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2.3 FAMÍLIAS COMO SISTEMAS

2.3.1 O Ciclo de Vida Familiar

Compreender a funcionalidade e a dinâmica do sistema familiar é um processo complexo que demanda um amplo conhecimento das múltiplas variáveis presentes no contexto. O estudo do ciclo vital pode ser uma das ferramentas para auxiliar no desvendar de informações que impulsionem uma análise mais coerente com a realidade da família.

Os conceitos gerais sobre ciclos indicam uma compreensão de que eles são sequenciais e com etapas distintas. No que se refere às famílias, esse foi um conceito apropriado da Sociologia e incorporado às práticas terapêuticas sistêmicas da Psicologia com o propósito de formulação de possíveis hipóteses que pudessem auxiliar nos atendimentos (CERVENY; BERTHOUD, 2002). O Quadro 1 apresenta alguns autores e as etapas do ciclo de vida familiar desenvolvidas ao longo dos anos.

Quadro 1: Conceitos - Ciclo de Vida Familiar

Autores Ciclos de Vida Familiar

Durvall (1957)

1. Casal sem filhos;

2. Família com filhos até 30 meses;

3. Família com crianças em idade pré-escolar (2 anos e meio a 6 anos);

4. Família com crianças em idade escolar (6 a 13 anos); 5. Família com filhos adolescentes (até 20 anos); 6. Família com jovens adultos (inclui a saída do 1° até o

último filho);

7. Casal na meia idade; 8. Envelhecimento. Hill e Rodgers (1964)

1. Jovem casal sem filhos;

2. Estágio Expansivo (nascimento dos filhos);

3. Estágio Estável (período da educação dos filhos até o lançamento do 1° filho);

4. Estágio da Contratação (saída dos filhos até a ultima saída);

5. Estágio Pós-parental (novamente casal sem filhos). Minuchin e Fishman (1990)

1. Formação do casal;

2. Família com crianças pequenas;

3. Família com crianças em idade escolar ou adolescentes;

4. Família com filhos adultos. Carter e McGoldrick (1995)

1. Saindo de casa, jovens solteiros;

2. A união de família no casamento: o novo casal; 3. Famílias com filhos pequenos;

4. Família com adolescentes;

5. Lançando os filhos e seguindo em frente; 6. Família no estágio tardio da vida.

Cerveny, Berthoud e Cols (1997)

1. Família na fase de aquisição; 2. Família na fase adolescente; 3. Família na fase madura; 4. Família na última fase. Fonte: Elaborada com base em Cerveny; Berthoud (2002).

O que perpassa cada um desses ciclos é a certeza de que, com o passar do tempo e algumas mudanças na estrutura familiar, aparecem novas demandas ao sistema para que haja um processo evolutivo. Daí, a relevância de se considerar a fase do ciclo vital para uma melhor compreensão do funcionamento do sistema familiar. Na abordagem desta pesquisa, será utilizado o modelo de Carter e McGoldrick (1995; 2011). Suas fases são detalhadas pelas autoras na Tabela 3.

Tabela 3: Estágios do Ciclo de Vida Familiar

Estágio de Ciclo de

Vida Familiar Processo emocional de transição: princípios- chave

Mudanças de segunda ordem no status familiar necessários para se prosseguir desenvolvimentalmente

1 - Saindo de casa:

jovens solteiros Aceitar a responsabilidade emocional e financeira pelo

eu a. Diferenciação do eu em relação à família de origem; b. Desenvolvimento de relacionamentos

íntimos com adultos iguais;

c. Estabelecimento do eu com relação ao trabalho e independência financeira; 2 - A união de famílias no casamento: o novo casal Comprometimento com o

novo sistema a. Formação de um sistema marital; b. Realinhamento dos relacionamentos

com as famílias ampliadas e os amigos para incluir o cônjuge..

3 - Famílias com

filhos pequenos Aceitar novos membros no sistema a. Ajustar o sistema conjugal para criar espaço para o(s) filho(s);

b. Unir-se nas tarefas de educação dos filhos, nas tarefas financeiras e domésticas;

c. Realinhamento dos relacionamentos com a família ampliada para incluir os papéis de pais e avós..

4 - Famílias com

adolescentes Aumentar a flexibilidade das fronteiras para incluir a independência dos filhos e as fragilidades dos avós

a. Modificar os relacionamentos progenitor-filho para permitir ao adolescente movimentar-se par dentro e para fora do sistema;

b. Novo foco nas questões conjugais e profissionais do meio da vida;

c. Começar a mudança no sentido de cuidar da geração mais velha.

5 - Lançando os filhos e seguindo em frente

Aceitar várias saídas e entradas no sistema

familiar a. Renegociar o sistema conjugal como díade; b. Desenvolvimento de relacionamentos de adulto para adulto entre os filhos e seus pais;

c. Realinhamento dos relacionamentos para incluir parentes por afinidades e netos;

d. Lidar com a incapacidade e morte dos pais (avós).

6 - Famílias no

vida interesses próprios e/ou do casal em face do declínio fisiológico;

b. Apoiar um papel mais central da geração do meio;

c. Abrir espaço no sistema para a sabedoria e experiência dos idosos, apoiando a geração mais velha sem superfuncionar por ela;

d. Lidar com a perda do cônjuge, irmãos e outros iguais e preparar-se para a própria morte. Revisão e integração da vida.

Fonte: Carter; McGoldrick(1995, 2011, p. 17)

Outros aspectos precisam ser observados na análise do ciclo vital das famílias. Para Carter e McGoldrick (1995, 2011), há evidências de que os estresses familiares costumam ocorrer nas fases de transição do ciclo vital e podem potencializar a ocorrência de rompimentos do ciclo, resultando em sintomas e disfunções. As autoras apresentam, para um aprofundamento da análise dos ciclos de vida, os estressores verticais e horizontais que geram um fluxo de ansiedade no sistema. Os verticais incluem padrões de relacionamento e funcionamento que são transmitidos para as gerações seguintes, como atitudes, tabus, expectativas, rótulos e questões opressivas familiares inerentes do contexto emocional em que somos criados. Os horizontais são resultados do processo e do avanço ao longo do tempo, envolvidos com as transições nas fases do ciclo vital. A ocorrência da convergência entre vertical e horizontal irá criar um grande rompimento no sistema. Assim, há o estresse herdado pelas gerações e os gerados pelas mudanças no ciclo vital, como pode ser observado na Imagem 4.

Imagem 4 : Estressores Horizontais e Verticais

Fonte: Carter e McGoldrick (1995, 2011, p. 12)

A análise do ciclo de vida proposto por Carter e McGoldrick auxiliará na compreensão dos estudos de caso desta pesquisa. Será uma ferramenta sistêmica de apoio às análises da pesquisa, podendo indicar uma melhor compreensão de possíveis estresses latentes nas narrativas dos casais que serão pesquisados. Não será fonte única e determinante das informações identificadas, apenas ampliará a contextualização, buscando-se maior fidedignidade aos dados.