA ENTRE SOCIEDADE, TECNOLOGIA E MATEMÁTICA Aportes relativos à formação profissional em um curso superior de Informática MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "A RELAÇÃO TRANSITIVA ENTRE SOCIEDADE, TECNOLOGIA E MATEMÁTICA Aportes relativos à formação profissional em um curso superior de Informática MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA"

Copied!
109
0
0

Texto

(1)

JULIANO CAVALCANTE BORTOLETE

A RELAÇÃO TRANSITIVA ENTRE SOCIEDADE, TECNOLOGIA E

MATEMÁTICA

Aportes relativos à formação profissional em um curso superior de

Informática

MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

JULIANO CAVALCANTE BORTOLETE

A RELAÇÃO TRANSITIVA ENTRE SOCIEDADE, TECNOLOGIA E

MATEMÁTICA:

Aportes relativos à formação profissional em um curso superior de

Informática

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação do Prof. Dr. Gerson Pastre de Oliveira.

(3)

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

________________________________________

(4)

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

(5)

AGRADECIMENTOS

!

"

#

$

%

$ &

'

!$

!#

(

!$

!$

!$

)

*

&

+

&

,

-!#

.

!#

/ 0)

!#

1 !$

1

2

3

. 4

5

5 '

&

&

3

(

6 4

6

)

)

!#

7

!$

!

83

)

9

.) 9

(6)

RESUMO

Este trabalho procura discutir e compreender, através de uma abordagem qualitativa de pesquisa, a influência que a Matemática exerce no desenvolvimento tecnológico e social. Os aportes teóricos empregados apontam para o fato de as pessoas, atualmente, viverem em uma sociedade informacional, cujo funcionamento está alicerçado nos pilares das tecnologias da informação, as quais, por sua vez, são condicionadas pela Matemática. A partir destes pressupostos, mediados pela perspectiva da Educação Matemática Crítica, procurou-se encontrar uma aplicação apta a explicitar as interfaces entre Matemática e tecnologia, e suas implicações ao mundo contemporâneo, o que levou ao emprego do Modelo Vetorial para Recuperação de Informações, tema presente no currículo da disciplina Matemática Discreta, como fundamento para a construção de mecanismos de busca pelos sujeitos da pesquisa, alunos de um curso superior de Análise de Desenvolvimento de Sistemas de uma faculdade pública de São Paulo. A coleta de dados foi realizada por meio de questionários e observações em sala de aula, procurando identificar no discurso dos alunos as inquietudes acerca do emprego profissional do conteúdo de disciplinas ligadas à Matemática. Constatada uma dissociação, na visão dos alunos, a respeito da aplicabilidade da Matemática ao desenvolvimento tecnológico e profissional, os mesmos foram convidados a construir mecanismos de busca com base nos conceitos matemáticos presentes no Modelo Vetorial mencionado. As análises mostraram que o processo de construção das aplicações ocasionou uma mudança de percepção e de postura em relação ao conhecimento Matemático, de sua inserção no contexto de produção tecnológica e de seu uso em situações profissionais reais.

(7)

ABSTRACT

This work seeks to discuss and comprehend, through qualitative research approach, the influence that Mathematics has over technological and social development. The theoretical contributions employed in this study point to the fact that currently people live in an informational society, whose operation is based on the pillars of information technologies which, in turn, are driven by Mathematics. From these assumptions, mediated by the perspective of Critical Mathematics Education, we sought to find an application capable of explaining the interfaces between Mathematics and technology, as well as their implications for the contemporary world, which led to the use of the Vector Model for Information Retrieval, theme present in Discrete Mathematics syllabus, as the basis for the building of search engines by the students of Analysis of System Development in a public college in São Paulo. Data collection was carried out by means of questionnaires and observations in the classroom, trying to identify from the students’ answers their concerns about the professional use of the contents of disciplines related to Mathematics. Because of dissociation, from the student’s point of view, regarding the applicability of Mathematics to technological and professional development, they were invited to build search engines based on mathematical concepts present in the Vector Model mentioned above. The analyses showed that the construction process of applications led to a change of perception and attitude towards the mathematical knowledge, its insertion in the context of technological production and its use in real professional situations.

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA...17

1.1 Tecnologia e Educação Matemática ...17

1.2 Trabalhos Correlatos...23

2. SOBRE TÉCNICA E TECNOLOGIA EM UMA PESQUISA DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ...31

2.1 Técnica, evolução e modernidade ...31

2.2 Implicações Sociais das Tecnologias de Armazenamento e Recuperação de Informações na Visão de Levy ...36

3. EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE...45

3.1 Educação Matemática Crítica...45

3.2 Matemática e Sociedade ...52

3.3 Matemática e Tecnologia...58

4 MODELO VETORIAL PARA RECUPERAÇÃO DE INFORMAÇÃO...63

4.1 Construção do Modelo Vetorial ...64

5. APORTES METODOLÓGICOS ...69

5.1 Pesquisa em Ciências Humanas ...69

5.2 Pesquisa Qualitativa ...70

5.3 A escolha do Problema Matemático Abordado na Pesquisa ...72

(9)

5.5 Coleta e Análise dos Dados...76

6. COLETA E ANÁLISE DOS DADOS ...79

6.1 Primeiro Questionário ...80

6.1.1 Apresentação dos Dados e análises preliminares ...80

6.2 Categorias de análise ...84

6.2.1 Percepção da influência dos artefatos tecnológicos na sociedade...85

6.2.2 Percepção da importância da Matemática para o desenvolvimento tecnológico ...89

6.2.3 Percepção da influência da Matemática na formação e exercício profissional futuro. ...93

6.3 Questionário pós-implementação dos mecanismos de busca ...101

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...105

REFERÊNCIAS ...109

(10)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Ciclo de uso de tecnologias por professores de Matemática – Fonte: Santos, 2010

...21

Figura 2 – Tela inicial do programa ...95

Figura 3 – Tela de cadastro dos documentos...95

Figura 4 – Tela de cadastro dos termos (palavras-chave) ...96

Figura 5 – Matrizes representantes do banco de dados ...96

Figura 6 – Matriz transposta...97

Figura 7 – Tela de consulta...97

Figura 8 – Vetor consulta ...98

Figura 9 – Cosseno entre os vetores documento e o vetor consulta ...98

Figura 10 – Documentos de maior relevância para a consulta...99

Figura 11 – Mecanismo de Busca – Linguagem Visual Studio 2010 ...100

(11)

LISTA DE QUADROS

(12)

INTRODUÇÃO

No livro “Educação Matemática Crítica: a questão da democracia”, de Skovsmose (2008), encontram-se, no capítulo 41, questões que relacionam a Educação Matemática ao uso de tecnologias. No discurso do autor:

Quando usamos a conjunção “Educação Matemática e tecnologia”, facilmente associamos tecnologia com computadores na sala de aula (ou, numa interpretação mais próxima, tecnologia significa equipamento usado na Educação Matemática). Perguntas associadas ao planejamento curricular são: Como usar uma tecnologia para facilitar aos estudantes o acesso às idéias Matemáticas? Como usar computadores a serviço da Educação Matemática? [...] Toda nossa civilização se torna uma reconstrução tecnológica, e se poderia fazer uma tentativa de relacionar a Educação Matemática ao conceito de tecnologia. Questões educacionais poderiam ser: como pôr os estudantes a par do impacto tecnológico sobre a sociedade? Como tornar os estudantes cientes do papel da Matemática como parte de um desenvolvimento tecnológico? Como ter uma idéia das condições básicas para viver em uma sociedade altamente tecnológica? Como refletir sobre a cultura tecnológica? Tais questões podem revelar uma abertura para a educação crítica, e também para a Educação Matemática. (SKOVSMOSE, 2008, p. 97 - 98)

As indagações do autor dinamarquês fazem refletir sobre as distintas possibilidades de atrelar os temas “Educação Matemática” e “Tecnologias”. A partir destas reflexões, iniciou-se, nesta pesquisa, uma busca na literatura acadêmica e constatou-se uma forte tendência relativa a uma das possíveis formas de vincular a Educação Matemática às tecnologias. Em todos os trabalhos analisados, verificou-se o uso da tecnologia como proposta central, visando a facilitar ou viabilizar o entendimento de algum conceito matemático, o que certamente ratifica as questões associadas ao planejamento curricular, citadas acima.

De outro modo, sabe-se que a conjunção entre Matemática e tecnologias oferece outras possibilidades à educação. Essas diversas possibilidades relacionam a Matemática com o desenvolvimento tecnológico, com a sociedade tecnológica, com a cultura tecnológica, e estão contidas no segundo grupo de questões propostas por Skovsmose (2008).

A partir destas constatações, vislumbramos a possibilidade de percorrer a via que liga a Educação Matemática e as tecnologias em um sentido oposto ao convencional, ou seja, ao comum à maioria das pesquisas. Em outras palavras, percebemos a viabilidade do desenvolvimento de um modelo que possibilite o entendimento da Matemática como conhecimento fundamental para o desenvolvimento tecnológico.

1 O capítulo começa na pagina 97, e tem por título “EM DIREÇÃO À EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

(13)

Na busca por um problema que pudesse aguçar a percepção do aluno no que diz respeito à influência da Matemática no desenvolvimento tecnológico e, conseqüentemente, na sociedade atual, nos deparamos com o Modelo do Espaço Vetorial para Recuperação de Informações, desenvolvido por Gerard Salton, na Cornell University. Este modelo usa conceitos matemáticos de álgebra linear e geometria analítica para a construção de mecanismos de recuperação de informações (RI), conforme se encontra de forma mais detalhada no capítulo 4 deste trabalho. A opção por esse modelo informático justifica-se, de certa forma, por ser a atual sociedade fortemente baseada em princípios e culturas informacionais. Os pilares para o desenvolvimento desta sociedade, em seus diversos segmentos, estruturam-se por meio das tecnologias da informação. A necessidade de informação para o desenvolvimento não é característica exclusiva da sociedade atual, apesar de encontrar-se maximizada na atualidade: grandes bibliotecas e centros de pesquisa foram criados ao longo de toda história da humanidade. Toda nova tecnologia, em quaisquer épocas, foi possibilitada pelo uso de informações geradas e acumuladas nos anos antecedentes à sua concepção. No entanto, o que é próprio deste novo momento é a forma de produção e propagação das informações. Neste sentido é que afirma Castells:

O termo sociedade da informação enfatiza o papel da informação na sociedade. Mas afirmo que informação, em seu sentido mais amplo, por exemplo, como comunicação de conhecimentos, foi crucial a todas as sociedades, inclusive à Europa medieval que era culturalmente estruturada e, até certo ponto, unificada pelo escolasticismo, ou seja, no geral uma infra-estrutura intelectual. Ao contrário, o termo informacional indica o atributo de uma forma específica de organização social em que a geração, o processamento e a transmissão da informação tornam-se as fontes fundamentais de produtividade e poder devido às novas condições tecnológicas surgidas nesse período histórico. (CASTELLS, 2009, p. 65)

Com o surgimento da informática, o desenvolvimento da Internet e, consequentemente, a criação da World Wide Web, os computadores tornaram-se instrumentos fundamentais no auxilio à busca e manipulação de informações. Por sua capacidade de computação e conectividade, possibilitaram uma forma inédita de difusão das informações, contribuindo, assim, para o surgimento de um novo paradigma informacional e de desenvolvimento, em que a fonte de produtividade acha-se na tecnologia de geração de conhecimentos, processamento da informação e de comunicação de símbolos, conforme afirma o autor espanhol:

(14)

tecnologia para melhorar a geração de conhecimentos e o processamento da informação: é por isso que, voltando à moda popular, chamo esse novo modo de desenvolvimento de informacional, constituído de um novo paradigma tecnológico baseado na tecnologia da informação. [...] Embora graus mais altos de conhecimentos geralmente possam resultar em melhores níveis de produção por unidade de insumos, é a busca por conhecimentos e informação que caracteriza a função da produção tecnológica no informacionalismo. (CASTELLS, 2009, p. 54)

Este momento histórico, possibilitado pelas tecnologias de informação e comunicação, não seria possível sem a contribuição da Matemática, enquanto linguagem, meio e interface. O conhecimento matemático, incorporado ao conhecimento tecnológico, foi e continua sendo fundamental para a criação de modelos e algoritmos que viabilizam e impulsionam a criação das novas tecnologias. Em análise convergente, Skovsmose afirma que:

A Educação Matemática desempenha um papel significante nos processos sociopolíticos. Isso é indicado por algumas das observações referidas aqui, previamente: que a Educação Matemática pode ser vista como a base da sociedade tecnológica; que ela pode ser vista como uma invasão cultural; que ela fornece formas de conhecimento e técnicas de particular relevância para a sociedade informacional; que a aprendizagem Matemática está intimamente relacionada com o desenvolvimento de competências para a manipulação de tecnologias de comunicação e de informação. (SKOVSMOSE, 2007, p. 67)

Este trabalho parte de pressupostos a partir dos quais há forte relação entre Matemática e tecnologia. De alguma forma, procura inserir-se no âmbito de estudos que contemplam a Matemática como conhecimento necessário para o desenvolvimento tecnológico. Por outro lado, pensar em Educação Matemática e uso de tecnologias tem, do ponto de vista desta pesquisa, dois componentes fundamentais: a questão da estratégia pedagógica adotada pelo professor e uma proposta de matematização da informática. Estes elementos teóricos são explicados de forma mais adequada nos capítulos 3 e 4 deste trabalho. Por enquanto, resta dizer, assim como declara Oliveira (2009b), que uma estratégia pedagógica deve prever a figura do professor como orientador, a centralidade do aluno e sua relevância na construção do conhecimento matemático de que é sujeito. De fato, o autor argumenta, ainda, que a estratégia adotada como proposta para uma trajetória de aprendizagens em Educação Matemática permeada pelo uso de tecnologias é, em tudo, muito mais relevante do que a mera adoção de um software qualquer.

(15)

incorporação de uma dimensão crítica que envolve reflexões sobre usos e conseqüências dos dispositivos em que a Matemática subjaz.

Desde este ponto, então, parece importante destacar a pergunta norteadora do esforço de investigação aqui envidado, como síntese do problema de pesquisa levantado: A construção de um programa computacional de ampla relevância na sociedade contemporânea, com base em conteúdos da Geometria Analítica e da Álgebra Linear, pode contribuir para que o estudante de Informática do Ensino Superior compreenda a correlação entre a Matemática e o desenvolvimento de aplicações tecnológicas, no âmbito de sua atuação profissional?

Lendo autores como Castells, Lévy, Kerckhove e Skovsmose, entre outros, encontramos a base teórica necessária para a fundamentação deste trabalho, que está organizado em sete capítulos, descritos a seguir:

No capítulo 1, apresentamos a revisão bibliográfica, formada por trabalhos acadêmicos correlatos ao nosso tema de pesquisa. Também fizemos uma breve análise sobre as principais concepções sobre o uso de tecnologia com o objetivo de auxiliar o ensino da Matemática.

No capítulo 2, tecemos algumas considerações etimológicas a respeito da palavra técnica e apresentamos ainda as concepções de alguns pensadores sobre a técnica e suas influências na sociedade. Por fim, discorremos sobre o tema comunicação, sociedade e tecnologia, culminando com o entendimento do computador como uma interface entre estes componentes.

A relação entre Tecnologia, Educação Matemática e Sociedade é abordada no capítulo 3, em que apontamos aspectos que evidenciam o poder de condicionamento social exercido pela tecnologia. Prosseguimos neste capítulo destacando algumas intersecções entre Educação Matemática e Educação Crítica e por fim, fazemos algumas considerações a respeito do papel desempenhado pela Matemática no desenvolvimento tecnológico.

Reservamos o Capítulo 4 para dissertar sobre o Modelo do Espaço Vetorial para Recuperação de Informações. Faremos alguns apontamentos sobre a Matemática envolvida na construção deste modelo com destaque para a Álgebra Linear e Geometria Analítica. Além disso, explicaremos suas funcionalidades e traremos um exemplo de aplicação.

(16)

Com o objetivo de investigar se um aprendizado de Matemática, com ênfase na matematização da informática, proporciona ao aluno um entendimento sobre o significado e importância da matemática, elaboramos uma oficina para a construção de um mecanismo de busca utilizado em RI. As atividades propostas nessa oficina, a descrição das observações feitas e as respectivas análises a priori e a posteriori encontram-se no capítulo 6.

(17)

1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Para nos situarmos em relação aos atuais trabalhos relacionadas ao nosso tema de investigação, realizamos esta pesquisa bibliográfica, que nos permitiu conhecer, entender e listar os temas e objetivos já estudados, bem como alguns dos resultados alcançados. Esta análise possibilitou identificar algumas questões em aberto e, principalmente, encorajou-nos a desenvolver este trabalho, já que não encontramos abordagem similar à que pretendemos.

Os trabalhos foram obtidos exclusivamente por meio de sites de universidades que desenvolvem estudos relacionados à Educação Matemática, com destaque à UNICAMP, que mantém o CEMPEM (Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação Matemática), órgão de apoio à docência, pesquisa e extensão em Educação Matemática do Departamento de Metodologia de Ensino da Faculdade de Educação. Também nos valemos das dissertações desenvolvidas no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da PUC/SP, disponibilizadas em seu site. O CINTED (Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias na Educação), da Universidade Federal do Rio grande do Sul, igualmente serviu-nos como fonte para consultas.

1.1 Tecnologia e Educação Matemática

Pesquisas em educação Matemática – ver, por exemplo, a seção 1.2 deste trabalho – mostram que a disponibilidade crescente e o poder das tecnologias eletrônicas tais como computadores e calculadoras gráficas, quando aliadas ao aspecto humano que relaciona-se ao saber fazer, ou melhor, o saber operar com essas tecnologias, inclusive de forma crítica, não tomando-as como se fossem verdadeiras panacéias, proporcionam novos meios de ensino e de desenvolvimento do pensamento matemático por promover/facilitar a conjectura, a justificação e a generalização, além de proporcionar um importante aspecto relacionado à memória, à coleção e análise de dados, tornando disponível a exploração de múltiplas formas de representação (por exemplo: numérica, simbólica e gráfica) Goos et al (2003).

(18)

No livro Cibercultura, Lévy definiu o termo que o intitulou de acordo com a seguinte argumentação:

O ciberespaço (que também chamarei de “rede”) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial de computadores. O termo especifica não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ele abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo “cibercultura”, especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolve juntamente com o crescimento do ciberespaço. (LÉVY, 2008b, p. 17)

Neste cenário, marcado pela relação homem–máquina, ou, segundo Skovsmose (2008), humano e não-humano, Lévy constata que:

[...] o ciberespaço suporta tecnologias intelectuais que amplificam, exteriorizam e modificam numerosas funções cognitivas humanas: memória (bancos de dados, hiperdocumentos, arquivos digitais de todos os tipos), imaginação (simulações), percepção (sensores digitais, telepresença, realidades virtuais), raciocínios (inteligência artificial, modelização de fenômenos complexos). (LÉVY, 2008b, p.157)

Acrescenta ainda que, graças à memória auxiliar, podemos nos dedicar a novas operações cognitivas, tais como contar, medir, comparar etc. Um conceito similar ao de tecnologia intelectual, proposto por Lévy, é apresentado por Kerckhove. Esse autor introduz o termo psicotecnologia e o define como “qualquer tecnologia que emula, estende ou amplifica o poder de nossas mentes” (KERCKHOVE, 2009, p. 23).

Ambas as perspectivas se coadunam com o pensamento de Castells ao assumir que “computadores, sistemas de comunicação, codificação e programação genética são todos amplificadores e extensões da mente humana” (CASTELLS, 2009, p. 69). Mais adiante veremos que essa visão a respeito das tecnologias, sobretudo as digitais, é reconhecida no campo da Educação Matemática mediante a concepção denominada “incorporar tecnologias”.

Por se tratar de um trabalho de Educação Matemática, é pertinente e necessário trazer para o debate autores desta área de pesquisa com visão aglutinadora em relação aos aspectos cognitivos das interfaces tecnológicas. Entre os teóricos da Educação Matemática, Borba (2001) argumenta que uma mídia como a informática reorganiza o pensamento. O autor esclarece que não apenas a informática, mas também outras tecnologias – oralidade, escrita, lápis e papel – exerceram e exercem, ao longo da história humana, papéis importantes na produção do conhecimento. Contrário à visão dicotômica entre técnica e ser humano, Borba defende que:

(19)

mesmo tempo em que enfatizava a noção de que produção de conhecimento é um processo interno do ser humano. (BORBA, 2001, p.137)

Em sua linha argumentativa, o autor em questão salienta que, se pensarmos na oralidade e no lápis/papel da mesma forma como pensamos na informática, será possível constatar a função oculta que cabe a estes suportes. Para o autor, então, é possível concluir que lápis e papel são tecnologias também, já que estendem a memória.

Por essas razões, Goos et al (2003) consideram a tecnologia um dos vários tipos de ferramentas culturais que não só ampliam, mas também reorganizam processos cognitivos por meio da sua integração nas práticas sociais e discursivas de uma comunidade do conhecimento.

Ao analisar o papel desempenhado pela tecnologia no desenvolvimento cognitivo, sobretudo no desenvolvimento do pensamento matemático, Frota e Borges (2004) teorizaram três diferentes aspectos sobre o uso das tecnologias nas práticas educacionais, a saber: i) consumir; ii) incorporar; iii) matematizar.

No que concerne à primeira abordagem (consumir tecnologia), essa concepção relaciona-se aos argumentos que essencialmente sustentam serem as novas tecnologias e as TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação) recursos poderosos para ensinar e aprender Matemática (FROTA e BORGES, 2004). Entretanto, o consumo de tecnologia não necessariamente implica em uma mudança de comportamento de ensino-aprendizagem por parte dos professores e alunos.

A tecnologia, neste sentido, pode ser utilizada apenas como um instrumento, isto é, uma maneira de tornar menos enfadonhos os diversos cálculos necessários para o desenvolvimento de uma determinada tarefa, permitindo ao aluno concentrar seus esforços na proposta da atividade. No entanto, as práticas em sala de aula, em certo nível, permanecem as mesmas: a esse entendimento, os autores denominaram “consumir tecnologia para automatizar as tarefas”. Em extensão, Goos et al (2003) criaram uma metáfora para descrever esse tipo de uso de tecnologia – “Tecnologia como Serva” – e esclarecem que é serva quando usada como uma substituição rápida e confiável para os cálculos mentais ou com lápis e papel, mas sem qualquer criatividade para mudar a natureza das atividades.

Valente chama a atenção para esse fato e argumenta que:

(20)

informatizadas. Mas, a abordagem educacional ainda é, na sua grande maioria, a tradicional. (VALENTE, 1999, p.18)

A segunda concepção (incorporar tecnologia) está relacionada à modificação das formas de fazer Matemática. Em outras palavras, surgem novas maneiras de pensar e resolver problemas à medida que a tecnologia vai sendo incorporada pelo acúmulo de experiências em seu uso (MIRANDA e FROTA, 2007). Nesse contexto, professores e alunos vislumbram, no uso das tecnologias, novas possibilidades de fazer Matemática. O uso de calculadoras gráficas, softwares geométricos, planilhas de cálculos, entre outros, incorporam o ferramental matemático, propiciando-lhes novas formas de pensar e resolver problemas. Todavia, esse nível de uso de tecnologias exige uma destreza em relação à sua manipulação. Ao atingir tal nível de entendimento, o usuário terá novos recursos que ampliam as possibilidades de fazer Matemática para além daquelas com a utilização de lápis e papel.

Semelhante assertiva é estabelecida por Goos et al (2003), ao afirmarem que ocorre uma reorganização cognitiva quando a interação dos alunos com a tecnologia, a qual, como um novo sistema semiótico, transforma qualitativamente seu pensamento. Exemplificam dizendo que o uso de planilhas eletrônicas e softwares gráficos pode alterar o privilégio tradicional que é dado ao raciocínio algébrico em detrimento do raciocínio proporcionado pela visualização gráfica ou análise numérica. Assim, o aprendizado torna-se um processo de apropriação de ferramentas que mudam a maneira pela qual os indivíduos formulam e resolvem problemas. Esse entendimento sobre o uso de tecnologias corresponde a considerar a Tecnologia como Parceira - uma metáfora identificada pelos autores.

A concepção “incorporar tecnologia” pode ser entendida, na visão de Oliveira (2009), como parte integrante de uma estratégia pedagógica concebida pelo professor, de forma crítica e reflexiva, e indica quatro níveis pelos quais os docentes precisam passar para utilizar, de forma crítica, as tecnologias em suas práticas. Santos (2010, p.43), referindo-se ao trabalho de Oliveira, sintetiza esses níveis da seguinte forma:

• apropriação das interfaces e dos recursos, desenvolvendo fluência na manipulação das ferramentas;

• inclusão das tecnologias como partes integrantes do fazer didático;

• exploração dos elementos matemáticos envolvidos nos problemas e nos contextos trabalhados em sala de aula, do ponto de vista do desenvolvimento de tecnologias;

(21)

estudantes e ao conteúdo matemático (essa dimensão permite empregar, de forma integrada, as anteriores).

Acrescenta ainda que:

Para Oliveira (2009), estas quatro concepções podem representar um ciclo – e deveriam fazê-lo, idealmente – de modo que o professor de Matemática transite de uma para a outra à medida que refina seu entendimento teórico-prático sobre uso das tecnologias em seu trabalho. Segundo o autor, à medida que avança na apropriação destes níveis e dos conhecimentos correspondentes, o ciclo se repete, em uma instância superior. (SANTOS, 2010, p. 43)

O quadro abaixo, extraído do trabalho de Santos (2010), ilustra a interação entre as quatro fases descritas acima:

Figura 1 Ciclo de uso de tecnologias por professores de Matemática – Fonte: Santos, 2010

(22)

Por serem abstratos, os conceitos matemáticos necessitam de um meio para serem representados e manipulados. O lápis e o papel foram, por longo tempo, e continuam sendo, importantes instrumentos com essa finalidade, por viabilizarem a visualização dos objetos matemáticos – ou seja, não dos objetos eles mesmos, mas de suas representações (DUVAL, 2003). Dessa forma, podem-se entender esses instrumentos como uma interface entre o mundo da Matemática e o sistema cognitivo. Como relata Lévy, a “interface contribui para definir o modo de captura da informação” (LÉVY, 2008a, p. 180).

Podemos, então, dizer que o lápis e papel, ou instrumentos afins, proporcionam meios específicos à captura dos conceitos matemáticos. De posse desse pensamento, seria insensato supor que a obtenção do conhecimento ocorre da mesma forma em diferentes interfaces. Nesse sentido, Lévy afirma que seria ilusão:

crer que haveria ‘conhecimentos’ ou ‘informações’ estáveis que poderiam mudar de suporte, ser representados de outra forma ou simplesmente viajar guardando ao mesmo tempo sua identidade. Ilusão, porque aquilo sobre o que versam as teorias do conhecimento: saberes, informações e significações são precisamente efeitos de suportes, conexões, proximidades, interfaces. (LÉVY, 2008a, p. 184)

Com esse entendimento, concordamos com a visão de Goos et al (2003) ao afirmarem que ocorre uma reorganização cognitiva quando a interação dos alunos com a tecnologia, como um novo sistema semiótico, qualitativamente transforma seu pensamento. Concluímos, assim, que a concepção “incorporar a tecnologia” implica necessariamente uma mudança no modo de “fazer”, aprender e ensinar Matemática.

O terceiro aspecto (matematizar a tecnologia) coloca a tecnologia em uma perspectiva diferenciada: “nessa concepção a tecnologia pode ser incorporada à Educação Matemática, não como recurso ou ferramenta material ou simbólica, mas como um objeto curricular de Matemática valioso em si e por si mesmo” (FROTA e BORGES, 2004).

Esse aspecto consiste em descrever a Matemática subjacente ao desenvolvimento tecnológico e implica no “desenvolvimento da capacidade de projetar tecnologias e de adaptar a Matemática disponível para resolver problemas reais e concretos, ou projetar processos que criarão novas realidades sociais” (FROTA e BORGES, 2004).

Segundo os autores, essa concepção entende tecnologia como parcialmente decorrente da Matemática e, ao mesmo tempo, impulsionando seu desenvolvimento, estabelecendo-se assim uma relação intrínseca entre ambas.

(23)

A Matemática é o sustentáculo lógico do processamento da informação, e o processamento matemático é também a base para as atuais aplicações da tecnologia da informação. De fato, todas as aplicações de um computador podem ser vistas como uma aplicação de um modelo matemático simples ou complexo. (SKOVSMOSE, 2008, p. 77).

O autor afirma ainda que não teríamos uma sociedade como a atual, altamente tecnológica, caso subtraíssemos da nossa sociedade o convívio com o conhecimento matemático.

Esse escritor, no entanto, amplia esta visão de Matemática como apenas um baluarte para o desenvolvimento tecnológico e entende que matematizar significa, “em princípio, formular, criticar e desenvolver maneiras de entender; conseqüentemente, a matematização deve ter um papel importante no processo educacional” (SKOVSMOSE, 2008, p. 26). Para ele a matematização implica em reflexões, não somente desenvolvimento de modelos matemáticos que tenham alguma aplicação prática. Trataremos melhor dessa questão no capítulo 3 deste trabalho.

Balizados pelos trabalhos de Frota e Borges (2004) e Goos et al (2003), descreveremos a seguir, de forma sucinta, alguns trabalhos que interligam a Educação Matemática e a tecnologia, possuindo, assim, algumas adjacências com o tema desta pesquisa. Procuraremos evidenciar qual a concepção sobre o uso de tecnologias que permeia o desenvolvimento destes trabalhos. Esta análise é importante, pois nos mostra a pouca ênfase que tem sido dada à matematização da tecnologia, e, conseqüentemente, à necessidade do desenvolvimento de trabalhos que possibilitem essa abordagem.

1.2 Trabalhos Correlatos

Santos (2008), ao propor uma integração do ensino de geometria analítica com a utilização de tecnologias digitais, mais precisamente com a introdução do software GrafEq2, elaborou um tutorial de uso do programa na forma de páginas para web, e um conjunto de atividades envolvendo tópicos da disciplina em estudo, objetivando responder à seguinte questão: “A manipulação de igualdades e desigualdades no GrafEq, verificando suas representações no plano cartesiano, ajudará aos estudantes na apropriação da linguagem algébrica representativa de situações no plano? Quais problemas ou atividades serão geradores desta situação de aprendizagem?”

2 O GrafEq é um Software livre produzido por Pedagoguery Software Inc., no Canadá. Está disponível para

(24)

Seu estudo fundamentou-se nas teorias de James J. Kaput, que abordam a introdução das tecnologias digitais na Educação Matemática.

Na tentativa de responder a pergunta norteadora de seu trabalho, o pesquisador, também professor dos estudantes envolvidos na experiência, criou atividades com a intenção de desenvolver e utilizar o raciocínio lógico para testar e validar suas hipóteses. A dinâmica interativa que permeou o trabalho foi a manipulação dos objetos algébricos com instantânea visualização das representações geométricas. O GrafEq ofereceu a possibilidade de alteração das equações já utilizadas, permitindo ao aluno rever, durante suas construções, a representação que mais se ajustava à solução do problema.

Entretanto, Santos (2008) enfatiza que os conteúdos curriculares não foram abandonados, apenas a forma tradicional de trabalhar com eles, criando novas perspectivas de aprendizado. Afirma que o uso do GrafEq proporcionou a aquisição de conceitos em Geometria Analítica, ampliando a percepção dos estudantes sobre os objetos algébricos, geométricos e a equivalência entre eles; além disso, ofereceu diferentes formas de visualizar uma situação-problema. Entre os fatores benéficos aos estudantes, cabe ressaltar a apropriação da tecnologia para aprender Matemática, a disseminação da cultura informática e a apropriação da escrita em Matemática.

Neste aspecto, nossa investigação adota perspectiva convergente a de Santos, já que compactua com a proposta dos PCNs (2006), ao estabelecer uma relação entre Matemática e tecnologia, propondo uma formação escolar que contemple a Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática. Pode-se dizer, ainda, que a abordagem proposta por Santos buscou proporcionar incorporação de tecnologias, no sentido descrito por Frota e Borges (2004), já que o autor desenvolveu novas estratégias pedagógicas possibilitadas pela inserção da tecnologia em suas aulas.

Trabalhando com alunos do 1º ano do Ensino Médio, Faria (2007) desenvolveu uma pesquisa que abordou a elaboração e a leitura de gráficos cartesianos que expressam movimento, em particular o retilíneo, traçando um paralelo entre as representações com lápis e papel e aquelas com sensor e calculadora gráfica. Nessa pesquisa, pediu aos educandos que fizessem um gráfico retilíneo, apresentando a trajetória feita por um garoto que andou de sua casa até a escola.

(25)

implicações que distintas disposições de símbolos e gráficos acarretam na produção de significados pelos alunos.

Inicialmente, cada grupo pôde utilizar apenas lápis, papel e régua. Durante a confecção do gráfico, foi percebida a dificuldade de relacionar o movimento com sua representação gráfica cartesiana. As opiniões dos próprios alunos do grupo foram diferentes. Nenhuma solução comum foi encontrada para o problema.

No segundo momento, foi entregue um sensor e uma calculadora gráfica a cada um dos grupos. Munidos destes equipamentos, os alunos simularam o trajeto percorrido pela personagem, obtendo, assim, a representação gráfica de seus movimentos na tela da calculadora. Ao compararem este gráfico com aquele produzido sem o auxílio dos artefatos mencionados, puderam identificar os erros cometidos. Tal situação levou os estudantes a compreender os conceitos de origem, referencial, repouso e velocidade do movimento.

O pesquisador, então, percebeu a importância das interações ocorridas entre aluno-aluno, aluno-professor e aluno-tecnologia. A curiosidade de conhecer o aparelho despertou a vontade de aprender, e o uso de diferentes instrumentos tecnológicos trouxe à tona questões que fizeram o aluno ver o mesmo problema de várias formas. Para o autor, os educandos mostraram-se independentes do professor, pois a própria calculadora permitiu a percepção das inadequações cometidas, tornando-se motivadora, assumindo um importante papel no aprendizado. Faria (2007) acredita na importância da utilização de outras tecnologias e sugere o uso de softwares na resolução de determinados problemas ou questões.

Em análise convergente, Goos et al (2003) tomaram como foco de estudo as interações entre professores e alunos, entre os próprios alunos, e entre pessoas e tecnologias. A partir destes pressupostos, teorizaram papéis para a tecnologia em relação ao ensino e aprendizado, quais sejam: mestre, serva, parceira e extensão de si mesmo. Diante das metáforas identificadas pelos autores, poder-se-ia dizer que Faria (2007) utilizou a tecnologia como parceira. Essa metáfora descreve o estágio em que a tecnologia é usada criativamente na Educação Matemática, para facilitar o entendimento ou explorar diferentes perspectivas.

Nobre (2005) abordou o uso do software Matlab3 e algumas de suas aplicações no estudo de Álgebra Linear, especialmente equações lineares e álgebra matricial.

Em seu trabalho, o autor busca esclarecer de que forma o uso de softwares pode auxiliar o aluno em seu processo de construção do conhecimento. Para tanto, deu ênfase ao

3 Matlab é um ambiente para desenvolvimentos matemáticos, numéricos ou simbólicos, com recursos gráficos.

(26)

uso do Matlab como ferramenta didática, descrevendo alguns passos sobre sua utilização por meio de seqüência didáticas. Em função disto, menciona a tecnologia como indispensável e irreversível devido à diversidade de suas aplicações e acrescenta que:

A importância da álgebra linear nas aplicações tem crescido de modo diretamente proporcional ao crescimento do poder computacional, onde cada geração de

software desencadeia uma demanda de novas funções. Na atualidade, cientistas, matemáticos e engenheiros trabalham com problemas muito complexos, e a álgebra linear tem grande potencial tanto nas áreas científicas quanto de negócios, alguns exemplos podem ser vistos na exploração de petróleo, na programação linear, em circuitos eletrônicos, entre outros. (NOBRE, 2005, p.1)

Concordamos com a visão de Nobre (2005), ao citar a tecnologia como indispensável e irreversível e mais ainda, a álgebra linear como conhecimento necessário para o desenvolvimento tecnológico. Este pensamento leva, no âmbito da investigação aqui relatada, a compreender a necessidade de incorporar a matematização da informática, como descrito no início deste capítulo, nas práticas educacionais.

Para o autor, a escola deve munir-se de recursos tecnológicos, que devem ser usados na formação inicial e continuada do professor. Nobre (2005) conclui que as tecnologias enriquecem o ensino da Matemática, valorizam a abordagem experimental de conceitos e oferecem novas perspectivas de linguagens, mas para isso torna-se imprescindível que toda a ação seja planejada e que os objetivos a serem atingidos estejam implícitos em cada tarefa sugerida. Salienta ainda que incorporar o ambiente eletrônico à rotina escolar não significa uma adesão, mesmo porque é necessário recebê-lo criticamente, conhecer suas vantagens e desvantagens, seus riscos e suas possibilidades, para assim, transformá-lo em ferramenta pedagógica.

Fortes (2007) buscou investigar se o uso da robótica poderia ajudar os alunos a resolver suas principais dificuldades quanto à confecção e à interpretação de gráficos cartesianos, principalmente aqueles em que uma das variáveis é dependente do tempo.

(27)

Foram desenvolvidas três atividades com uma turma da 8ª série do ensino fundamental e uma do 1º ano do ensino médio, utilizando o material de robótica LEGO e o software

Robolab4.

A autora concebeu, como primeira atividade, a tarefa de construir um carrinho com o LEGO, fazê-lo movimentar-se e analisar o tipo de gráfico gerado pelo software para esse movimento. A segunda atividade solicitava a construção de um carrinho e sua movimentação de acordo com os deslocamentos descritos em gráficos já prontos. Como terceira atividade, a autora propôs construir um carrinho e, usando sensores de luminosidade e de toque, além do

software mencionado, fazer um radar que emite um sinal quando o objeto anda com uma velocidade acima da pré-estabelecida.

No decorrer das atividades, ficou comprovada a dificuldade dos discentes na compreensão dos parâmetros do gráfico, como, por exemplo, inclinação da reta e área, e o que significavam em situações reais. Alguns fizeram associações erradas, acreditaram que a inclinação da reta, do gráfico distância X tempo, representava a inclinação do plano inclinado em que o carrinho realizava seu movimento. Os educandos do Ensino Médio mostraram mais facilidade em interpretar os gráficos por terem maior embasamento teórico em Física e Matemática.

Os alunos puderam compreender melhor como cada aspecto do movimento é determinado graficamente devido à resposta gráfica imediata dada pelo conjunto (lego e

software). De uma forma geral, apresentaram-se muito interessados na utilização da tecnologia recém-apresentada, principalmente na confecção dos carrinhos. Alguns alunos chegaram a acrescentar tarefas que não estavam previstas inicialmente.

Em determinados momentos das atividades, os alunos foram levados a programar o movimento dos robôs na linguagem Logo. Tal programação, evidentemente, exige conhecimentos matemáticos. Com isso, os alunos perceberam a necessidade da Matemática para dar movimento aos robôs – em síntese, eles matematizaram a tecnologia, conforme argumentam Frota e Borges (2004).

Richit (2006) apresenta, em sua pesquisa, a descrição e a análise de como trabalhar com projetos em Geometria Analítica usando software de geometria dinâmica para favorecer a formação de futuros professores de Matemática.

4 O programa ROBOLAB é uma linguagem de programação, que utiliza uma interface gráfica, baseada em

(28)

Fundamentada no construcionismo de Papert, que propõe a realização e a construção do conhecimento a partir da interação do indivíduo com o computador, a teoria apresenta o educando como agente do processo educativo, o professor como estimulador da investigação e reflexão e as mídias como mediadoras no processo de aprendizado.

A autora ressalta a importância de introduzir na grade curricular dos cursos de licenciatura atividades e disciplinas pedagógicas que visem ao desenvolvimento de projetos com uma abordagem em conteúdos específicos e ao uso de tecnologias, com a finalidade de proporcionar experiências do cotidiano escolar durante a formação docente.

Baseada nos princípios citados no parágrafo anterior, a pesquisadora desenvolveu um projeto na disciplina de Geometria Analítica utilizando o software Geometricks5 com um grupo de licenciandos do curso de Matemática. Os alunos exploraram e utilizaram recursos distintos na execução das construções, substituindo-as por outras quando o resultado não era satisfatório. O software facilitou o desenvolvimento das atividades quanto a representações geométricas; porém, apresentou limitações na análise de algumas propriedades das construções, sendo necessária a utilização de lápis, papel e calculadora.

Segundo Richit (2006), o desenvolvimento de projetos com auxílio de tecnologia embasada no Construcionismo, durante a formação do professor, proporciona experiências pedagógicas que auxiliarão o docente em suas aulas. Para ela, a visualização de conceitos e propriedades proporcionada pelo Geometricks despertou o interesse do aluno, promoveu maior aprofundamento dos conteúdos de Geometria Analítica, a construção do conhecimento em virtude das demonstrações oferecidas pelo software, bem como o domínio dos recursos tecnológicos que foram utilizados.

Tendo em vista as dificuldades que alunos apresentam para entender Álgebra Linear, França (2007) baseou sua pesquisa em como a geometria dinâmica pode ajudar os alunos a assimilar conceitos fundamentais como vetores e coordenadas, dependência linear, base e transformações lineares. A autora utiliza o software Cabri-Géomètre II6 como ferramenta didática, podendo, assim, proporcionar uma abordagem diferente da convencional. Ela fundamenta a pesquisa nos Registros de Representação Semiótica de Duval, cujo objetivo é estudar o funcionamento cognitivo do sujeito em uma atividade Matemática, em que a maneira de raciocinar e visualizar está intrinsecamente ligada às representações semióticas, e

5 Software de geometria dinâmica, desenvolvido por Viggo Sadolin da The Royal of Educational Studies.

Disponível em http://www.igce.unesp.br/pgem/gpimem.html.

6 Cabri-Geometry é um software de construção em geometria desenvolvido pelo Institut d'Informatiqe et de

(29)

na Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud, baseada na formação e no desenvolvimento de conceitos – o que ocorre de forma interligada a vários conceitos e em muitas situações – tendo como objetivo discutir o comportamento cognitivo do indivíduo nas situações de aprendizado.

A pesquisa foi realizada com uma turma de alunos do curso de licenciatura em Matemática de uma universidade particular de São Paulo, matriculados na disciplina Geometria das Transformações. Todos eles já tinham familiaridade com o software Cabri-Géomètre e haviam cursado a disciplina de Álgebra Linear.

Foi construída uma seqüência composta de três blocos de atividades: o primeiro abordando os assuntos vetores e coordenadas de vetores; o segundo, dependência linear e base; e o terceiro, transformações lineares. Os estudantes apresentaram, de forma geral, uma evolução significativa, tendo alcançado um domínio mais amplo das representações gráfica, algébrica e geométrica, assim como das conversões em ambos os sentidos. O ambiente diferenciado possibilitou aos alunos o confronto com as formulações erradas e fez que buscassem estratégias para resolver os problemas encontrados. Para a autora, as mudanças mais positivas que os sujeitos apresentaram foram a melhor compreensão de conceitos importantes da Álgebra Linear e uma maior habilidade para realizar conversões do registro algébrico para o geométrico e vice-versa.

A revisão bibliográfica aqui apresentada expõe a existência de pesquisas que evidenciam as diferentes concepções sobre o uso de tecnologia: consumir, incorporar e matematizar. No entanto, deixa claro que não houve, ao menos entre os trabalhos estudados, nenhuma abordagem que objetivasse o estudo sobre a matematização da informática como estratégia de ensino. Tampouco encontramos estudos com o foco na compreensão do papel da Matemática como conhecimento necessário para o desenvolvimento tecnológico.

(30)

2. SOBRE TÉCNICA E TECNOLOGIA EM UMA PESQUISA DE

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

A investigação empreendida neste trabalho perpassa por uma análise que compreende as interações entre sociedade, educação e tecnologia, deste modo, torna-se imprescindível, entender os conceitos em questão. Neste capítulo, abordaremos o conceito de técnica e tecnologia, bem como suas implicações à sociedade contemporânea

2.1 Técnica, evolução e modernidade

Ao contrario do que concebe o senso comum, a técnica não nasce com o mundo moderno; é na verdade a técnica uma realidade intrínseca ao ser humano, ou seja, trata-se de um aspecto inseparável do “modo de ser” do “espírito” do homem. Como disse Oswald Spengler em sua obra “o homem e a técnica”:

“Na existência do homem a técnica é consciente, voluntária, suscetível de modificação, pessoal, imaginativa e inventiva.”7

Contudo, antes de um aprofundamento no sentido antropológico da técnica, faz-se mister explanar as questões etimológicas pertinentes à palavra “técnica”. “Técnica” deriva do grego “téchnè” que segundo Abbagnano coincide com o sentido geral de “Arte”. O filósofo Aristóteles, na antiga Grécia já tratava do tema concebendo a téchnè como algo amplo, que não englobava apenas a matéria/natureza utilizadas na transformação do mundo, nem apenas as ferramentas com as quais se efetuava a transformação, mas que unia a essas também o sujeito produtor/criador. (ABBAGNANO, 2003, p.1106).

Em sociedades culturalmente envolvidas numa amálgama metafísico-religiosa, ou seja, em cosmologias, como foi, por exemplo, a sociedade da Grécia antiga, por vezes, a técnica se distinguia da natureza, segundo o sociólogo alemão Niklas Luhmann, “no sentido grego a técnica tem características lesivas à ordem natural em si, de insistir na habilidade humana contra a natureza em si que vem a ser por si mesma.” (LUHMANN, 2007, p. 410-411).

Desse modo tudo nos leva a entender a técnica como algo artificial. Diferentemente da concepção grega, a contra-conceituação cristã (que sucedeu historicamente a primeira) libera o conceito de técnica entendendo-a como imitação de leis da natureza. Tal transformação semântica já iniciada na Idade Média repercutiu posteriormente no modo com o qual os primeiros pensadores passaram a interpretar a relação entre o homem e a natureza, a qual,

(31)

longe de ser uma mera postura de admiração religiosa mostrou-se como relação prática/pragmática/manipuladora.

No século XVII, na Inglaterra, Francis Bacon escreveu em seu famoso “Novum Organum”: “O homem, ministro e intérprete da natureza, faz e entende tanto quanto constata, pela observação dos fatos ou pelo trabalho da mente, sobre a ordem da natureza [...]” (BACON, 1999, p. 33)

Em Bacon está claro o pensamento do início da época moderna, de um homem que não apenas observa, mas que além de observar, age na natureza, transformando-a por meio de instrumentos desenvolvidos para tal. Na modernidade, a técnica passou a ser ligada à aplicação do saber natural para fins humanos, entretanto há que se ressaltar que “a ação humana de milênios já incorporou o meio ambiente natural na sociedade, tornando-nos de forma concreta e simbólica, parte inseparável desse meio ambiente” (CASTELLS, 2009, p. 52). Castells nos leva a extinguir a dicotomia homem-natureza, desta forma, quando Bacon fala da ação humana sobre a natureza, pode-se interpretar segundo a visão do autor espanhol, que está falando da ação do homem sobre si mesmo.

De acordo com o pensador alemão Arnold Gehlen, (ABBAGNANO, 2003, p. 1106), “a técnica nasce da carência de apetrechamento do homem, que precisa de instrumentos para:”

a) substituir órgãos e capacidades de que é isento; b) potencializar órgãos e capacidade já existentes; c) aliviar o trabalho dos vários órgãos.

Analisando de forma simplista a visão de Gehlen, poder-se-ia dizer que a técnica propicia a criação de instrumentos que permitem ao homem fazer coisas que não faria sem eles. Castells, (2009, p.75) reforça esta idéia falando em expansão e aumento da força do corpo humano, possibilitada pelas invenções tecnológicas e vai, além disso, falando não apenas da expansão do corpo, mas também da mente humana. Mais adiante, ao analisar os trabalhos de Lévy falaremos mais sobre esta última expansão.

(32)

surgidos por decorrência do processo evolutivo se tornaram em algo característico da sociedade moderna.

Similarmente a Gehlen, Niklas Luhmann (2007) expõe que a técnica e a sociedade moderna (não o homem, como para Gehlen) produziram entre si uma relação que jamais poderá ser dissolvida; a sociedade moderna tornou-se dependente da técnica, ou melhor, evoluiu e desenvolveu-se com esta. Não apenas Gehlen e Luhmann, mas também autores tais como Pierre Lévy (2008a, 2008b, 2010), Manuel Castells (2009) e Skovsmose (2007, 2008) possuem uma visão em comum no que concerne ao forte vínculo entre a sociedade atual e a técnica. Castells afirma que “a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas” (CASTELLS, 2009, p. 43). Segundo Lévy (2008b), é apenas por meio da técnica que se abrem algumas das inúmeras possibilidades e opções culturais e sociais averiguadas na sociedade atual.

Enveredando-se pela linha de pensamento de Lévy entendemos que “de fato as técnicas carregam consigo projetos, esquemas imaginários, implicações sociais e culturais bastante variados. Sua presença e uso em lugar e época determinados cristalizam relações de força sempre diferentes entre seres humanos.” (LÉVY, 2008b, p. 23). Segundo o autor, essa concepção bem estimada de técnica significa que “não podemos falar dos efeitos sócio-culturais ou do sentido da técnica em geral, como tendem a fazer os discípulos de Heidegger, ou mesmo a tradição saída da Escola de Frankfurt.” (LÉVY, 2008b, p. 23).

Lévy faz acertadamente tal observação. Primeiramente é de conhecimento comum o fato do grande alvo da Escola de Frankfurt ser a crítica à sociedade burguesa na qual se dão os fenômenos massificadores e da indústria cultural. Tal perspectiva é incorporada especialmente por Theodor W. Adorno e Max Horkheimer. Para ambos a técnica, entendida especialmente como aplicação da “razão instrumental”, está por trás do desencadeamento e fomento de tais fenômenos negativos.

Um texto bastante conhecido destes filósofos é a “Dialética do Esclarecimento”, na qual é feita uma reconstrução crítica da evolução do racionalismo iluminista e seus impactos na modernidade. Por outro lado, Lévy também cita a perspectiva de Martin Heidegger, que rotula nosso tempo e o pensamento cibernético como expressões agudas de uma era na qual o “ser” foi completamente esquecido graças ao obscurecimento gerado pelo pensamento metafísico moderno inaugurado por Descarte.

(33)

Na época atual, a técnica é uma das dimensões fundamentais onde está em jogo a transformação do mundo humano por ele mesmo. A incidência cada vez mais pregnante das realidades tecno-econômicas sobre todos os aspectos da vida social, e também os deslocamentos menos visíveis que ocorrem na esfera intelectual obrigam-nos a reconhecer a técnica como um dos mais importantes temas filosóficos e políticos de nosso tempo. (LÉVY, 2008a, p. 7)

Ou seja, a técnica altera substancialmente todos os âmbitos da sociedade, conseqüentemente, isso coloca-nos diante de questões filosóficas novas. Recorrendo a Kant, em sua “Crítica da Razão Pura”, há uma distinção básica de ordem epistemológica “entre um domínio empírico (aquilo que é percebido, que constitui a experiência) e um domínio transcendental (aquilo através de que a experiência é possível, que estrutura a percepção)” (LÉVY, 2008a, p.14), ou segundo o próprio Kant, o “a posteriori” e o “a priori”. Kant atribui esta função de estruturação do mundo percebido a um sujeito transcendental a-histórico e invariável.

Levy, no entanto, superara a perspectiva kantiana do sujeito transcendental operando uma verdadeira transição de paradigma. Para Lévy:

Hoje ainda que características cognitivas universais sejam reconhecidas para toda espécie humana, geralmente pensa-se que formas de conhecer, de pensar, de sentir são grandemente condicionadas pela época, cultura e circunstancias. Chamaremos de “transcendental histórico” aquilo que estrutura a experiência dos membros de uma determinada coletividade. (LÉVY, 2008a, p. 14)

Com isso, deixa claro que em sua concepção, também o sujeito perde espaço como figura central do quadro epistêmico na sociedade moderna. Para conectar a idéia de técnica e coletividade podemos dizer que “a técnica em geral não é nem boa, nem má, nem neutra, nem necessária, nem invencível. É uma dimensão, recontada pela mente, de um devir coletivo, heterogêneo e complexo na cidade do mundo” (LÉVY, 2008a, p. 194).

(34)

O autor quer ir além do sujeito e do objeto, para tanto, baseia sua proposta numa série de trabalhos de filósofos e pensadores de extrema relevância, em especial no cenário acadêmico francês. O próprio Lévy confessa que suas idéias:

Vão de encontro a uma tendência da filosofia francesa que está representada, hoje, por Gilles Deleuze e Michel Serres. Estes autores radicalizaram o protomaterialismo empedocleano das misturas, o monismo naturalista de um Spinoza ou o pluralismo infinitista de um Leibniz. (LÉVY, 2008a, p.136)

O autor Francês declara ainda que na obra “Mil e Um Platôs”, “Deleuze e Guattari descrevem os “rizomas” que se estendem sobre um imenso “plano de consistência”, transgredindo todas as classificações arborescentes e conectando extratos do ser totalmente heterogêneos. As multiplicidades e os processos moleculares opõem-se às forças unificadoras”. (LÉVY, 2008, p. 136). Tais idéias desses filósofos franceses coadunam-se com as propostas de Lévy em suas características gerais. No mesmo sentido, Michel Serres, em sua obra “O Parasita”,

[...] utiliza as mesmas palavras para falar das relações humanas e das coisas do mundo. Ainda que os dois domínios encontrem-se habitualmente separados e sejam estudados por ciências diferentes, em ambos os casos trata-se de comunicações, interceptações, traduções, transformações efetuadas sobre mensagens, “parasitas”. Ao ser analisada, toda entidade revela-se como uma rede em potencial. (SERRES, 1993 apud LÉVY, 2008a, p. 136)

Lévy segue mencionando Serres ao afirmar que na obra “Statues”, este autor explora novamente

Os intermediários e as relações recíprocos entre sujeito e objetos. Mostra como através da múmia, do cadáver e dos ossos, o objeto nasce do sujeito, e como inversamente, o sujeito coletivo está fundado sobre as coisas e mistura-se a elas. Ele atinge uma filosofia do conhecimento objetal, que se opõe à vulgata kantiana segundo a qual o sujeito transcendental imporia suas formas a priori sobre qualquer experiência e deteria a chave da epistemologia. (LÉVY, 2008a, p. 136)

Também,

(35)

Para fundamentar seus estudos e conclusões, o autor cita os trabalhos de Bruno Latour. Para ele, Latour e a nova escola de antropologia das ciências mostram o papel essencial das circunstâncias e das interações sociais em todos os processos intelectuais, até mesmo, ou, sobretudo, quando se trata de pensamento formal ou cientifico. Nesse sentido, segue Lévy sobre o pensamento de Latour:

Nenhuma essência, nenhuma substância é aceita por Latour, que mostra através da investigação histórica ou etnográfica como instituições mais respeitáveis, os fatos científicos mais concretos ou os objetos técnicos mais funcionais foram, na realidade, resultado provisório de associações contingentes e heterogêneas. (LÉVY, 2008a, p. 137)

Observe-se que também Latour rompe radicalmente com o paradigma ontológico próprio do pensamento antigo europeu; expõe ainda Lévy na esteira destes filósofos franceses que:

Por trás de qualquer entidade relativamente estável, ele trás à tona a rede agonística impura, heterogênea, que mantém a existência desta entidade. Como os rizomas de Deleuze e Guattari, as redes de Latour ou de Callon não respeitam a distinção entre coisas e pessoas, sujeitos pensantes e objetos pensados, inerte e vivo. Tudo que for capaz de produzir uma diferença em uma rede será considerado como ator, e todo ator define a si mesmo pela diferença que ele produz. (LÉVY, 2008a, p. 137)

É exatamente neste ponto que, segundo Lévy, Latour inova:

Esta concepção do ator nos leva, em particular, a pensar de forma simétrica os homens e os dispositivos técnicos. As máquinas são feitas por homens, elas contribuem para formar e estruturar o funcionamento das sociedades e as aptidões das pessoas, elas muitas vezes efetuam um trabalho que poderia ser feito por pessoas como eu e você. Os dispositivos técnicos são, portanto, realmente atores por completo em uma coletividade que já não podemos dizer puramente humana, mas cuja fronteira está em permanente redefinição. (LÉVY, 2008a, p. 137)

Desse modo está dado, ainda que em síntese, o material teórico necessário para fundamentar tal guinada paradigmática, a qual se mostra mais adequada para descrever a sociedade moderna na qual se perfaz as evoluções obtidas através dos artefatos técnicos.

2.2 Implicações Sociais das Tecnologias de Armazenamento e Recuperação

de Informações na Visão de Levy

(36)

arraigada na idéia do “eterno retorno”; também são marcantes, nesse tipo de sociedade, a presença de narrativas míticas e ritos; outro detalhe pertinente é a grande dependência destas sociedades com a memória psíquica, visto que na ausência da escrita, necessariamente a memória repousa na pessoa e não em escritos.

A ausência da escrita impossibilita a comunicação entre ausentes, ou seja, para que ocorra a comunicação, necessariamente “os parceiros da comunicação encontram-se mergulhados nas mesmas circunstâncias e compartilham hipertextos próximos” (LÉVY, 2008a, p. 127). Evidentemente, a mente humana é debilitada, por isso:

A memória humana está longe de ter a performance de um equipamento ideal de armazenamento e recuperação das informações já que [...] ela é extremamente sensível aos processos elaborativos e à intensidade dos processamentos controlados que acompanham a codificação das representações. (LÉVY, 2008a, p. 81)

Contudo, com a intensificação do uso da escrita como forma de comunicação no sistema social, se dá uma alteração panorâmica no horizonte de possibilidades comunicacionais, ou seja, há um incremento variativo na comunicação; para demonstrar isso, basta observar a abertura das chances do estabelecimento de uma comunicação entre ausentes, como coloca Lévy:

A distância entre os hipertextos do autor e do leitor pode ser muito grande, disto resulta uma pressão em direção à universalidade e à objetividade por parte do emissor, assim como a necessidade de uma atividade interpretativa explícita por parte do receptor. (LÉVY, 2008a, p. 127)

Também, de certo modo, é com a escrita que surge a historicidade social, ou seja, a escrita permite a acumulação de informações e sua conseqüente organização causal.

Segundo Lévy (2008a, p. 127), a memória liberta-se em certa medida da mente humana, e por meio da escrita torna-se semi-objetivada, aspecto este que:

a) permite a “possibilidade de uma crítica ligada a uma separação parcial do individuo e do saber”;

b) torna a “exigência de verdade ligada à identificação parcial do indivíduo e do saber”. Com a escrita, abordamos aqueles que ainda são nossos modos de conhecimento e estilos de temporalidade majoritários. O eterno retorno da oralidade foi substituído pelas longas perspectivas da história. A teoria, a lógica, as sutilezas da interpretação dos textos foram acrescentadas às narrativas míticas no arsenal do saber humano. (LÉVY, 2008a, p. 87)

(37)

seja, desde seu surgimento dentro da religião, a escrita esteve sempre sob o domínio de uma determinada classe social, em especial a sacerdotal.

Apenas no fim da Idade Média européia, por volta do século XV é inventada a imprensa. Segundo o autor francês,

[...] podemos sustentar que a invenção de Gutenberg permitiu que um novo estilo cognitivo se instaurasse. A inspeção silenciosa de mapas, de esquemas, de gráficos, de tabelas, de dicionários encontra-se a partir de então no centro da atividade científica. Passamos da discussão verbal, tão característica dos hábitos intelectuais da Idade Média, à demonstração visual, mais que nunca em uso nos dias atuais em artigos científicos e na prática cotidiana dos laboratórios, graças a estes novos instrumentos de visualização, os computadores. (LÉVY, 2008a, p. 99)

Podemos dizer que a imprensa foi um dos artefatos técnicos mais importantes inventados, pois por meio dela diversas transições estruturais, em especial no sistema científico da sociedade, fizeram-se possíveis. Isso, não significa dizer que esse artefato técnico tenha determinado a evolução da sociedade européia, como pondera Lévy:

A prensa de Gutenberg não determinou a crise da reforma, nem o desenvolvimento da moderna ciência européia, tão pouco o crescimento dos ideais iluministas e a força crescente da opinião pública no século XVIII – apenas condicionou-as. Contentou-se em fornecer uma parte indispensável do ambiente global no qual essas formas culturais surgiram. Se, para uma filosofia mecanicista intransigente, um efeito é determinado por suas causas e poderia ser deduzido a partir delas, o simples bom senso sugere que fenômenos culturais e sociais não obedecem a esse esquema. A multiplicidade dos fatores e dos agentes proíbe qualquer cálculo determinista”. (LÉVY, 2008b, p. 26)

Do século XV até a primeira metade do século XX o ocidente passou por um processo de modernização, o qual implicou numa série ainda mais drástica de transição em praticamente todos os âmbitos da sociedade.

Nesse cenário, a imprensa permanece atuante, e aquilo que Lévy (2008b) chama de “pólo da escrita” tem seu apogeu, em especial com a publicação de livros, numa sociedade que passa a tomar cada vez mais contato com a alfabetização, contudo, toda essa gama de possibilidades continua ainda restrita às classes dominantes como a nobreza e a burguesia.

Imagem

Figura 1 – Ciclo de uso de tecnologias por professores de Matemática – Fonte: Santos, 2010
Figura 3 – Tela de cadastro dos documentos
Figura 4 – Tela de cadastro dos termos (palavras-chave)
Figura 6 – Matriz transposta
+4

Referências

Documentos relacionados

39 Segundo Brígido (2001), o modelo de educação por competências, relaciona-se com o novo paradigma da produção - o toyotismo - e considera superado o modelo da qualificação,

Os desfechos a partir de 1967, trouxeram um declínio no seio congregacional e o êxodo de muitos membros para outras ramificações evangélicas; contudo, após a

Todas as amostras de água mostraram-se próprias para o cultivo de organismos aquáticos, uma vez que não apresentaram índices de CTT/100 mL superiores a 2.500; como não há

In this sense, the challenges towards promoting sustainable livestock in Brazil, which has the recovery of degraded pas- tures, comprising intensification and the increase

Tanto do ponto de vista político programático, da intervenção político partidá- ria, quanto do ponto de vista sindical, e aí a questão do peso da estrutura sindical é re-

Os números de competição fornecidos pela Organização deverão figurar em cada uma das portas da frente da viatura, durante toda a prova. A falta de um número de competição

Como uma irrupção para a pós-retomada da produção audiovisual capixaba que aconteceria nos anos 1990, o primeiro ciclo videográfico chega no fim da década de 1980

Em São Jerônimo da Serra foram identificadas rochas pertencentes à Formação Rio do Rasto (Grupo Passa Dois) e as formações Pirambóia, Botucatu e Serra Geral (Grupo São