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15. PILAR I: O território da docência

15.7 Núcleos Livres

Os Núcleos Livres, na UFG, são disciplinas criadas pelos professores, aprovadas em Conselho Diretor, e oferecidas, a partir de sua unidade acadêmica, ao corpo discente de toda a universidade. Os currículos de cada curso preveem uma carga horária a ser cumprida em disciplinas de Núcleos Livres. Neles, se configura um espaço de interação entre estudantes oriundos de diferentes cursos, embora, muitas vezes, o interesse despertado seja maior nos cursos vinculados à própria unidade no qual seja oferecido.

Há de se considerar que as matrizes curriculares, em geral, são razoavelmente fechadas, observando-se um trânsito muito restrito dos estudantes entre diferentes unidades acadêmicas da universidade, e mesmo entre diferentes cursos dentro de uma mesma unidade. Os Núcleos Livres acabam configurando um desses espaços de trânsito, tão saudáveis à formação nas diferentes áreas, em sintonia com a ideia de universidade.

Desde 2004, quando do meu ingresso na UFG, assumi a oferta de duas disciplinas de Núcleo Livre. A primeira foi ofertada em apenas uma ocasião, a segunda vem sendo ofertada com alguma regularidade desde 2008.

Seminário de arte e ensino

No início do segundo semestre de 2004, a pedido da direção da Faculdade de Artes Visuais, ofereci a disciplina de Núcleo Livre que foi denominada Seminário de arte

e ensino. Em razão de uma programação extraordinária de reposição de aulas, ela

foi ofertada aos sábados, logo no início da manhã. Na condição de uma disciplina de escolha dos estudantes, era de se esperar que fosse baixa a procura. O que não aconteceu: com uma turma numerosa, foi possível discutir os modos como as pessoas se relacionavam com as visualidades presentes em seus quotidianos, e como relacionar essas experiências com projetos de ensino nos contextos

escolares. Também foram desenvolvidas pequenas ações de pesquisa na cidade, com entrevistas e registro de visualidades em diversos contextos, desde os centros de compras, salas de cinema, a praças, avenidas, escolas, bares e outros espaços de entretenimento.

Oficina dos fios

Em 2006, a então mestranda no Programa de Pós-Graduação em Cultura Visual, Manoela dos Anjos Afonso Rodrigues (desde 2009, integra o corpo docente da FAV), iniciou uma série de intervenções artísticas coletivas, em Goiânia, que denominou Le Mur, que ocupava um muro lateral do espaço da Aliança Francesa. Convidada por ela a integrar a terceira intervenção, já em 2007, propus uma ação à qual chamamos de Intervention III – Tramas no Muro (Le Mur). Consistiu na inserção de teares de prego ao longo de todo o muro. Durante uma semana, foram convidadas pessoas que teceram e tramaram tecidos, linhas e fibras diversas na estrutura, incorporando os elementos das intervenções anteriores que ali haviam permanecido.

Dessa ação tomaram parte, além de artistas e interessados, um grupo de estudantes dos cursos de Artes Visuais, bacharelado e licenciatura. Esta motivação apontou para a possibilidade de oferta de uma disciplina de Núcleo Livre que pudesse propiciar o trabalho com tecelagem e outras modalidades envolvendo as artes têxteis. Assim, no primeiro semestre de 2008, cadastrei a Oficina dos Fios, no formato de Núcleo Livre, realizando sua primeira oferta. A turma foi formada por várias estudantes que tinham participado da intervenção artística, mas também por estudantes vindos de outros cursos, tais como Letras, História, Educação, dentre outros.

Desde então, a disciplina teve sete edições, com alguns traços que a caracterizam: a. A cada oferta, reúne estudantes de cursos diversos, alguns dos quais muito díspares da área de artes (Biologia, Medicina, Engenharias, Veterinária, Química, Direito, dentre outros), outros que dialogam com o campo (Comunicação, Letras, Educação, Ciências Sociais, História, dentre outros), além dos cursos oferecidos pela própria Faculdade de Artes Visuais

(Arquitetura, Design de Moda, Design Gráfico, Artes Visuais/bacharelado), e estudantes do curso de Artes Visuais/licenciatura, ao qual está vinculado.

b. A disciplina é organizada em quatro blocos. Em dois deles, se trabalham com técnicas definidas em conjunto com a turma, que podem ser tecelagem em tear de pregos, bordado, crochê, dentre outras possíveis. Num terceiro, organizam-se grupos que estudarão o trabalho com arte têxtil desenvolvido por artesãos, artesãs, artistas e profissionais em geral cujas produções dialoguem com o campo das artes. O quarto bloco envolve um projeto de trabalho artístico preferencialmente coletivo, ou em grupos, que pode resultar numa intervenção externa à sala de aula. Como exemplos desse bloco previsto na disciplina, podem ser citadas: a) ações de bordados sobre a tela da cerca que protege uma das matas do Campus II da UFG; b) intervenção nos jardins internos da Biblioteca Central, que contou com a participação de um grupo de pessoas da comunidade indígena Kuykuro; c)0 ação nos corredores da FAV; d) o bordado de um estandarte com dimensões de 1mx2m para integrar o cenário do espetáculo DeBanda, dirigido e permormado pelo professor e artista César Lignelli, da Universidade de Brasília.

c. O amadurecimento conquistado nas diversas ofertas da disciplina propiciou o desenvolvimento de uma metodologia organizada em torno a formas mais colaborativas de trabalho, e a experimentação, em ambientes de produção, da noção de poética da solidariedade (MARTINS, 2018b), ainda em processo de elaboração.

Em 2020, em oferta no primeiro semestre, a disciplina previu a inclusão de estudantes de pós-graduação (mestrado e doutorado) regularmente matriculados, bem como a oferta de uma ação artística na Galeria da FAV, intitulada CÁ ENTRE NÓS, cujo projeto foi aprovado nos termos do Edital público de chamada para exposições. No entanto, sua execução foi inviabilizada em razão da pandemia causada pela COVID192.

Bordados na tela da cerca que protege a mata (2011), e ação no jardim interno da Biblioteca Central, com participação da comunidade Kuykuro (2015), ambos no Campus II da UFG. Fotos: Alice Fátima Martins (2011 e 2015).