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2 O CAMPO DA PESQUISA EM POLITICAS PÚBLICAS PARA EDUCAÇÃO:

2.3 O enfoque de análise de políticas: discussões conceituais para a pesquisa em

Convém demarcar uma importante distinção que Cavalcanti (2007) apresenta em sua tese ao discutir a existência de dois enfoques no campo das políticas públicas: o enfoque de análise de políticas (EAn) e o enfoque de avaliação de políticas (EAv). De uma forma bastante sintética, para a autora o primeiro enfoque diz respeito à interface existente entre as áreas de ciência política e administração pública e se atém ao processo de formulação da política. Já o segundo enfoque se concentra muito mais na ação do governo, valorizando os resultados que são produzidos pela política.

se relacionam ao EAn e menos ainda os que, empregando este enfoque tratam da política educacional”.

De acordo com Souza (2006) a expressão análise de política (policy analysis) foi uma criação de Laswell na década de 1930, como forma de estreitar relações entre os campos teórico e o empírico e possibilitar uma interlocução entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo. Contestando a racionalidade proposta por Laswell, segundo Souza (2006, p.24), Lindblon ressaltou a importância de se considerar as relações de poder e a integração entre as fases distintas de um processo de decisão “o que não teria necessariamente um fim ou um princípio”, indicando essas novas variáveis à formulação e análise de políticas.

Frey (2000) demonstra que a origem da sistematização da análise de políticas públicas como área do conhecimento data da segunda metade do século XX, nos Estados Unidos, com a denominação ‘policy science’ e consta nessa procedência o interesse restrito às ações dos governos, sem a devida relação às questões relativas ao Estado e suas instituições, conforme sinaliza Souza (2006). Na perspectiva de Frey (2000), a análise de políticas públicas ganhou impulso a partir da década de 1970 com a ascensão da socialdemocracia, onde o planejamento e as políticas setoriais apresentaram maior notoriedade.

Entretanto, o interesse da análise de políticas públicas não se restringe meramente a aumentar o conhecimento sobre planos, programas e projetos desenvolvidos e implementados pelas políticas setoriais. Visando à explanação das leis e princípios próprios das políticas específicas, a abordagem da ‘policy analysis' pretende analisar a inter-relação entre as instituições políticas, o processo político e os conteúdos de política com o arcabouço dos questionamentos tradicionais da ciência política (FREY, 2000, p.4)

Farah (2011) apresenta uma análise sobre a consolidação da administração pública como disciplina, circunscrita no campo da ciência política, incorporando desde os anos 50, ainda que de forma incipiente, o tema das políticas públicas. Ao final dos anos da década de 60 registra-se o crescimento de escolas e cursos de análise de políticas públicas, com atuação divergente das tradicionais escolas de administração pública.

Considerando que o objeto dessa tese é uma política educacional recente, implementada a partir do ano de 2009, admite-se que uma avaliação dos efeitos dos processos de gestão dos Institutos Federais, decorrentes dessa política seria precipitado. Assim, optar por uma análise da política, além da coerência com o próprio objeto, há uma pretensão de contribuir para redução da lacuna apresentada anteriormente por Cavalcanti (2007). Para tanto, precisamos

compreender as bases teóricas que sustentam esse modelo e como é possível desenvolver uma pesquisa nessa perspectiva.

O conceito de análise de política apresenta definições diversas, conforme investigação desenvolvida por Cavalcanti (2007, p.157), com destaque para a definição proposta por Dye (1992) “ele afirma que a análise de políticas públicas é uma investigação sistemática que estuda sobre o que os governos fazem, porque fazem e que diferença que isso faz”. Nessa perspectiva, a investigação se concentra nas causas e consequências da atuação (ou não atuação) governamental.

Vargas Velásquez (2001) também se destacou na conceituação do enfoque da análise de políticas ao compreendê-lo como uma forma de complementar as perspectivas tradicionais de estudos em políticas que se atém ao fenômeno burocrático-administrativo, com especial atenção para o resultado das relações entre Estado e sociedade. Entre os pressupostos apresentados por Velásquez (2001) observa-se a crença em uma relativa independência da administração em relação ao poder político, além disso, considera as inter-relações entre sociedade civil, administração pública e sistema político (CAVALCANTI, 2007).

As contribuições de Velásquez (2001) colocam a administração pública no cenário da análise de políticas o que se revela uma promissora fonte de investigação, com indícios importantes para a explicação da gênese e desenvolvimento das políticas públicas, ultrapassando o caráter meramente descritivo, presente em algumas práticas de análise tradicionais.

O enfoque de análise de políticas objetiva a produção de conhecimentos capazes de auxiliar no processo de compreensão acerca das políticas em curso, com intuito de descortinar as motivações, interesses e perspectivas relativas ao processo de sua elaboração e implementação. Esse conhecimento nos ajuda a compreender a sociedade e sua dinâmica, esta traduzida em constantes disputas em prol da manutenção ou superação de um dado projeto político hegemônico em vigor em cada momento histórico. De acordo com Pérez Sanchez,

A característica mais marcante deste conhecimento sobre as políticas, para além do que tem ocorrido, é a sua orientação essencialmente prática: o conhecimento é um guia para a ação, mais do que um fim em si mesmo da ação. Em outras palavras, o espírito de análise política ao longo da história tem sido a de fornecer informações que poderiam ser usadas na aplicação das decisões fundamentadas para encontrar soluções para problemas práticos (PÉREZ SANCHEZ, 2005, p. 32). (tradução nossa)

e considerou essa prática de análise com potencial para auxiliar o processo de tomada de decisão governamental, orientando a própria política em desenvolvimento. Assim, o objetivo precípuo dessa prática deveria ser o fortalecimento da democracia, à medida que os conhecimentos eram gerados com o intuito de possibilitar revisões e orientações para a própria política, na tentativa de promover uma articulação sistemática entre ciência e decisão, em resposta à fragmentação identificada nas ciências sociais e às carências governamentais acerca da sua atuação na esfera pública (AGUILAR VILLANUEVA, 1996, p.39).

O enfoque da análise de políticas tenta compreender as opções governamentais para a resolução de um determinado problema, desvelando as intencionalidades dessas escolhas e seus impactos para a sociedade como um todo. Localiza-se no centro dessa perspectiva um esforço de compreender o que torna uma alternativa política – externada em ações, projetos ou programas governamentais – mais relevantes que outra.

A análise de política, contudo, não deve se limitar a dar respostas ao governo no sentido de afirmar ou negar uma determinada política, nem tampouco ter essa esfera como principal público alvo, antes deve optar por contribuir para a compreensão das distintas formas de organização social e suas interfaces com a conjuntura política e econômica, situação esta que tem repercussões e impactos globais. Nesse sentido, é válido destacar a distinção apresentada por Ham e Hill (1993, p.11) entre análise da política e análise para a política, que ressalta respectivamente o caráter descritivo e prescritivo presentes em uma proposta de análise. Além disso, argumentam que não se pode desconsiderar a inter-relação entre o Estado, a economia e a sociedade para uma abordagem coerente (CAVALCANTI, 2007).

Portanto, analisar uma política significa estar atento ao que está expresso em forma de documentos e ações, mas também observar o que dizem as entrelinhas deste processo, nem sempre conteúdo expresso, mas com efeitos significativos para a sociedade como um todo. Assim, consideramos que mais importante do que pensar se uma política é boa ou ruim é tentar refletir de forma interdisciplinar sobre as razões de sua constituição e os meandros dos procedimentos de implementação. Para tanto, uma interlocução com as áreas da ciência política, sociologia, filosofia etc. é de considerável relevância.

Desse modo, uma abordagem crítica e fundamentada em dados empíricos se apresenta como alternativa plausível para uma análise consistente e mais próxima da realidade, mas longe de se constituir uma verdade absoluta, tendo em vista a complexidade dos processos que envolvem uma política. A produção de conhecimento nessa vertente dialoga com a

perspectiva apresentada por Majone (2005), o qual adota uma perspectiva dialética de análise e ressalta a questão política, identificando que por vezes é menos enfatizada que a questão técnica. Na visão do autor a argumentação e a persuasão devem se destacar nesse enfoque de análise. Para ele “as informações (evidências e argumentação) seriam utilizadas para o debate público e, consequentemente, para o debate sobre as políticas públicas” (CAVALCANTI, 2007, p. 165) qualificando dessa forma o diálogo entre o governo e a sociedade civil.

A análise de políticas admite uma variedade de metodologias e instrumentos apropriados ao estabelecimento das categorias de análise referentes ao fenômeno em evidência. No caso desta tese optamos pela utilização da abordagem do Ciclo de Políticas como orientação metodológica capaz de atender aos objetivos expressos, surgindo assim a necessidade de explanar sobre esta abordagem de forma mais detalhada.

2.4 As contribuições do ciclo de políticas para a análise de políticas públicas no campo

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