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O objetivo do presente tópico é analisar como a Análise Econômica do Direito pode oferecer à responsabilidade civil — especialmente no tocante aos punitive damages — mecanismos que promovam ampla tutela dos bens jurídicos.

De início, há que se recordar que a lei e as decisões judiciais interferem nas estruturas de incentivos dos sujeitos. Os agentes racionais tendem a evitar praticar condutas que, embora ilícitas, proporcionem-lhes acréscimo de utilidade quando há consciência de risco de condenação a uma sanção cujas desvantagens mostrem-se superiores aos benefícios que poderiam ser obtidos com o ato. As sanções legais são, assim, preços implícitos em relação à atuação dos agentes.

Assentada a premissa básica, importa examinar algumas ferramentas diponibilizadas pela Análise Econômica do Direito para a fixação do valor de sanções.

A primeira delas é considerar os custos de precaução para a fixação de indenizações. Eles envolvem “custo explícitos, como os pagamentos que fazemos pelas revisões de nossos automóveis, e custos de oportunidade, como a perda de tempo decorrente de guiarmos a uma velocidade mais baixa”490.

Assim, agentes racionais que observam os custos de precaução deve sofrer uma sanção inferior àqueles que negligenciam os necessários investimentos na prevenção de danos, merecedores de reprimenda mais gravosa.

Um exemplo de método para determinação da imposição ou não de responsabilidade a alguém baseado em custos de precaução é denominada regra de Hand, segundo a qual a imputação deverá ocorrer quando os custos de precaução do agente forem inferiores aos benefícios marginais resultantes491. Basicamente, o raciocínio é verificar se é, do ponto de vista dos custos e da eficiência econômica, justificável exigir investimentos adicionais (abrangendo custos explícitos e custos de oportunidade) para evitar os possíveis riscos de um dano.

490

RODRIGUES, Vasco. Análise Económica do Direito: Uma Introdução. Coimbra: Almedina, 2007, p. 87.

Exemplificativamente, segundo esta regra, riscos ínfimos de danos levíssimos não seriam o suficiente para exigir-se investimentos extraordinários em precaução.

Outro ponto importante é a constatação de que o estabelecimento de regras de responsabilidade objetiva consistem em desestímulo à prática de condutas ilícitas. Isto é, “a regra da responsabilidade objetiva com indenização perfeita faz com que o autor do dano internalize os custos e benefícios marginais da precaução, o que lhe dá incentivos para tomar precauções eficientes”492.

Impende considerar, ainda, a lei da pendente negativa da curva da demanda, que reflete a relação inversamente proporcional entre preço e demanda. Em outras palavras, quanto mais elevado for o “preço” de uma conduta, menor será a “demanda” de sua prática. Consoante tal regra, então, “o aumento das indenizações previne os danos”493, formulação que conduz à abordagem específica acerca das sanções punitivas.

Tal figura jurídica fundamenta-se, sob um ponto de vista, na constatação de que “algumas atividades desenvolvidas pelos réus são destituídas de valor social e, em verdade, impõem uma série de custos sociais sempre que iniciadas”494 e, sob outra perspectiva, na instrumentalidade de “despir os réus dos ganhos obtidos pelo abuso das regras de responsabilidade”495.

Nesta ordem de idéias, para a aplicação de punitive damages o enfoque deve ser direcionado à situação do réu, não do autor496. Desta maneira, encontra-se na

491 COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. 5 ed. Porto Alegre: Bookman, 2010, p. 346.

492

COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Op. cit., p. 335.

493 LORENZETTI, Ricardo Luis. Teoria da Decisão Judicial: fundamentos de direito. Tradução: Bruno Miragem; Notas da tradução: Claudia Lima Marques. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 199.

494

HADDOCK, David D.; MCCHESNEY, Fred S.; SPIEGEL, Menahem. Um fundamento econômico ordinário para sanções legais extraordinárias. Direito e Economia: textos escolhidos. SALAMA, Bruno Meyerhof (org.). São Paulo: Saraiva, 2010, p. 146.

495

Ibidem, p. 158. 496

“No modelo de sanções extraordinárias, indenizações punitivas são moldadas de acordo com as preferências dos réus (mapa de utilidade) enquanto indenizações ordinárias são moldadas de acordo com as preferências dos autores” (Ibidem, p. 168). Em sentido próximo: “Há casos em que a reparação d dano resulta insuficiente, pois subsiste um benefício econômico, derivado diretamente do ilícito, em favor daquele que praticou a lesão. Em outras palavras, há hipóteses em que a mera reparação do dano não é suficiente para sancionar aquele que lesou o bem, sendo necessária a previsão de uma sanção pecuniária, espécie de pena civil, para que a sanção seja adequada. Trata- se do que os americanos chamam de punitive damages” (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela específica: arts. 461, CPC e 84 CDC. 2. ed. rev. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 156).

sanção extraordinária um mecanismo de fazer o réu tornar à situação anterior, destituindo-lhe das vantagens provenientes de sua atuação ilícita497.

O desestímulo decorrente de decisões que, com base nessas considerações, utilizam punitive damages é um fator que, certamente, age sobre a estrutura de incentivos dos agentes econômicos, favorecendo-se, assim, a observância da ordem jurídica.

Explicitadas a renovada função da responsabilidade civil e as potencialidades do emprego da Análise Econômica do Direito como instrumento auxiliador da fixação do valor das sanções, importa examinar a aplicação desse arcabouço teórico nos casos em que se verifique a prática de dumping social. Será este o objeto do próximo capítulo.

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“(...) um sistema legal eficiente frequentemente irá optar por uma medida que retorne o réu à situação anterior em vez do autor, quando o réu intencionalmente se apodera de uma titularidade protegida pelas regras de propriedade, em vez de negociar por ela” (Ibidem, p. 186).

7 A INDENIZAÇÃO PELA PRÁTICA DE DUMPING SOCIAL

Partindo das considerações até aqui declinadas, o presente capítulo destina-se ao exame da possibilidade de fixação de sanções extraordinárias em hipóteses de ocorrência de dumping social. Para desempenho desse mister, será, preliminarmente, analisado o papel do magistrado no que diz respeito à realização das normas constitucionais, bem como os fundamentos normativos para a condenação. A seguir, serão examinadas questões processuais relativas à imposição da sanção e propostos critérios para a quantificação da condenação, sendo, após, enfrentada a temática da destinação da indenização. Por fim, analisar- se-á um caso concreto, aplicando-se as ponderações explicitadas.

7.1 A INSUFICIÊNCIA DA REPARAÇÃO EM CASOS CONCRETOS EM FACE DA