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5 TRANSFORMAÇÕES ESPACIAIS E CRESCIMENTO URBANO

5.1 O declínio da atividade mineradora e a pressão da expansão metropolitana

No início da década de 90, a mineração ainda era a atividade econômica principal em Nova Lima. No decorrer desta década, no entanto, observou-se um constante interesse, tanto por parte das empresas mineradoras tanto por parte do poder público, pela diversificação da atividade econômica que viessem fortalecer os setores secundário e terciário no local adotando-se medidas que privilegiasse, dentre outras atividades a imobiliária e o turismo. A tendência ao declínio da atividade econômica principal também foi sinalizada pelo esgotamento das lavras ou pela inviabilidade econômica de sua exploração e pelo crescimento da atuação da Mineração Anglo Gold144, por meio de seu departamento de expansão imobiliária. Por outro lado, a outra mineradora, MBR - Minerações brasileiras Reunidas, com a constante venda de suas terras impróprias para sua atividade de mineração de ferro, para incorporadores dispostos a aprovar loteamentos voltados ao atendimento das demandas geradas pela expansão do Vetor Sul de Belo Horizonte.

Pelos estudos preliminares e pelo diagnóstico do primeiro Plano Diretor de Uso e Ocupação do Solo de Nova Lima, elaborado a partir de 1994, uma das principais preocupações que orientaram a determinação das diretrizes de crescimento urbano local foi o “ordenamento e articulação do território municipal, tendo em vista as características da estrutura urbana atual e as perspectivas futuras” (NOVA LIMA, 1994, p. 6). Este plano contou com a participação constante de membros do corpo técnico da Mineração Morro Velho que fizeram sugestões na definição de seu formato final e de suas proposições. O documento, de circulação restrita dentro da Prefeitura, deu sinais de reconhecer a inexorabilidade do fim da mineração do ouro. Também apontou para um horizonte e apontava um horizonte muito pequeno para a exploração da mineração de ferro no município.

Um segundo estudo, o Diagnóstico do Plano Diretor, realizado por outra gestão pública já em 1999, reforçou a atividade de mineração como a atividade que teria “se constituído tradicionalmente na base da sustentação da economia local, sustentando o

144 A mineração Morro Velho assume o nome de Anglo Gold a partir da transferência acionária que ocorreu em 1996.

mercado de trabalho e contribuindo decisivamente para a arrecadação municipal” (NOVA LIMA, 1999, p. 8). Diante da queda de produtividade da atividade econômica, toda a lista de propostas e perspectivas apontava para adoção de novos caminhos, para novas e diferentes vocações.

Como característica espacial forte, o estudo apontou que “a dispersão e a desarticulação distinguem as principais características da estrutura urbana de Nova Lima” (NOVA LIMA, 1999, p. 12), provavelmente indicando subliminarmente que o problema da concentração de terras nas mãos de grandes proprietários talvez agravasse a dispersão, repercutindo em propostas conflitantes entre o setor público e o privado quando à escolha de políticas públicas que incidissem em áreas onde a maioria de terras pertencia aos grupos que ainda sustentavam a economia local. O debate convergiu para a seguinte conclusão: haveria uma gradativa, mas importante perda da mineração como atividade econômica principalmente em função da exaustão dos recursos naturais locais.

Tal constatação trouxe a perspectiva sombria da queda de arrecadação municipal,

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conquistada a partir da década de 70, pela implantação do imposto único sobre a mineração, outrora não cobrado e, anos depois, pela distribuição de royalties minerais aos municípios que lhe faziam jus, na década de 80. As alternativas de receitas tributáveis possíveis, a partir da diminuição de ambas as arrecadações, passavam pelo aumento do Imposto Sobre Serviços – ISS –, Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU – e Imposto Territorial Urbano – ITU –, a fim de compensar, para o município, as perdas com arrecadação das receitas de mineração que segundo o Planejamento Metropolitano de Belo Horizonte - PLAMBEL - (1990, p. 25) vinham caindo à ordem de 12% ao ano, desde o início da década de 90. Isso implicava em dar grande parte destas terras, uma caracterização de área de expansão urbana definida por lei d mesmo nome.

Em capítulos anteriores, fez-se uso da história para contextualizar de que forma a vocação mineradora foi sendo construída para servir de subsídio à reflexão sobre em quais condições ela deixa de ser a atividade econômica principal. Algumas perguntas emergiram nessa segunda etapa.

Existia planejamento governamental ou uma política de estado que estruture essa nova fase de desenvolvimento? Se fato fosse, que tipo de medidas poderia atenuar os

145 Essa arrecadação pela mineração só foi fomentada pela mudança do regime tributário brasileiro a partir de 1966 e pela concessão dos royalties sobre a mineração com arrecadação distribuída a partir da década de 90.

impactos do crescimento urbano na estruturação do espaço, com a diversificação da vocação municipal, calcada no princípio do esgotamento das atividades econômicas e diferentes da mineração?

Dentre as diversas constatações deste último Plano Diretor, ênfase foi dada à perspectiva de evolução de políticas de planejamento que visem resolver os problemas causados pela expansão urbana desencadeada pela busca dessas novas alternativas de desenvolvimento econômico e pelas perspectivas de expansão do urbano residencial de Belo Horizonte sobre Nova Lima. As hipóteses testadas trabalham com a eminência do declínio da atividade mineradora do ouro e do minério de ferro que coincidiram com a pressão do crescimento urbano metropolitano sobre os vazios urbanos existentes no território municipal, por força da expansão do urbano belo-horizontino.

Em Nova Lima, a atividade de mineração, pelos aspectos históricos que a condicionaram, impediu que o município acompanhasse tendências locais de crescimento urbano experimentadas por outros municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Mesmo aqueles municípios cuja história foi ligada ao ciclo do ouro no século XVIII, as características de expansão, em muito se diferenciam da realidade novalimense. Afinal, o grande controle fundiário criado pelos maiores proprietários de terras e a manutenção dessas terras por força da atividade mineradora continuada, evitaram por motivos internos ao funcionamento da atividade econômica, e até impediram um processo de expansão contínua do tecido urbano fazendo com que os proprietários dos loteamentos da área de expansão urbana e, junto com eles, seus moradores, não sentissem os efeitos perversos de uma aglomeração urbana popular espontânea nos seus arredores, resultantes em outros pontos do tecido metropolitano das contradições pertinentes ao funcionamento do modo de produção.

Os loteamentos, aprovados desde a década de 50 e espalhados no imenso território, representaram, momentaneamente, ilhas, áreas isoladas no meio de áreas verdes (muitas vezes, áreas de preservação ou reserva direta da atividade de mineração ou mesma constituída de loteamentos vazios e não ocupados). Ao longo do tempo a retenção estratégica de terras nas mãos dos empresários da mineração reforçou a idéia, no senso comum, de que a atividade contribuiu voluntária e desinteressadamente para a preservação

da qualidade de vida da região146, quando na verdade, ela preservou foi a utilização, para fins industriais, da área, em momentos oportunos.

Como reflexo direto de uma perspectiva de extinção da mineração enquanto principal atividade econômica no município, a terra guardada adquiriu um novo significado, transformando-se em exaurida para a mineração, mas propícia para alguma outra atividade, diferente da anterior. As grandes parcelas de terras municipais acabaram por reservar espaços para serem utilizadas na atividade imobiliária em tempos recentes. A acumulação de propriedade fundiária, por parte das mineradoras, pôde ser historicamente justificada ao se examinar a lei de mineração e suas modificações no decorrer do século. No capítulo anterior, da primeira parte deste trabalho, quando se discutiu a propriedade da terra no município, viu-se que a terra armazenada, quando não utilizada para fins minerários, pode ser descartada pela mineradora e utilizada para fins de aprovação de parcelamentos urbanos em locais onde revitalizações, reaproveitamentos, propostas de

ordenamentos147 (sic) do espaço físico territorial poderiam ter condição de transformar o município no local das expansões urbanas metropolitanas qualificadas para atendimento especialmente dos privilegiados setores de alta renda.

Há na atividade imobiliária, uma crescente demanda de ocupação urbana vinda principalmente da região sul de Belo Horizonte, justificada nos dias atuais pela ausência de novos espaços de expansão urbana de alta renda, existente dentro da capital de Minas Gerais. Este crescimento, por sua vez, refletiu-se uma mobilidade dos setores de renda média e alta belo-horizontinos, principalmente, aqueles que enxergam na região de Nova Lima a área de expansão suburbana com boa qualidade ambiental, em franco desenvolvimento, o que possibilitou uma apropriação de suas vantagens, verbalizadas em discursos referentes às garantias reais de qualidade de vida valorizadas pelas novas formas de morar.

146 Em algumas abordagens, ficou evidente a interpretação que se transformou em senso comum acerca dos benefícios da localização da a mineração em volta da área de expansão urbana do município. É importante não esquecer que esses cinturões verdes guardam áreas de manejo, represas e outras áreas da jazida que se constituem, segundo o código de minas, em áreas reservadas para apropriação do setor industrial. Cabe notar que a sede urbana é produto direto da atividade econômica e expressa o controle efetivo que tal atividade apresenta sobre a terra, haja vista a renovação constante da cidade sobre si mesma, sendo poucas as áreas de expansão para os setores populares.

147 A despeito do que possa dizer o discurso oficial, considera-se esse ordenamento a base da formulação do planejamento das empresas mineradoras. Por ser à base do econômico, ele já foi idealizado, sendo distorções fruto das contradições do sistema. Além do mais, segundo Resende (1982) é mais fácil trabalhar com o conceito da crise porque este induz à busca de soluções para os problemas.

Tal discurso foi compatível com a discussão geral sobre o futuro crescimento da capital de Belo Horizonte na medida em que a década de noventa foi marcada pelo reconhecimento do esgotamento das possibilidades de expansão da cidade de Belo Horizonte, dentro dos limites administrativos e políticos do seu território municipal.

A prova disso foi a aprovação da lei n. 7.166/96148, lei de uso do solo de Belo Horizonte em seu texto, ao estabelecer como área urbana todo o território municipal. Intuitivamente esta lei, assim como o plano diretor149 da cidade, em sus diretrizes, transferiu para os municípios mais próximos, a pressão por áreas vazias e urbanizadas a serviço da expansão exercida pelo núcleo metropolitano representado por Belo Horizonte. A pressão da expansão urbana de Belo Horizonte pode ser verificada, nos últimos anos, nos principais vetores de ligação da sede da metrópole com o município de Nova Lima150, sendo mais expressiva, e comprovada historicamente, nos locais descritos a seguir:

 BR-040151

- Num processo que se iniciou na década de 50 até os últimos anos. A ocupação da BR-040 se iniciou primeiramente com o lançamento de alguns loteamentos voltados para sítios de recreio, localizados nas bordas da rodovia, aproveitando-se da acessibilidade produzida pelos planos de estruturação viárias, típicos da década de 50, no momento em que nesta década, políticas governamentais equipam o território com equipamentos adequados à atividade industrial e que integraram o município no processo de desenvolvimento industrial mineiro, nesta mesma época.

 MG-030 -A partir da década de 50, antecedendo inclusive ao término de construção da rodovia de ligação de Belo Horizonte/Nova Lima, foram implantados loteamentos direcionados para setores de média e alta renda. Porém, estes loteamentos tinham como perfil de usuários os chamados aventureiros urbanos que estavam dispostos a adquirir terras em loteamentos voltados para um modelo de parcelamento, conhecido á época

148 DO ZONEAMENTO Art. 4º - O território do Município é considerado área urbana, dividindo-se em zonas, de acordo com as diretrizes estabelecidas no Plano Diretor.

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Lei 7165/96.

150 Inclui-se a tão temida conurbação entre os bairros do Taquaril e assentamentos do município de Sabará via antigo eixo rodoviário que seria a estrada velha de Belo Horizonte e Rio de Janeiro, cujo contato com a sede se faria via expansão de bairros novalimenses na região do bairro Mina D’água. Temida por que representaria não uma expansão de setores médios e altos, mas de setores de baixa renda, representados pela área pobre do setor leste de Belo Horizonte. No entanto, analisaremos essa possibilidade quando abordarmos os destinos da sede urbana mais à frente.

como sítios de recreio e logo a seguir para uma residência de uma elite mais alternativa (ANDRADE, 2001). À medida que o acesso viário se consolidava, a ocupação se efetivou e a foi pródiga neste processo. Esses loteamentos foram, aos poucos, ocupados em uma ação que Andrade (2001) interpretou como sendo pioneira e decisiva para a consolidação de uma determinada tipologia residencial na região, principalmente no que tange à disseminação dos padrões de ocupação condizentes com as características dos condomínios fechados, ou conforme se afirma neste trabalho, loteamentos ilegalmente fechados. Trabalhos como o de Gomes (2001) fez uma concisa revisão da ocupação urbana no que se convencionou chamar aqui, neste trabalho, da zona de

contato, 152 estabelecidas com interações substanciais, entre os limites geopolíticos de municípios historicamente díspares tais como Nova Lima e Belo Horizonte.