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PARTE II A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

3. A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NO DIREITO PORTUGUÊS

3.8 O Ônus da Prova

Uma das questões mais relevantes na análise da responsabilidade tributária dos gestores das sociedades é a definição de quem deve comprovar essa responsabilidade.

A jurisprudência e a doutrina oscilaram bastante no decorrer dos últimos anos, até mesmo em razão das constantes alterações no quadro legal.

Porém, desde a entrada em vigor do Código de Processo Tributário, em 1991, parece não restar mais dúvidas sobre esta matéria.

Com efeito, passou então a caber aos administradores o ônus de provar que não praticaram nenhum ato causador da insuficiência do patrimônio da sociedade. Presunção juris tantum, que admite, obviamente, prova em sentido contrário.

Entretanto, para Teixeira Ribeiro90, a obtenção desta prova é tarefa extremamente árdua para os gerentes da sociedade:

Se era difícil à Fazenda Pública fazer a prova positiva da culpa, ainda é mais difícil aos administradores ou gerentes fazerem a prova negativa.

Tânia Meireles da Cunha91 comunga do mesmo ponto de vista:

Já o credor Estado, no que toca à responsabilidade tributária dos gestores, vem gozando, quase ininterruptamente, de uma presunção de culpa dos gestores que, além de o beneficiar em termos de prova, onera os responsáveis com o ônus da prova de um facto negativo: o ônus da prova da não culpa.

90

RIBEIRO, José Joaquim Teixeira. Anotação ao Acórdão do STA de 28 de novembro de 1990. Revista de Legislação e Jurisprudência, [S.l.], ano 125, n. 3815, p. 46-50, jun. 1992.

91

CUNHA, Tânia Meireles da. Da Responsabilidade dos Gestores de Sociedades Perante os Credores Sociais: a Culpa nas Responsabilidades Civil e Tributária. Coimbra: Almedina, 2004, p. 14.

Esta presunção de culpa dos gestores, no âmbito da sua responsabilidade tributária, tem assumido contornos diferentes, desde 1929 até hoje, tendo começado por ser interpretada maioritariamente como uma presunção de culpa funcional, inilidível.

Apesar de, desde 1991, a culpa a que se presume ser considerada como uma culpa efectiva e a presunção ser ilidível, a verdade é que os gestores têm a seu cargo um difícil ônus da prova.

De todo modo, a jurisprudência, por meio do Supremo Tribunal Administrativo, já pacificou esta matéria, como se constata no seguinte julgado:

Processo: 0717/05

Supremo Tribunal Administrativo Data do Acordão: 11/01/2006 2ª SECÇÃO

Relator: BAETA DE QUEIROZ Descritores: EXECUÇÃO FISCAL. REVERSÃO DA EXECUÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO.

CULPA.

ÓNUS DA PROVA.

APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.

Para o STA, a responsabilidade do gerente pelas dívidas sociais, prevista no artigo 24º, nº 1, alínea ”a”, da Lei Geral Tributária, é subsidiária e tem como pressuposto o não pagamento ou a insuficiência do patrimônio da pessoa jurídica para honrar a obrigação tributária .

Assim sendo, havendo uma presunção de culpa do gerente, a Administração Fiscal não está obrigada a prová-la, pelo que se lhe não impõe que, no caso de reversão, expresse os fundamentos da culpa do revertido, sendo antes a ele que incumbe convencer da ausência dessa culpa, em oposição à execução.

Portanto, o gestor da época do vencimento do tributo é, em regra, responsável pela obrigação, cabendo a ele o ônus de provar que não foi por culpa sua que o pagamento deixou de ser realizado.

O procedimento de responsabilização começa com a audiência prévia dos gestores, desde a época do fato gerador até o vencimento, que apresentam justificativas para o não pagamento do tributo, ou para a insuficiência de bens da sociedade, para que a Administração Tributária possa então decidir sobre o redirecionamento.

Em Portugal existem duas situações bem distintas, no tocante ao ônus da prova: ele será da Administração, no tocante ao gestor que administrava a empresa no momento do fato gerador do tributo. Por outro lado, o ônus será do administrador, quando este geria a empresa no momento do vencimento do tributo.

3

3..99 AA DDeessccoonnssiiddeerraaççããoo ddaa PPeerrssoonnaalliiddaaddee JJuurrííddiiccaa

Diversos autores portugueses tem defendido a tese de que a responsabilidade tributária dos sócios e administradores de sociedades é uma decorrência da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, já vista anteriormente ao longo deste trabalho. Entre eles, merece destaque Saldanha Sanches, ainda que defenda que tal regra seja aplicada com as devidas cautelas:92

Sublinhemos contudo que a responsabilização do gerente e administrador pela insuficiência do patrimônio para o cumprimento das dívidas do executado só pode ser legitimada pela comprovação de um comportamento censurável por parte do decisor empresarial, nomeadamente no caso de haver prova bastante que este preferiu o cumprimento das normais obrigações da empresa em detrimento dos seus deveres fiscais.

Entretanto, ainda que amplamente majoritária, tal posição enfrenta a dissonância de alguns autores, como é o caso de Isabel Marques da Silva:93

92

SANCHES, J. L. Saldanha. Manual de direito fiscal. Lisboa: Lex, 1998. p.137. 93

SILVA, Isabel Marques da. A responsabilidade tributária de administradores de pessoas colectivas no direito português. Revista Fórum de Direito Tributário, São Paulo, ano 3, n. 17, p.113-131, set./out. 2005

Há quem, na doutrina portuguesa, veja na responsabilidade tributária um fenómeno de desconsideração da personalidade societária. A esta tese pode, porém, contrapor-se que a desconsideração da personalidade societária permite executar o património dos sócios e não o dos titulares dos órgãos de administração ou gestão enquanto tais e independentemente de serem ou não também sócios ou accionistas. Assim, não parece que na responsabilidade tributária dos gestores enquanto tais haja uma desconsideração da personalidade tributária, ao menos em sentido próprio.