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2. O SEMINÁRIO TEOLÓGICO DE SÃO PAULO

2.2. O início do Seminário após o cisma (1905-1929)

Como fruto da cisão de 1903, a igreja independente permaneceu com o templo da Primeira Igreja de São Paulo. O prédio da Rua Maranhão, todavia, permaneceu como propriedade do Sínodo, o que significava que o grupo independente ficou sem o Seminário. O grupo independente assumiu como prioridade a criação de um espaço de formação teológica, promovendo campanhas para construção do Colégio Evangélico e do Seminário Teológico de São Paulo, inaugurados em 21 de abril de 1905, nos fundos do templo da Primeira Igreja, que na ocasião estava localizado na Rua 24 de maio, número 23474

. O templo permaneceu aí até 1955, quando foi construída uma Catedral em estilo gótico, uma das primeiras e ainda das poucas neste estilo dentro do protestantismo brasileiro. Depois de algum tempo o seminário funcionou numa casa na Rua Vitória; e em 22 de janeiro de 1914 foi inaugurado um majestoso prédio na Rua Visconde de Ouro Preto, que passaria a abrigar o Seminário75

, além da Escola Paroquial da Primeira Igreja, o Colégio Evangélico e as oficinas do jornal O Estandarte.

Figura 2.5. Templo da rua 24 de Maio

Fonte: Caderno de O Estantarde, 2003 (Raízes da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil).

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Do salão do fundo ao templo, o primeiro andar foi usado como dormitório e os dois andares à frente comportavam as salas de aulas.

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O Seminário tem uma história itinerante; podemos perceber no período e nos endereços citados que esteve sempre por perto da 1ª Igreja.

O programa inicial do curso está assim disposto: História eclesiástica, moral, história da filosofia, Introdução à Bíblia, teologia sistemática, hermenêutica bíblica, governo da igreja e homilética, sendo acrescentado ao final do mesmo ano a disciplina de Física e História Natural. Eduardo Carlos Pereira assumiu a direção do Seminário, auxiliado por Albertino Pinheiro. O curso teve início com dois alunos, e após um mês eram quatro os alunos recebidos pela Diretoria e três os que estavam sendo avaliados para admissão. O corpo docente era composto pelo próprio Eduardo Carlos Pereira, além de Albertino Pinheiro, Saulo Ferraz, Odilon Moraes, Carlos Pereira de Magalhães, Adelaide Molina e Esther Leme, que dividiam suas aulas entre o Instituto Teológico e o Colégio Evangélico76

.

Quadro 2.1. Regimento Interno da Faculdade de Theologia (1926):

I. Haverá estudos obrigatórios das sete e trinta ás dez e trinta (ou em horário equivalente, para os que tiverem aulas nessa occacião) e das vinte às vinte e duas horas, guardando-se o necessario silencio.

II. Os que tiverem necessidade especial de prolongar os estudos além das vinte e duas horas, devem obter permissão e estudar sem incomodo para os demais.

III. Não haverá estudos obrigatórios aos sábados á noite e nem nos dias que a Faculdade considerar feriados.

IV. Será facultativo, para os estudantes de teologia, o estudo em uma noite da semana, para assistirem a culto publico.

V. É preciso obter permissão para o estudante permanecer fóra, depois das vinte horas, alem dos casos acima expostos.

VI. Será obrigatória a todos os estudantes a frequencia aos cultos do estabelecimento. VII. Á hora das aulas, devem os estudantes de theologia estar nas salas, á espera dos professores.

VIII. Ás vinte e duas horas será fechado o estabelecimento, e os estudantes, apagadas as luzes, guardarão logo absoluto silencio (sendo que aos domingos a luz deve apagar-se ás vinte e duas horas e meia)

IX. Ninguem poderá ausentar-se da cidade sem licença prévia (mesmo nos dias feriados, nos casos dos estudantes de preparatórios).

X. Todos devem tomar o maior interesse na limpeza e conservação do edificio e objectos de uso e na manutenção da ordem geral da casa.

(o presente Regimento visa os estudantes de theologia e os prepatorianos que vivem no estabelecimento).

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O jornal O Estandarte é fonte privilegiada sobre informação desse período; ver as edições do mês de abril e maio daquele ano.

O Instituto Teológico elevou os ânimos dos independentes, que consideram sua criação a consolidação do projeto nacional, do qual o cisma de 1903 fora um infeliz e inevitável capítulo. A autonomia da igreja nacional era defendida por Eduardo Carlos Pereira desde seu envolvimento com o trabalho religioso. Formado em Teologia em 1880 e ordenado pastor um ano mais tarde, Pereira começara seu trabalho já preocupado com as questões autóctones. Sensível às dificuldades de acesso às principais obras teológicas disponíveis, todas em língua estrangeira77

, organizou em 1883 juntamente com Remígio de Cerqueira Leite, a Sociedade Brasileira de Tratados Evangélicos, dedicada à publicação de obras, e quase exclusivamente formada de pastores nacionais. Essa sociedade conseguiu sobreviver com recursos das igrejas brasileiras sem precisar contar com recursos das missões estrangeiras. Sobre essa realização assim se manifestou Pereira: “Era o primeiro ensaio de uma cooperação brasileira independente para um trabalho commum de evangelização, era o prenuncio sagrado da independencia ecclesiastica” (THEMUDO LESSA, 1938, p.229).

Em 1886 Eduardo Carlos Pereira apresentou ao Presbitério o Plano de Missões Nacionais, projeto que objetivava a criação de um fundo que permitisse, sem auxílio financeiro do Board: a manutenção de pastores; a manutenção de evangelistas; a manutenção de professores e estudantes do ministério. O presbitério aprovou a nomeação da Comissão de Missões Nacionais, da qual Pereira foi eleito presidente. Como resultado dos trabalhos da Comissão, em 1887 teve início a publicação da Revista das Missões Nacionais, um importante periódico do protestantismo brasileiro.

É possível afirmar que a atuação dos nacionais, encabeçados por Eduardo Pereira, fez constar no Sínodo de 1888 a decisão sobre a educação teológica, datando daí o início da luta da igreja brasileira pelo seu seminário, ao menos na visão de seu líder. A realização do Seminário Teológico de São Paulo não foi encarada apenas como uma conquistada igreja Independente, mas como a materialização do projeto dos pastores nacionais. Daí que Pereira tenha se empolgado tanto com a inauguração do Seminário, como pode ser lido em matéria

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Essas dificuldades consistiam em obstáculos de acesso, dificuldades de leitura ou até mesmo leituras não proveitosas em função de traduções mal feitas.

publicada no jornal O Estandarte, justamente um registro do discurso da inauguração pelo próprio Pereira:

É solenne para nós este momento, e será elle para sempre memoravel em nossos annaes. [...] Ha dezessete annos que miramos estas alturas; ha dezessete annos que subimos as escarpas alcantiladas que nos conduziram ao cismo do Fasga, donde nos é dado descortinar, nas visões do Senhor, a Chanaan de nossos destinos (O Estandarte, 27/04/1905, p.1).

Os passos dados pelo Sínodo de 1888 culminaram, como já dissemos, no seminário de Nova Friburgo em 1892 e no Instituto Teológico em São Paulo um ano depois, no edifício construído na Rua Maranhão, sob auspícios das igrejas brasileiras. A perda do edifício no cisma de 1903 representou um duro golpe no orgulho dos nacionais, que se empenharam na urgente tarefa de organizar seu próprio lugar de formação teológica. Daí o clima festivo das palavras de Pereira, bem como de vários que registram suas congratulações pela inauguração do Seminário Independente. Se o cisma foi resultado inevitável das divergências que se estabeleceram, é a inauguração do Instituto Teológico que marca definitivamente a conquista da liberdade que reivindicavam os pastores brasileiros. No mesmo texto citado, Pereira prossegue:

Somos livres hoje, graças a Deus: somos independentes. Chegamos ao

ponto culminante de poder affirmar essa liberdade e independencia

lançando, por ordem de nosso concílio superior os fundamentos do

Collegio Evangélico annexo ao Instituto Theologico. Assim a inauguração

de hoje é, historicamente, a mais genuína proclamação da independencia espiritual da Egreja Presbyteriana Brazileira, é o escopo de dezessete annos de luctas, é a meta da carreira que nos estava proposta (O

Estandarte, 27/04/1905, p.1)78.

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Naquele ano o dia 21 de Abril coincidiu com duas datas comemorativas: sexta-feira da Paixão e Tiradentes. Eduardo Carlos Pereira faz menção ao fato ressaltando que ambas ocasiões são marcos de luta por liberdade.

Figura 2.6. Edifício da Rua Visconde de Ouro Preto.

Fonte: Acervo da FATIPI