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NA VONTADE, A FALTA SE DÁ COMO ESCRAVIDÃO DAS PAIXÕES

I. A DINÂMICA CONSTITUTIVA DA VONTADE

6. VONTADE E ALIENAÇÃO

6.2. NA VONTADE, A FALTA SE DÁ COMO ESCRAVIDÃO DAS PAIXÕES

Antes de considerarmos a condição da falta em relação à vontade especificamente, é importante enfatizar, antes de qualquer coisa, que a falta é um evento com imensas possibilidades. Nos seus limites externos, a falta é uma descoberta do infinito, uma experiência invertida do sagrado: do sagrado no demônico. É pecado no sentido mais ontológico da palavra. A falta que sozinha poderia colocar um problema ético no seu contexto genuíno, é também sozinha capaz de depor a ética considerada como uma ordem fechada da lei. Está relacionada com Deus, está diante de Deus, indo além da subjetividade pelo seu próprio excesso. Somente mais tarde, entre os frutos do Espírito, a harmonia pode ser apresentada como uma nova ética. Assim, o que não pode ser

equivocado na ontologia da vontade é que ela não é uma ética real no sentido imediatista. Isto a sobrecarregaria como tendo que agüentar sozinha todo a confluência das cargas do viver. A vontade não é um trator vasculante, mas é um centro direcional e de sentido em conexão gerencial contínua com todas as forças que atuam sobre o homem e reagindo a elas e com elas responsiva e criativamente. Além do mais, celebrar o senhorio da vontade sobre a natureza nos levaria a elogiar falsamente o “fariseu” e o “justo”: prometer auto-controle prematuramente seria uma promessa que não pode ser cumprida.10 O auto-controle é um mister a ser conquistado como fruto de sincera

disposição e habilidade de exercício e não algo a ser decretado ou assumido superficialmente.

No caso da vontade, a falta se dá na dificuldade de reconciliar a liberdade (voluntário) e natureza (involuntário), que se torna premente na tendência do “Eu” em fechar-se num círculo de si mesmo. Seja como for, num sentido mais estrito, a falta está mergulhada no princípio das paixões que é uma certa escravidão que a alma impõe a si mesma,11 como se amarrando a si mesma. Esta

escravidão não tem nada a ver com determinismo, que é somente uma regra necessária ligando os objetos para uma consciência teórica. A escravidão das paixões é algo que acontece a um sujeito, ou seja, a uma liberdade. Servidão e livramento são coisas que acontecem à liberdade. O perigo de se falar em escravidão das paixões é passar a entendê-la como um determinismo destruindo a liberdade ao invés de algo que acontece à liberdade por meio de sua auto-degradação em tornar-se objeto. Assim, assumir a falta como um determinismo que corrói e destrói a liberdade não é um procedimento metodologicamente correto, principalmente por aqueles que assumem que o ser humano é um ser aberto a possibilidades. Toda metodologia que busca compreender a vontade deve tentar escapar da armadilha de ver a vontade inteiramente mergulhada no “determinismo” da falta. O método empírico seria o unicamente adequado a uma paixão em particular, mas ele nada pode dizer ou estabelecer com respeito à questão da falta ser fundamental ou somente um acidente nas possibilidades fundamentais do homem. Não pode haver nenhuma compreensão fundamental da vontade começando com um acidente, somente uma descrição empírica.

A falta como escravidão também não é uma necessidade revelando um involuntário absoluto, ao qual estou sujeito enquanto viver. A escravidão das paixões introduz uma nova ocasião de eventos para que corramos o risco de perder a conexão possível entre a necessidade experimentada e a liberdade. Começando com a corrupção, a liberdade fica fascinada com o sonho de se auto- afirmar, e a partir daí exila-se de si mesma. Ela passa a negligenciar levianamente a necessidade, super proclamando-se como liberdade soberana, mesmo quando usa a necessidade como um álibi

10 IDEM. Ibid., p. 25 11 IDEM. Ibid., p. 25

justificador para as paixões. Assim, o indivíduo se escusa ambiguamente, apelando ao seu caráter para desincumbir sua responsabilidade.

É somente na paixão que a vontade se escraviza ao invés de estar soberana ou mesmo derrotada. Na medida em que a emoção fornece o ponto corpóreo de entrada e um álibi para a paixão, isto não é paixão. A paixão é um fenômeno mental e não corpóreo. É uma vertigem a que a vontade escolhe se render, uma escravidão que a vontade impõe sobre si mesma. O verdadeiro involuntário corpóreo, a saber, a emoção, permanece em princípio um órgão ao invés de um senhor do voluntário. A questão de que a paixão é uma obra da vontade, um fenômeno mental, e não o contrário, é evidente pelo fato de que a vontade pode recobrar-se da paixão. Se a paixão fosse uma realidade “superior” ou fundamentalmente determinante, não haveria uma instância outra e possível ao qual a vontade pudesse se recobrar ou recorrer. A paixão seria a primazia e o recobrar-se uma patologia ou mero acidente.

Assim, as paixões procedem da região da vontade mesma e não do corpo. A paixão encontra sua tentação e seus meios no involuntário, mas o encanto vem da alma. Neste sentido específico, as paixões são a vontade mesma. Elas agarram a totalidade humana pela cabeça e a torna uma totalidade alienada. É por isso que nenhuma paixão pode ser colocada entre as funções sintéticas do voluntário e involuntário. Cada paixão é uma forma da totalidade humana. Se isto é fato, para Ricoeur, não há como experimentar desejos de forma alheia ou extrínseca à totalidade. Este também foi o entendimento de Sartre, que apontou a impossibilidade da má-fé humana se esquivar de nossa condição inescapável de sermos livres.

As paixões são distorções tanto do voluntário quanto do involuntário. Comumente, consideramos as paixões como emoções complexas, resistentes e mais sistemáticas. Apesar das emoções estarem ligadas às paixões, como demonstrou Descartes, as paixões não são graus elaborados da emoção. A emoção pertence a uma natureza fundamental de uma chave comum que serve tanto à inocência quanto à falta. Já a paixão tem um princípio ativo e ao mesmo tempo pertencente ao nada. Se nos detivermos no locus das paixões humanas, ficamos impedidos de vislumbrar as possibilidades fundamentais do homem. Este vislumbre não é somente uma mera suspensão de um puro involuntário mas também de um puro querer (vouloir).12 As paixões são tanto ramificações da vontade quanto do involuntário. Por exemplo, a ambição é uma forma apaixonada de energia empreendida em escolha e em esforço. Tanto a vontade de poder de Nietzsche quanto as paixões exemplificadas por dramas novelísticos, são formas apaixonadas da vontade.

A ambigüidade presente na paixão encontra-se no fato de que a paixão, ao mesmo tempo em que é sinal de meu salto livre acima dos determinismos do caráter ou qualquer outro a ser rejeitado, também depende, ao mesmo tempo, deste senso de caráter para eximir-se de sua responsabilidade. Mas sem o reconhecimento dos determinismos do caráter, nenhuma auto-proclamação da liberdade seria possível. Assim, tal liberdade fala da tirania do “caráter” e ao mesmo tempo santifica sua escravidão e dependência em nome de uma necessidade que se tornou fraterna13 ou simuladamente

domesticada. A trama destes subterfúgios e ambigüidades nos faz perceber uma oscilação contínua a ou petrificar a necessidade ou congelar a liberdade. Se este é o caso, devemos tentar uma penetração heróica nos laços mais elementares que ligam, inclusive, até mesmo a necessidade com a liberdade.

A escravidão das paixões é uma escravidão ao nada. Há uma diferença fundamental entre o nada da negatividade e o nada da inutilidade ao qual a paixão sucumbe. Toda paixão é inutilidade (vanité). Reprovação, suspeita, concupiscência, inveja, mágoa e pesar são nomes variados para correr atrás do vento. Esta ficção, esta mentira, revela o papel decisivo da imaginação na gênese da paixão. Aqui de novo não esqueçamos de notar os pontos de menor resistência onde a imaginação pode insinuar seus mitos e fazer a alma sucumbir ao encanto do nada. A idéia do nada é uma fonte inexaurível de erro. Como tal, a negação já tem um lugar importante na ontologia fundamental: a necessidade como ‘ausência de’, o buraco de vão da possibilidade aberta por um projeto, a recusa inaugurando toda afirmação voluntária, a negatividade da finitude, a impotência indicada pela morte e mesmo pelo próprio nascimento. Mas esta negação deve ser colocada fora do nada da inutilidade (vanité). Há uma diferença entre o nada da negatividade e o nada da inutilidade. A negatividade deve ser colocada fora do nada da inutilidade que a complica e a perverte. Comparada com a suspeita no ciúme, alimentando-se de sua própria ficção, o vazio-ausência da fome é ainda um tipo de saciedade – uma saciedade da verdadeira angústia e uma verdade do corpo, em contraste com o vazio que é inutilidade e desdobramento da alma. Portanto, devemos suspender este poder assustador que constrange a liberdade a se tornar indisponível ao projetar a escravidão que ela impõe a si mesma num nada intencional.

A paixão escrava introduz um infinito, um excesso, que é ao mesmo tempo um infinito doloroso que torna a paixão infeliz. A paixão atrai a alma a uma busca sem fim e inaugura o ‘mau infinito’. O mau infinito nos força a nos negar a nós mesmos. Só um infinito autêntico pode abraçar a finitude sem requerer a sua auto-negação. O infinito autêntico não exige de ninguém a negação de

sua própria finitude, concretude e particularidade. Dessa forma, não pode haver nenhuma gênese da falta começando com o voluntário e nem tampouco começando com o involuntário, embora cada aspecto deste sistema circular (prazer, poder, costume, domínio, recusa, auto-afirmação) possa constituir um convite para a falta. Ao contrário, a falta permanece como um corpo estranho na estrutura essencial do homem. Não há nenhum princípio de inteligibilidade de tal ruptura análogo ao da inteligibilidade das funções do involuntário e voluntário no sentido de que suas essências completam uma a outra dentro da unidade humana.14 Em outras palavras, o homem não é essencialmente o que é dependendo de como o voluntário ou o involuntário imprime seu teor de especificidade. O homem é essencialmente o que é porque tanto o voluntário quanto o involuntário estão constituídos nele de forma total e relacionalmente implicada. Esta é a base do que podemos atribuir à unidade humana.

Já a falta é um absurdo e o mal é incompreensível. E justamente por serem incompreensíveis, não estamos autorizados a considerar como caídos nem o involuntário, devido à sua irraciona lidade parcial, nem o voluntário, devido ao seu poder de estabelecer sentido. A falta altera tanto o voluntário quanto o involuntário, e não apenas o voluntário. Contudo, embora a falta tenha “entrado no mundo”, isto não impede que seja possível buscarmos uma compreensão descritiva das possibilidades primordiais que não nos são absurdas.15 Mas apesar de tudo, a falta oferece condições para uma ocasião privilegiada para consideração da iniciativa de um sujeito. O homem que vai agir ou que está agindo normalmente não reflete sobre sua condição de ser fundamentalmente um sujeito. Somente em memória e particularmente na retrospectiva do remorso aparece a ele de repente, ao mesmo tempo no centro e fora de seu ato, um eu que poderia e deveria ser outro, com outras possibilidades. Assim, ao passar pela falta, a consciência ainda assim tem a chance de alcançar sua liberdade fundamental, experimentando-a de um modo transparente. Em outras palavras, isto revela que, em última análise, a falta não consegue destruir as estruturas fundamentais do homem. Seria mais correto dizer que o voluntário e o involuntário, em si mesmos como são, caem no poder do nada como um país ocupado que é rendido intacto ao inimigo. É por isso que a antropologia é possível; e é por isso que a vontade pode ser mais que a falta, aprendendo a intuir sua situação bem no ponto em que passa a fechar-se em si mesmo.

Neste sentido, na perspectiva da subjetividade, as expressões míticas eram tentativas de inspecionar possibilidades fundamentais do homem – ou seja, é o homem tentando conhecer-se a si mesmo fora de sua falta, desejando por uma parada nas representações exclusivas e obsessivas do mundo das paixões e da lei. Apesar de seu aspecto ingênuo, o mito possui algo nada ingênuo:

14 IDEM. Ibid., p. 29 15 IDEM. Ibid., p. 28

possui a coragem do possível. E esta coragem é relevante para a busca de conhecimento das estruturas humanas. A imaginação, ao recontar estórias da inocência primitiva, encanta e faz surgir através deste encanto, aquele senso difuso do mistério corpóreo conjugado com nossa própria condição de ser livre, sem a qual a narrativa mítica seria engolida no paradoxo. Esta coragem diante do mistério é o desejo aliado à experiência imaginária sustentando a compreensão (ou a auto- compreensão) da relação do voluntário com o involuntário. Esta experiência por si já representa uma ruptura no círculo que formo comigo mesmo. A liberdade encarnada transcende o si-mesmo já no seu próprio corpo.

Somente uma liberdade encarnada tem a possibilidade de não se estagnar apenas na ingenuidade superficia l e inocente do mito e penetrar corajosamente na possibilidade, na novidade de vida, no élan criador. A coragem não pode se manter apenas como mero desejo. Ela exige mais. Se a coragem se mantiver no nível do desejo, o ímpeto de coragem freqüentemente acaba refém de uma manobra de prestidigitação que ligeiramente acena a si mesmo como tendo superado a falta quando tudo o que fez foi deslocar a falta para dar lugar à inocência. É por isso que a compreensão da vontade não deve ter nem a falta nem a inocência como ponto de partida. Não há ‘estruturas inocentes’ na vontade da mesma forma como não há ‘estruturas da falta’. Inocência e falta não são estruturas e sim situações da realidade. Assim, uma abordagem da vontade não pode ser nem a descrição da vontade como falta, nem a descrição da vontade como um estado original paradisíaco.

Abordar a vontade é buscar as estruturas que lhe são fundamentais e que são oferecidas igualmente à inocência e à falta como uma base comum da natureza humana na qual a inocência mítica e a culpa empírica agem de modos diferentes.16 Este empreendimento não é uma busca de refúgio numa região de neutralidade confortável, superficial e abstrata. Seria isto se as possibilidades só pudessem ocorrer a partir dessa “região confortável”. Mas este não é o caso visto que a região de possibilidades subsiste e é disponível não só nesta “região confortável” mas também dentro da mais completa falta. A falta acontece para a liberdade. A liberdade pode entrar sim em escravidão (auto-imposta), mas o que ela não pode intentar ou realizar é um retorno à natureza animal, mineral ou qualquer outra que lhe seja estranha e na qual a liberdade está ausente. Se isto fosse possível, a falta deixaria de ser falta para o homem, mas isto é impossível porque o preço da falta é que ela deve ser sempre falta e não algo diferente. Afinal, a falta é sempre fruto da liberdade, e sempre passível de ser objeto de remorso.

A abordagem da vontade propicia contornos e limites para a ontologia fundamental. Ainda que este limite seja parcialmente inacessível, ele nos proíbe de transformar o conhecimento da falta, das paixões e da lei numa ontologia. Ele denuncia o que nós poderíamos chamar num sentido especial “a fenomenologia da consciência culpada em relação ao ser da liberdade encarnada”.17 Mas o fenômeno aqui é o que mais esconde do que revela. O fenômeno da falta esconde o ser da condição humana. O torna indisponível. Mas, o ser da liberdade é limitador somente enquanto é constitutivo.

Se a vontade possui uma reserva ontológica que lhe abre à possibilidade para um auto- resgate, esta reserva se encontra aquém tanto da falta quanto da lei. O terreno que tem o poder de suspender a falta é o mesmo que suspende a lei. Dessa forma, já não devemos mais falar em falta ou em leis, mas em valores que as motivam originalmente, e a relação com os valores que justificam escolhas fundamentais. A vontade é fundamentalmente a habilidade para receber e aprovar valores.18 Ao perverter o voluntário e involuntário, a falta muda nossa relação fundamental com os valores e abre o verdadeiro drama da moralidade que é o drama de um homem dividido. O dualismo ético pega o homem antes de qualquer dualismo do entendimento e da existência. No contexto da falta, paixões e lei formam um círculo vicioso da existência real. As paixões ejetam os valores do homem, os aliena numa transcendência hostil, embora melancólica, que é, falando estritamente, a lei no sentido Paulino da palavra; a lei sem graça. A lei condena sem ajudar: ela implica a falta pela proibição e precipita a própria decadência interna que ela parecia ser feita para impedir.

Esta reserva na vontade não deve causar em nós reações morais prematuras. A significação moral da busca pela zona de reconciliação fundamental entre a alma e o corpo deve permanecer suspensa. Seu sentido permanece escondido e requer um longo desvio a fim de ser percebido. O sentido grego de simetria e harmonia está dentro de nosso alcance, mas tal harmonia só é possível num ponto além do alcance fácil e cômodo. Ao se levantar em desafio diante da falta, a vontade desafia também a ética real. Mas este desafio custa nada menos que tudo. A reserva não é experimentada como procura de respostas numa ‘sabedoria” fácil do equilíbrio e auto-controle. A falta, quando considerada, destrói este mito da harmonia fácil que é uma mentira e ilusão do estágio ético por excelência se tomado na condição da comodidade

A relação fundamental do voluntário e involuntário na vontade revela a unidade do homem, na medida em que este está em sua totalidade implicado a um mistério central da existência

17 IDEM. Ibid., p. 30 18 IDEM. Ibid., p. 24

encarnada – o mistério que eu-corpo sou. É o mistério que exige que eu me torne um com ele, participe no mistério, de forma a não me ver a mim mesmo como mero objeto. Ocorre que esta participação está sob constante ameaça de obstrução. É importante ressaltar que as estruturas que conectam o voluntário e o involuntário são estruturas de ruptura tanto quanto de união. Atrás destas estruturas reside o paradoxo que culmina no paradoxo da liberdade e natureza.19 Assim, a “união viva que reúne o voluntário e o involuntário do homem deve ser constantemente e ativamente reconquistada,”20 e é esta exigência que a traz ao âmbito da preocupação existencial.

Estamos diretamente implicados tanto com nossa realidade fundame ntalmente vital e de totalidade quanto com nossa realidade existencial. Daí, nenhuma atitude transcendental está autorizada a criar um sistema totalizador que acarrete a perda da singularidade da vontade individual existente, pois se o fizer, perde seu horizonte de totalidade e de transcendência, e perde seu poder de ser horizonte à vontade individual existente. Em outras palavras, a vontade propriamente não pode ser nem transformada num acidente, por um lado, nem ser engolfada ou diluída por nenhuma adequação, seja ela cognitiva, metafísica, ética, religiosa ou científica, por outro lado. Kierkegaard ressaltava que a salvação do homem, com todas as suas faculdades e potencialidades, dá-se na sua tarefa de se tornar constantemente um indivíduo. Somos sim condenados ao absoluto, mas tal absoluto só pode ser encontrado dentro de si, e que por este fato, e, para que continuemos livres, estamos condenados a um contínuo processo de construção e transformação em nome da liberdade da vontade.

19 IDEM, Ibid., p. 22 20 IDEM. Ibid., p. 22 a 23

II. A CONDIÇÃO DA VONTADE NA CONTEMPORANEIDADE

PÓS-MODERNA

“Um sujeito estava colocando flores no túmulo de um parente, quando vê um chinês deixando um prato de arroz na lápide ao lado.

Ele se vira para o chinês e pergunta: ‘ – Desculpe, mas o senhor acha mesmo que o defunto virá comer o arroz?’

E o chinês responde: ‘ – Sim, quando o seu vier cheirar as flores...’”

“Em apenas dois dias, o amanhã será ontem!”

“Quando há um excesso de realismo, o fato torna-se irreal. E se, além do excesso, o real for exaustivamente repetido, a irrealidade torna-se delírio, e do delírio, a profunda estranheza, e da estranheza, o afogamento na descompreensão total.

Todas as filosofias de desconexão das energias, de irradiação das intensidades e da molecularização do desejo vão no mesmo sentido, no sentido de uma saturação”.

Jean Baudrillard

“Desaparecendo gradativamente o homem natural, a sociedade só oferece aos olhos do sábio uma reunião de homens artificiais e de paixões factícias que são obra de todas essas relações novas e não têm nenhum fundamento na natureza... O homem selvagem e o homem policiado diferem de tal modo, tanto no fundo do coração quanto nas suas inclinações, que aquilo que determina a felicidade de um reduziria o outro ao