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2.3 Funções executivas no futebol

2.3.1 Memória de trabalho no futebol

Baddeley e Hitch (1974) consideram que a memória de trabalho compreende um sistema de armazenamento e processamento de informações dinâmico e de capacidade limitada, diferenciando da memória de curto prazo, um sistema de manutenção temporária de informações. Portanto, a memória de trabalho permite o armazenamento temporário de informações, bem como a manipulação de informações de naturezas visuoespaciais e fonológicas necessárias para tarefas cognitivas complexas, como por exemplo, compreensão da linguagem, raciocínio, planejamento e solução de problemas (DIAMOND, 2013).

Durante uma partida de futebol da categoria sub-20 o atleta é levado a utilizar este recurso, quando, por exemplo, tem que realizar uma determinada movimentação solicitada pelo treinador em busca de espaços para ele próprio e para seus companheiros, principalmente para o companheiro de ataque que porta a bola, tornando-se opção de passe e procurando oportunidades de finalização.

Inicialmente, Baddeley e Hitch (1974) consideravam que a memória de trabalho seria um sistema composto por três componentes: o executivo central como o principal componente, atuando como controlador atencional e regulador dos processos cognitivos, sendo auxiliado por dois sistemas de suporte (alça fonológica e esboço visuoespacial), ambos com capacidade limitada e responsáveis pelo processamento e manipulação de informações. A alça fonológica é responsável pela manutenção temporária das informações verbais, e o componente visuoespacial é responsável pela manutenção temporária de informações visuais e espaciais que

permitem, por exemplo, a formulação de um mapa mental (MALLOY-DINIZ et al., 2010).

Baddeley (1996, 2000) ao revisar o modelo acrescentou um quarto componente (retentor episódico) que é responsável pela conexão das informações mantidas temporariamente na memória de trabalho com aquelas provenientes dos sistemas de memória de longo-prazo, integrando os novos conteúdos em uma representação episódica única. O executivo central é fundamental para a memória de trabalho, sendo responsável por: a) focar a atenção em uma informação relevante, inibindo informações irrelevantes; b) coordenar várias atividades cognitivas simultaneamente; c) selecionar e executar planos e estratégias mais eficientes; d) alocar recursos em outras partes da memória de trabalho; e e) buscar informações armazenadas na memória de longo-prazo (UEHARA;.CHARCHAT- FICHMAN; LANDEIRA-FERNANDEZ, 2013).

Em conjunto, os diferentes componentes da memória de trabalho permitem o armazenamento de informações direcionadas a um objetivo específico, como a produção de linguagem verbal, a solução de problemas, o comportamento motor, a leitura e a escrita (MALLOY-DINIZ et al., 2010). Desta forma, a memória de trabalho armazena temporariamente informações que podem ser manipuladas, alteradas ou reorganizadas durante a realização de uma tarefa (MALLOY-DINIZ et al., 2008). Além disso, a memória de trabalho propicia operações mentais que reúnem informações e conhecimentos provenientes da memória de longo prazo aos estímulos ambientais, permitindo sua manipulação e atualização na própria memória de trabalho a fim de adotar estratégias mais eficientes (BADDELEY, 2000; MALLOY- DINIZ et al., 2008).

Especificamente, no futebol, a memória de trabalho pode ser importante para a escolha do posicionamento em campo e mentalização de possíveis estratégias de jogo (VERBURGH et al., 2014). Nesse caso, atletas com uma maior capacidade de memória espacial teriam uma vantagem durante as sequencias do jogo ao recordarem de ações ofensivas e defensivas previamente estabelecidas pelo técnico.

Ainda que haja diferentes definições para memória de trabalho, há um consenso na literatura de que a memória de trabalho é um conjunto de processos e um componente integral de muitas operações cognitivas, que envolvem o armazenamento temporário e a manipulação de informações utilizadas para as

tomadas de decisões complexas da atenção seletiva, nas quais o indivíduo foca a atenção em uma informação relevante em detrimento de outra, considerada irrelevante (BADDELEY, 1998; BADDELEY; ALLEN; HITCH, 2011; BADDELEY, 2012).

Neste estudo, a avaliação da memória de trabalho será realizada através do teste Cubos de Corsi (CORSI, 1973). A tarefa consiste em repetir sequências de toques em cubos numerados na ordem direta (memória de curto prazo) e na ordem inversa (memória de trabalho), sendo que ambas avaliam o componente visuoespacial (ABREU et al., 2016). No presente estudo será analisada apenas a memória de trabalho. O Quadro 2 apresenta a descrição do teste Cubos de Corsi (CORSI, 1973).

QUADRO 2 - Descrição do teste Cubos de Corsi.

Teste Descrição

Cubos de Corsi

Consiste em um teste neuropsicológico em que em sequências de cubos numerados são apresentadas visualmente pelo avaliador a uma velocidade de aproximadamente um cubo por segundo. O teste é realizado em uma base de madeira (225 x 205 mm) com nove blocos idênticos (30 x 30 x 30 mm) e distribuídos de maneira uniforme sobre a base (CORSI, 1973). Em cada cubo é pintado um número compreendido entre um e nove, sendo visível apenas para o avaliador. O avaliado senta-se de frente para o avaliador que apresenta uma sequência de toques nos cubos, que devem ser reproduzidos pelo avaliado imediatamente após o avaliador terminar a sequência. O teste é realizado primeiramente na ordem direta e, em um segundo momento, na ordem inversa. As séries iniciam com dois cubos e progridem aumentando um cubo a cada nova série, sendo realizadas duas tentativas em cada série. O teste é interrompido quando o participante comete erros nas duas tentativas de uma mesma série. O escore total é calculado multiplicando o número de acertos obtidos pelo valor máximo da sequência atingida (CORSI, 1973).

Fonte: Corsi (1973).

Entende-se que no futebol, sobretudo na categoria sub-20, a utilização da memória de trabalho permite uma ampliação do repertório de jogadas do atleta que podem ser aplicadas durante a partida, nas quais o atleta pode perceber a movimentação dos adversários e usar seu repertório para antecipar, conforme seu posicionamento em campo a reação da defesa ou ataque. Entretanto, os estudos realizados até o presente momento não oferecem evidências consistentes quanto à

contribuição desse construto no rendimento tático de atletas de futebol da categoria sub-20. Existem diferenças na medida de memória de trabalho entre os atletas da categoria sub-20 que jogam em clubes grandes e em clubes pequenos? Suprir esta lacuna do conhecimento poderá contribuir para uma melhor compreensão da forma como esse construto se manifesta nesses atletas durante a competição.