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MONOPÓLIOS VERTICAIS, SETORIAIS E REGIONAIS

No documento DE ENERGIA ELÉTRICA (páginas 74-78)

PARTE I – DISCIPLINA JURÍDICA DO SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO

3 ESTRUTURAÇÃO DO SETOR ELÉTRICO A PARTIR DO MODELO HUNT-

3.1 MONOPÓLIOS VERTICAIS, SETORIAIS E REGIONAIS

O primeiro modelo apresentado pelos referidos autores é o de monopólios verticais como estruturas do setor elétrico, nas quais não há concorrência.

A noção de monopólio é eminentemente econômica, e pode ser sinteticamente conceituada como “mercado em que existe um único ofertante”.141 Nesse sentido, a posição monopolística decorre da produção de um bem ou serviço para o qual não haja substituto próximo. O agente monopolista pode atuar de modo simultâneo nas duas variáveis que caracterizam as operações de compra e venda, quais sejam: preço e quantidade. Pode assim, criar uma situação de escassez ao limitar sua produção e elevar o seu preço ao ponto tão alto quanto os compradores estejam dispostos a pagar. Em verdade, no monopólio, o preço de mercado deixa de existir, uma vez que este último decorre unicamente de decisão do monopolista.142

O monopólio natural, a seu turno, de acordo com Fábio Nusdeo, decorre de uma posição de mercado na qual os custos fixos (principalmente aqueles de instalação) de determinada indústria são desproporcionalmente elevados em relação aos seus custos variáveis. Os custos unitários desta única empresa são decrescentes na proporção do seu aumento de produção até que seja alcançada toda a produção necessária para o atendimento de determinado mercado. Desta feita, a elevada proporção de custos fixos exige a produção de larga escala, e os custos nesse regime de monopólio são inferiores aos custos que possuiriam várias empresas, caso houvesse vários competidores. Por conseguinte, as características

Horizonte: Fórum, 2004, p. 342-344.

141 GREMAUD, Amaury Patrick et al. Introdução à economia. São Paulo: Atlas, 2007, p. 103.

142 NUSDEO, Fábio. Curso de economia. São Paulo: RT, 1997, p. 273-274.

estruturais daquele determinado setor impede a existência de concorrência.143 Calixto Salomão Filho ressalta a necessidade de regulação estatal dos monopólios naturais para a proteção, tanto dos agentes de mercado, quanto dos consumidores:

Os competidores devem ser protegidos contra a concorrência predatória que subsistiria em um setor predisposto à existência de um monopólio natural. Por outro lado, por se tratar de situação em que a racionalidade monopolística movo o agente econômico no sentido do aumento abusivo de preços, o controle é necessário também para a proteção dos consumidores. 144

Até a década de 1980, os setores elétricos eram vistos como monopólios naturais de cadeia produtiva verticalizada por excelência. Ou seja, num sistema de integração vertical da cadeia produtiva, o agente monopolista detém todas as etapas desta, desde a geração até a distribuição em baixa voltagem para o consumidor final, havendo, assim, monopólio sobre a produção e a venda de energia elétrica. Há também a “integração vertical por contrato”, no qual um agente tem monopólio sobre a distribuição e outro agente sobre a geração, podendo o primeiro comprar eletricidade apenas do segundo.

Além dos monopólios verticalizados na indústria de eletricidade, são dignos de nota os modelos de monopólios setoriais (quando o monopolista detém alguns, porém, não todos processos básicos da cadeia produtiva do setor de energia elétrica) e os de monopólios regionais (o agente monopolista detém um dos segmentos da cadeia de energia elétrica em um território delimitado).

Nos monopólios baseados em integração vertical da cadeia produtiva, a possibilidade de operações econômicas entre agentes é limitada, ocorrendo marginalmente, ou como medida de segurança de suprimento, entre diferentes monopólios verticais (exempli gratia entre diferentes monopólios regionais, ou entre estruturas de diferentes países, mediante operações de importação e exportação de

143 Ibidem, p. 274.

144 SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito Concorrencial – as estruturas. 2 ed. São Paulo:

Malheiros, 2002, p. 209. A temática da regulação e do monopólio natural é extremamente rica, mas não será objeto aqui de maiores aprofundamentos devido às limitações de escopo. Sobre o tema, além das obras de direito concorrencial já citadas, indica-se, por exemplo, as seguintes: POSNER, Richard A. Natural monopoly and its regulation. Washington: Cato Institute, 1999. TRAIN, Keneth E.

Optimal regulation – the economic theory of natural monopoly. Cambridge: MIT Press, 1992, p. 1-17.

STIGLTIZ, Joseph E. La economia del sector publico. 3 ed. Barcelona: Antoni Bosch, 2000, p. 220-229.

energia).

Os sistemas baseados numa estrutura monopolista verticalizada podem ser públicos ou privados.

Nos monopólios públicos verticalizados, o Estado exerce praticamente todas as etapas da cadeia produtiva de energia, ou seja, de geração, de transmissão, de distribuição e de comercialização, embora sejam admitidas pequenas participações privadas. Tal modelo frequentemente tem origem em sistemas que eram inicialmente privados e sofreram processos de estatização.145

Há vantagens na introdução de cadeias produtivas monopolistas e verticalmente integradas no setor elétrico, conforme apresenta Ivan Camargo:

É o mais conhecido. Os engenheiros pensam o sistema elétrico de forma integrada. [...]

Menor custo de transação. Os contratos, quando firmados, ocorrem entre empresas integradas de geração e transmissão com empresas de distribuição. São os chamados contratos de suprimento.

Clara definição da responsabilidade do suprimento. As empresas geradoras têm a responsabilidade de atender a expansão da carga. A empresa de distribuição apenas informa a sua expectativa de crescimento.

Facilidade de implementação de subsídios. Como não há a necessidade de definir claramente o preço de cada função, é fácil embutir subsídios no valor final da tarifa.

Facilidade no planejamento da expansão [...].146

Um aspecto relevante deste modelo de monopólio decorre da facilidade na implementação de obrigações relacionadas a políticas públicas ao agente monopolista, o que resta dificultado em estruturas onde há maior pulverização e competição entre os agentes. Assim, há maior facilidade de intervenção estatal em diversas linhas de atuação, tais como: obrigações de fornecimento; regulação de emissões de gases poluentes e implementação de outras obrigações ambientais;

diversificação de fontes, subsidiando fontes específicas que sejam de interesse da sociedade; programas de eletrificação rural e de universalização do acesso à energia; formulação de tarifas reduzidas para consumidores de baixa renda, ou para

145 PAIXÃO, Leonardo André. Aspectos Institucionais do setor elétrico brasileiro. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (coord.). Direito regulatório: temas polêmicos. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 342-344.

146 CAMARGO, Ivan. Análise do processo de reestruturação do setor elétrico brasileiro.

Revista Brasileira de Energia, Itajubá, v.11, n. 2, jul./dez. 2008.

grandes consumidores industriais que representam investimento em capital produtivo e geração de empregos; aliás, é possível também a utilização das tarifas ou como mecanismo arrecadatório, ou como instrumento de fomento à atividade econômica.

Como desvantagens, destacam-se o difícil aumento de eficiência, uma vez que há menor incentivo para o agente monopolista se tornar mais eficiente.147 Isso porque a formação de preço é feita apenas mediante análise de custo. Ou seja, a regulação da tarifa se dá normalmente pelo custo do serviço, modelo historicamente adotado no setor elétrico do Brasil, de acordo com José Claudio Pires e Maurício Piccinini.148 Destarte, são repassados ao consumidor grande parte dos erros e problemas do agente monopolista como: mudanças não previstas na demanda;

erros em investimentos; problemas de obsolescência não programada de equipamentos, dentre outros. Além disso, a assimetria de informação dificulta a atuação do órgão regulador, principalmente no que toca a aferição do efetivo custo de produção do detentor da cadeia produtiva e o respectivo repasse de possíveis ganhos de eficiência para as tarifas dos consumidores finais.

Ainda, por ser uma estrutura monopolista estatal, frequentemente os preços para o usuário final não são proporcionais aos custos efetivos da cadeia produtiva, para valores acima ou abaixo destes. Isso se dá mediante a utilização da tarifa como mecanismo de política econômica, seja subsidiando-a, seja utilizando-a como subsídio indireto. O problema desta utilização é que ela não reflete a estrutura de custos do setor, o que acaba minando sua sustentabilidade ao longo prazo.

Outra possibilidade de estrutura setorial monopolística baseada em integração vertical decorre dos monopólios privados verticalmente integrados, cuja nota diferenciadora é o fato da cadeia produtiva ser de propriedade de agentes privados. Em tais casos, faz-se necessária uma forte atuação regulatória estatal, de modo a corrigir as ineficiências do mercado a fim de proteger o consumidor do poder

147 Ibidem, loc. cit.

148 PIRES, José Claudio Linhares; PICCININI, Maurício Serrão. Mecanismos de regulação tarifária do setor elétrico: a experiência internacional e o caso brasileiro. Rio de Janeiro: BNDES, 1998, p. 9. Calha também mencionar que “A tarifação pelo custo do serviço, também conhecida como regulação da taxa interna de retorno, é o regime tradicionalmente utilizado para a regulação tarifária dos setores de monopólio natural. Através desse critério, os preços devem remunerar os custos totais e conter uma margem que proporcione uma taxa interna de retorno atrativa ao investidor.” Ibidem, p.

10.

de mercado do agente monopolista.

O modelo baseado em monopólios verticalizados foi prevalente por quase um século por diversas razões. Dentre elas, merece relevo a possibilidade de viabilização de sistemas de transmissão e distribuição de larga escala e a implantação de usinas de geração de elevado porte, em razão da economia de escala necessária para implementá-las.

Todavia, foi superada a visão de que seria impossível ou indesejável a competição no setor elétrico, sendo possível a construção de modelos competitivos, que serão apresentados sucintamente nos tópicos seguintes.

3.2 COMPETIÇÃO POR COMPRADOR ÚNICO OU “PURCHASING AGENCY

No documento DE ENERGIA ELÉTRICA (páginas 74-78)