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1 INTRODUÇÃO

7.2 NATUREZA JURÍDICA

Importa estabelecer a natureza da AIME para identificar sua localização no sistema jurídico vigente e, dessa forma, esclarecer a sua utilidade, classificação, importância e efeitos.

Conforme se viu acima, a Impugnatória está prevista no artigo 14, § 10 e § 11 da CF/88, decorrendo daí sua natureza eminentemente constitucional. Aliás, a doutrina majoritária é convergente quanto a este aspecto, em especial aquela defendida pelos eleitoralistas (Fávila Ribeiro, Joel J. Cândido, Torquato Jardim, Pedro Henrique Távora Niess, Adriano Soares da Costa e José Antônio Fichtner).

Tal premissa também estabelece, pois, a vinculação da ação à interpretação e hermenêutica constitucionais, com forte influência dos princípios da soberania popular (art.1º,parágrafo único, CF/88), cidadania (art.1º,II, CF/88), normalidade e legitimidade das eleições (art.14, §9º, CF/88), moralidade (art.37,caput e art.14, §9º, CF/88), probidade(art. ), lisura das eleições (art.22, da LC n.º 64/90 ), dentre outros.

Nesse contexto, a AIME integra o Direito Constitucional Processual, revelando-se também um autêntico remédio constitucional, ao lado do Mandado de Segurança, do Habeas Corpus, do Habeas Data, da Ação Civil Pública, do Mandado de Injunção e das demais ações constitucionais desse calibre. Ainda nessa linha, Edmilson Barbosa177 afirma tratar-se de “uma garantia constitucional especial do direito a lisura do pleito”.

Para o Tribunal Superior Eleitoral178“A ação de impugnação de mandato eletivo é um instrumento jurídico previsto na Constituição Federal para a cassação de mandato eletivo obtido por meio de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude.”

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BARBOSA, Edmilson. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. In Ações Constitucionais. FREDIE, Didier Jr. (coord.). 4ª edição revista, ampliada e atualizada. Salvador: Juspodivm, 2009,p. 585

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TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Disponível em:

Então, não se trata de simples ação a ser regida isoladamente pela legislação infraconstitucional, ou seja, pela LC n.º 64/90 e o Código de Processo Civil – CPC, aqui utilizados subsidiariamente. Devem, assim, tais dispositivos processuais serem aplicados à luz do arcabouço constitucional, priorizando sempre o espírito da lei (legislador constituinte) na busca pela efetividade da AIME.

Quanto a este aspecto afirma José Antônio Fichtner179:

(...) Por ser norma constitucional, ela é que estabelece os parâmetros que irão balizar a aplicação do instituto, transferindo-se às regras infraconstitucionais o preenchimento que for necessário dos espaços deixados pelo texto constitucional com a finalidade de tornar o instituto mais eficaz e efetivo(...)

Na mesma linha, tão evidente quanto a natureza constitucional é a natureza eleitoral da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. Ora, o próprio nome da ação já traz a lume esta faceta na medida em que se refere ao ataque do Mandato Eletivo daquele candidato que fora eleito praticando ou beneficiando-se de atos ilícitos, mas não só por isso.

É eleitoral, portanto, porque é instrumento cujo objeto pressupõe matéria puramente eleitoral, isto é, envolvem os direitos políticos, a soberania popular, a preservação da normalidade e legitimidade das eleições, o acesso válido ao exercício dos mandatos eletivos e, em especial, o combate aos ilícitos que maculam estes elementos fundamentais da democracia.

Por outro lado, a AIME não possui natureza criminal. Isto porque, os propósitos da ação são eminentemente constitucionais-eleitorais, não sendo determinante a ocorrência de crimes eleitorais para a configuração de suas hipóteses de cabimento.

Nesse sentido, ressalta-se que o crime de compra de um único voto (art. 299 do

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Código Eleitoral) não oportunizará o uso da AIME (apesar de viabilizar a representação pelo art. 41-A da Lei n.º 9.504/97), mas o abuso do poder econômico caracterizado pela compra de voto em larga escala (comprometedora da normalidade e legitimidade do pleito – potencialidade lesiva) esta sim a viabilizará o manejo da Impugnatória.

É conhecido, pois, que uma única conduta ilícita poderá implicar diversas conseqüências a serem apuradas e sancionadas pela ação adequada, sendo relevantes para a delimitação da natureza da AIME aquelas precipuamente eleitorais.

Registra-se, por oportuno, que há na doutrina eleitoralista quem entenda identificar-se a AIME como uma Ação Civil Pública. É a opinião de Marcos Ramayana180, que afirma:

Identifica-se essa ação como ação civil pública à proteção de interesses difusos, porque o bem público tutelado subsume-se na normalidade e legitimidade das eleições (art. 14, §9º, da CF), bem como no interesse público de lisura eleitoral (art. 23, in fine, da Lei Complementar n.º 64/90).

Nesse ponto, se entende haver semelhanças entre ambas as ações, sobretudo, quando considerados os interesses jurídicos tutelados. Contudo, não se pode confundi-las nem igualá- las sob pena de distorcer os institutos, em face das suas características peculiares. Por outro lado, verifica-se que a AIME possui aplicabilidade imediata, sendo viável o seu uso de forma eficaz e efetiva, ainda que ausente lei específica regulamentando-a. É que o artigo 5º, §1º e §2º, ambos da CF/88, impõe a aplicação imediata dos direitos fundamentais e garantias fundamentais.

Nessa perspectiva, o exercício da soberania popular (art.1º,parágrafo único, CF/88), a normalidade e legitimidade das eleições (art.14, §9º, CF/88), a lisura das eleições (art.14, §9º, CF/88 e art.22, da LC n.º 64/90 ) e a própria democracia (art. 1º, caput, CF/88), devem ser

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considerados direitos fundamentais no contexto do Estado Democrático de Direito brasileiro. Logo, sendo a AIME garantia constitucional destes direitos, deve gozar da prerrogativa de aplicação imediata, sem necessidade de lei específica regulamentando-a, ainda que para tanto se utilize pro analogia as leis eleitorais existentes.

Por último, destaca-se que a Impugnatória detém natureza preponderantemente constitutiva-negativa ou desconstitutiva, tendo em vista o escopo de desconstituir o mandato eletivo daquele que fora eleito ilicitamente. Além disso, pode-se admitir a natureza declaratória da ação em virtude de eventual efeito de decretação de inelegibilidade. Esta e as demais facetas da ação serão mais bem tratadas no tópico dos objetivos e efeitos da sentença, posteriormente.

Portanto, a AIME localiza-se no ápice hierárquico da legislação pátria, isto é, na Constituição Federal de 1988, revelando-se uma típica ação constitucional- eleitoral, não criminal, de eficácia imediata, constitutiva-negativa, assemelhada à ação civil pública, manejável como instrumento de garantia da soberania popular, da lisura, normalidade e legitimidade das eleições, além da democracia.

7.3 CONCEITO

A conceituação de um determinado instituto jurídico é imprescindível quando se busca analisá-lo, exatamente porque se permite delimitá-lo, precisando-o e distinguindo-o dos demais existentes. Assim, estabelecem-se os critérios objetivos determinantes da pesquisa. Nessa perspectiva, há diversos exemplos conceituais sobre a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - AIME trazidos pela doutrina especializada.

Para Djalma Pinto181 “É um instrumento de ativação da jurisdição previsto na própria constituição para subtração do mandato de quem se utilizou para obtê-lo de fraude, corrupção, abuso do poder econômico ou político”.

Na mesma linha, Marcos Ramayana182concluiu que a AIME é “uma ação de Direito Constitucional Eleitoral, cuja tutela reside na defesa dos direitos públicos políticos subjetivos ativos, protegendo-se as eleições contra a influência direta ou indireta dos abusos econômicos, políticos, corrupção e fraudes”.

Ampliando o espectro da ação Pedro Henrique Távora Niess183 afirma:

Destina a ação impugnação, como indica o nome com que foi batizada, a fazer perder o mandato o candidato eleito mediante fraude, corrupção ou abuso de poder econômico, bem como a impedir que suplente, nas mesmas condições, venha exercê-lo, e, conseqüentemente, a torná-los inelegíveis, nos termos da LC n.º 64/90,art. I, d, este efeito produzindo a sentença passada em julgado, ainda que silencie a respeito.

Diante dos conceitos acima trazidos impõem-se conceituar a AIME sob a ótica analítica, isto é, considerando os seus diversos aspectos constitutivos e de delimitação, tais com natureza, competência, rito, prazo, objetivo, cabimento além de outras características.

Assim, considera-se que a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo é uma ação constitucional eleitoral, de competência exclusiva da Justiça Eleitoral, rito abreviado e sigiloso, com prazo decadencial de quinze dias a contar da diplomação e que visa à cassação do mandato eletivo e do respectivo diploma, além da inelegibilidade de quem foi eleito e beneficiado pela corrupção, fraude e abuso de poder econômico ou político vinculado, desde que configurada a potencialidade lesiva para comprometer a normalidade e legitimidade das eleições.

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PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal.Noções Gerais. 4ª Ed. São Paulo: Atlas, 2008,p. 225.

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RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral.8ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008, 486. 183

NIESS, Pedro Henrique Távora. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. Rio Grande do Sul: Edipro, 1996,p.16.