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Superada a discussão acerca da existência de danos que não vulneram bens materiais, doutrina e jurisprudência firmaram a compreensão da possibilidade de ocorrência de danos extrapatrimoniais, bem como da obrigatoriedade de sua reparação408. Majoritariamente, então, a noção de dano tem sido entendida como lesão a determinado bem jurídico, seja patrimonial ou moral409. Com esteio na doutrina de PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA FILHO, pode-se conceituar

normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar à pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade. Disponível em: <http://www.jf.jus.br/cjf/cej-publ/jornadas-de- direito-civil-enunciados-aprovados/>. Acesso em 21 de abril de 2012.

407

Enunciado n.º 448 - Art. 927. A regra do art. 927, parágrafo único, segunda parte, do CC aplica- se sempre que a atividade normalmente desenvolvida, mesmo sem defeito e não essencialmente perigosa, induza, por sua natureza, risco especial e diferenciado aos direitos de outrem. São critérios de avaliação desse risco, entre outros, a estatística, a prova técnica e as máximas de experiência. Disponível em:<http://www.jf.jus.br/cjf/cej-publ/jornadas-de-direito-civil-enunciados-aprovados/>. Acesso em 21 de abril de 2012.

408 Na evolução do entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a matéria, há que se destacar a importância da previsão expressa, na Constituição Federal de 1988, da reparabilidade dos danos morais, no art. 5º, incisos V e X, in verbis: “V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, “X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Posteriormente o Superior Tribunal de Justiça avançou na compreensão da possibilidade de cumulação do material e do dano moral, entendimento consubstanciado no Enunciado nº. 37 de sua Súmula de jurisprudência dominante: “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”. Relativamente à tutela dos danos morais, registre-se, por fim, a previsão do art. 186 do novel Código Civil: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

409 “Quando ainda não se admitia o ressarcimento do dano moral, conceituava-se o dano como sendo a efetiva diminuição do patrimônio da vítima. Hoje, todavia, esse conceito tornou-se insuficiente em face do novo posicionamento da doutrina e da jurisprudência em relação ao dano moral e, ainda, em razão da sua natureza não-patrimonial. Conceitua-se, então, o dano como sendo a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade etc. Em suma, dano é a lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 80).

dano como a “lesão a um interesse jurídico tutelado – patrimonial ou não –, causado por ação ou omissão do sujeito infrator”410(grifo no original).

Danos materiais consistem em dano emergente ─ aquilo que efetivamente se perdeu ─ e lucros cessantes ─ aquilo que razoavelmente deixou-se de lucrar, “aquilo que o lesado deixou de obter por causa do fato ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão”411.

Danos morais, por sua vez, têm sido recentemente compreendidos como a violação da cláusula geral, presente no ordenamento jurídico, de tutela da pessoa humana412. Não obstante, há que se ressaltar que, predominantemente, a doutrina adota, ainda, uma noção menos ampla de danos morais, limitando-a a lesões relativa a direitos da personalidade413.

Estabelecida a premissa conceitual relativa à figura jurídica do dano moral, cumpre perquirir acerca de sua pertinência no âmbito da construção teórica sobre os direitos transindividuais. Para tanto, impõe-se tecer, ainda que brevemente, algumas considerações a respeito das atuais formulações jurídicas em torno desses direitos.

410

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol III: responsabilidade civil. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 78.

411

VARELA, João de Matos Antunes. Das Obrigações em geral. vol I, 9. ed., Coimbra: Almedina, 1998, p. 621.

412 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos a Pessoa Humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 182-184. Em sentido muito próximo, CAVALIERI afirma: “Dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que violação do direito à dignidade.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 85).

413 Afirma CARLOS ROBERTO GONÇALVES que dano moral é “(...) lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere dos arts. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação.” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. v. IV, 3ª ed, rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 343-344). Nesse sentido, RODOLFO PAMPLONA aduz que “dano moral consiste no prejuízo ou na lesão de interesses e bens, cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro, como é o caso dos direitos da personalidade (ex: vida, integridade corporal, liberdade, honra decoro, intimidade, sentimentos afetivos, auto-imagem) ou dos atributos da pessoa (ex: nome, capacidade, estado civil).” (PAMPLONA FILHO, Rodolfo. O dano moral na relação de emprego. São Paulo: LTr, 1998, p. 34). A seu turno, conquanto afirme dever a agressão abalar a dignidade da pessoa humana, sustenta MAURO SCHIAVI que basta “que ocorra violação efetiva a um direito da personalidade para que o

6.4.1 Apontamentos acerca dos direitos transindividuais

Consoante leciona XISTO TIAGO DE MEDEIROS NETO, os denominados direitos coletivos lato sensu414 correspondem a

modalidade dos interesses transindividuais ou metaindividuais, com a nota característica básica de se projetarem para além da esfera individual (subjetivada), posicionando-se na órbita coletiva, cuja titularização (não determinada individualmente) repousa em um grupo, uma classe, uma categoria de pessoas ou mesmo em toda a coletividade.415

No ordenamento jurídico brasileiro, a definição das espécies de direitos transindividuais foi positivada no Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 81, in verbis:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

dano moral esteja configurado.” (SCHIAVI, Mauro. Ações de reparação por danos morais decorrentes da relação de trabalho. 3 ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2009, p. 67).

414 CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE afirma que a visão tradicional acerca da categoria dos “direitos” foi construída na ideologia individualista do Estado Liberal, de modo que, de um ponto de vista histórico, “há, entre direito e interesse, uma vinculação na qual à preponderância daquele se reflete uma negação deste. Vale dizer, a hegemonia do direito subjetivo implica a desqualificação do interesse como portador de alguma relevância jurídica” (Ação Civil Pública na perspectiva dos direitos humanos. 2. ed. São Paulo: LTr 2008, p. 50). Adverte, contudo, que as modificações sociais e o surgimento de conflitos de massa viria a afastar a relevância jurídica da distinção (Op. cit., p. 50- 51). Em sentido próximo, posiciona-se PEDRO LENZA: “Não se chega a ponto de dizer que, teoricamente, interesses e direitos são utilizados como sinônimos. Buscando um sentido à redação dada ao art. 81, parágrafo único, do CDC, que fala em proteção de interesses ou direitos, não se crê tratar-se de uma mesma situação. No entanto, apesar de se distinguir, no plano teórico, direitos de interesses, no plano prático, a partir do momento em que os aludidos interesses passam a ser tutelados juridicamente pelo sistema, surge o direito. Nesse sentido, inexistiria razão para diferenciá- los, porquanto indiscutível a aproximação entre os dois institutos. Abstraindo-se, na tentativa (às vezes inútil) de distingui-los, sugere-se que se trata da mesma ‘alma’, em ‘corpos’ distintos” (grifos no original) (Teoria geral da ação civil pública. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 54). Neste trabalho, em face de tais ponderações, serão as expressões direito e interesse utilizadas como sinônimos.

415

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. 2 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 107. MANOEL JORGE E SILVA NETO, em definição sintética, assevera que “transindividuais são os interesses transcendentes à órbita individual do sujeito de direito, aqueles cuja lesão afeta um número considerável de pessoas” (Proteção constitucional dos interesses trabalhistas: difusos, coletivos e individuais homogêneos. São Paulo: LTr, 2001, p. 29).

Obtempera XISTO TIAGO DE MEDEIROS NETO que os interesses difusos são inerentes à sociedade contemporânea, caracterizada por conflitos de massa, a exigir uma resposta do ordenamento jurídico lastreada numa concepção social, “não mais focando-se a atenção do sistema jurídico ao indivíduo isoladamente considerado”416. O conteúdo destes direitos, assevera MÁRCIO MAFRA LEAL, é de duas ordens: “um direito à qualidade de vida, expresso no sacrifício de vantagens econômicas imediatistas em nome da preservação de determinados valores” e um “direito à integração social mediante o devido reconhecimento jurídico e político” 417 (grifo no original).

Pode-se indicar como elementos característicos de tais direitos, na precisa lição de XISTO TIAGO DE MEDEIROS NETO, a indeterminação dos seus titulares, os quais não possuem vínculo associativo, mas ligam-se por um liame fático, bem como a indivisibilidade do seu objeto, cuja satisfação alcança toda a coletividade418.

O interesse coletivo, por sua vez, pode ser compreendido como aquele que

transcende o aspecto individual para irradiar efeitos sobre um grupo ou categoria de pessoas, sendo uma espécie de soma de direitos individuais, mas também um direito próprio do grupo, cujos titulares são indeterminados, mas que podem ser determinados, ligados entre si por uma relação jurídica base.419 (grifo no original)

Por fim, os direitos individuais homogêneos são aqueles nos quais não há relação jurídica prévia entre os titulares, conquanto possam ser coletivamente tutelados. Eles são “interesses transindividuais vinculados a uma situação fática, porém divisíveis, isto é, torna-se viável a quem foi atingido pelo ato lesivo recorrer ao Poder

416

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Op. cit., p. 110. 417

LEAL, Márcio Flávio Mafra. Ações coletivas: História, teoria e prática. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 104.

418 MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Op. cit., p. 111/112. Analisando a definição positivada dos direitos em apreço, LEONARDO ROSCOE BESSA assinala que, na “conceituação legal de direitos difusos, optou-se pelo critério da indeterminação dos titulares e da ausência entre eles de relação jurídica base (aspecto subjetivo) e pela indivisibilidade do bem jurídico (aspecto objetivo).” (grifo no original) (BESSA, Leonardo Roscoe. Dano Moral Coletivo. Revista da EMERJ, v. 10, nº. 40, 2007, p. 254).

419

SCHIAVI, Mauro. Ações de reparação por danos morais decorrentes da relação de trabalho. 3 ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2009, p. 195. Por sua vez, ANA CRISTINA COSTA MEIRELES, discorrendo acerca da característica da divisibilidade ou do bem jurídico no âmbito dos direitos transindividuais, aduz que, nos direitos coletivos, “há divisibilidade externa e indivisibilidade externa. Desse modo, a indivisibilidade interna do bem significa que ele não pode ser partilhado internamente entre aqueles que participam do grupo, embora este, externamente, em relação à comunidade em geral possa partir o bem.” (MEIRELES, Ana Cristina Costa. A eficácia dos direitos sociais: os direitos subjetivos em face das normas programáticas de direitos sociais. Salvador: JusPODIVM, 2008, p. 214).

Judiciário para, mediante ação individual, buscar a devida reparação”420.

Ultrapassada a etapa de necessária compreensão acerca dos direitos transindividuais, impõe-se investigar a compatibilidade da utilização da figura jurídica dos danos morais para sua proteção. É o que se intentará empreender a seguir.

6.4.2 Dano social ou dano moral coletivo? A responsabilidade civil e a defesa de direitos transindividuais

Embora o conceito exposto de dano moral revele-se adequado em face da tutela individual, não é necessário longo exercício intelectual para a constatação de sua insuficiência diante de direitos ou interesses metaindividuais, gerando, inclusive, concepções jurídicas inusitadas.

É o que se verifica com a noção doutrinária de dano moral coletivo. Este é conceituado por CARLOS ALBERTO BITTAR como “a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos”421. Com efeito, predomina na doutrina a tentativa de nele identificar uma “modificação desvaliosa no espírito da coletividade”422. A terminologia encontra-se, inclusive, prevista no ordenamento pátrio, através da Lei

420 SILVA NETO, Manoel Jorge e. Proteção constitucional dos interesses trabalhistas: difusos, coletivos e individuais homogêneos. São Paulo: LTr, 2001, p. 40.

421

BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 559, 17 jan. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6183. XISTO TIAGO DE MEDEIROS NETO, por sua vez, critica a utilização da terminologia dano moral coletivo, em razão da equivocidade do termo “moral”, afirmando ser mais adequado falar-se dano extrapatrimonial coletivo. Não obstante, em face da consagração da primeira expressão, admite seu emprego, definindo o dano moral coletivo como a “lesão injusta e intolerável a interesses ou direitos titularizados pela coletividade (considerada em seu todo ou em qualquer de suas expressões – grupos, classes ou categorias de pessoas), os quais possuem natureza extrapatrimonial, refletindo valores e bens fundamentais para a sociedade.” (MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Op. cit., p. 137). Afirma, ainda, que a “reparação do dano moral coletivo não tem relação necessária com o reconhecimento e visualização de ‘sofrimento’, ‘aflição’, ‘angústia’, ‘constrangimento’ ou ‘abalo psicofísico’ atribuído a dada coletividade, ou mesmo com a idéia de se enxergar uma ‘alma’ própria, passível de visibilidade, a possibilitar uma ‘ofensa moral’”. (Idem, p. 191). Tal compreensão corresponde, conforme adiante se demonstrará, à noção de dano social proposta neste trabalho. A rejeição, aqui, da expressão “dano moral coletivo”, para além da equivocidade ínsita ao termo moral, decorre, como adiante se sustentará, da incongruência da construção do instituto do dano moral em face da tutela de direitos de natureza metaindividual. Não se trata, pois, de mera opção terminológica, mas de consequência da filiação a posicionamento que parece melhor adequar-se à compreensão da matéria.

422

VIOLA, Rafael. O papel da responsabilidade civil na tutela coletiva. O papel da Responsabilidade Civil na Tutela Coletiva in TEPEDINO, Gustavo et. al. (Org.). Diálogos sobre Direito Civil. vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 396.

7.347/85, em seu art. 1º423, bem como no Código de Defesa do Consumidor, no art. 6º, incisos VI e VII424.

O problema decorre da tentativa de aplicação de instituto engendrado sob a perspectiva individual para a seara dos direitos metaindividuais425. Partindo da premissa de que o dano moral é aquele que viola direitos da personalidade, afigura- se de intransponível dificuldade sustentar a existência de dano moral coletivo em decorrência, v. g., de agressão localizada ao meio ambiente. Não parece razoável a tese de que esses danos ambientais possam importar em lesão à esfera de direitos da personalidade, por exemplo, dos membros de determinada comunidade em distante centro urbano, ou, mesmo, do “espírito” da coletividade.

Por óbvio que não se está a defender, aqui, a inexistência de danos em hipóteses

como essas426. Manifestos são os danos e imperiosa é a utilização da

responsabilidade civil como meio de repará-los (e, como será sustentado adiante, de dissuadir a reiteração de sua prática). O que não parece viável é a transposição da

423 Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

I - ao meio-ambiente; II - ao consumidor;

III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V - por infração da ordem econômica e da economia popular; VI - à ordem urbanística.

424 Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...)

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

425

PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA asseveram, com lucidez, que “partindo da premissa de que os danos morais são lesões à esfera extrapatrimonial de um indivíduo, ou seja, a seus direitos da personalidade, não seria possível se imaginar, a priori, um dano moral a interesses difusos, como, por exemplo, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico-cultural.” (GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. vol. III: Responsabilidade Civil, São Paulo: Saraiva, 2011, p. 123). A partir dessa assertiva e considerando a previsão expressa da lei 7.347/85, os ilustres autores sustentam a ampliação da compreensão dos direitos da personalidade, de modo a abranger a previsão do mencionado diploma normativo, a fim de viabilizar a proteção de direitos transindividuais (Idem, p. 124).

426

Impende ressaltar, todavia, que, sob a terminologia de danos morais coletivos, os tribunais trabalhistas têm tutelado diversos direitos metaindividuais, entendendo ser possível a imposição do dever de indenizar nessas hipóteses, consoante se observa, exemplificativamente, no seguinte julgado: “DANO MORAL COLETIVO – POSSIBILIDADE. Uma vez configurado que a ré violou direitos transindividuais de ordem coletiva, infringindo normas de ordem pública que regem a saúde, segurança, higiene e meio ambiente do trabalho e do trabalhador, é devida a indenização por dano moral coletivo, pois tal atitude da ré abala o sentimento de dignidade, falta de apreço e consideração, tendo reflexos na coletividade e causando grandes prejuízos à sociedade.” (TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 8ª REGIÃO. Primeira Turma. RO 5309/2002. Relator: Juiz Convocado Luís José de Jesus Ribeiro. Data do julgamento: 17.12.2002. Data da publicação: 19.12.2002).

figura dos danos morais ─ como construída na experiência jurídica nacional ─ para a tutela de direitos metaindividuais.

Nesse sentido, RAFAEL VIOLA afirma que

o dano extrapatrimonial, na área de direitos metaindividuais decorre da lesão em si a tais interesses (difusos ou coletivos) pouco importando se houve ou não uma diminuição no espírito da coletividade. Conclui-se, portanto, que o dano extrapatrimonial à sociedade não é dano moral em que pese a positivação do termo dano moral coletivo no art. 6º, VI e VII do CDC e do caput do art. 1º da Lei 7.347/85.427

Com efeito, a defesa o consumidor428, a atuação no sentido da promoção de um

meio ambiente saudável429 e de sua proteção, a determinação de desenvolvimento

da Ordem Econômica lastreada na valorização do trabalho humano e dirigida à garantia de justiça social e da dignidade humana430 trata-se de alguns dos interesses consagrados na Constituição Federal, cuja violação, por si mesma, produz dano a toda a sociedade. A violação de interesses metaindividuais constitucionalmente tutelados é idônea, per se, a provocar dano social, prescindindo, para tanto, do sentimento íntimo de violação a direitos de personalidade de quem quer que seja.

Nesta ordem de idéias, XISTO TIAGO DE MEDEIROS NETO, valendo-se da expressão dano moral coletivo – no sentido antes indicado –, obtempera:

É bem verdade, anote-se, que nesses casos de danos coletivos não se pode ignorar a recorrente presença de efeitos negativos que o ato lesivo porventura venha a produzir, em relação a determinadas coletividades de pessoas atingidas, apreendidos em dimensão subjetiva, como a repulsa, o abalo psíquico ou a consternação, entre outras reações.

Todavia, é de absoluta importância ressaltar que a caracterização do dano moral coletivo não se vincula nem se condiciona diretamente à observação ou demonstração efetiva de tais efeitos negativos, visto que constituem eles, quando perceptíveis coletivamente, mera consequência do dano produzido pela conduta do agente, não se apresentando, evidentemente, como

427 VIOLA, Rafael. O papel da responsabilidade civil na tutela coletiva. O papel da Responsabilidade Civil na Tutela Coletiva in TEPEDINO, Gustavo et. al. (Org.). Diálogos sobre Direito Civil. vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 397.

428

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à