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A produc¸˜ao de pol´ımeros na primeira metade do s´eculo XX revolucionou o modo de consumo de materiais da sociedade moderna. Atualmente, os mais diferentes tipos de pol´ımeros s˜ao empregados, desde embalagens at´e em reforc¸os estruturais na engenharia. Tamanha versatilidade se deu em parte pela grande diversidade de suas estruturas moleculares, atrav´es da s´ıntese de copol´ımeros e enxertias. Mais um fator respons´avel pelo sucesso est´a em sua associac¸˜ao com diferentes materiais, sejam eles outros pol´ımeros, como no caso das blendas polim´ericasa, ou algum tipo de reforc¸o, como no caso dos comp´ositos e nanocomp´ositosb. Se no in´ıcio do s´eculo XX o apelo era por novas propriedades mecˆanicas e de processamento, impulsionado pelo crescente mercado de commodities, no fim do s´eculo XX o foco se deslocou para o mercado de especialidades, impelido pela busca de propriedades espec´ıficas e mais

aNome dado `a mistura de pol´ımeros.

bComp´ositos polim´ericos s˜ao misturas heterogˆeneas em que um s´olido (chamado de carga) ´e disperso numa matriz

polim´erica visando-se alterac¸˜ao de suas propriedades. Quando a carga tem dimens˜ao nanom´etrica em pelo menos uma de suas dimens˜oes, diz-se tratar de um nanocomp´osito.

elaboradas. Mais uma vez, o alcance dessas propriedades espec´ıficas se deu em grande parte pela associac¸˜ao de pol´ımeros com outros materiais.2

Diversas func¸˜oes e propriedades que seriam interessantes se apresentadas por um material polim´erico podem ser conferidas por mol´eculas pequenas, s´olidos com es- truturas bi ou tridimensional estendidas ou biomol´eculas contendo centros met´alicos. Destacam-se magnetismo, usado no armazenamento de informac¸˜ao, conduc¸˜ao e su- perconduc¸˜ao el´etrica, eletro e termocromismo, luminescˆencia e cat´alise. Aliando-se estas e outras propriedades dos metais do bloco p, d ou f com a capacidade de pro- cessamento dos pol´ımeros, surge uma nova classe de materiais funcionais chamados de metalopol´ımeros.3, 4

O primeiro metalopol´ımero sintetizado foi o poli(vinilferroceno), em 1955.5 A baixa solubilidade e a dificuldade sint´etica de se manter um metal na cadeia macro- molecular fizeram com que os primeiros estudos focassem a soluc¸˜ao dessas dificul- dades, o que resultou numa literatura voltada para s´ıntese de pol´ımeros baseados no ferroceno e em sililferroceno principalmente.6 A investigac¸˜ao das proprieda- des dos metalopol´ımeros foi deixada para meados da d´ecada de 1990, quando as dificuldades sint´eticas foram superadas atrav´es do desenvolvimento de t´ecnicas de polimerizac¸˜ao compat´ıveis com a presenc¸a de centros met´alicos.3 A partir de ent˜ao, metalopol´ımeros com elevada massa molar, boa solubilidade em solventes comuns e dispon´ıveis em quantidades adequadas ao estudo detalhado de suas propriedades e aplicac¸˜oes permitiram r´apido desenvolvimento da pesquisa nessa ´area, visando-se elaborac¸˜ao de estruturas supramoleculares auto-montadas7 e materiais funcionais. No que tange as aplicac¸˜oes, destacam-se as em materiais condutores e semicon- dutores, foto e eletroluminescentes, fotovoltaicos, l´ıquido-cristalinos, sens´ıveis `a

est´ımulos externos, com alto ´ındice de refrac¸˜ao, exibindo propriedade de ´otica n˜ao- linear e com potenciais aplicac¸˜oes em nanotecnologia.4

A qu´ımica de metais de transic¸˜ao ganhou uma nova forc¸a motriz com o desenvol- vimento de metalopol´ımeros. Pol´ımeros n˜ao s˜ao somente ligantes macromolecula- res, s˜ao tamb´em uma matriz process´avel na qual uma dada propriedade do complexo met´alico pode ser suportada dispensando um solvente l´ıquido. A processabilidade de uma matriz polim´erica deve ser entendida como sua capacidade de ser transformada em filme, revestimento de uma superf´ıcie, membrana, gel ou numa pec¸a, por exem- plo. No caso dos metalopol´ımeros, as propriedades dos centros met´alicos podem ser impregnadas em materiais nesses diferentes formatos. Um exemplo interessante s˜ao os trabalhos de Forster e colaboradores em que a eletroquimioluminescˆencia do complexo [Ru(bipy)2]2+ imobilizado em poli(4-vinilpiridina) na formac¸˜ao do meta-

lopol´ımero [Ru(bipy)2(P4VP)10]2+passa a ter eficiˆencia aumentada em quase quatro

vezes quando comparada com medidas em soluc¸˜ao.8 Recentemente, a adic¸˜ao de na- nopart´ıculas de ouro neste sistema para a formac¸˜ao de um nanocomp´osito eletroqui- mioluminescente permitiu aumento da condutividade do filme e com isso aumento da luminescˆencia pelo aumento da taxa de gerac¸˜ao de n´ucleos emissores.9

1.1.1 Classificac¸˜ao de metalopol´ımeros

Uma vez que propriedade e estrutura est˜ao intimante ligadas, faz-se necess´ario compreender os tipos de estruturas e o tipo de ligac¸˜ao poss´ıveis de se formar entre metais e cadeia polim´erica. ´E com base nesses fatores que metalopol´ımeros podem ser classificados, tendo-se como referˆencia o metal. O metal pode ser parte inte- grante da cadeia principal do pol´ımero ou pode se localizar como um grupo lateral,

j´a a ligac¸˜ao, por sua vez, pode ser covalente com um ´atomo de carbono (t´ıpica de compostos organomet´alicos) ou com um hetero´atomo da cadeia (t´ıpica de compos- tos de coordenac¸˜ao).4, 10

Pol´ımeros lineares contendo metal na cadeia principal podem ser formados a par- tir de um ligante macrom´erico orgˆanico contendo grupos coordenantes em suas ex- tremidades. A complexac¸˜ao com um metal une dois macrˆomeros, havendo assim uma polimerizac¸˜ao supramolecular. Han e colaboradores11 produziram uma s´erie de metalopol´ımeros eletrocrˆomicos a partir de um polifenileno linear contendo uma terpiridina em cada ponta, que por sua vez se coordena a um ´ıon Ru(II). O com- primento de onda emitido pˆode ser variado em func¸˜ao do n´umero de an´eis fenilas da frac¸˜ao orgˆanica. De forma similar, Maeda e colaboradores12 produziram nanoes- feras fluorescentes com base em ligantes orgˆanicos conjugados contendo um grupo dipirrometeno em cada ponta. Foi usado Zn(II) e Cu(II), posto que nesse sistema um n´umero de coordenac¸˜ao 4 era necess´ario para formac¸˜ao da estrutura linear.

Quando o metal est´a localizado num grupo pendente, a sua inserc¸˜ao pode ser feita polimerizando-se um monˆomero que j´a contenha o metal ou coordenando-se o metal ap´os a formac¸˜ao da cadeia polim´erica. Lacroix e colaboradores13 partiram da poli(4-vinilpiridina) (P4VP) comercial e do W(CO)6 para formar um metalopol´ı-

mero em que o crom´oforo pendente -W(CO)5 gerou modesta propriedade ´otica n˜ao-

linear. De outra maneira, Franco e colaboradores14sintetizaram e caracterizaram um copol´ımero usando como um dos comonˆomeros o complexo trans-[RuCl2(4vpy)4].

Uma outra poss´ıvel classificac¸˜ao considera a cadeia polim´erica. Pol´ımeros con- tendo metal podem (i) formar uma estrutura tridimensional estendida r´ıgida e in- sol´uvel, em que a parte orgˆanica tem tamanho pequeno, ´e polifuncional e se coor-

dena aos centros met´alicos, que por sua vez constituem os v´ertices do edif´ıcio cris- talino. Tais materiais s˜ao conhecidos como metal-organic framework, ou MOF. Al- ternativamente, (ii) as macromol´eculas podem ser lineares ou (iii) dendr´ıticas, sendo frequentemente process´aveis e podendo, por exemplo, agregar para gerar estruturas nanom´etricas. H´a tamb´em (iv) sistemas envolvendo coordenac¸˜ao de ligantes l´abeis que s˜ao capazes de se estruturar em soluc¸˜ao formando g´eis. A estruturac¸˜ao do gel pode, por exemplo, responder a um est´ımulo externo que afeta diretamente os centros met´alicos.10

A despeito da classificac¸˜ao, ´e relevante ressaltar que a pesquisa em metalopol´ı- meros consiste numa ´area claramente multidisciplinar, j´a que envolve tanto conhe- cimentos de qu´ımica de coordenac¸˜ao e organomet´alicos quanto conhecimentos de s´ıntese e propriedade de pol´ımeros. A concatenac¸˜ao dessas ´areas da qu´ımica se faz imprescind´ıvel para o suprimento de diversas demandas da sociedade moderna por materiais com propriedades espec´ıficas.