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3. Uma etnografia de três encontros

3.2. Tenda de Umbanda Ogum Rompe Mato

3.2.3. As mulheres de Sete Giras

Este foi o único centro em que entrevistas com outra entidade que não pombagira entraram na pesquisa, pois se configuraram como significativas para a análise dos dados. Trata-se também do único centro gerido por uma figura masculina.

Houve entrevistas com quatro médiuns em transe de pombagira: Maria Padilha, Maria de Lourdes, Maria da Noite e Marlene da Praia124. Realizei também três entrevistas com as médiuns desincorporadas: D. Ida (mãe de Adilson), Kelly e Sílvia. Por isso, foquei o trabalho no centro Ogum Rompe Mato nestas três médiuns.

Os exus, aqui, participam ativamente mesmo durante o ritual de pombagira. Por exemplo, quando uma médium não consegue incorporar, é o exu Sete Giras que “chama” as pombagiras das médiuns, como podemos ver na foto abaixo. Pode também ser o Exu Cigano, entidade que Adilson costuma incorporar quando as mulheres estão todas com suas pombagiras. Ou seja, as pombagiras, de fato, estão sempre acompanhadas do exu: Assim, abrimos as portas também aos cavalheiros125.

124 Marlene da Praia é pombagira de Adilson, mas como não incorpora, é recebida no corpo de uma médium do

centro: Vim para completar o homem, sim? Sou a fêmea de Sete Giras, como não pôde vestir, então eu vim a este. Fui oferecida e bem aceita. (...) poderia até receber, mas não aceita. (entrevista com pombagira Marlene da Praia, 21/2/2007)

125A relação “feminino e masculino” a partir das figuras de exus e pombagiras será melhor aprofundada no

Sete Giras

“Seu Sete Giras” é o exu chefe da casa e tem muito respeito e prestígio por todos, tanto pelos consulentes quanto pelos médiuns. Quando Adilson o incorpora, seu corpo se transforma. Sua voz suave fica firme, grave e fala bastante alto.

Usa uma capa preta e vermelha, calça e camisa pretas. Fuma charuto e fica a maior parte do tempo sentado num pequeno banco com os cotovelos apoiados nos joelhos, o charuto em uma mão e uma taça com whisky na outra. Uma entidade de classe, eu diria.

No entanto, Adilson diz que não foi sempre assim, pois seu exu teve que receber “doutrinamento” do pai-de-santo com quem desenvolveu :

Ele era todo deformado, se ele quisesse ir daqui pra lá, ele não andava, ele se jogava, se arrastava, tinha uma característica bem arrogante, xingava. O A. (pai-de-santo com quem desenvolveu sua mediunidade) não aceitava essa deformação dentro da doutrina, ele foi doutrinando, transformando, até ficar em pé, pra ficar mais suave, até pra ficar mais fácil pro próprio médium incorporar (Adilson, 26/5/2006).

O próprio Adilson também foi “doutrinador” de sua entidade e comenta ser este o modo como trabalha com todas as entidades em seu terreiro:

Ele era muito mais rude, tinha um palavreado mais, se ele tivesse que te chamar ele chamava de fêmea, ele chamava de desgraçada, de cadela, que eu fui cortando, nunca deixei comer carne crua, nunca deixei beber sangue, que eu não aceito, cheguei a falar que se fizesse isso no meu corpo, então não viria mais. Eu sempre fui muito questionador e doutrinador dos meus próprios guias. Eu falo que seu Sete Giras pra mim é um pai, problemas que eu tenho, eu peço pra ele, tenho soluções e ele me dá uma resposta imediata. Todas as pessoas do centro quando fala de seu Sete Giras, apreciam, ele é duro no que ele faz e fala, mas pra tudo ele tem uma explicação, uma linguagem fácil, pedra é pedra, pau é pau, e as pessoas gostam dessa franqueza dele. E eu desenvolvi a linha de Exu nesse ponto, o mesmo rigor que eu tive com a linha de exu pra mim, eu passo pros meus médiuns. Então, todos sentam em bancos, não tem cuspidor, se beber, não vai beber exageradamente pra não deixar no corpo do médium. Vai beber em taças ou em copos, o Reino encantado das Pombagiras é a mesma coisa, as meninas têm taças, eu exijo a vestimenta, porque acho que é uma caracterização que...se você for trabalhar de pombagira ou de exu de branco, fica uma coisa meio descaracterizada, e eu acho que às pessoas ajuda muito (Adilson, 26/5/2006).

Com muita classe, em entrevista, o seu Exu Sete Giras também falou sobre as pombagiras, e de uma maneira tão esclarecedora deu luz (e palavras) a algumas questões nebulosas:

7: Toda pombagira e todo o Exu são muito canalizados ao emocional do seu médium. Eles o defendem de unhas e garras, sim, dentes e unhas, protegem realmente, mas punem também. Então vós quando for identificar uma pombagira, busque principalmente uma caracterização visual, há uma mudança aparente, a mulher se torna muito feminina, bonita em se vê, se torna outra mulher. Então é muito interessante vós visualizar isso.

Eu: E a pombagira, o que ela faz pela médium? Não só quando incorporada...

A: A pombagira acaba tendo para a médium muitas vezes uma proteção como o próprio exu. Então ela aconselha, ela orienta, ela defende, ela limpa, sim, ela indica certos caminhos, dentro da linha de amor, muitas vezes ela consegue ser muito mais clara do que nós exu, muito mais tranquila em encaminhar quando se pede o amor a elas. Elas conseguem abrir essas portas.

Eu: Elas estão mais ligadas a isso?

7: Porque o encanto, sim, o desejo, pombagira é o desejo, é o estímulo, tá muito ligado isso ao amor, mas não é somente isso. Cuida também de problema de relacionamento, mas cuida também de justiça se for o caso, de uma demanda se for o caso.

Eu: E quando vós me diz que é muito Terra quer dizer que está mais próximo dos homens ? (logo percebi que deveria ter ficado apenas na

pergunta “o que quer dizer por ser “muito Terra”?”)

7: Sim, temos conhecimento de tudo da Terra, de tudo que se tem ideia, por isso bebemos bebidas um pouco mais...fortes, fumamos, sim, falamos palavras um pouco mais fáceis e mais simples ao cotidiano humanos, o acesso que nós temos é muito mais fácil à Terra de vocês, o paralelo nosso é muito perto.

Seu Sete Giras falou dedicou-se a explicar-me sobre a complementação entre o casal exu e pombagira, mas acrescentou ainda palavras ao que sentia e intuía: a pombagira é muito feminina, é a “feminilidade completa” e passa isso para as suas médiuns:

Eu: E o que é ser feminina? Essa “feminilidade completa”? O que é uma mulher que consegue ser feminina?

7: A mulher que consegue ser feminina ela domina sem ser, como posso dizer de uma forma bem mais clara, ela consegue ter o domínio de toda e qualquer situação, principalmente dentro de um relacionamento, sem se mostrar e fazer arruaça, vamos dizer assim, ela faz de um homem, ou mesmo de uma mulher, se sentir rei ou rainha, sem precisar,é, sendo que ela é a rainha, sem precisar ter o título e sem perder o interior.

Eu: Então ele faz os seus médiuns se sentirem reis em rainhas, tanto o homem quanto a mulher...

7: ...De uma forma plena. Quando vós pensares em feminilidade, pensa em uma rosa, uma rosa vermelha. O que ela representa? É assim que vós pensa em pombagira. Quando vós bater o olho numa rosa vermelha, toda aquela feminil...aquela mulher de ser, aquela beleza, é assim uma pombagira, e é o que ela faz com as suas um médiuns que aceitam ser orientadas e acatam as orientações. Assim como há o lado negro também. Assim como ela pode te estimular, ela pode te desestimular se você começar a andar pelo lado errado. Eu: Pensei nos espinhos da rosa.

7: Exatamente. Até vós chegar no frescor, muitas vezes se espeta. Se começar a fazer uso errado, será espetada. Mesma coisa é o exu, vigoramos, mas também desvigoramos, muitas vezes por aprendizagem, porque muitos médiuns acabam sendo relapsos.

Seu Sete Giras atribuiu palavras às pombagiras de maneira que não imaginava que um exu o pudesse fazer. Por meio de uma linguagem poética, ofereceu contornos a tudo o que vinha vivendo há dois anos desde o meu primeiro encontro com as pombagiras.

Mas não é curioso justamente o Exu exprimir com tanta clareza o que são as pombagiras, por que elas não o fizeram? Tenho a impressão de que as pombagiras não precisam (ou não poderiam) dizer, porque elas o são, ou seja, elas atuam, elas se mostram. Já o exu, só pode dizê-las126.

Maria Padilha / Maria Rosa/ Maria Molambo

Para mim, esta é a médium das três Marias; o que poderia soar como bastante angelical, mas apesar de sua voz doce, de seus olhos claros e de ser mãe de dois lindos filhos, Kelly é uma bela e forte médium de três pombagiras.

Mais interessante é notar como as suas pombagiras são extremamente diferentes uma da outra. Maria Molambo, que é a mais “desbocada”, tira sarro das outras pombagiras da médium:

Molambo: Essa aí não faz nada (fala em relação de Maria Rosa)

Mãe pequena do centro127: Não são , não. Ela é cigana, ela lê carta muito bem, é muito boa!

Molambo: Nada...São tudo devagar. Rosa: Se deixar, vem só ela.

126

Aprofundo esta ideia ao longo do sexto e sétimo capítulos.

127 Rosa, médium de alta posição hierárquica no centro, estava presente em minha entrevista com a pombagira

Maria Molambo é engraçadíssima, adora conversar com mulheres “gosto de ajudá fêmea, porque muié é tudo burra, sabe?(risos) E os home pior ainda, tudo cafajeste! Por isso que eu venho pra ajudá”. Por ter sofrido em vida, Maria Molambo diz que sabe como ajudar uma mulher que sofre. Ajuda a qualquer um, seja homem, criança, ou mulher, mas confessa a preferência por ajudar mulheres.

Conheci primeiro a Maria Padilha desta médium, que guarda a semelhança da alta posição na hierarquia das pombagiras, mas aparentemente é bastante diferente da Maria Padilha que conheci no centro Tenda Espírita de Umbanda Pai Benedito.

Esta Maria Padilha é também belíssima, mas não transparece o porte de “realeza”. Fica sentada em um banco, com as pernas cruzadas, de cabeça baixa, é mais reservada e fala bastante baixo. Ela mesma atesta a existência de outras da linha de Maria Padilha e acrescenta sobre o prestígio que lhes foi conquistado:

O trabalho que eu faço, é ...Tanto faz aqui como em qualquer outro terreiro, tanto faz ser eu propriamente ou qualquer outra da Maria Padilha, é, só faz um trabalho de limpeza, de energização, de desmanchar o que foi feito, e resolver os problemas assim. Ao contrário do que todos acham, que pombagira resolve só problema amoroso...Sou quem sou porque gosto de fazer as coisas bem-feitas. Meu nome é reconhecido em muitos e muitos lugares. Se não for pra fazer bem-feito, então eu não faço. Eu não faço nada. Eu passo para outra pessoa. Então, acho que vós consegue fazer bem-feito.

Sobre a relação com sua médium, Maria Padilha acrescenta:

Agora? Agora é boa, ah, já briguei muito, ou faz o que quero ou não está certo. Eu enxergo o que está certo, o que é melhor, onde pisar para cair menos. Então eu posso dizer, eu posso orientar, se não faz, cai. Se escolhi, não quero que caia, então quero que faça como eu quero, assim... Não interfiro na vida pessoal, mostro, mostro o que tem que fazer. E quando cai, aí demora mais para levantar. Tem que levantar, tem que retornar e começar tudo outra vez. É mais longo, não é? Por isso posso demonstrar. Respondi?

Maria Padilha evidencia ainda que não trata apenas de problemas amorosos, assim como outras pombagiras do centro de Pai Bendito já haviam dito. Também refere que existe discriminação em relação às pombagiras, pois as pessoas não entendem que vêm para ajudar:

MP: Acho que todas as pessoas discriminam bastante, não discriminam? Até onde vejo, não entendem... Eu trabalho como qualquer outro espírito. O trabalho que eu faço, é, tanto faz aqui como em qualquer outro terreiro, tanto faz ser eu propriamente ou qualquer outra da Maria Padilha, é, só faz um trabalho de limpeza, de energização, de desmanchar o que foi feito, e resolver os problemas assim. Ao contrário do que todos acham, que pombagira resolve só problema amoroso...não queres sentar, vai cansar... M: vou sentar.

MP: Ao contrário do que as pessoas acham, não é só problema amoroso, são todos os tipos de problemas como qualquer outro exu, é uma força que é feminina, mas é exatamente como um exu, não tem diferença. As pessoas veem a parte da esquerda um pouco distorcida do que é. Serve para limpar, serve para resolver, a diferença é que a comunicação é mais rápida, falo exatamente como vós fala. Falo exatamente como qualquer outra pessoa, trabalho com o mesmo elemento que o vosso, trabalho com o corpo (ela pega em meu braço), trabalho com a cor, trabalho com a voz (aponta para sua boca), trabalho com a energia, falo igual, falo assim se tiver que falar, falo outra língua se tiver que falar, falo como tiver que falar, fica mais fácil o acesso, resolvo mais fácil. Mas as pessoas não entendem muito bem isso. Falar em pombagira é falar em coisas ruins, não é assim que as pessoas acham?

Indicada por Adilson, fui à casa de Kelly para entrevistá-la sobre suas pombagiras. Ao chegar em sua casa, logo noto a forte presença da umbanda em altares com orixás, entidades e pinturas dos mesmos. As figuras dos exus e pombagiras têm lugar no quarto do casal.

Kelly relata uma relação intensa com suas pombagiras. Desde seus treze anos sabia que tinha uma pombagira e sempre pedia ajuda a ela. Mas foi quando passou a desenvolver sua mediunidade no terreiro de Adilson que descobriu que ao invés de uma, tinha três.

A médium conta que não foi fácil o período de desenvolvimento, pois uma de suas pombagiras não queria respeitar a regra usual de desenvolver primeiramente as entidades de direita e em seguida as de esquerda:

Então, por causa dessa, da Maria Rosa, eu só fiquei lá dentro e só consegui entrar porque ela queria trabalhar primeiro, mas o Adilson não deixava ela entrar. Ele queria tirar as minhas pombagiras de frente, por isso que ele falou

a hora que eu cheguei: “ A da pombagira!” Ele queria tirar a pombagira de

frente, passar a linha branca primeiro, e comigo não seria dessa forma, comigo não tinha como fazer isso, porque elas estavam comigo e me acompanhando desde quando eu tinha treze anos, elas estavam comigo, então tudo o que eu precisava, todos os problemas que eu tinha, eu chamava elas pra resolver. Então mesmo quando eu não incorporava, elas tavam resolvendo muita coisa pra mim, muita coisa. Sem incorporar, só na

condição de que quando eu encontrasse o lugar, eu iria trabalhar com elas. Então, elas sempre estiveram muito presentes.

Kelly diz que se incorpora uma pombagira durante o ritual, deve incorporar todas. As próprias pombagiras exigem que sejam incorporadas, e se a médium não o faz, diz passar mal. Mas este, pelas entrevistas com a médium, é apenas o único desconforto causado por suas pombagiras, pois, para ela, são suas grandes companheiras e protetoras.

Elas sempre me ajudaram, teve momento que eu não sabia o que fazer, „não

sei se vou, se paro, se fico, o que eu faço? Faz alguma coisa e me mostra o

que eu tenho que fazer‟, já aconteceu muito isso. Nossa senhora, ela já me

tirou de cada buraco grande... Eu gosto muito, muito, muito, não sei ficar sem. (...) quando acontece alguma coisa que eu fico nervosa, elas se manifestam presente mesmo, sabe, como se fosse...você não tá sozinha, vamos resolver, se manifestam muito, muito, muito. Muito presente.

Ao final da entrevista com a médium, pergunto:

Eu: O que você acha que é importante as pessoas saberem sobre as pombagiras?

Kelly: Que elas não fazem coisa ruim. Pelo menos, não todas pombagiras, elas fazem coisas que são como qualquer outra entidade, elas dão um escudo muito bom, elas livram das coisas ruins que as pessoas desejam, que as pessoas fazem, então eu acho que teria que ser visto como uma outra linha qualquer, mas não é o que elas fazem não. O pessoal acha que pombagira só faz coisa pra amarrar namorado, amarrar homem, né, desmanchar casamento (...) A Maria Padilha, segundo a Rosa (mãe pequena), ela não faz, ela já ta muito elevada, que já nem é mais ela, é alguém que trabalha na mesma sintonia da Maria Padilha, então, ela só desmancha as coisas, ela alinha, faz as coisas como o exu faz, ela faz assim, ela mais doutrina do que faz mesmo alguma coisa ruim, e agora a Maria Molambo faz sim, se tiver que fazer um auê tem que chamar ela pra fazer, e a Maria Rosa, que é minha, ela só lê a sorte, ela não faz nada.

Acho interessante notar que o corpo da médium se transformava quando desincorporava a sua Maria Padilha e incorporava a Maria Molambo. O porte de “mulher séria” e reservada é substituído por um andar cambaleante, como de uma mulher bêbada, os cabelos bagunçados, o corpo curvado e com uma linguagem típica “de rua”.

E quem conhece Maria Molambo não mexe com Molambo. Não é todo mundo que tem força pra trabalha com Molambo. Molambo não só

desmancha, Molambo também pode fazer, vai dependê do que vai pedi pra eu e do que vós pagá pra eu. Molambo sabe o que é do bem e o que é do mal (Maria Molambo).

Geralmente, as pombagiras Maria Molambo costumam trabalhar com o que é mais sombrio, mais “pesado”, como dirá a Maria Molambo do Casa Mãe Guacyara (próximo terreiro a ser apresentado). Já a pombagira Maria Rosa, que infelizmente ainda não pude conhecê-la, é mais leve. Kelly diz, inclusive, que ela poderia vir na linha de ciganos, porque trabalha como uma cigana, mas a própria entidade diz que não quer, porque gosta de “ser pombagira”. Por ser a mais “leve” das três pombagiras, foi a primeira a ser incorporada pela médium. Depois veio a sua Maria Padilha e, depois ainda, veio a Maria Molambo, que não gosta de esperar que as outras sejam incorporadas para que só então ela seja chamada.

Apesar de se dizer muito “perigosa”, Maria Molambo foi uma das pombagiras mais agradáveis com que já conversei. Percebi ainda que o mesmo não se passa apenas comigo. As mulheres ficam muito tempo contando sua vida para a entidade, que as escuta com atenção, mas sem recalque, fala “na lata” o que a pessoa “precisa” ouvir.

Maria da Noite

Maria da Noite é a primeira pombagira de Sílvia, médium do centro de Adilson. Há aproximadamente vinte anos incorpora sua pombagira, mas há também uma pombagira cigana chamada Íris e uma Pombagira da Calunga (cemitério) com quem começou a trabalhar há aproximadamente quatro anos. Entrevistei Maria da Noite várias vezes, mas apenas vi sua pombagira da Calunga, e não conheci a sua pombagira cigana.

Como havia conversado com sua pombagira durante o primeiro ritual que presenciei, perguntei diretamente à médium se poderia conversar com ela sobre suas pombagiras.

Na época eu morava a apenas algumas quadras de minha casa e fui recebida gentilmente com bolo e refrigerante. Sílvia fala apaixonadamente sobre sua pombagira e

contou a história desde o início, pois quando começou a se desenvolver na umbanda, a sua pombagira estava “de frente”, ou seja, era a entidade que queria vir primeiro. Assim, a mãe- de-santo do centro em que se desenvolveu a “doutrinou” para que pudesse obedecer a hierarquia das entidades. No entanto, ainda hoje, a entidade a defende “de frente”:

Se tem um trabalho, e tá pesado, ou eu tô com algum problema, ela sempre chega na frente, ela vem, abre a gira, puxa, ela mesma já faz a limpeza em mim, ou alguma coisa que tá ali junto comigo, então, ela sempre tá na frente, eu chamo ela de mãezona... quando tenho algum problema que eu não consigo resolver...eu não tenho um pai (fala com a voz engasgada), meu pai é doente, eu não tenho uma orientação. Meus amigos, coitados, não vou ficar enchendo o saco deles toda hora, então eu tenho ela como...não só ela como os outros guias, eu tenho assim, como se diz, todo o respeito de chegar lá, pedir pra abrir o caminho, me ajudar, me orientar, me mostrar o que eu posso fazer diante do problema, entendeu? E aí, sempre vem, ou vem alguém me ajudar, ou eu tenho uma saída, coisas que eu sozinha não tenho capacidade de realizar, entendeu? E quando você tá pensando pra fazer aquilo, você sabe que é a presença deles, e você sabe que eles estão te ajudando, entendeu? E é assim, e eu gosto muito, a gente se sente muito protegida, eu gosto muito...

Ela diz “minha pombagira é minha mãezona”, e sente que percebe qualquer dificuldade em sua vida, logo pede ajuda para sua pombagira. A médium diz ainda que se comunica com ela por meio de “sinais”, o que faz com que perceba que ela está sempre por