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N esta Seção iniciamos as primeiras aplicações de relações de equivalência

X k=0 n k akbnk⇒(a+b)n+1= n+1 X k=0 n+ 1 k akbn+1k.

Observar que cada parcela do somatório que antecede a condicional acima, envolvendo o fator ajbl, é tal quej+l=n. Mas(a+b)n+1= (a+b)(a+b)n. Logo,(a+b)n+1=a(a+b)n+b(a+b)n. Portanto,

(a+b)n+1=a n X k=0 n k akbnk+b n X k=0 n k akbnk.

Ou seja, agora cada parcela da adição dos somatórios do lado direito da igualdade acima, envolvendo fatores ajbl, é tal quej+l =n+ 1. Logo, (a+b)n+1= n+1 X k=0 n+ 1 k akbn+1k.

b

Se o leitor não se convenceu da última parte da demonstração acima, observar que n k + n k−1 = n+ 1 k ,

cuja demonstração pode ser um interessante exercício.

Se o leitor não se convenceu com a denição de somatórioPn

k=0zk, introduzida no último teorema, essa pode ser escrita como se segue:

i: P1

k=0zk=z0+z1; ii: Pn+1

k=0zk =Pn

k=0zk+zn+1;

Apesar do Teorema Binomial para Naturais ser um resultado da aritmética, ele pode ser estendido de modo a repercutir em áreas como cálculo diferencial e integral, conforme vemos na Seção 49. Esse é um dos aspectos mais marcantes da matemática: o surpreendente alcance dos resultados mais relevantes.

Ÿ30. Inteiros.

N

esta Seção iniciamos as primeiras aplicações de relações de equivalência.

Eventualmente relações podem ser denidas sobre relações, como se faz a seguir. Anal, toda relação é um conjunto.

Definição 21. Sejam(m, n)e(p, q)elementos da relaçãoω×ωemω. Logo,

(m, n)∼(p, q)...m+q=n+p.

Exemplo 40. i: (5,2)∼(7,4); isso porque5 + 4 = 2 + 7; ii: (7,4)∼(32,29); com efeito, 7 + 29 = 4 + 32;

iii: (5,2)∼(32,29);

iv: (5,2)6∼(2,5); com efeito, 5 + 56= 2 + 2.

Notar que ω×ω é uma relação em ω, e ∼ é uma relação em ω×ω. Neste momento é importante não confundir uma relação emω×ω com qualquer sub-conjunto deω4. Com efeito,ω4=ω×(ω×(ω×ω))(Denição 10), enquanto∼

é subconjunto próprio de(ω×ω)×(ω×ω). Logo,∼não é subconjunto deω4. Teorema 20. A relação∼emω×ω da Denição 21 é de equivalência.

b

A demonstração deste último resultado ca a cargo do leitor. Resumi-damente, tanto reexividade quanto simetria de ∼são consequências da comu-tatividade da adição+entre naturais. Com relação à transitividade de∼, essa pode ser facilmente provada se o leitor enunciar e demonstrar um teorema de cancelamento de termos para a adição de naturais. Tal teorema de cancelamento diz o seguinte: dadosm,nepnaturais, então

m+n=m+p⇔n=p.

Uma vez que toda relação de equivalência dene uma partição (Teorema 12), há aqui a oportunidade para introduzir números inteiros. As classes de equiv-alência deω×ω relativamente a∼são denotadas como se segue.

Definição 22.

+n= [(n,0)] ={(a, b)∈ω×ω|(a, b)∼(n,0)} −n= [(0, n)] ={(a, b)∈ω×ω|(a, b)∼(0, n)∧n6= 0}

A classe de equivalência+nse lê `inteiro positivon'. A classe de equivalência

−nse lê `inteiro negativo n'.

Exemplo 41. i: O inteiro positivo zero é 0 = [(0,0)] =

{(0,0),(1,1),(2,2),(3,3),· · · };

ii: o inteiro positivo um é+1 = [(1,0)] =

{(1,0),(2,1),(3,2),(4,3),· · · };

iii: o inteiro negativo um é −1 = [(0,1)] =

{(0,1),(1,2),(2,3),(3,4),· · · };

iv: o inteiro positivo dois é+2 = [(2,0)] =

{(2,0),(3,1),(4,2),(5,3),· · · };

v: o inteiro negativo dois é−2 = [(0,2)] =

Um número inteiro é uma classe de equivalência de pares ordenados de números naturais relativamente a∼. Um inteiro positivo (ver sinal+) tem como represen-tante um par ordenado(m, n)ondem≥n(isso equivale a armar quen≤m). Um inteiro negativo (ver sinal −) tem como representante um par ordenado

(m, n) onde m < n. Um inteiro estritamente positivo é um inteiro positivo diferente de0. Eventualmente podemos omitir o sinal+entre inteiros positivos. O emprego das notações +n e −n serve ao propósito de enfatizar que ne-nhum inteiro é natural e nene-nhum natural é inteiro. Por exemplo, o natural 0 é o conjunto vazio, enquanto o inteiro positivo zero é o conjunto0 = [(0,0)] =

{(0,0),(1,1),(2,2),(3,3),· · · }. Logo, de acordo com o Axioma da Extensionali-dade,06= 0.

Para denirmos operações de adição e multiplicação entre inteiros, basta, por-tanto, denirmos operações sobre representantes quaisquer de inteiros. Essa é a enorme vantagem do emprego de classes de equivalência! Para operar entre inteiros não há necessidade alguma de denir operações entre classes de equiv-alência. Denir operações entre representantes de classes de equivalência induz operações entre as próprias classes de equivalência.

Definição 23. Se (m, n) e (p, q) são representantes quaisquer de inteiros, então (m, n) + (p, q) = (m+p, n+q) e (m, n)·(p, q) = (mp+nq, mq+np). Se (m, n) + (p, q) = (r, s),

dizemos que(r, s)é a soma das parcelas (m, n)e(p, q). Se

(m, n)·(p, q) = (r, s),

dizemos que (r, s)é o produto dos fatores (m, n)e(p, q). O mesmo se diz sobre os respectivos inteiros com representantes(m, n), (p, q)e(r, s).

Em outras palavras, em virtude do que foi dito acima, sex ey são inteiros, positivos ou negativos, entãox+y=zsss(m, n)e(p, q)forem representantes de

xey, respectivamente, e(m, n) + (p, q)for representante dez. Situação análoga ocorre com a multiplicação entre inteiros.

Exemplo 42. Como calcular4 +−2? Basta escolhermos representantes quaisquer dos inteiros4e−2e aplicarmos a Denição 23. Por exemplo, um dos representantes de +4é (5,1), e um dos representantes de−2 é

(16,18). Logo,

(5,1) + (16,18) = (5 + 16,1 + 18) = (21,19).

Mas (21,19) é representante de +2. Com efeito, (21,19)∼ (2,0) (ver Denição 22), uma vez que21 + 0 = 19 + 2. Logo, 4 +−2 = 2.

Exemplo 43. Como calcular4· −2? Basta usar a mesma estratégia do exemplo anterior. Ou seja,

(4,0)·(1,3) = (4.1 + 0.3,4.3 + 0.1) = (4 + 0,12 + 0) = (4,12).

Mas (4,12)é representante de −8, uma vez que (4,12)∼(0,8) e (0,8)

é representante de−8, de acordo com a Denição 22.

Importante observar que a operação de adição entre naturais é uma função

+ :ω×ω→ω,

enquanto a adição entre inteiros é uma função

+ : ((ω×ω)/∼)×(ω×ω)/∼)→((ω×ω)/∼)

induzida pela Denição 23. Logo, são funções diferentes. Mais do que isso, nenhuma é restrição da outra.

Do ponto de vista formal isso signica que tais funções deveriam ser denotadas por símbolos diferentes. Mas, como já foi dito anteriormente, matemáticos estão mais interessados em rigor do que formalismo. Do ponto de vista do rigor, naturalmente se sabe que adição entre naturais é uma função e adição entre inteiros é outra. Comentário análogo vale para a multiplicação entre naturais e a multiplicação entre inteiros.

Teorema 21. 0 é neutro aditivo.

Demonstração: Seja(m, n)um representante de um inteiro qualquer. Uma vez que todo representante de zero inteiro é um par ordenado(p, p), onde

pé natural, então basta aplicar a Denição 23. Logo,

(m, n) + (p, p) = (m+p, n+p).

Mas(m, n)∼(m+p, n+p), uma vez que

m+n+p=n+m+p,

graças à comutatividade e à associatividade da adição entre naturais. Logo,

(m+p, n+p)e(m, n)são representantes do mesmo inteiro. Demonstração análoga para o caso da adição entre zero inteiro e um inteiro qualquer. Logo,0é neutro aditivo.

Em outras palavras, no teorema acima foi provado que, se +n ou −n são inteiros, então +n+ 0 = +n, −n+ 0 =−n, 0 + +n= +n e 0 +−n=−n.

Para evitar notação sobrecarregada, eventualmente podemos nos referir a in-teiros simplesmente por letras latinas minúsculas em itálico. Ou seja, foi provado acima que, para qualquer inteirop,

p+ 0 = 0 +p=p

(observar que esta última notação é uma abreviação metalinguística equivalente a armar quep+ 0 =p∧0 +p=p).

Teorema 22. Todo inteiro admite simétrico aditivo. Ou seja, se p é um inteiro, então existe inteiroqtal que, tantop+qquantoq+presulta no neutro aditivo0.

Demonstração: Seja(m, n)um representante qualquer de um inteirop. Se

(n, m)é representante de um inteiroq, então

(m, n) + (n, m) = (m+n, n+m).

Uma vez que adição entre naturais é comutativa,

(m+n, n+m) = (m+n, m+n).

Logo, este último par ordenado é representante de0, o qual é neutro aditivo. Portanto, todo inteirop(com representante(m, n)) admite simétrico aditivo

q(com representante(n, m)).

b

Observar que 0 é o único inteiro cujo simétrico aditivo é ele mesmo. Consegue provar isso?

É uma prática comum denotar o simétrico aditivo de um inteiro p por −p. Neste texto a mesma notação é empregada. Mas é preciso cuidado: não confundir o sinal −, usado na denição de inteiros, com simétrico aditivo −p de p. Isso porque, eventualmente,−ppode ser um inteiro estritamente positivo.

O último teorema é de importância vital para compreender a diferença entre naturais e inteiros. Todo inteiro admite simétrico aditivo. No entanto, 0 é o único natural que admite simétrico aditivo relativamente à adição entre naturais. Por exemplo, não existe natural n tal que n+ 2 ou 2 +n seja igual a 0 (o neutro aditivo entre os naturais).

Para uma denição precisa do conceito de simétrico relativamente a uma op-eração binária qualquer (não apenas adição ou multiplicação), ver Seção 67.

Graças à existência de simétrico aditivo entre inteiros, é possível denir uma nova operação a partir da adição entre inteiros. A subtração

p−q

entre inteiros é a adição

p+ (−q),

ou seja, a adição do inteiro pcom o simétrico aditivo deq. Obviamente não é possível denir conceito equivalente entre naturais.

Demonstração: Seja(m, n)um representante de um inteiro qualquer. Logo,

(m, n)·(1,0) = (m.1 +n.0, m.0 +n.1) = (m+ 0,0 +n) = (m, n).

Demonstração análoga para o caso de (1,0)·(m, n). Logo, 1 é neutro multiplicativo, uma vez que(1,0)é representante de1.

b

Recomendamos ao leitor provar este último teorema usando outro repre-sentante para o inteiro1.

Teorema 24. O neutro aditivo entre os inteiros é absorvente multiplicativo. Ou seja, sepé um inteiro, entãop·0 = 0·p= 0.

Demonstração: Seja(m, n)um representante de um inteiro qualquer. Um representante do neutro aditivo entre os inteiros é(0,0). Logo,

(m, n)·(0,0) = (m(0) +n(0), m(0) +n(0)).

Mas este último é o par ordenado(0,0), uma vez que a multiplicação entre naturais garante trivialmente que o natural 0 é absorvente multiplicativo. Demonstração análoga para0·p= 0. Logo,0é absorvente multiplicativo. Obviamente, a demonstração acima poderia ser feita a partir de qualquer outro representante de0. Optamos pelo par ordenado(0,0)para destacar que o próprio natural 0 é absorvente multiplicativo entre os naturais.

Outros teoremas podem ser demonstrados:

i: a adição entre inteiros é comutativa e associativa; ii: a multiplicação entre inteiros é comutativa e associativa; iii: sep,qersão inteiros, entãop(q+r) =pq+pr.

Moral da História: Todas as propriedades algébricas da adição e da mul-tiplicação entre naturais ocorrem também para a adição e mulmul-tiplicação entre inteiros. No entanto, os inteiros contam com uma propriedade algébrica não replicada entre os naturais, a saber, a existência de simétricos aditivos. Esta é a relevante diferença entre naturais e inteiros!

Teorema 25. A multiplicação entre um inteiro estritamente positivo e um inteiro negativo é um inteiro negativo.

Demonstração: Um representante de um inteiro estritamente positivo+m

qualquer é o par ordenado (m,0), ondem 6= 0. Um representante de um inteiro negativo qualquer−q é o par ordenado(0, q), ondeq6= 0. Logo, a multiplicação entre eles é simplesmente

(m,0)·(0, q) = (m(0) + 0(q), mq+ 0(0)) = (0, mq).

Mas este último é representante de um inteiro negativo.

As demais regras de sinais (tão propagadas no ensino médio, mas sem justi-cativa alguma!) podem ser demonstradas de maneira análoga:

i negativo multiplicado por estritamente positivo é negativo, ii negativo multiplicado por negativo é estritamente positivo,

iii positivo multiplicado por positivo é positivo.

b

Recomendamos ao leitor que prove esses últimos três teoremas.

Apesar de nenhum natural ser inteiro, como já foi discutido acima, ainda é possível copiar os naturais entre os inteiros. Para tanto, basta observar os seguintes teoremas:

• A adição entre inteiros positivos é fechada nos inteiros positivos, ou seja, sepeqsão inteiros positivos, entãop+qé um inteiro positivo.

• A multiplicação entre inteiros positivos é fechada nos inteiros positivos, ou seja, sepeq são inteiros positivos, entãop·qé um inteiro positivo.

• A adição entre inteiros positivos é comutativa, associativa e admite neutro aditivo.

• A multiplicação entre inteiros positivos é comutativa, associativa e admite neutro multiplicativo.

• Entre os inteiros positivos temos como teorema a distributividade da mul-tiplicação.

• Não é teorema a seguinte armação: `para todo inteiro positivo existe simétrico aditivo que seja inteiro positivo'. Com efeito, basta provar que o simétrico aditivo de qualquer inteiro estritamente positivo é um inteiro negativo.

Ou seja, os inteiros positivos contam com as mesmas propriedades algébricas dos naturais, no que se refere às respectivas operações de adição e multiplicação. Vale a pena notar que, em momento algum, foram denidas operações de adição ou multiplicação entre um natural e um inteiro, ou entre um inteiro e um natural. Não há necessidade disso justamente porque os inteiros positivos podem replicar os naturais.

Apesar de alguns autores armarem irresponsavelmente que todo número na-tural é inteiro, o que se mostra aqui é que os inteiros positivos copiam os naturais. Nada além disso. Mais detalhes na Seção 41.

Observar também que, entre os inteiros, não é teorema a seguinte armação: `todo inteiro admite simétrico multiplicativo'. Se existisse, o simétrico multiplica-tivo de um inteiro p, deveria ser um inteiro qtal que pq = 1, sendo 1 o neutro multiplicativo entre os inteiros. Obviamente o neutro multiplicativo dos inteiros admite ele mesmo como simétrico multiplicativo. Analogamente, o simétrico aditivo do neutro multiplicativo (ou seja, −1) também admite como simétrico multiplicativo ele mesmo, uma vez que −1· −1 = 1. Mas nenhum outro inteiro conta com essa propriedade algébrica.

Considere, para ns de ilustração, o inteiro2. Supor que ele admite simétrico multiplicativo com representante(p, q). Logo,

Para que o resultado (2p,2q) seja representante do neutro multiplicativo é necessário que

(2p,2q) = (n+ 1, n)

para pelo menos algumnnatural. No entanto, ambos2pe2q, independentemente dos valores depeq, são naturais pares. Logo, é necessário que ambosnen+ 1

sejam pares. Mas, sené par, então n+ 1é ímpar. Sené ímpar, entãon+ 1é par. Isso é uma contradição!

O fato de não haver simétrico multiplicativo para todo e qualquer inteiro serve como motivação para a denição dos números racionais. A proposta é a seguinte:

Como denir um conjunto x e duas operações (+ e ·), fechadas em

x, de modo que este novo conjuntox consiga copiar os inteiros e os naturais e ainda admitir a existência de simétrico multiplicativo para todos os termos pertencentes ax?

Esse problema é resolvido na próxima Seção.

Entre os inteiros é possível denir relações de ordem total≥(maior ou igual) e≤(menor ou igual) como se segue:

Definição 24. Sejamres inteiros. Logo,

• r≥0 ...ré inteiro positivo; • r≥s...r+ (−s)≥0; • r≤s...s≥r. Além disso, r < ssssr≤s∧r6=s; e r > ssssr≥s∧r6=s.

Exemplo 44. 5 > 2. Com efeito, 5 +−2 = 3; Uma vez que 3 é um inteiro positivo, então5 +−2≥0. Uma vez que56= 2, então 5>2. Para encerrar essa discussão, o conjunto dos números inteiros é denotado por

Z. Em outras palavras,

Z= (ω×ω)/∼.

Estudar os números inteiros signica estudar o conjunto(Z,+,·). Ÿ31. Racionais.

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