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O 11 de Setembro de 2001 e as suas Consequências

3.3 Descrição Breve dos Acontecimentos

3.3.3 O 11 de Setembro de 2001 e as suas Consequências

O mundo depois de 1989 está marcado pelos atentados do 11 de setembro de 2001. O Papa está cansado e doente. Por ocasião dos atentados aos Estados Unidos, a Santa Sé exprime grande participação na dor americana. O Papa fica muito impressionado, com tudo aquilo. Percebe imediatamente que o terrorismo, em Nova Iorque, deu um salto qualitativo. Mas a Santa Sé é cautelosa quanto aos métodos de luta contra o terrorismo.

Perante a segunda guerra no Iraque, a posição de João Paulo II é firme. Neste contexto, os seus interlocutores são, sobretudo, os Estados Unidos de Bush Jr.

Pelo simples facto de se dirigirem aos EUA, as palavras e as atitudes do Papa parecem assumir um certo tom antiamericano. É forte o conflito entre a Santa Sé e os Estados Unidos do presidente cristão e new born George W. Bush.

Novos documentos americanos, recentemente publicados, mostram que, desde 2001, a Santa Sé tinha posto de aviso a administração Bush sobre os riscos para os cristãos iraquianos, se se atacasse «a ditadura laica de Saddam Hussein». A guerra não teria podido criar uma solução melhor e talvez acabasse por abrir o caminho a uma «ditadura islâmica»356. O Papa

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Segundo G. WEIGEL, o Papa teria dito a um diplomata do Vaticano que se congratulava com ele pela Coragem da iniciativa de mediação: «O Senhor pensa que eu, depois de ter aceite este ofício, poderia ficar de braços cruzados enquanto dois países católicos vão para a guerra?» (Testimone della speranza, 339).

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110 opõe-se frontalmente à decisão americana de declarar guerra ao Iraque de Saddam. Todavia, o seu prestígio pessoal é tão elevado que a administração americana não considera a divergência um motivo suficiente para arrefecer as relações com o Vaticano ou para discutir o respeito pela autoridade papal, como se vê pela visita muito obsequiosa feita pelo presidente ao Pontífice. No século XXI, João Paulo II, vencedor do comunismo e cristão intrépido, é já uma grande autoridade mundial e uma personagem «histórica» que incute respeito, embora não seja ouvido.

Na lógica de João Paulo II, as decisões de um país como os Estados Unidos – grande não só pela sua força política e militar, mas também pela sua importante tradição democrática –, têm uma vasta influência no comportamento da comunidade internacional. Os Estados Unidos são aquele império, o último, a que o Papa de Roma pode falar com decisão, mas também com proximidade e quase a partir de dentro, pela sua tradição cristã e porque a Igreja católica é a maior confissão do país. Em suma, os Estados Unidos são um país cristão. João Paulo II realiza a sua diplomacia pessoal, enviando aos Estados Unidos o cardeal Laghi, Ex- Núncio e amigo pessoal da família Bush, para pressionar o presidente. Não obtém nenhum resultado junto do presidente, decidido a fazer a guerra, que, quando muito, lhe fala do seu empenho contra o aborto. Paralelamente, envia o cardeal Etchegaray, prestigiado legado papal para as missões humanitárias, falar com Saddam Hussein. Por fim, o Papa encontra-se entre os derrotados da guerra querida por Bush sendo a sua figura aureolada por um grande consenso na Europa e noutros lugares, por aqueles que não gostam da guerra ou que são pacifistas.

O ano de 2003, quadragésimo aniversário da Pacem in terris de João XXIII, é ocasião propícia para manifestações em memória do Papa da paz: é uma opção consciente da iminência da ameaçada guerra ao Iraque. O Papa intervém em muitas ocasiões:

É preciso multiplicar os esforços. Não podemos parar diante dos ataques do terrorismo nem diante das ameaças que se levantam no horizonte. Não podemos resignar-nos como se a guerra fosse inevitável357.

Ele já sente que a guerra foi reabilitada nas relações internacionais. Precisamente em 2003, sob os auspícios do embaixador americano junto da Santa Sé, Jim Nicholson, realiza-se em Roma uma conferência do pensador católico Michael Novak, que reformula o conceito de guerra justa, partindo do ataque do 11 de setembro e motivando teologicamente a intervenção dos Estados Unidos358.

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L´Osservatore Romano, 9 de fevereiro de 2003. 358

Observações em G. SCICHILONE, «Il problema della guerra e della pace in Cataldo Naro», in E. GUCCIONE - A. RASPANTI (ed.), Sapienti per sempre, Sciascia, Palermo 2009, 201-201.

111 João Paulo II tem várias experiências importantes, a começar pela experiência polaca, que o confirmam na convicção de que o diálogo e a transição pacífica são o caminho para chegar à paz e à liberdade. Todavia, também pôde experimentar a fragilidade do povo católico, atraído pela lógica do conflito em diversas situações de tensão e pela inadequação dos instrumentos diplomáticos. Como já havia dito em Assis, em 1986, a paz deve tornar-se um estaleiro aberto a todos sendo mais frequentado pelos próprios cristãos. Sabe que deve fortalecer a aliança com o empenho/compromisso pela paz na consciência dos católicos.

No discurso ao Corpo Diplomático em janeiro de 2003, o Papa enquadra o «não à guerra» («a guerra nunca é uma fatalidade; é sempre uma derrota da humanidade»), no «não à morte» (a começar pelo aborto) e no «não ao egoísmo359. É o manifesto do novo compromisso do pontificado em que o tradicional ministério pela paz se apresenta intimamente ligado à luta pela vida humana. Deste modo, o Papa delineia o seu desígnio para um mundo que saiu não só da Guerra Fria, mas também das ideologias e do militantismo político do século XX, em que se afirmam comportamentos cada vez mais baseados no interesse pessoal, como acontece com a difusão global da lógica de mercado. Entre os séculos XX e XXI, o Papa reafirma o ministério da paz como parte integrante do seu ofício e do seu carisma conectando-o com a luta pela vida.

Num mundo saído da Guerra Fria, a Sé de Roma fala uma linguagem de paz, apta a constituir uma referência para cristãos e não-cristãos. O Papa está consciente disso: certamente não reduz a mensagem religiosa unicamente à paz, mas realiza o sonho antigo dos Papas de Roma de serem «profetas» de paz no mundo contemporâneo sendo confortado pelo grande eco das suas palavras.