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2. MATERIAIS E MÉTODOS

3.3. Morfometria linear dos espécimes

Foram tomadas 19 medidas totais em todos os espécimes estudados (a lista completa está descrita no Anexo I). Duas delas são medidas utilizadas como base para a análise das outras variáveis: a medida 01, que é o comprimento máximo do crânio, e a medida 15, que é o comprimento máximo da mandíbula. Por isso, estas medições não serão avaliadas individualmente quanto à suas trajetórias ontogenéticas. Todas as outras foram classificadas de acordo com três comportamentos ontogenéticos possíveis: A) Medidas isométricas, que mantêm a mesma proporção de tamanho durante o desenvolvimento de Mariliasuchus; B) Medidas com alometria positiva, que ficam proporcionalmente maiores durante o desenvolvimento; e C) Medidas com alometria negativa, que ficam proporcionalmente menores com o desenvolvimento. Uma linha de isometria hipotética (utilizando as mesmas coordenadas nos eixos x e y e mantendo necessariamente a mesma proporção de crescimento) foi inserida para facilitar a observação das trajetórias ontogenéticas das diferentes medidas. As medições encontram-se descritas abaixo de acordo com a categoria de alometria em que se encaixam.

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3.3.1. Medidas isométricas

Seis medidas distintas foram classificadas como isométricas na presente análise (Figura 105). São elas: 02 (altura máxima do crânio); 05 (comprimento máximo da porção posterior do crânio); 09 (largura máxima do rostro na região nasal); 14 (comprimento máximo da fenestra suborbital); 16 (comprimento máximo do processo retroarticular); e 17 (largura máxima do processo retroarticular). As medidas 02, 05, 09 e 16 apresentam um comportamento ontogenético que é virtualmente idêntico tanto em relação à isometria quanto em relação aos táxons de Caiman e, portanto, não serão discutidas em detalhes.

O comprimento máximo da fenestra suborbital em Mariliasuchus (medida 14) apresenta isometria, mas seu comportamento ontogenético é sutilmente distinto daquele observado em Caiman. Os pontos relacionados ao táxon fóssil estão deslocados à direita no gráfico (Figura 105D), significando que indivíduos maiores de M. amarali possuem um tamanho de fenestra suborbital proporcionalmente menor do que em Caiman. Esta observação pode ser notada pelo fato dos pontos referentes aos indivíduos de Mariliasuchus estarem deslocados no eixo y em relação aos pontos referentes a Caiman. No gráfico, indivíduos de Caiman situados no mesmo ponto do eixo x que indivíduos de Mariliasuchus (isto é, com o mesmo tamanho total) apresentam um maior valor no eixo y, mostrando que a fenestra suborbital é proporcionalmente maior no táxon atual. Isso se deve ao fato de Caiman apresentar uma maior longirostrinidade do que Mariliasuchus, com a fenestra suborbital participando do aumento relativo do comprimento total do rostro.

Já a medida 17 (largura máxima do processo retroarticular) apresenta um comportamento ontogenético oposto ao observado na medida 14. No gráfico (Figura 105F), é possível observar que os dados referentes à Mariliasuchus estão deslocados para o lado esquerdo dos dados de Caiman, mostrando que animais menores do táxon fóssil possuem uma largura do processo retroarticular que se assemelha mais à dimensão desta estrutura observada em animais maiores de Caiman. Esses resultados confirmam a observação visual de que Mariliasuchus possui um processo retroarticular relativamente mais largo e robusto do que o observado em Caiman.

3.3.2. Medidas com alometria positiva

Também seis medidas foram classificadas como alométricas positivas durante o desenvolvimento ontogenético de Mariliasuchus: 03 (largura máxima do crânio); 04 (comprimento máximo do rostro); 08 (largura máxima do crânio nos exoccipitais); 11 (altura

79 máxima do foramen magnum); 13 (comprimento máximo da fenestra infratemporal); 19 (comprimento máximo da fenestra mandibular).

O crânio fica proporcionalmente mais largo ao longo do desenvolvimento ontogenético de Mariliasuchus, tanto ao analisar a medida 03 (Figura 106A) quanto ao analisar a medida 08 (Figura 106C). Tais resultados demonstram que M. amarali adquire um crânio gradativamente mais amplo e robusto durante sua ontogenia, enquanto que Caiman mantém aproximadamente a mesma proporção de largura craniana durante seu desenvolvimento.

Em relação ao comprimento do rostro (medida 04), ambos Caiman e Mariliasuchus apresentam alometria positiva (Figura 106B) durante seu desenvolvimento. Embora o táxon atual apresente um rostro notavelmente mais alongado do que o táxon fóssil, é importante observar que M. amarali também sofre um alongamento proporcional de sua porção rostral durante a ontogenia. Mariliasuchus possui uma trajetória ontogenética do comprimento rostral que se “encaixa” sobre a trajetória ontogenética do rostro em Caiman (Figura 106B), com os dados se sobrepondo nos dois táxons, e é interessante notar que indivíduos adultos do táxon fóssil se assemelham em proporção do rostro a indivíduos jovens e/ou subadultos de Caiman.

Uma das medidas que apresentou uma forte tendência alométrica positiva em M. amarali foi a medida 11 (altura máxima do foramen magnum). No gráfico (Figura 106D) é possível observa que Caiman apresenta uma sutil alometria negativa nesta medição, enquanto que Mariliasuchus apresenta uma significativa alometria positiva, contrastando enormemente com o padrão do táxon fóssil. Entretanto, tal resultado é desconsiderado na presente análise, uma vez que diversos espécimes do táxon fóssil apresentam a região occipital bastante danificada e deformada por processos tafonômicos (Figura 90). Essa deformação afeta enormemente a forma e o tamanho do foramen magnum¸ que é uma pequena abertura na região occipital, ao quebrar suas paredes e colapsar sua estrutura. Devido a este fato, as medições realizadas nesta estrutura não são plenamente confiáveis e, portanto, são aqui desconsideradas.

A fenestra infratemporal fica levemente maior durante o desenvolvimento ontogenético de Mariliasuchus amarali (Figura 106E). Através da análise da medida número 13, foi observada uma trajetória ontogenética distinta entre esta estrutura nos dois táxons analisados. Mariliasuchus apresenta uma sutil alometria positiva na região, enquanto que Caiman apresenta uma sutil alometria negativa no mesmo local. A ontogenia da fenestra

80 mandibular (medida 19) parece se comportar de maneira semelhante à ontogenia da fenestra infratemporal (Figura 106F) em M. amarali. Enquanto que Caiman apresenta isometria em relação ao desenvolvimento desta fenestra durante sua ontogenia, Mariliasuchus apresenta uma leve tendência alométrica positiva para a região. As diferenças observadas na ontogenia destas fenestras podem indicar um maior uso da musculatura adutora da mandíbula no táxon fóssil em relação ao táxon atual.

O espécime MZSP-PV 760 apresenta um interessante comportamento morfométrico, ora se alocando nas trajetórias ontogenéticas de Mariliasuchus e ora se alocando nas trajetórias ontogenéticas de Caiman. Nas medidas 11 e 13, o pequeno crocodilomorfo parece se comportar de maneira mais próxima a um Caiman juvenil (Figura 106D, E), enquanto que na medida 19 ele claramente se posiciona mais próximo à trajetória ontogenética de Caiman (Figura 106F). Obviamente, o espécime é filogeneticamente mais próximo de Mariliasuchus do que de Caiman, mas os resultados morfométricos obtidos reforçam a hipótese de que MZSP-PV 760 pertence a um outro táxon fóssil que não Mariliasuchus.

3.3.3. Medidas com alometria negativa

Cinco medidas apresentaram alometria negativa durante o desenvolvimento ontogenético de M. amarali: 06 (comprimento máximo da órbita); 07 (constrição interorbital); 10 (largura máxima do foramen magnum); 12 (comprimento máximo da fenestra supratemporal); 18 (comprimento máximo da sínfise mandibular).

A alometria negativa do comprimento máximo da órbita (medida 06) era um padrão esperado para os dois táxons, uma vez que a diminuição da órbita ao longo da ontogenia é uma tendência entre os animais. No gráfico (Figura 107A), é possível observar que tanto Mariliasuchus como Caiman possuem trajetórias ontogenéticas bastante similares relacionadas a esta medida. Já em relação à constrição interorbital (medida 07) há uma diferença entre os táxons: Mariliasuchus apresenta uma sutil alometria negativa em relação ao desenvolvimento ontogenético desta região, enquanto que Caiman, de maneira oposta, apresenta uma sutil alometria positiva desta medida (Figura 107B).

O comprimento máximo, em largura, do foramen magnum nos dois táxons apresenta uma idêntica trajetória ontogenética (Figura 107C). Tanto Mariliasuchus como Caiman apresentam alometria negativa da medida de número 10.

A trajetória ontogenética da fenestra supratemporal (medida 12) tem um interessante comportamento morfométrico. Mesmo com a observação da manutenção de uma fenestra

81 supratemporal de grandes proporções durante toda a ontogenia de M. amarali (ver item 3.2.1.3.), foi notado que esta fenestra apresenta uma sutil alometria negativa (que beira a isometria) no táxon fóssil. Entretanto, ao comparar a trajetória ontogenética desta fenestra com a observada em Caiman, fica claro que a alometria negativa apresentada pelo táxon atual é extremamente mais evidente do que a observada no táxon fóssil (Figura 107D). No gráfico, notam-se ainda alguns pontos alocados totalmente fora da linha de tendência ontogenética (indicada em 107D pela seta roxa). Estes pertencem a indivíduos de Caiman que possuem uma fenestra supratemporal extremamente reduzida em sua anatomia, com tendência ao fechamento desta estrutura, principalmente relacionados à C. latirostris. Os pontos que estão posicionados bem em cima do eixo x se referem a indivíduos onde a fenestra supratemporal se fecha completamente, que são alguns C. latirostris observados no jacarezário da UNESP de Rio Claro.

Por fim, o comprimento da sínfise mandibular (medida 18) apresenta uma tendência de alometria negativa em M. amarali, enquanto que em Caiman a tendência é isométrica (Figura 107E). Entretanto, é importante notar que o conjunto de dados desta medida para Mariliasuchus está alocado, no gráfico, do lado esquerdo do mesmo conjunto de dados para Caiman, mostrando que a sínfise mandibular é proporcionalmente maior no táxon fóssil do que no táxon atual.

Da mesma maneira que nas medidas que apresentam alometria positiva, discutidas no item prévio, as medidas que apresentam alometria negativa mostram um interessante comportamento morfométrico para o espécime MZSP-PV 760. Em relação à constrição interorbital, este espécime claramente se comporta de maneira mais próxima à tendência ontogenética de Mariliasuchus (Figura 107B), enquanto que no comprimento da fenestra supratemporal ele se comporta como um indivíduo juvenil de Caiman (Figura 107D). O comportamento como um indivíduo juvenil de Caiman relacionado ao tamanho da fenestra supratemporal em MZSP-PV 760 se dá pelo fato de que esta estrutura, no espécime fóssil, é muito mais semelhante à observada em indivíduos juvenis de Caiman do que em indivíduos juvenis de Mariliasuchus (Figura 19). Curiosamente, em relação à sínfise mandibular MZSP- PV 760 parece não se adequar a nenhuma das trajetórias ontogenéticas, nem de Caiman nem de Mariliasuchus, mostrando que o morfoespaço ocupado por esta estrutura parece único neste espécime (Figura 107E).

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