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MULTIDISCIPLINARIDADE E FISIOTERAPIA: POSSIBILIDADES

Gostaria de iniciar compartilhando uma sábia reflexão de Rubem Alves, um dos maiores educadores brasileiros que faleceu recentemente nos deixando como herança uma obra rica em escritos inspirados, plena de inquietações, tal como podemos perceber na citação a seguir:

Não sei como preparar o educador. Talvez por que isso não seja nem necessário, nem possível [...] É necessário acordá-lo. E aí aprendemos que educadores não se extinguiram como tropeiros e caixeiros. Porque, talvez, nem tropeiros, nem caixeiros tenham desaparecido, mas permaneçam como memórias de um passado que está mais próximo do nosso futuro que o ontem. Basta que chamemos do seu sono, por um ato de amor e coragem. E talvez, acordados, repetirão o milagre da instauração de novos mundos. (ALVES, 2012, p.36, grifos meus)

É neste sentido que quero deixar claro que as modificações curriculares a serem sugeridas a partir deste trabalho, quanto às contribuições dos conhecimentos da Fisioterapia na formação docente para a prática da Educação Inclusiva, não tem a pretensão de encontrar uma fórmula mágica para tornar a inclusão uma realidade na escola regular. Tal como disse sabiamente Alves (2012), o que todos almejamos é “acordar” os educadores para suas possibilidades de atuação adormecidas, através de uma nova forma de trabalhar com diversos e diferentes conhecimentos a favor de um propósito maior: a prática da Educação Inclusiva.

Algumas pesquisas (CHESANI et al., 2006; JORQUEIRA e BLASCOVI-ASSIS, 2009; MEDEIROS e BECKER, 2009; MORAES et al., 2010; MOTA e PEREIRA 2010) destacam a importância de uma abordagem multidisciplinar na inclusão da criança com deficiência na escola de ensino regular. São trabalhos que salientam a relevância da interação entre profissionais de educação e da área de saúde, entre estes o fisioterapeuta.

É inegável que a educação brasileira passou por inúmeras transformações ao longo dos anos, porém talvez nenhuma tenha sido tão discutida quanto à inclusão da pessoa com deficiência no ensino regular, ou seja, o surgimento da Educação Inclusiva.

Conforme Mantoan (2011, p. 7) “as mudanças na Educação Especial e na escola comum estão vivendo o assombro pelo Outro, pelo diferente.” Supõe-se que para compreender os “outros” talvez seja necessário a formação ou (re)construção de uma nova consciência acerca do papel de cada um neste processo. Neste sentido, compartilhar conhecimentos de forma multidisciplinar pode ser um importante dispositivo para esse entendimento e para essa conscientização sobre o “outro” e sobre o “si mesmo”.

Ao falar sobre as consciências e sobre a construção de novas consciências em relação ao “outro” e ao “diferente”, bem como em relação ao “si mesmo”, todos em interação com o mundo mediada através da comunicação, gostaria de recordar que Freire (2013a) já preconizava a necessidade de encontro das consciências num mundo comum de significados, que possibilite inclusive a divergência:

As consciências não se encontram no vazio de si mesmas, pois a consciência é sempre, radicalmente consciência do mundo. Seu lugar de encontro necessário é o mundo, que, se não for originariamente comum, não permitirá mais a comunicação. Cada um terá seus próprios caminhos de entrada neste mundo comum, mas a convergência das interações, que o significam, é a condição de possibilidades de divergências dos que, nele, se comunicam. A não ser assim, os caminhos seriam paralelos e intransponíveis. As consciências não são comunicantes porque se comunicam; mas comunicam-se porque comunicantes. (FREIRE, 2013a, pp. 20-21, grifos meus)

Segundo Mantoan (2011, p. 7) não é suficiente “Reconhecer o Outro como o diferente” por conta da grande diversidade de “outros”, que se diferenciam infinitamente. Desta forma “a compreensão do que é ser o outro se torna limitada e por isso não é possível uma catalogação desses outros”, e isso decorre das infindáveis características distintas inerentes aos seres humanos. Retomando a reflexão de Freire (2013a), entendo que é imprescindível que aconteça comunicação e interação com o “outro”, com o “diferente”, pois de outra forma o reconhecimento não é mais que a mera tolerância, assim o mundo continua dividido entre “nós” e “eles” – sem um ponto de encontro de consciências comunicantes onde a Educação é possível.

A definição de Fisioterapia, encontrada no Dicionário Ilustrado de Fisioterapia (Lopes, 2008), evidencia que esta é uma ciência da saúde que estuda, previne e trata distúrbios cinéticos funcionais intercorrentes em órgãos e sistemas do corpo humano. Partindo deste conceito, entendo que o compartilhamento dos conhecimentos da Fisioterapia com o corpo docente possa ser de grande utilidade em diversos aspectos da prática educacional.

Conforme o CREFITO – Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, o “profissional da Fisioterapia tem como objeto de estudo o movimento humano. É ele quem avalia, previne e trata os distúrbios da cinesia7 humana, sejam decorrentes de alterações de órgãos e sistemas ou como repercussões psíquicas e orgânicas.".

A lei que regulamenta a profissão do fisioterapeuta é a Lei Nº 938, de 13/10/69. De acordo com Bispo (2009) foi em 1929 que surgiu a Fisioterapia no Brasil, motivada pelo

grande número de casos de poliomielite, sendo criado o primeiro curso técnico na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. De acordo com o autor a Fisioterapia ainda é vista como uma profissão nova no país, cerca de 46 anos, porém houve um crescimento vertiginoso na quantidade de oferta de formação superior em Fisioterapia entre os anos de 90 até a atualidade.

Conforme consulta ao site da FSBA - Faculdade Social da Bahia (2015), são inúmeras as áreas e possibilidades de especialização do fisioterapeuta, à exemplo da: respiratória, obstetrícia, pediatria, uroginecologia, dermato-funcional, ortopedia, neurologia,, traumatologia, esportiva, cardiologia, saúde da mulher, saúde do idoso, saúde da família, saúde do trabalhador, entre outras.

Saliento que o tratamento fisioterapêutico é baseado no conhecimento e entendimento das funções de forma individualizada, sendo este fator imprescindível para o sucesso da terapêutica utilizada. Conhecer para intervir da forma mais adequada, dentro das possibilidades do profissional e do paciente.

Landmann et al. (2009) dizem que “conhecendo o indivíduo e sua circunstância é possível uma ação eficiente e permanente”. Freire (2013b, p. 29) chama a atenção para o fato de que “conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito, e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer”.

De acordo com Alonso (2013), para a realização de uma verdadeira prática inclusiva é imprescindível readequar e fortalecer o currículo dos profissionais de educação para que através da formação voltada para a inclusão e para a diversidade se possa criar e manter uma rede de relacionamento entre docentes, alunos, equipe escolar, família, sociedade e também entre estes e profissionais de saúde que atendem as crianças com necessidades educacionais especiais.

Tendo em vista a perspectiva proposta por Alonso (2013), torna-se importante que haja uma mudança no paradigma educacional predominante no país, tanto nos modelos de ensino, quanto na consolidação de uma multidisciplinaridade educativa. Precisamos encontrar soluções que possibilitem a inclusão verdadeira, não apenas no que tange às exigências legais, mas principalmente no que diz respeito aos preceitos humanos. É neste contexto de soluções multidisciplinares que os conhecimentos fisioterápicos podem vir a ser uma contribuição positiva para aqueles educadores que praticam a Educação Inclusiva.