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4.2 ESCOLA SOLIDARIEDADE

4.2.2 O que dizem as professoras da Escola Solidariedade

4.2.2.1 Professora Diana

A professora Diana é professora do 4º ano do Ensino Fundamental da Escola Municipal Solidariedade, tem cerca de 30 alunos em sua classe, e um aluno com deficiência: autismo. Foram realizadas duas sessões de observação na sala da professora Diana, nos dias 11 e 15/05/2015, ambas no turno vespertino. Destaco que a professora tem formação dupla para a docência, possuindo em seu currículo tanto o Magistério quanto a Pedagogia.

A sala da professora Diana é ampla e com muitas janelas, bem ventilada e arejada. As carteiras são separadas, mesa e cadeira, na cor branca e com laterais arredondadas. As carteiras dos alunos estavam arrumadas em filas uniformes. A mesa da professora fica de frente para a porta e com um quadro ao fundo. A sala não tem cores vivas e nem enfeites nas paredes.

Na sala da professora Diana havia um único aluno com deficiência, autismo. A professora relatou que o comportamento dele variava. O aluno fala poucas palavras, faz

tratamento, e no geral, segundo a professora, ele participa de algumas atividades.

A professora mencionou que muitas vezes fala com o aluno e o mesmo não demonstra nenhuma reação, como se ela não estivesse ali presente. O aluno geralmente vai à escola em companhia da irmã.

Durante a aula o aluno ficou o tempo todo sentado distante, movimentava-se insistentemente na mesa e com certa frequência colocava as mãos nos órgãos genitais. Inclusive a professora relatou que essa “mania” (como a mesma afirmou) a deixava entre constrangida e irritada, também porque existiam outras crianças na sala.

Apesar de a professora ter colocado o caderno do aluno na mesa o mesmo não o utilizou nas duas visitas realizadas, e a professora não pareceu se incomodar com a situação, talvez em virtude da repetição cotidiana.

Quando perguntada, durante a entrevista, sobre como era a participação do aluno em sala de aula a professora respondeu que:

Na minha sala ele participa. Ele faz todas as atividades, mas é mais lento, demora e isso muitas vezes atrapalha um pouco a turma, porque eu preciso estar sempre ajudando, atenta e nem sempre consigo dar atenção a todos. Mas ele participa sim, faz tudo direitinho, do jeito dele, como ele sabe fazer. Eu sempre ajudo e ele faz o dever igual dos colegas, não é porque é deficiente que vai fazer outra atividade, vai fazer a mesma atividade dos colegas, mesmo que seja do jeito dele. (DIANA, ESCOLA SOLIDARIEDADE, 2015, grifos meus)

Tal afirmativa não foi constatada durante a observação, uma vez que nas duas visitas o aluno não teve uma participação significativa nas atividades em sala de aula.

Em 1980 foi criada, pela Organização Mundial de Saúde – OMS, a Classificação Internacional de Funcionalidade – CIF, que “oferece uma linguagem unificada e padronizada de orientações para descrever e mensurar os estados de saúde e de saúde relativa.”. (EFFGEN, 2007, p. 8)

Diferentemente da Classificação Internacional de Doenças – CID, a CIF tem um foco maior na questão funcional para além da patologia. Assim, foram estabelecidos componentes funcionais para classificação das disfunções. Destaco que o modelo baseado na CIF é o ponto de partida para a atuação fisioterapêutica, onde as condutas serão conduzidas de acordo com essa classificação, considerando outros contextos como o ambiente e fatores pessoais.

A CIF não está centrada em uma doença, mas sim nas disfunções e limitações porventura desencadeadas por esta. Para facilitar a compreensão e classificação foram definidos e padronizados alguns componentes da CIF, de acordo com Effgen (2007, p. 8) são estes:

 Funções corporais: funções fisiológicas (inclusive psicológica);

 Estruturas corporais: estruturas anatômicas do corpo;

 Deficiência: disfunção na estrutura corporal ou na função com perda ou significativa alteração;

 Atividade: realização de ações e/ou tarefas por uma pessoa;

 Participação: envolvimento em situação de vida, social ou de grupo;

 Limitação de atividade: dificuldade na realização de uma atividade; e

 Restrição de participação: problemas que uma pessoa pode experimentar em ambientes cotidianos.

O objetivo da classificação pela CIF é identificar as dificuldades e subsidiar a realização de atividades de vida diária o mais independentemente possível, através da implementação de inúmeros recursos. Assim, a atitude da professora ante as dificuldades de participação de seu aluno são de extrema importância.

Um dos preceitos da Fisioterapia é que o foco não deve estar apenas nas impossibilidades de execução de uma determinada tarefa, mas também, e principalmente, nas

possibilidades de encontrar novos caminhos para a realização de uma atividade e participação nas situações de vida cotidiana.

Assim, destaco que tanto as atitudes quanto o ambiente e sua estrutura física podem servir como fatores de restrição à atividade da criança com deficiência no ambiente escolar, acentuando a limitação, a deficiência e resultando em restrição da participação. Por este motivo é importante oferecer o máximo de estímulos possíveis para estas crianças, tanto no que diz respeito à realização das atividades quanto a sua participação na vida social.

Conforme a CIF a participação somente ocorre através do envolvimento em situação de vida, social ou de grupo, assim a limitação da participação seriam os problemas que a criança experimente no contexto onde está inserida. Portanto, talvez por desconhecimento de tal prerrogativa a professora não esteja se dando conta de que a ausência de auxílios para realização das atividades configura-se como uma limitação que vai além da deficiência.

Desta maneira, conhecer o aluno, suas reais dificuldades, os conceitos pertinentes sobre a deficiência e possibilidades desta criança seriam fatores imprescindíveis para uma prática educativa da inclusão, destacando que não estou propondo uma fórmula mágica para incluir, mas enfatizando a importância do conhecimento para incluir.

Saliento que negar as dificuldades encontradas nas situações cotidianas não tornam tais obstáculos menores. Ainda que os camufle, os mesmos continuam presentes e crescentes. Desta forma é importante perceber que apenas matricular o aluno com deficiência na escola regular não se configura uma inclusão, mas uma integração. A inclusão somente é possível quando o aluno tem todo apoio necessário para a realização das atividades, participação no contexto escolar, e respeito à sua diferença.

Quando questionei a professora sobre ela sentir-se ou não preparada para a inclusão à mesma respondeu com olhar triste que:

Não. Como eu disse antes eu não tive essa formação voltada para esses alunos, eu não tive aluno com deficiência no estágio e eu não fiz nenhum curso de inclusão, só vim descobrir como era quando tive um aluno na minha turma, eu não sabia nada, fiquei perdida sem saber o que fazer, sem preparo para isso. (DIANA, ESCOLA SOLIDARIEDADE, 2015, grifos meus)

Destacou, ainda, acerca de haver necessidade de mudança na formação docente para a Educação Inclusiva:

Acho que sim. Como é que a gente vai trabalhar bem com a criança com deficiência se a gente não conhece, se a gente não teve uma formação para isso, se a gente não sabe o que fazer. Então acho que deve ter sim. (DIANA, ESCOLA SOLIDARIEDADE, 2015, grifos meus)

Tais respostas confirmam a necessidade de reformulação curricular na formação docente e a inclusão de novos conhecimentos, novos saberes e novos compartilhamentos, justamente a proposta sugerida por este estudo. Conforme Cortella (2011, p. 14) “é preciso pensar uma nova qualidade para uma nova escola, em uma sociedade que começa, paulatinamente, a erigir a Educação como um direito subjetivo de Cidadania e, portanto, inerente a cada sujeito, a cada pessoa.”.