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Museu da Fábrica de Cerâmica Vieira

II PROCESSOS MUSEOLÓGICOS EM SÃO MIGUEL: 1974-

11. Museu da Fábrica de Cerâmica Vieira

A origem da fábrica de Cerâmica Vieira remonta a 1862, ano em que foi fundada por Bernardino da Silva, natural de Vila Nova de Gaia,405 ficando as antigas instalações no Porto de Carneiros, junto a uma baía amena, a onde chegavam os barcos da vizinha ilha de Santa Maria, carregados de bolas de barro destinadas à produção da louça.

Em 1872, um dos seus co-fundadores, Manuel Leite Pereira, abandonou a sociedade e fundou uma nova fábrica nas Alminhas, na freguesia do Rosário da Lagoa.

Em 1985, António Vieira, o proprietário da Cerâmica Vieira comprou a antiga Fábrica Leite da Rua das Alminhas, reactivando-a em 1992406.

A actual fábrica de Cerâmica Vieira resulta da fusão dessas duas fábricas, a do Porto de Carneiros (dedicada actualmente à produção de telhas e tijolos) e a das Alminhas (vocacionada para a produção de loiça vidrada e azulejos). Na família ao longo de cinco gerações, a Cerâmica

404 Em 1997, foi celebrado um protocolo de colaboração entre a edilidade lagoense e o proprietário de um Forno de Cal situado

na Avenida Infante D. Henrique, com vista à salvaguarda e protecção daquela infra-estrutura, e a um tratamento etnomuseológico futuro, que culminará com a constituição do Núcleo Museológico do Forno de Cal. Esse projecto ainda não teve continuidade. Arquivo de Correspondência da Câmara Municipal de Lagoa, 1997. Musealização do Forno de Cal – Av. Infante D. Henrique. Ofício n.º4554. 16 de Setembro.

405 Manuel Pereira Leite (Vila Nova de Gaia), Tomáz d’Ávila Boim (Pico) e Manuel Joaquim do Amaral (Povoação) foram co-

fundadores. Cf. Martins. 2001.

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Vieira é a única que sobreviveu até hoje na Lagoa e nos Açores, fabricando por processo industriais loiça decorativa e de uso doméstico, azulejos, tijoleira e telhas.

Na Fábrica das Alminhas, o processo de produção, de modo geral, continua próximo do tradicional, embora tenham sido introduzidas novas máquinas, designadamente a de mistura, de secagem, o laminador e os fornos que passaram a ser eléctricos, por serem mais rápidos e mais práticos.

É nesse contexto que, em 1992, ao reactivar as actuais instalaçoes, António Vieira, reservou uma pequena área na fábrica para expôr testemunhos materiais da história da empresa, nomeadamente, instrumentos relacionados com a produção cerâmica lagoense, uma pequena colecção de peças de cerâmica produzidas nas antigas indústrias locais, bem com alguns objectos relacionados com a antiga moagem de cereais, situada perto do Porto de Carneiros e que também pertenceu à família. Esses artefactos estão expostos sem grande cuidado museográfico ou de conservação, apresentando apenas tabelas de explicação em algumas peças.

Porém, esse conjunto de objectos situa-se à entrada da fábrica, constituindo uma introdução à visita aquele espaço que, à semelhança do passado, continua a ser visitável em laboração, sendo as explicações dadas pelos funcionários que aí trabalham ou, quando se justifica, pelos próprios proprietários.

Este binómio, exposição de objectos memória e fábrica visitável, complementado por um espaço de loja, tem vindo a imprimir o estatuto de museu de empresa à Cerâmica Vieira. Esse estatuto é inclusivé considerado pela autarquia lagoense que, por exemplo, na sua página oficial da internet, no item dedicado aos museus do concelho, referencia o Museu da Fábrica de Cerâmica Vieira.407

Mas, paralelamente a essa realidade que é visível actualmente, existem outros aspectos e intenções a analisar. De facto, para o actual proprietário, António Vieira, os objectos expostos na

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fábrica são apenas um embrião do futuro Museu da Cerâmica Vieira que gostaria de construir408. Considera para o efeito que, na zona envolvente à fábrica, existe espaço suficiente para a instalação de um futuro espaço museológico. A ideia é a de manter a fábrica a funcionar nos moldes actuais409, e sempre visitável, e dispor também de um museu de empresa, o Museu da Cerâmica Vieira, onde seja contada a história daquela unidade produtiva, no contexto do concelho e da ilha e o percurso de uma família ligada aquela actividade. Um espaço museológico onde projecta apresentar também diversos testemunhos materiais da produção cerâmica da Lagoa, desde o século XIX à actualidade. De referir aqui, o gosto com que António Vieira colecciona, desde longa data, peças das antigas produções de cerâmica da Lagoa. Algumas dessas peças herdou da família, outras compra, e tem ainda a preocupação em guardar sempre um exemplar de todos os artefactos que ainda hoje são produzidos pela sua fábrica. A visita ao armazém, espaço de reserva que se situa entre a sua moradia e as actuais instalações da Cerâmica Vieira, são expressão da dimensão e do valor do espólio que tem coleccionado ao longo dos anos.

Interessante é o espírito de coleccionador com que António Vieira continua a procurar determinada peça que lhe falta, pelo tipo, material, forma ou função, ou o facto de adquirir localmente peças de cerâmica provenientes de mercados orientais, para comparar, a nível de qualidade, com as que produz. Um exemplo paradigmático diz respeito à garrafa mulher de

capote e capelo produzida pela Cerâmica Vieira que compara com outra semelhante proveniente

da China, que, embora apresente o trajo típico dos Açores, tem uma fisionomia oriental, particularmente a nível dos olhos.410

O Museu da Fábrica de Cerâmica Vieira é então um embrião, cujo desenvolvimento continua adiado, pois para isso António Vieira necessitava de apoios financeiros. É uma intenção que não

408 Depoimento de António Vieira prestado em Julho de 2009.

409 Eventualmente com alguma alteração pontual que seja necessário efectuar. 410 Idem.

140/318 está no papel mas na sua cabeça411 e que coexiste com a actual produção da vulgarmente

conhecida Louça da Lagoa, hoje considerada um ex-libris do concelho.