• Nenhum resultado encontrado

Notas Breves sobre a Delimitação do Conceito de Desenvolvimento 46

1. Construção da Arquitetura do Enquadramento Teórico 45

1.1. Revisita às Noções de Desenvolvimento e Desenvolvimento Comunitário 45

1.1.1. Notas Breves sobre a Delimitação do Conceito de Desenvolvimento 46

Não há dúvida que, há várias décadas, o termo desenvolvimento tem veiculado como uma palavra da “moda”, sobretudo no âmbito dos discursos oficiais dos países ri- cos, quer a nível das instituições doadores dos países emergentes e do Terceiro Mundo, quer no seio das organizações internacionais que aspiram fazer do tema “desenvolvi- mento” o foco central da sua agenda de modernização, crescimento económico, na luta contra a pobreza, etc. Já na década de 1960, Paulo Freire (1975) advogava uma perspetiva de humanização do processo de desenvolvimento. Relembremos ainda que a agenda para o desenvolvimento do milénio, criada e implementada na última década (2000-2015) por um vasto conjunto de países signatários, preparou as bases da Agenda 2030, documento orientador das políticas públicas composto por 17 objetivos de desenvolvimento susten- tável (ODS) para vigorar durante quinze anos (2015-2030) (Talesco et al., 2016, p. 2). Os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e o ODS serviram e servem como um guião para o desenvolvimento dos países, tanto dos países ricos como dos pobres, influ- enciando a formulação das linhas políticas de desenvolvimento nacional em cada país. Perspetiva-se assim num discurso otimista que, através da implementação dos desígnios dos objetivos de desenvolvimento (ODS) sejam criadas as condições para erradicar a po- breza e a fome, promover a prosperidade e o bem-estar, sem prejudicar e destruir o am- biente ou a natureza, e combater as alterações climáticas 14,15.

14 United Nations. (s/d). Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development. Disponível em

https://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/21252030%20Agenda%20for%20Sustainable%20Deve- lopment%20web.pdf

15 Consultar o documento do Centro de Informação Regional das Nações Unidas para a Europa Ocidental (2016).

Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável. Disponível em https://www.instituto-camoes.pt/activity/o-que-faze- mos/cooperacao/cooperacao-portuguesa/mandato/ajuda-ao-desenvolvimento/agenda-2030

Porém, a ideia duma vocação prática e transformadora das políticas públicas que subjazem nos objetivos de desenvolvimento das sociedades não é recente. Por exemplo, no seu livro Introdução à Sociologia, Norbert Elias (1970, pp. 159-160) afirma que, na segunda metade do século XX, o conceito de desenvolvimento é utilizado para se referir a problemas práticos claramente definidos ou de necessidades dum país, território, região ou local que carecem de resolução. Acrescenta ainda o autor que é “muito comum falar- se de países ‘em vias de desenvolvimento’, onde cada um dos respetivos governos luta com diferentes graus de energia (mas geralmente com a ajuda de sociedades mais ricas) no sentido de desenvolver, mudar e melhorar o seu próprio país” (Elias, 1970, pp. 159- 160). Neste sentido, o termo “desenvolvimento” está e esteve sempre relacionado com uma atividade político-económica, algo que as pessoas com responsabilidades político- governativas fazem, tendo em vista o alcance de objetivos concretos, através de um certo grau de planeamento (Elias, 1970). Porém, em última instância, o que tem de essencial em falar de desenvolvimento, é o seu grande objetivo. Dito doutro modo, “o desenvolvi- mento planificado é bastante simples: melhorar e combater a pobreza relativa dessas so- ciedades” (Elias, 1970).

Parafraseando Elias (1970), o desenvolvimento dum país significa sobretudo a procura de vias e processos de aumento do rendimento da maioria e não apenas o aumento da riqueza de um grupo de pessoas privilegiadas. Enquadra-se assim numa lógica de ação publica de combate às desigualdades sociais. De facto, em quase todos os países pobres há sempre alguns indivíduos extraordinariamente ricos, e muitas vezes mais ricos do que certos países com uma melhor situação económica, e que apropriam para si os recursos do desenvolvimento. Não é de admirar que Elias (1970) argumente que a procura do de- senvolvimento destas sociedades economicamente mais débeis, trata-se sobretudo de ten- tativas para “aliviar a pobreza de todo o povo e não só de alguns dos seus membros”. Para o autor, a sua concretização, são necessárias “fortes” políticas públicas e “medidas deci- sivas para regular a produtividade e o rendimento de todos os indivíduos politicamente integrados num Estado particular” (Elias, 1970, pp. 159-160). Por outras palavras, o “de- senvolvimento surge como sendo essencialmente uma atividade levada a cabo por pes- soas (com competências e capacidade para tal, sendo) sobretudo executada por aqueles que detêm cargos governamentais” (Elias, 1970, pp. 159-160) e pelos peritos, técnicos ou

agentes de desenvolvimento, na maioria das vezes oriundos de países ditos mais “avan- çados”. Na verdade, é especialmente aos olhos destes agentes de desenvolvimento que o desenvolvimento é entendido como sendo um tema relacionado com problemas essenci- almente “económicos”. Por outras palavras, embora numa leitura redutora, avançar com um processo de desenvolvimento em países mais pobres, tal como advogam certos países doadores, significa sobretudo lutar pelo aumento do “potencial económico” dessas soci- edades, ou melhor, dos Estados mais pobres (Elias, 1970).

Nesta linha de raciocínio, a noção de desenvolvimento não se dissocia da sua de- finição mais “simples” e talvez do seu uso mais “comum” relacionado com a mudança social, que pode igualmente ser considerado como um objetivo de se mudar para um es- tado ou situação social relativamente melhor ao que era anteriormente. Não é de admirar que se fala de “Good Change” ou (“mudança boa”) tal como refere Chambers (1997 re- ferido por Thomas, 2000, p. 23). Se considerarmos que a mudança é um processo social, então ao adotarmos a definição de desenvolvimento, tendemos de enfatizar um processo em direção a um certo estado desejável na sociedade. Se este estado pode ser alcançado num curto, médio ou longo prazo, a mudança pode ter várias implicações, efeitos ou im- pactos para e na sociedade. Por conseguinte, a questão que se coloca aqui, não é afirmar o desenvolvimento como uma mudança, mas sim como se deve definir e avaliar uma “boa mudança” e a quem essa mudança dita de “boa” se dirige (Thomas, 2000). Assim sendo, se ao perspetivar uma ideia de “boa mudança”, estamos igualmente a relevar a importân- cia da capacidade dos atores sociais de porem a funcionar algo diferente e melhor. Quando se refere a uma sociedade ou a um sistema socioeconómico, o “desenvolvimento” implica geralmente a ideia de melhoria, quer a nível da situação geral do sistema, quer nalguns dos seus elementos constitutivos (Bellù, 2001). Por outras palavras, ao adotarmos essa perspetiva, o desenvolvimento está igualmente relacionado com a lógica do “capa- citar”, particularmente, no que concerne ao alargamento das escolhas que as pessoas po- dem ter e fazer numa sociedade para alcançarem as melhores condições de vida. A pro- pósito desta questão, Bellù (2001, p. 2) sublinha igualmente que, em termos gerais, o “desenvolvimento” significa “um evento que constitui uma nova etapa numa dada situa- ção de mudança”, ou melhor, um processo de mudança. Neste sentido, tal como referimos acima, ao qualificarmos algo de “desenvolvimento” estamos implicitamente a pretender algo positivo ou desejável.

Perspetivar o desenvolvimento centrado nas necessidades humanas (“human-ne-

eds centred development”), é um outro ângulo de visão. Assim sendo, entende-se o de-

senvolvimento como um processo que, de acordo com as suas próprias aspirações, os membros duma comunidade pretendem melhorar a capacidade dos indivíduos e das ins- tituições na mobilização e gestão dos recursos para produzir melhores condições susten- táveis de qualidade e igualdade de vida (Corten, 1990). Esta perspetiva está em concor- dância simétrica com a posição da UNESCO (Alechina, 1982, p. 13) que, como sabemos, defende a ideia de que o desenvolvimento tem de estar centrado nas necessidades reais da sociedade, ser um processo total e multi-relacional, envolvendo todos os aspetos da vida duma comunidade, desde as suas relações com o mundo exterior à consciência de si de cada membro da comunidade. Assim sendo, segundo Dudley Seers (1969 referido por Thomas, 2000, p. 34) só podemos falar de desenvolvimento se tivermos em consideração o nível de satisfação das várias dimensões das necessidades humanas que possam e devem ser melhoradas. Para este autor, em termos estritos, as condições ou critérios para o de- senvolvimento relacionam-se com os seguintes nove indicadores: a) baixos níveis de po- breza material; b) baixo nível de desemprego; c) igualdade relativa; d) democratização da vida política; e) independência nacional; f) boa alfabetização e níveis educacionais; g)

status relativamente igual para as mulheres e a participação das mulheres; h) capacidade

sustentável para atender às necessidades futuras; i) segurança da vida humana.

No entanto, se é verdade que há uma certa ideia otimista da prática de desenvol- vimento à escala planetária, não é menos verdade que os processos de desenvolvimento nos países ditos subdesenvolvidos do Terceiro Mundo são cada vez mais orientados por uma certa ideologização e ocidentalização do processo, onde impera de forma dominante uma perspetiva de crescimento da economia, com elevados efeitos nefastos ao nível do ambiente e impactos nas vidas das comunidades.

De facto, subjaz nos processos de desenvolvimento uma outra visão pessimista, geradora de uma certa reação radical que põe a nu um conjunto de dilemas do desenvol- vimento em certos países, tais como o do sudeste da Ásia, em África ou na América Cen- tral, e que muitos o designam de “antidesenvolvimento”. A propósito desta questão, Pieterse (2000, p. 178) adjetiva o desenvolvimento como a “Nova Religião do Ocidente”, argumentando ainda que, até à data, as propostas de desenvolvimento apresentadas não

trazem apenas impactos negativos no ambiente, mas comportam outras implicações, entre as quais a omnipresença de orientações das práticas moldadas por uma ocidentalização desmesurada e uma homogeneização dos modos de vida marcada pela ocidentalização forçada da(s) cultura(s) local(is). Era a lógica do “one best way” à americana (Amaro, 2017)

Num tom igualmente crítico, Fakih (2004) subscreve esta tese e afirma que os processo de desenvolvimento ocorridos nas duas últimas décadas tornaram-se numa es- pécie de “nova religião” ou uma nova ideologia para as milhões de pessoas no Terceiro Mundo. Para o autor, a forma como o desenvolvimento tem vindo a ser “apresentado”, promete uma nova esperança para a mudança e melhoria das oportunidades de vida das populações. Porém, salienta o autor que a questão é “mais virtual do que real”, na medida em que, embora se tenham sido realizados projetos e investimentos em muitas regiões e localidades nos países “pobres”, continua a aumentar o número ou a percentagem de pes- soas a viver numa situação de pobreza absoluta no Terceiro Mundo. Contudo, Fakih (2004) argumenta que, em termos práticos, cada programa de desenvolvimento pode re- velar um impacto diferente, dependendo do conceito e da lente utilizada para perspetivar os processos de desenvolvimento. Para o autor, em última instância, o conceito de desen- volvimento dominante que encontramos na atualidade, e que é aplicado na maioria dos países do terceiro mundo, reflete a mera ideologia de desenvolvimento baseado em mo- delos ocidentais. Neste conceito otimista de desenvolvimento, oferecido como uma ine- vitabilidade do processo em direção à “modernidade”, reflete apenas a dominação das formas ideológicas ocidentais do progresso tecnológico e económico (Martins, 2002) do mundo, tal como são conhecidas nas nações industriais, ditas avançadas. É assim que se entende que o desenvolvimento é quase sempre apresentado em estreita relação com “mo- dernização” e “ocidentalização” de Norte para o Sul, onde o Norte se apresenta como “civilizadora” ou “modernizadora” do Sul (Ferreira & Raposo, 2017, p. 116), sendo este, o Sul, um mero espectador das “ofertas” generosas do Norte.

Importa relevar que a principal orientação ou mainstream desta ideologia ociden- talizada de desenvolvimento baseada no “crescimento económico” (Amaro, 2003; Fer- reira & Raposo, 2017), é considerada como a primeira “geração do desenvolvimento

(crescimento económico) (Ferreira & Raposo, 2017) ou unilinear que foi transferida pela teoria da modernização, e que durante um longo período de tempo dominou o pensamento sobre o desenvolvimento e o desenvolvimento da comunidade nos países em vias de de- senvolvimento (Terceiro Mundo) (Soetomo, 2012).

De recordar que, após o final da Segunda Guerra Mundial, a expansão e o domínio dos Estados Unidos América (EUA) começaram a tornar-se globais, particularmente no contexto do período da guerra fria com a ex União Soviética (ex-URSS), fomentando uma nova teoria do desenvolvimento muito exacerbada nas ideias de modernização e tecnolo- gização. Por exemplo, a teoria de Rostow, considerada como uma referência da política externa dos EUA desse período, ajudou a sedimentar uma espécie de ideologia do desen- volvimentismo baseada na tese da modernização que mais não foi senão uma arma ideo- lógica de expensão da influência das políticas e visões dos EUA. Foi através desta ideo- logia do desenvolvimento e da democracia à “americana” que os EUA procuraram exer- cer as suas influências nos países em vias de desenvolvimento (Terceiro Mundo). Cha- mamos a atenção que diversas variantes desta teoria do desenvolvimento complementa- ram e fortaleceram uma perspetiva conservadora do desenvolvimento que dominou o pe- ríodo entre as décadas de 1960 e 1970 (Berbereglu citado por Soetomo, 2012, p. 51). Por outras palavras, o rumo do desenvolvimento das décadas 60 e 70 do século XX, imposto pelos EUA, afirmou-se definitivamente na arena internacional com a materialização do Plano Marshall (Truman, 1949, referido por Ferreira & Raposo, 2017), procurando desta forma influenciar os restantes países com a expansão da sua ideologia político-económica (Ferreira & Raposo, 2017, p. 117), sobretudo junto dos países em vias de desenvolvi- mento (Terceiro Mundo).

É de notar que, em termos geopolíticos, os países do mundo podem ser classifica- dos em dois grandes grupos, ou seja, em países desenvolvidos e em países em vias de desenvolvimento. Os países em vias de desenvolvimento, também designados do Ter- ceiro Mundo, consistem geralmente de ex-colónias dos países europeus que conquistaram a independência. Para compensar o “atraso” do processo de desenvolvimento nesses paí- ses do Terceiro Mundo, foram promovidas políticas para a mudança acelerada (geral- mente chamado de processo de modernidade), nomeadamente através da transferência do conhecimento e da tecnologia dos países, ditos desenvolvidos. Como a transferência da

ciência e tecnologia oriunda dos países desenvolvidos, que são geralmente oriundos dos países ocidentais, trouxe aquilo que muitos designaram de ocidentalização, facto que cau- sou muito debate pelo facto do processo de modernização poder ser meramente chamado de ocidentalização (Soetomo, 2012, p. 94-96).

Com base na classificação dos países do mundo em Norte-Sul, países desenvolvi- dos e países em vias desenvolvimento (Terceiro Mundo), centro-periferia, rico-pobre, emergiram as teorias da dependência e do sistema mundial. Segundo a teoria da depen- dência, as relações entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento (Ter- ceiro Mundo) são descritas como uma relação entre o centro e a periferia. Perspetiva-se que o Estado central está sempre “explorando” ou dominando a periferia, de modo que quanto mais complexas forem as relações da periferia com o centro, mais intenso será o processo de “exploração”, e mais dependente estará a periferia do Estado central. Neste sentido, para sair da condição de subdesenvolvimento dos países do Terceiro Mundo, são propostas novas orientações políticas económico-sociais e de descentralização, onde a redução da dependência da periferia ao centro (Estado) (Soetomo, 2012, p. 55) marca um lugar privilegiado de passagem.

Para além da teoria da modernização e da teoria da dependência, importa ainda salientar a teoria do sistema mundial. Segundo Berberglu (1992) citado por Soetomo (2012, p. 55), a teoria do sistema mundial foi desenvolvida por Helerstein, argumentando este que todos os países do mundo estão inseridos num sistema capitalista mundial. De certa forma, essa visão da teoria do sistema mundial tem certas semelhanças com a teoria da dependência. As diferenças fundamentais são e residem na forma como a teoria da dependência perspetiva a divisão do Estado em centros e periferia, e na proposta da teoria do sistema mundial que a divide em centros, semiperiféricos e periféricos. Em contraste com a teoria da dependência, na visão do sistema mundial, é possível ocorrer para qual- quer país a mobilidade vertical da sua posição (Soetomo, 2012).

Ainda no confronto entre a teoria da modernização e a teoria do sistema mundo, Alvin So (1990 referido por Caramelo, 2009) argumenta que “as duas perspetivas desen- volveram um quadro teórico polarizado, ainda que a Escola da Modernização tenda a enunciá-­‐‑lo a partir da dicotomia tradição versus modernidade e a Escola da Dependência clássica a enuncie segundo a dicotomia centro versus periferia” (Caramelo, 2009, p. 77).

O sucesso destas teses sobre o desenvolvimento só foi possível com o surgimento da política do “mercado livre” que permitiu garantir e manter a continuidade e a domina- ção dos países ricos sobre os mais pobres. O aparecimento desta ideologia, entendida como a “segunda geração de políticas de afirmação da microeconomia e da ‘mão invisí- vel’ do mercado, é orientada agora para a industrialização por exportações” (Ferreira e Raposo, 2017, p. 117). Para o seu desenvolvimento, e inspirada por North (1991 citado por Meier, 2001 cf. Ferreira & Raposo, 2017), surge “uma terceira geração de políticas, impulsionada por preocupações com as estruturas institucionais – formais e informais, nomeadamente ‘as regras do jogo’ – que se supunha terem um impacto mais direto na performance económica”, conforme preconizado pela Nova Economia Institucional” (Ferreira & Raposo, 2017, p. 118).

Embora tenham sido implementados muitos modelos de desenvolvimento, são so- bejamente conhecidos alguns estudos, por exemplos os de Amaro (2003, 2017), que co- locam em evidência lacunas diversas nos processos de desenvolvimento16. Nascem assim

novos debates, propostas e a procura de novas perspetivas. A questão da preservação dos recursos e a defesa do ambiente fizeram surgir uma nova tendência do desenvolvimento no campo da sustentabilidade. Na esteira das teses de Amaro (2003, 2017), Caramelo (2009) afirma que “o conceito de desenvolvimento sustentável designa o processo de sa- tisfação de necessidades atuais que não põe em causa a satisfação de necessidades das gerações futuras” (Amaro, 2003, p. 56 citado por Caramelo, 2009, p. 140)17. Para o autor,

esta nova realidade coloca como condição sine qua non da sua concretização a ocorrência do seguinte:

“i) a solidariedade intergeracional; ii) a integração da gestão dos recursos naturais nas estratégias de desenvolvimento (é necessário considerar em simultâneo a fini- tude de certos recursos naturais e o ritmo possível de renovação daqueles que não são finitos); iii) a durabilidade dos processos de produção e consumo inerentes ao

16  Na perspetiva de Roque Amaro, “as falhas dos processos de desenvolvimento, mormente nos países em vias de

desenvolvimento e das suas comunidades, apontando como principal causa dos fracassos, as tendências de desenvol- vimento operadas que mais não têm senão fomentado e perseguido a ideia da inevitabilidade do crescimento econó- mico, ignorando a valoração de outras dimensões, entre as quais a dimensão social da sociedade (comunidade)” (Costa, Z. & Silva, C., 2018, p. 132).  

17 Esta ideia de responsabilidade retoma a tese de Jonas (1995) sobre as questões da ética e desenvolvimento. Apesar

da sua pertinência, na presente tese não são tratadas estas questões éticas. Para um maior aprofundamento poderão consultar a sua obra: Jonas, H. (1995). El Principio de Responsabilidad. Ensayo de una ética para la civilización

desenvolvimento o que implica pensar o desenvolvimento na interação entre o subsistema económico e o sistema ecológico (corresponde à metáfora de que o desenvolvimento é uma maratona e não uma prova de velocidade)” (Caramelo, 2009, p. 140).

No seguimento do exposto acima, é de assinalar uma crítica à perspetiva unilinear (unidimensional) do desenvolvimento na medida em que subjaz nesta teoria (unilinear ou unidimensional) uma posição demasiada etnocêntrica, promovendo em concreto um de- terminado padrão de sociedade como orientação para o desenvolvimento, que mais não são senão, a visão da Europa Ocidental (Amaro, 2017; Ferreira & Raposo, 2017). Trata- se de uma visão castradora do processo evolutivo duma sociedade que não admite que ela possa seguir um outro padrão ou caminho distinto da perspetiva unilinear (unidimensio- nal), ou seja, que toda e qualquer sociedade possa ter seu próprio caminho (Soetomo, 2012, p. 49).

Decorrente das críticas à perspetiva unilinear (unidimensional) e “romântica” do desenvolvimento, emergiram novas perspetivas alternativas que olham para o desenvol- vimento como um processo de mudança. Uma dessas novas perspetivas pressupõe que não há nem pode haver um padrão determinista no desenvolvimento, porque cada socie- dade ou comunidade tem seu próprio padrão. Trata-se de uma nova perspetiva designada de perspetiva multilinear ou multidimensional que se baseia no pressuposto de que toda a sociedade e a sua comunidade constroem um desenvolvimento que se adapta ao ambi- ente, tanto ao nível “físico” como social (Soetomo, 2012, p. 50). Assim sendo, o novo olhar sobre o desenvolvimento coloca-o como um processo multidimensional (multili-

near), em que a economia (crescimento económico) é apenas uma parte do processo, não

sendo a única dimensão de desenvolvimento como tem vindo a ser apresentada pelos teóricos da modernização, da dependência e do sistema mundo.

Segundo Soetomo (2012, p. 53), a abordagem multilinear ou multidimensional do desenvolvimento surge para contrapor o seguinte. Em primeiro lugar, ao aplicar a teoria da modernização no desenvolvimento, apenas se usa uma abordagem unilinear (unidi-

mensional) que nem sempre é o mais apropriado para aplicar nos países em vias de de-