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Necessidade de uma abordagem global, rigorosa e não comprometida dos processos de mudança na Administração Pública portuguesa.

DESENVOLVIMENTO DA ESTRATÉGIA METODOLÓGICA.

1.7. Necessidade de uma abordagem global, rigorosa e não comprometida dos processos de mudança na Administração Pública portuguesa.

Na execução do projecto de investigação apresentado, apercebemo-nos de que se impunha observar com determinação e até ampliar, a estratégia de abordagem global do tema da investigação, uma vez que optámos por procurar uma visão de conjunto do progresso da ideia de gestão empresarial na Administração Pública portuguesa. Nestas condições, desenvolvemos uma análise sistemática não só do ciclo dos Governos de Cavaco Silva e posteriores, como nos tínhamos proposto inicialmente, mas também do período do Estado Novo e do período de consolidação do regime democrático. Os resultados dessa análise preenchem cinco capítulos da tese e estão sintetizados em outros tantos quadros inseridos no final dos Capítulos II a VI. Que nos revelam eles?

Muito sucintamente, que sob as etiquetas de Reforma Administrativa, Modernização Administrativa, Reforma do Estado e da Administração Pública, Reforma da Administração Pública, Modernização da Administração Pública se acolheram não um único programa que se foi arrastando no tempo, mas sim dois programas com características diferentes que se imbrincam dentro dos próprios ciclos governativos, e que em alguns momentos de crise económica e financeira sofrem a sobreposição de programas que poderemos qualificar

46 como de recentralização, isto porque se por vezes os programas de reforma administrativa são apresentados como tendo consequências na redução de custos a longo prazo, no curto prazo os governos privilegiam os velhos remédios centralizadores (Quadro 1.4.).

Quadro 1.4. Programas de mudança na Administração Pública portuguesa

Programas

Conteúdo

Horizonte de aplicação

Reforma

administrativa de primeira geração

Criação de empresas de economia mista e em mecanismos de coordenação das participações do Estado

Modificação progressiva dos modelos institucionais e de estruturação interna da administração pública.

Atribuição do estatuto de empresa pública a serviços e empresas do Estado que não o detinham formalmente.

Interesse pela simplificação e desburocratização.

Consumo de literatura sobre experiências estrangeiras designadamente sobre o PPBS, sem as conseguir concretizar em Portugal Planos nacionais e planos e relatórios de actividades de organismos.

Aposta no recrutamento dos dirigentes dentro da administração pública mas sem um regime de nomeação vitalício. Consolidação do modelo estatutário e na generalização da sua aplicação.

Início de implementação nos anos 1960, mantendo-se, quanto à aplicação do modelo estatutário, até ao ano de 2001

Reforma

administrativa de segunda geração

Privatização de empresas mesmo que tinham resultado da conversão de serviços autónomo.

Primeiras experiências sob o Governo de Cavaco Silva com aplicação mais generalizada, designadamente quanto ao fim do modelo estatutário, a partir de 2001.

47 Experiências de financiamento por

fórmula ou à produção

Institutos públicos quase empresariais, Hospitais Empresa, agrupamentos de unidades de saúde, escolas e outros estabelecimentos para facilitar a gestão.

Valorização de competências de gestão geral e ligação da remuneração dos dirigentes ao cumprimento de objectivos.

Contabilidade empresarial.

Liquidação do modelo estatutário, com generalização do contrato individual de trabalho e relacionamento da remuneração com o desempenho.

Programas de recentralização

Fusão ou extinção de organismos Centralização financeira e redução de autonomias.

Uniformização da gestão de recursos e redução das competências dos dirigentes.

De 1926 até 1935

Tentativas pós II Guerra Mundial e início dos anos 1950

Reforma da Contabilidade Pública / Reforma da Administração Financeira do Estado

Recentralização e reuniformização nos ciclos de Durão Barroso e José Sócrates

Emergência económica a partir de 2010

Poderemos ser criticados por a orientação do nosso trabalho nos ter empurrado para uma espécie de “institucionalismo histórico”?

Talvez, mas a abordagem global que seguimos, obrigando-nos a aprofundar realidades muito diversas, teve o mérito de pôr em causa a nossa visão originária, expressa no projecto de investigação apresentado em 2005.

48 Efectivamente, no final de 2005, altura em que delineámos o nosso projecto, a generalidade dos autores consultados assumia que as tentativas de reforma da Administração Pública, particularmente as que se haviam desenrolado no ciclo dos Governos de Cavaco Silva, haviam falhado, e não era evidente se as reformas anunciadas por José Sócrates iriam ou tão conhecer o mesmo destino. Por isso mesmo escrevemos

‘…A investigação incidirá sobre a evolução verificada desde 1985, ano do lançamento da ‘Modernização Administrativa’, até aos nossos dias, sem prejuízo da consideração de alguns antecedentes. Os processos de mudança lançados ou anunciados na altura em que terminamos a redacção do presente projecto não poderão deixar, na medida do possível, de ser incluídos (…).

E se pôs em causa a nossa própria visão, também nos levou a distanciar-nos de algumas abordagens largamente difundidas, que passam a ideia de um processo de reforma administrativa segundo um programa único com períodos de avanço e períodos de interrupção que não devem provocar desânimo, apenas debatendo se a reforma deve ser radical ou incremental, de que é exemplo o Relatório publicado em 1996 sobre a experiência portuguesa:

it should be noted that, according to the experience of most OECD Member countries, public management reform is a long process. To be sucessful, it requires strong support systems and a great deal of time. On the other hand, public opinion and the media may feel that changes are small and limited. A feeling of dissatisfaction and a sense of cynicism may emerge. A similar danger also exists in Portugal (OCDE, 1996 b: 8),

Do mesmo modo, levou-nos a manter alguma reserva em relação aos estudos que procuram ver a influência do New Public Management por detrás de todo e qualquer processo de mudança. Na realidade, localizámos na realidade portuguesa algumas situações por vezes identificadas com aquele corpo de ideias muito antes das décadas de 1980 e 1990 que são consideradas o seu período de eleição, como sejam a elaboração de planos e relatórios de actividade por alguns organismos desde a década de 1960 e a criação em 1977 do primeiro dos institutos públicos quase empresariais. Isto não quer dizer que a nossa administração pública tenha sido precursora no New Public Management, obriga sim a recordar que o Management by Objectives vem sendo divulgado desde os anos 1950 veiculando abordagens e propondo medidas que foram sendo ponderadas e nalguns casos adoptadas antes de se ouvir falar em NPM.

Para além de uma abordagem global, procurámos vincular-nos a uma abordagem rigorosa, evitando distorções infelizmente frequentes em trabalhos já produzidos.

Algumas destas distorções relevam de um exagerado fetichismo relativo à criação de estruturas da Administração Pública. Por exemplo a convicção de que Marcelo Caetano, ao confiar em 1969 à Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros as missões do

49 Secretariado da Reforma Administrativa, criado em 1967, arruinou por longos anos a Reforma Administrativa, quando seria necessário atentar em que a referida Secretaria- Geral, estruturada por Marcelo Caetano aquando da sua passagem por Ministro da Presidência e liderada por um seu colaborador próximo, coordenou a produção de numerosas medidas no domínio da organização administrativa e do pessoal. Houve é certo problemas ligados a escolhas de dirigentes e subsequente desmotivação de quadros, houve quem se sentisse maltratado, houve a extinção sob Marcelo Caetano da licenciatura do ISCSP em Ciências de Administração (Gonçalves, 1999; Mendes, 1999) mas é exagerado eternizar a memória de agravos pessoais e institucionais e apresentar o então Presidente do Conselho como um opositor da Reforma. Um outro exemplo é dado pela inclusão de um Ministério da Reforma Administrativa no elenco dos departamentos governamentais, que acabou por revelar-se menos produtiva que a criação em 1985 de um Secretariado para a Modernização Administrativas com uma estrutura ligeira. Do mesmo modo, a criação do Instituto Português de Qualidade no ciclo de Cavaco Silva pode impressionar, mas o facto é que sucede a uma Direcção – Geral da Qualidade criada em 1977 e que desde 1948 existia legislação sobre qualidade e se perspectivava a ligação à ISO, de outra forma não se compreenderá por que razão a perspectiva da qualidade foi tão facilmente adoptada e por que razão a publicação de Cartas da Qualidade em Portugal se fez em paralelo com outros países. Não foi a criação do Instituto que fez nascer o movimento, antes terá sucedido o contrário.

Outras distorções relevam, tem de se dizer, do preconceito. Quando se lê repetidamente que a dificuldade em criar uma base de dados do pessoal da Administração Pública é (foi) uma consequência da resistência dos funcionários à mudança, o que é evidentemente absurdo (mexiam-se enquanto estavam a ser contados?), cabe recordar que Santos já mostrou que a dificuldade de conciliar os diferentes serviços (centrais) que detinham competências concorrentes na matéria foi a verdadeira responsável por as peças do puzzle terem demorado décadas a encaixar (Santos, 2001).

Para além de uma abordagem global e rigorosa, procurámos também, enfim, cingir- nos a uma abordagem descomprometida, como o recomendam aliás Pollitt e Bouckaert, que declaram não se considerarem escravos de nenhuma teoria ou abordagem em particular, assumindo embora reconhecer alguma validade nas proposições neo-institucionalistas (Politt e Bouckaert, 2004: 22-23).

A grande polarização do debate sobre reformas da administração pública em Portugal levou muitos dos membros da academia a tomar posição pela mudança e contra os que “resistem à mudança”. Estes reagem imputando aos defensores das reformas posições “neo-liberais”. Sem sermos neutros, entendemos que o presente trabalho não deveria tomar

50 posição nesse conflito, concentrando-se antes em algo que é preliminar, ou seja, na identificação e caracterização mais precisa das propostas de mudança que estiveram ou estão no terreno, e na sua relação com a ideia de gestão empresarial.

A título de “declaração de interesses” assumimos que não podemos deixar de simpatizar com a abordagem de Niskanen, tendo como ele formação de base em economia e experiência de negociação orçamental na administração pública. Mas, tal como Mintzberg, não estamos convencidos de que o mercado possa ser alternativa ou sequer que funcione necessariamente bem. E se há quem “viva” da falta de mudança, há por seu turno organizações, carreiras, consultores e formadores que vivem de programas de mudança que se arrastam no tempo. Também nas Reformas da Administração Pública existem estradas que não vão dar a lado nenhum, e algumas dessas estradas ficaram assinaladas no nosso trabalho.

Sobretudo, e embora possa parecer que fomos demasiado longe no sentido contrário, entendemos que seria deslocada neste contexto uma atitude prescritiva. Friedberg situa, parece-nos que bem, a mudança como uma acção política:

Nenhuma regra geral, nenhum princípio universal, virão já guiar a acção de mudança. Esta é uma acção política, no pleno sentido do termo, que não releva de uma lógica de optimização nem mesmo de maximização. Enquanto acção política, vai buscar a sua racionalidade e a sua legitimidade só aos actores que a têm e que a inscrevem num contexto, isto é a um sistema de actores empíricos com as suas características, as suas estruturas de poder, as suas capacidades e as suas regras do jogo. Como toda a acção política, ela pode certamente alimentar-se de princípios e de valores de alcance geral: mas não são unicamente esses valores que a justificam e a legitimam, é a sua capacidade de transformar efectivamente no sento desejado a estruturação do sistema de actores em questão, ou seja, são os seus resultados. Se a mudança vai numa outra direcção que não a desejada, não são o contexto (o sistema de actores empíricos), a sua inércia ou a sua irracionalidade que se devem censurar, mas a estratégia de mudança, naquilo em que é guiada por princípios e métodos de acção inadaptados que ignoram e desconhecem a estrutura profunda e os mecanismos de regulação do sistema que se quer transformar.

Pelo que não estamos longe de subscrever a sua conclusão:

O mesmo é dizer que, nesta perspectiva, já não há lugar para uma noção como a ‘resistência à mudança’ ou, pelo menos, dever-se-ia utilizá-la com muito mais circunspecção do que habitualmente fazemos. A resistência com que uma acção de mudança pode deparar não deve ser entendida como uma simples inércia atravessada no caminho do progresso encarnado por essa acção de mudança…A ‘resistência à mudança’ não é nem mais nem menos racional, nem mais ou menos legítima que a acção da mudança que a provoca (Friedberg, 1995: 325-326).

51 CAPÍTULO II - DINÂMICAS DE MUDANÇA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PORTUGUESA.

2.1. Introdução.

Para a nossa investigação sobre o progresso na ideia de gestão empresarial na Administração Pública Portuguesa demos maior relevo a uma abordagem macro, centrada na formação de uma vontade política e na forma da sua concretização, designadamente por via legislativa.

Neste contexto, a periodização que considerámos para efeitos de análise assenta sobretudo em características relativas à organização constitucional e à composição dos órgãos de poder político, levando a distinguir como grandes períodos: o do Estado Novo, o período da Revolução de Abril e da consolidação do regime democrático até 1985 (os seis Governos Provisórios e os nove primeiros Governos Constitucionais), o período dos governos de Cavaco Silva (X a XII Governos Constitucionais), o período dos governos de António Guterres (XIII e XIV Governos Constitucionais), o período do governo de Durão Barroso (XV Governo Constitucional), o período dos Governos de José Sócrates (XVII e XVIII Constitucionais). Salvo ressalva expressa, consideraremos o efémero Governo Santana Lopes como parte do período do Governo Durão Barroso, dada a herança do programa e da maioria da equipa. Completamos a análise com uma referência à evolução registada até final de 2011, já sob o Governo de Pedro Passos Coelho, cujo período de governação não é abordado em função do seu programa e dinâmica de mudança próprios, mas apenas referenciado pelas medidas que concretizaram um programa de recentralização que o agudizar a partir de 2010 das dificuldades financeiras já tinham imposto ao Governo anterior. A circunstância de o período estar ainda no seu início e a necessidade de distanciamento sugerem que não devemos ir mais longe.

É necessário assumir, antes de uma discussão mais aprofundada das dinâmicas de mudança, que esta periodização talvez seja mais justificável do ponto de vista da análise da Reforma Administrativa / Modernização Administrativa / Reforma da Administração Pública / Modernização da Administração Pública e das políticas de Administração Pública em geral, do que do progresso da ideia de gestão empresarial. Sendo esse progresso difícil de rastrear com autonomia, aceitaremos a diluição do seu estudo numa análise mais geral dos processos de mudança, sem deixar de ter em conta que a Reforma / Modernização tem sido invocada para justificar orientações pouco compatíveis com a ideia de gestão empresarial e até tem servido de cobertura a políticas de sinais contrários, como se verá a propósito das

52 relações laborais da Administração Pública, onde deram lugar sucessivamente à consolidação do modelo estatutário, e à ruptura com este.

Não seguimos a orientação de Araújo de considerar vários períodos entre os movimentos militares de 28 de Maio de 1926 e de 25 de Abril de 1974 (Araújo, 2002b: 40- 42). A Ditadura Nacional (que Araújo desdobra em “Revolução Militar” e “Controlo das Finanças Públicas”) não é formalmente o Estado Novo, mas é o quadro em que se desenrola o processo que conduz à sua institucionalização em 1933. Também não nos parece que as referências de Marcelo Caetano ao Estado Social, sem abandono efectivo das instituições do regime (cujo carácter ditatorial permanece intacto) permitam autonomizar os anos 1969-74 num período distinto. Mas, sobretudo, as investigações já conduzidas por diversos autores como Brito e Rosas1, identificando e relacionando fenómenos económicos, factos políticos e até debates ideológicos, iluminam a evolução registada a partir dos últimos anos da II Guerra Mundial, também abordada por Viegas (1996), e permitem não só ver mais claro no que ainda aparece como uma “longa noite” como propor subperiodizações alternativas. Também Rocha toma o Estado Novo no seu conjunto (1986).

É também certamente discutível a aglutinação que fazemos dos Governos Provisórios pós 25 de Abril de 1974 e dos primeiros nove Governos Constitucionais. Consideramo-la legítima na medida em que, embora com diferenças de tónica e de amplitude, e não obstante uma grande conflitualidade e indefinição iniciais, parece ter estado adquirido praticamente desde o início que o regime a construir seria uma democracia, preveria a subordinação do poder económico ao poder político, garantiria direitos sociais, e no, plano das políticas de administração pública, assumiria a necessidade da Reforma Administrativa, aliás em continuidade com os últimos anos do período anterior. Araújo distingue o período 1974/1982 do período 1982/86 por considerar que, após a revisão constitucional de 1982 se verifica uma abertura à economia de mercado. Todavia, o impacto prático em termos de políticas de administração pública parece-nos negligenciável. Por seu turno, Corte-Real distingue os períodos 1974-1979 e 1980-1985 por no segundo período se ter verificado uma primazia das reformas técnicas, introduzidas de acordo com uma perspectiva global e sistémica (Corte-Real, 2008). Pese embora a presença ininterrupta a partir dessa altura do Partido Social Democrata (PSD) nas coligações, como líder ou como segundo partido, assegurando alguma estabilidade de preocupações e uma atenção crescente ao controlo dos encargos com as despesas de pessoal, não podemos deixar de notar que muitos dos objectivos das medidas adoptadas e até dos protagonistas são comuns aos dos anos que se seguiram imediatamente à Revolução.

1

Iremos utilizar directamente uma recente obra colectiva em que o segundo destes autores participou (Costa et al, 2010).

53 Mais recentemente Rocha e Araújo, num artigo conjunto, identificam o período do Estado Novo (1976), o período da construção do Welfare State (1974-2002), distinguindo dentro deste os anos de 1986 a 2002 como anos de modernização, e apresentam o período entre 2002 e 2007 como de influência simultânea do neo-liberalismo e do New Public Management (Rocha e Araújo, 2007). Também Carvalho, a partir de uma análise de conteúdo dos Programas dos Governos Constitucionais considera dois períodos distintos (1976 a 1985 e pós 1985), numa visão que a autora reconhece poder não ser consensual, e ressalvando que a ruptura assinalada não pode ser vista como total:

Não podemos deixar de mencionar que a análise de conteúdo dos Programas do Governo revela-nos que o fluxo de problemas a tratar em matéria de políticas públicas de modernização administrativa não sofreu alterações substanciais, ao longo do período rem estudo. O problema a resolver era e foi a “excessiva” burocracia do aparelho administrativo, primeiro para ajudar o país a sair da crise económica, depois para torna-lo mais competitivo. Já o fluxo das políticas públicas, isto é, das alternativas (soluções) apresentadas para a desburocratização do sistema, patenteia elementos de continuidade e outros de inovação (Carvalho, 2008: 159).

Ao partirmos para a nossa investigação, deixámos escrito no projecto apresentado: “A nossa percepção actual do tema em estudo conduz-nos a acreditar que iremos encontrar uma sucessão de períodos com diferentes discursos mas com continuidade das ‘reformas’, ao menos num plano sectorial”. Assim, uma vez delimitados os períodos por referência aos ciclos governativos, afigurou-se-nos importante identificar até que ponto se mantêm aquando da transição para um novo ciclo as prioridades e as linhas de orientação identificadas no ciclo anterior (o Not Invented Here é uma atitude ainda hoje característica de muitos Governos que iniciam o novo ciclo político, a não ser que o consenso social exija a assunção explícita de uma continuidade), para o que recorreremos a uma tabela compreendendo as seguintes posições, que podem surgir combinadas: Inovação, Continuidade, Aprofundamento (ou Radicalização), Correcção, Inversão. Também para cada período procuraremos identificar condicionantes de ordem económica e financeira, grandes documentos programáticos, principais concretizações sobretudo no plano legislativo, espaços e produtos de reflexão. Uma visão de conjunto é dada no Quadro 2.2.

Em matéria de metodologia de exposição, são certamente pertinentes as observações formuladas em trabalho recente de Mozzicafreddo e Gouveia:

Relativamente ao significado das reformas, importa resistir a duas tentações analíticas ou normativas, menos interessantes para a compreensão da complexidade dos processos de reformas. Com efeito, encontram-se as perspectivas de, por um lado, segmentar os movimentos de reforma segundo espaços temporais e características normativas dos diferentes governos, e, por outro, identificar momentos de reformas com enquadramentos teóricos e políticos, tal como seria o chamado “neoliberalismo” ou política de privatização. Por

54 outro lado, parece-nos igualmente menos adequado identificar uma corrente analítica com uma situação específica e concreta, tal como seria relacionar o new public management directamente com a introdução da perspectiva managerial ou empresarial na administração pública, ou relacionar a perspectiva do new public service com a consequente orientação participativa ou focalização no cidadão ou, ainda, a ideia, frequentemente referida, de que a tendência orientada para a desregulamentação e a desburocratização indicaria,