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O fantasma da inflação ataca os trabalhadores

OU QUEM PAGA AS CONTAS DO MILAGRE

2.1 O fantasma da inflação ataca os trabalhadores

A nova política econômica não permitiria nenhum tipo de concessão aos trabalhadores, mesmo as mais demagógicas. De fato, o fim do populismo materializou-se na política salarial do regime. O ministro do Planejamento Roberto Campos associava os aumentos salariais desvinculados do crescimento da produtividade ao avanço da inflação. A política salarial dos governos anteriores a 1964, denominada populista, foi assim caracterizada:

O enfoque populista é mais distributivo do que produtivo. Propugna maciços reajustamentos salariais, que, por excederem o crescimento possível da produção e produtividade, alimentam a espiral de preços. Acredita ingenuamente (ou

demagogicamente) ser possível legislar melhorias do padrão de vida, mediante a concessão de benefícios sociais superiores à capacidade da economia de sustentá-los (CAMPOS, 1969 apud SANTOS, 2000, p.116).

Para Campos, o populismo salarial, criado pelo salário mínimo que deveria representar uma indenização ao trabalhador, com “uma parte justa no crescente produto social por sua adaptação à ‘harmonia social’, como parceiro formal de direitos iguais”38, não conseguiu melhorar o padrão de vida operário, posto que a espiral de preços anulava as altas salariais e a estagnação econômica diminuía as oportunidades de emprego. Outra crítica era de que tais medidas visavam apenas aos trabalhadores “protegidos” pela CLT.

A nova política salarial pretendia quebrar as conquistas dos sindicatos mais politizados (dos trabalhadores em empresas ligadas ao Estado e nas indústrias têxteis e de alimentos, de menor porte), que, através da negociação direta, haviam conseguido reajustes de salário desvinculados da produtividade. Além disso, o governo Castello Branco revogou conquistas importantes de categorias profissionais, como os ferroviários, portuários e estivadores, marítimos e petroleiros (GORENDER, 1987).

Pela fórmula então estabelecida, todos os salários seriam reajustados pela média real e não pelos picos, como acontecia anteriormente. Em 1966, o cálculo do novo salário mínimo se baseou na aplicação dessa fórmula, estendida aos dissídios e acordos coletivos. A inflação para o próximo ano foi estimada em 10%, mas foi superior a isso, acelerando a queda do poder aquisitivo real dos trabalhadores39.

A nova política salarial, definida em julho de 1964, associou os aumentos salariais desvinculados da produtividade ao aumento da inflação. Campos defendia, então, que a única solução durável e realista para aumentar o consumo real dos trabalhadores era incrementar a produtividade da mão-de-obra ou dos meios de produção, já que salário, além de renda disponível para consumo, é custo de produção.

Concentrando-se primeiramente no setor público, Campos reorganizou o CNPS40 e criou, a partir de sugestões do economista Mário Henrique Simonsen, uma fórmula para calcular os

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Füchtner (1980, p.77).

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É bastante reveladora, para nossos propósitos, a informação de que a greve dos metalúrgicos de Contagem- MG (1968) encerrou-se com a ida do Ministro do Trabalho, Jarbas Passarinho, ao sindicato. Esse, a mando do presidente Costa e Silva, negociou um abono de 10%, que corrigiria o último achatamento.

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O CNPS foi criado pelo Decreto nº 52.275, de 17 de julho de 1963, e, em 7 de abril de 1967, foi alterado pela Decreto n. 60.563, que estabelece que ser o Conselho “integrado dos Ministros de Estado da Fazenda, dos

futuros aumentos salariais do setor público. Tal fórmula trabalhava com três fatores: a média do aumento do custo de vida durante os 24 meses precedentes; o aumento estimado da produtividade no ano anterior; e o “residual inflacionário” (a metade da média da taxa da inflação prevista pelo governo para os 12 meses seguintes). Além disso, estabeleceu-se que os salários passariam a ser reajustados anualmente.

Esperava-se que as empresas privadas seguissem a orientação estabelecida para o setor público, mas os salários desse setor subiram além dos níveis estabelecidos pelo PAEG, obrigando o governo Castello Branco a requerer ao Congresso a extensão ao setor privado das regras já estabelecidas. Apesar de resistências pontuais, em setembro de 1965, foi aprovada a Lei 4.72541, por decurso de prazo, que, além de impor as regras salariais supramencionadas ao setor privado, prorrogou por três anos a autoridade do governo para fixar salários.

A partir da Lei 4.725, de 13-07-65, reformada por alguns decretos no ano seguinte, os índices de reajuste salarial, fixados pelas autoridades, deveriam obrigatoriamente ser obedecidos pelas empresas e não podiam sequer ser alterados pelos Tribunais do Trabalho. Os conflitos trabalhistas, que naturalmente se realizariam contra os empresários, agora só teriam sentido se fossem contra o governo. Se já era complicado pressionar e negociar com os patrões isoladamente, tornou-se mais difícil, senão impossível, enfrentar todo o aparato estatal nas reivindicações. Alguns poucos tiveram condições de perceber a manobra e tentaram divulgar o que haviam descoberto, mas a repressão e a censura se encarregaram de neutralizá-los. Quaisquer comentários a respeito da estrutura de poder, no Brasil, eram totalmente vetados (GARCIA, 2005, p.169).

Marques (1980, p.173) reproduz o informativo do DIEESE sobre o tema, segundo o qual, a Lei 4.725/1965 consiste em:

a) Para o governo, em fixar mensalmente um índice de reajuste salarial calculado segundo uma fórmula matemática definida pela lei.

b) Para os trabalhadores, privados do uso de seu único meio efetivo de mudança, a greve, pela lei 4.330 de 1964, a negociar praticamente sem perspectivas de obter uma melhora de salário.

Transportes, do Trabalho e Previdência Social, da Indústria e do Comércio, das Minas e Energia, do Planejamento e Coordenação Geral e das Comunicações” (Art. 1º ).

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A Lei nº 4.725, “sob o pretexto de instituir uma política salarial no País, promoveu uma gigantesca transferência de renda do assalariado para o setor público e deste para o setor privado” (DIAP, 2000, p.19).

c) Para os patrões que não têm nenhuma razão de reclamar dos índices do governo, nada para se inquietar: lhes basta recusar os aumentos superiores ao índice e aguardar o julgamento longe do menor conflito.

d) Enfim para os juízes do TRT, que perderam sua capacidade de julgar e de decidir livremente em setembro de 1965, a procura uma solução ao impasse criado pelo índice que fixa o governo.

Nesse contexto, os salários reais, apesar do crescimento do PNB no período 1964-1967, decresceram. A primeira reação efetiva contra a política governamental de arrocho salarial partiu dos trabalhadores de São Paulo, que organizaram o MIA, que se manteve por um ano42. Entretanto, Marques (1980, p.176) afirma a origem “proletária” do arrocho:

É somente porque certas greves são desencadeadas nos estados mais importantes economicamente do país que o governo decide implantar uma nova política salarial, “integrando” as reivindicações operárias já conquistadas pelas categorias mais organizadas, como os metalúrgicos do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, os motoristas de ônibus do Rio de Janeiro e São Paulo, os professores do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, os bancários do Rio de Janeiro e de São Paulo. A nova política salarial visa a instaurar aumentos de salários semestrais calculados com base no INPC, índice dado pela Fundação Getúlio Vargas e pelo governo com base em um índice de produtividade, que seria negociado pelos operários com o patronato. Após essas medidas, o governo diz que as reivindicações operárias foram tomadas em conta, a lei deve ser aplicada.

Simonsen, que trabalhou na instituição do SFH (1964) e da Lei 4.728, que disciplinava o Mercado de Capitais (1965), afirmaria que, durante o ajuste de 1964 a 1967, os salários pagos na indústria foram defasados na ordem de 25% (cf. Mapa 1). O expediente da redução absoluta de salários como mecanismo de financiamento do crescimento econômico, depois de 1964, para o ministro Campos, mesmo parecendo socialmente cruel, era o preço a ser pago para restaurar o potencial de investimentos, tanto no setor público quanto no setor empresarial.

São dados estatísticos. É o óbvio ululante. Se era preciso aumentar a taxa de câmbio real, aumentar os aluguéis reais e elevar as tarifas públicas, como isso seria possível? Se houvesse aumento do salário real, o sujeito não ganharia o prêmio Nobel de Economia, ganharia o Nobel de Física. Teria descoberto a maneira de se

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Para a organização trotskista OC-1º de Maio (1971 apud REIS FILHO; SÁ, 2006, p.395), o MIA, com a presença ativa da AP e posto na ilegalidade pela ditadura, era “um organismo nacional dos pelegos, uma tentativa dos burocratas sindicais de assumirem a direção das movimentações que, cada vez mais, lhes escapavam das mãos; de tomarem as rédeas do processo, para conduzirem os trabalhadores para a luta reformista”.

criar a matéria do nada. A queda de salário real era inevitável (SIMONSEN, 1996 apud SANTOS, 2000, p.117).

A queda do poder aquisitivo real dos trabalhadores foi “compensada” por uma série de paliativos. Os aumentos monetários foram substituídos por “salários indiretos” que não comprometeriam o desenvolvimento econômico. Uma das medidas, empreendidas nesse sentido foi a criação dos fundos PIS e PASEP, que previam a distribuição de um salário mínimo aos cadastrados que recebessem até cinco salários mínimos mensais43. Assim, concedia-se um benefício ao mesmo tempo em que eram eliminados direitos históricos dos trabalhadores, como o controle social sobre a Previdência Social, após a criação, em 1967, do Instituto único, de administração centralizada.

Para convencer os trabalhadores de suas “boas intenções”, Castello Branco aproximou-se das confederações sindicais, cupulistas e corruptas, suas “legítimas representantes”. Assim, ocorreu na resolução sobre a partilha do 13o salário em duas cotas, uma em dezembro e outra no mês de férias de cada trabalhador, para a qual o presidente exigiu, para aprová-la, o apoio dessas confederações, o que demonstra que reconhecia a estrutura sindical atrelada ao Estado era um forte contributo à plena realização do novo regime.

Para Ianni (1971, p.282-283),

A “verdade salarial”, exigida pela política antiinflacionária somente poderia ser posta em prática nos quadros do “novo trabalhismo”. E esse novo trabalhismo, por sua vez, era essencial para conjurar “a hidra da luta de classes”. Em outros termos, tratava-se de reorientar o sindicalismo brasileiro, de acordo com as exigências da estrutura de poder criada em 1964. [...] tratava-se de “popularizar” o governo, e dar continuidade ao programa de “reconciliação” dos operários com o Executivo. Observa-se aí a recorrência do pensamento conservador, segundo o qual a representação profissional era forma obrigatória de superação da insolidariedade social que marcaria o povo brasileiro. Oliveira Vianna, mentor intelectual do sindicato CLT, chegara a afirmar que só ao cidadão sindicalizado se deveria dar o direito ao voto: “Não o daria ‘nunca ao homem desmolecularizado, ao homem puramente indivíduo, ao homem átomo - como é normalmente o homem típico do Brasil’” (VIANNA, s. d. apud BRESCIANI, 2005, p.450).

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Em 1976, os dois fundos unificaram-se, ainda que Programas tenham patrimônios distintos e como agentes operadores o Banco do Brasil S.A. e a CEF, além do BNDES, encarregado da aplicação dos recursos do Fundo.

A criação do FGTS, pela Lei 5.107, de setembro de 1966, aprovada por decurso de prazo, no governo Castello Branco, veio a substituir a estabilidade no emprego após 10 anos na mesma empresa, em vigor no País desde a Lei Eloy Chaves (Decreto 4.682, de 24 de janeiro de 1923). Para os trabalhadores, a estabilidade era uma barreira à demissão, pois fazia as empresas pagarem indenizações altas ao demitidos, daí é compreensível que esse ato tenha desencadeado fortes reações por parte da classe trabalhadora. Em razão da forte propaganda contrária, o presidente Castello introduziu no projeto uma cláusula que facultava aos trabalhadores continuarem no regime de estabilidade ou optarem pelo novo sistema. Os relatos operários do período mostram que a única opção era “ou você passa para o fundo de garantia ou vai demitido”. Assim, o regime de estabilidade no trabalho fora substituído pela livre demissão sem justa causa.

Para Marini (1986), essa medida, eliminando o “passivo laboral” das empresas, propiciou amplamente a centralização do capital, já beneficiado por uma política salarial que subestimava, sistematicamente, a inflação projetada, levando o salário mínimo a uma tendência declinante que se manteve até 1970. Sendo o salário mínimo o regulador da escala salarial em seu conjunto, esse se confundia com a própria taxa de salário, tendo servido de base para a negociação de tetos salariais, cujos valores se situavam, em sua grande maioria, muito próximos do salário mínimo. Desse modo, a imensa massa dos trabalhadores se viu afetada pelo arrocho salarial, fato agravado pela intensa rotatividade de mão-de-obra.

Na visão do establishment, o FGTS, em substituição ao instituto da estabilidade no emprego, era um instrumento de libertação, tanto das empresas quanto de seus empregados. Das primeiras, porque aquelas com maior número de empregados estáveis eram invendáveis por causa de seu “passivo trabalhista”. Ele libertava o trabalhador, porque ao invés de confinar-se eternamente a uma mesma empresa, sem possibilidade de aplicação de seus talentos e habilidades e sem possibilidade de crescimento profissional, ele poderia levar esse pecúlio financeiro, em conta nominal, de empresa para empresa.

Lula da Silva (1981, p.13) comenta os efeitos da rotatividade sobre os salários:

A rotatividade da mão-de-obra - que temos denunciado mas pouca gente tem dado ouvidos - faz com que o trabalhador, depois de três anos de firma ganhando Cr$ 30,00 por hora, arrume um outro emprego ganhando Cr$ 15,00. Seu salário foi reduzido em 50%, mas o aluguel, o feijão, o arroz, o leite, nada mais foi reduzido. Se já sofria ganhando Cr$ 30,00, imagine ganhando Cr$ 15,00! Por isso esse trabalhador quer segurar o emprego.

Promovendo a rotatividade, o FGTS ampliou o exército industrial de reserva e atuou, diretamente, no rebaixamento do nível salarial. As empresas passaram a demitir trabalhadores às vésperas dos acordos coletivos, readmitindo-os depois ou contratando outros, com salários mais baixos que os que obteriam através do acordo. Em 1974, a taxa média global de rotatividade na indústria automobilística alcançou 72%, no ramo de elétrico-eletrônica, e 63%, no ramo de metalurgia, fenômeno ainda mais acentuado na pequena e média empresa.

Tem um patrão, que é da Ford, que disse no jornal o seguinte: “O trabalhador que é um bom empregado não tem medo de ser mandado embora e, por isso, não está reivindicando estabilidade”. Como coisa que a gente só é mandado embora quando é mau empregado. Como coisa que ser mandado embora ou não, depende do comportamento da gente. Nós estamos de saco cheio de ver puxa-saco ser mandado embora (LULA DA SILVA, 1981, p.370).

Sendo os reajustes salariais definidos com base em índices determinados pelo governo, em uma economia recessiva e seriamente inflacionada, eles acarretaram um violento achatamento salarial. Nesse contexto, a substituição da estabilidade pelo FGTS44 tornou sólidos os alicerces econômicos do “milagre”.

Dreyfuss (1981, p.432) lembra que a Lei 5.107/66 extinguiu diversos programas de assistência aos trabalhadores, pagos por empregadores, e eliminou a contribuição estatutária destes para outros programas, “reduzindo assim os serviços anteriormente disponíveis para a classe trabalhadora e baixando ainda mais seu padrão de vida”. Além disso, essa norma estabelecia um cerceamento ainda maior do espaço de atuação política e social dos trabalhadores, com o impedimento do uso do recurso da greve, possibilitado pela Lei de Estabilidade.

Lula da Silva (1981, p.13), em entrevista ao Pasquim, afirma:

Esse negócio de passar pro FGTS [...] botou o cara rodando feito peru. Se essa lei veio com o objetivo de criar um banco, que esse banco seja administrado pela classe trabalhadora. O dinheiro é nosso, pô! Veio o Fundo de Garantia pra acabar com a estabilidade, deixando os trabalhadores à mercê dos empregadores e taí financiando mansões, deixando de lado o trabalhador. Convém registrar por que a memória nacional é curta: a sacanagem do fim da estabilidade foi feita por Roberto Campos.

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A instituição do FGTS estimulou um alto índice de rotatividade da força de trabalho nas áreas industriais do Brasil. Em 1970, em São Paulo, 35,5% da força de trabalho estavam há menos de um ano no trabalho; 55,6% ainda não haviam atingido dois anos, e 74,2% não haviam atingido três anos), quadro que inibia reclamações trabalhistas e favorecia os baixos salários.

Em 1963, num Congresso Nacional de Metalúrgicos, os trabalhadores aprovaram a criação de um fundo mas para ser paralelo à estabilidade e não pra acabar com ela. Roberto Campos aproveitou a deixa e criou o FGTS.

Para conter a expansão dos salários, em nome da ordem pública e da segurança nacional, em junho de 1964, foi sancionada a Lei de Greve, a Lei n. 4.330, de junho de 1964. Emendando a Constituição de 1946 (que garantia o direito de greve), ela definia as condições em que as greves seriam consideradas legais. Maria Helena Moreira Alves (1985) informa que funcionários públicos federais, estaduais e municipais ou de empresas estatais eram expressamente proibidos de entrar em greve.

Muitas das greves declaradas legais pelos tribunais de trabalho desde 1964 ocorreram em empresas que há mais de três meses não pagavam a seus trabalhadores. Entretanto, certas exigências burocráticas para a legalização de uma greve eram tão dispendiosas e complexas que muitos sindicatos simplesmente não as preenchiam. Entre as penas previstas para as greves não autorizadas estavam a suspensão ou a demissão do trabalhador grevista sem indenização, o afastamento da liderança sindical, pesadas multas e até mesmo o cancelamento do reconhecimento legal do sindicato. A Lei tornava ilegais as greves de motivação política - somente as greves contra atrasos de pagamento recebiam alguma tolerância - e estabelecia cautelas para desencorajar o “grevismo” do período anterior.

Lula da Silva (1981, p.166), entretanto, afirma que o arrefecimento do movimento sindical tem nos seus líderes os maiores culpados:

Outra coisa: ficou provado, para mim, que com toda a repressão que houve de 1964 para cá, com toda a recessão, uma coisa nunca foi proibida: é o dirigente sindical ir para a porta da fábrica conversar com trabalhador. A grande lição que os dirigentes sindicais têm de aprender é que o sindicalismo brasileiro esteve morto, talvez nem seja por culpa dos governos revolucionários45, mas por culpa mesmo da passividade dos dirigentes sindicais que não quiseram assumir, pelo menos em termos de preparação de base. Porque a lei de greve é a mesma de alguns anos atrás e o trabalhador está fazendo greve.

Fato é que o governo Castello Branco estava determinado a estabelecer uma política de controle salarial que impedisse a elevação dos salários acima da inflação e para isso precisava eliminar qualquer possibilidade de oposição dos trabalhadores, o que intentou fazer com intervenções nos sindicatos e o expurgo de vários líderes sindicais.

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Só nos primeiros dias do novo regime, houve intervenção em 409 sindicatos, 43 federações e quatro confederações, então dirigidas por sindicalistas atuantes (DIAP, 2000). Alves (1985) informa que, a partir desse momento até 1979, dentre intervenções, destituições de diretorias, cerceamento de eleições e dissoluções de entidades somaram-se 1.565 interferências diretas do governo nos sindicatos.

Outro instrumento foi a doutrinação ideológica. Varela (1966) afirma que, em junho de 1964, sob os auspícios do novo regime, ocorreu a Conferência Nacional de Dirigentes Sindicais pela Defesa da Democracia e do Bem Estar dos Trabalhadores, organizada pela CIOSL, e que definiu a participação dos sindicatos brasileiros na Aliança para o Progresso, que, em 1966, manteria 500 sindicalistas brasileiros estudando nos Estados Unidos e México.

O santo arrocho salarial maximizou as condições de reprodução do capital no país a níveis nunca antes observados. Substituindo as negociações diretas pelo cálculo oficial dos reajustes, o arrocho reduziu, sistematicamente, os salários reais, entre 1964 e 1967, atingindo 20% do salário mínimo. Os reclamos dos assalariados foram calados pelo caráter discricionário do regime.