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3.2 O BRINCAR NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO INFANTIL

3.2.3 O Lugar do Brincar e da Ludicidade na Formação Continuada

são aqueles em exercício e formados em cursos reconhecidos: nível superior e médio para atuar na educação infantil, fundamental e médio; no inciso II, define como trabalhadores em educação os diplomados em cursos de Pedagogia e habilitados em administração, planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacional, assim como mestres ou doutores nas mesmas áreas, além dos diplomados em curso técnico ou superior em área relacionada à pedagogia ou afim.

O Parágrafo único da referida Lei prescreve que a formação deve ter como fundamento atender necessidades específicas de cada etapa com formação básica sólida: I - possibilitar conhecimentos científicos e sociais de acordo com competências de trabalho; II - possibilitar a relação entre teoria e prática a partir de estágios supervisionados e formação em serviço; III - considerar conhecimentos e experiências dos professores nos seus locais de atuação ou em outras atividades em instituições de ensino. Essa reformulação busca recomendar para quem, como, o que e onde deve ser a formação do professor como profissional, mas não esclarece um perfil para o professor a partir das especificidades da educação infantil.

Atualmente, os professores precisam ser instados a refletir acerca de suas ações como ações de ensino, em face do papel de mediação que podem desenvolver junto às crianças, quando são sensíveis as suas necessidades e desejos, quando propõem atividades envolventes, quando potencializam “[...] o uso pedagógico de diferentes recursos, dentre eles os tecnológicos e os éticos” (OLIVEIRA et al., 2011, p.20).

3.2.3 O Lugar do Brincar e da Ludicidade na Formação Continuada

Vale a pena trazer para esta discussão a atualidade das reflexões de Kishimoto (2002), quando alertava para o fato de se acumularem problemas sempre que se avalia criticamente a realidade da formação de professores para atuar na educação infantil, especialmente, por conta da indefinição do perfil que se deseja para estes profissionais nos cursos de formação que vem sendo propostos, nos quais não se respeita a especificidade da educação infantil, entre outros quando se trata da mesma maneira especificidades de uma educação de crianças de 0 (zero) até 6 (seis) anos e de sete até dez anos, revelando contradições que conduzem a educação infantil a cristalização de práticas historicamente conhecidas como escolarização na educação infantil.

Kishimoto (2002) questiona em que medida os cursos oferecidos para a formação de professores para a educação infantil incorporam um plano curricular que respeite as especificidades da educação infantil? Para a autora (2002) a criança pequena está sempre aprendendo sobre e no mundo como um amplo ambiente educativo que a cerca, mas “[...] que não pode ser organizado de forma disciplinar” (p.108). Oliveira-Formosinho (2002) reflete que se faz necessário definir eixos na formação do professor, ao invés de campos disciplinares. Assim a formação do professor de educação infantil precisa ser norteada a partir da criança nas suas inserções no mundo.

No processo de construção e reconstrução de seu desenvolvimento profissional a partir de processos formativos, Barbosa (2009) considera que a formação do profissional da educação infantil deve nutrir-se das especificidades da criança e da infância para ser um espaço de discussão e fomentação de possibilidades a partir de uma relação de identificação com o seu fazer. Assim, os professores precisam ser instados a refletir suas ações como ações de ensino, em face do papel de mediação que podem desenvolver junto às crianças, quando são sensíveis as suas necessidades e desejos, quando propõem atividades envolventes, quando potencializam [...] o uso pedagógico de diferentes recursos, dentre eles os tecnológicos e os éticos (OLIVEIRA et al., 2011, p.20).

Prado e Azevedo refletem (2012, p.36) [...] se que torna imperativo o rompimento com a racionalidade técnica, entendida como tendência clássica da formação, em busca de um modelo dialógico. Refletem a importância de a formação propiciar a relação entre a teoria e prática o que significa dizer que a observação e a reflexão sobre a prática seja uma realidade constante a ser adotada na formação dos professores no sentido de possibilitar ao professor exercer seu protagonismo na docência.

Mesmo de maneira sucinta, queremos trazer uma reflexão de Stroisch (2007), quando retrata um trabalho de pesquisa na educação infantil que permitiu perceber a partir de falas de professoras, algumas mudanças na escola como um processo não linear de avanços e retrocessos em um círculo de avanços e participação da criança na prática docente “[...] o trabalho de formação continuada se dá num processo em que há idas e vindas e requer também o envolvimento de outras instâncias administrativas e revisão das condições de trabalho dos professores” (p.184).

A autora nos remete a interferência de fatores, especialmente de ordem externa que condicionam historicamente o processo da formação de professores e que precisam ser cada vez mais reconhecidos no sentido de trazer para a discussão o cunho político que ela precisa

ter e ser de domínio dos professores na sua ação de formação e atuação profissional em um processo de vigilância permanente em mecanismos de condicionamento que interferem na formação do professor e repercutem na sua atuação junto às crianças e na sua relação com o brincar.

Fortuna (2001) ressalta o papel da universidade neste âmbito, quando indaga:

Como garantir o direito da criança brincar, se na escola, local em que as crianças permanecem por muito tempo de sua vida, não se brinca e o brincar é desprezado? Qual a contribuição da universidade no sentido de garantir à criança este direito? Formar professores na perspectiva lúdica é uma contribuição possível [...] (FORTUNA, 2001, p, 115).

A autora nas suas indagações nos faz refletir sobre o paradoxo da existência de uma legislação específica, como a Constituição Federal (1988) e a Lei de Diretrizes e Bases LDB (9394/96), acompanhada de documentos oficiais como os Referenciais Curriculares Nacionais para a Formação de Professores (1998) e os destinados à educação infantil (DCNEI 1998 e 2009), e uma realidade ainda tão adversa para as crianças no tocante ao seu direito a uma educação de qualidade socialmente reconhecida.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998a, 2009) insere a interação e o brincar como direito a ser assegurado às crianças. Contudo, no início da década de 2000, Fortuna (2012) observa a ausência do brincar na escola e o papel da universidade na perspectiva da formação lúdica do professor, o que também vimos em pesquisa de Freitas (2005), Pasquali (2007), Blanco (2007) e Pantalena (2010), que em suas especificidades confluem ao tematizar a importância da formação continuada para professoras de educação infantil, para que o brincar não seja ferramenta de ensino na escola.

Para Kramer (2009) é necessário buscar o olhar da criança e da infância para discutir a formação de professores, com profissionais na e da educação infantil. Para Freitas (2008 e 2012), quando buscamos a criança, inevitavelmente se inscreve o brincar como o modo singular de estar e interpretar o mundo.

Freitas (2008) também ressalta que, mesmo não se questionando a importância do brincar nessa etapa da escolarização básica, não se tem conseguido articular laços entre a teoria e a prática que apresenta o brincar como direito, modo de ser e estar no mundo ou atividade principal das crianças, o que denota que os professores até então não construíram, no percurso de sua profissionalidade docente, conhecimentos sólidos no sentido de buscar organizar possibilidades do brincar na sala de aula, para, como diz Freire (2005b), reinventar

a sua prática, transformando a sua sala de aula em um grande encontro entre as crianças e com as crianças.

Ressaltamos ainda que Zeichner (1993) e Freire (2005b) referem-se à reinvenção da prática pelo professor e ressaltam que está atrelada não apenas ao desejo de mudança, mas especialmente à reflexão sobre o que faz e o porquê de sua ação educativa, o que também nos remete a Morais (2014) e a Brayner (2014) quando refletem o que vem ocorrendo com programas de formação que invadem os municípios, seduzem professores, mas não promovem o pensar crítico.

Assim, refletimos que a formação de professores que busca integrar o brincar e a ludicidade como conteúdo de estudo necessita promover espaços de construção por parte do professor, em uma postura investigativa, reflexiva, acerca da natureza de sua prática lúdica em uma perspectiva crítica, que busca compreender a historicidade do brincar na escola de educação infantil, a partir de concepções que estão subjacentes às vivências lúdicas, permitidas ou não pelos professores, em suas contradições e rupturas, também relacionadas às concepções dos professores e de outros sujeitos integrantes das decisões da escola.

Destacamos Kishimoto (2002), com pesquisas sobre brinquedo, educação infantil e formação do professor na formação inicial e continuada, na sua reflexão acerca da formação de professores, quando afirma que a criança aprende quando brinca, mas ressalta que os cursos de formação não vêm incluindo o brincar a partir de questões do cotidiano entre os objetos de estudo. A autora observa também que, quando o brincar é objeto de interesse nos cursos de formação, restringe-se a discussões teóricas, não suscitando o interesse do professor pelo distanciamento de sua prática, de que decorre a indagação se a "[...] homologia dos processos de formação e de ensino formativo não favoreceria o conhecimento a ser adquirido?"(KISHIMOTO 2002, p.109). A autora defende a necessidade de os professores vivenciarem processos semelhantes para compreender como a criança constrói conhecimento. Para Freitas (2005; 2008; 2012), olhar o brincar e a dimensão lúdica como eixos do trabalho do professor da educação infantil e, por isso, um saber de sua profissionalidade docente, vai requerer uma redefinição de programas de formação inicial e continuada, no sentido de se enfatizarem estudos do brincar e ludicidade na formação de professores, a partir de práticas que são vivenciadas na educação infantil.

Estudos de Freitas (2005, 2012) inspiram-se em Kishimoto (2002, 2005) e Kramer (2002, 2009), no sentido de chamar a atenção para que se possa refletir a relação entre a formação do professor, a função do brincar na escola e as concepções dos que definem a

abordagem do brincar na educação das crianças no tocante a quem são e do que precisam saber os professores e as crianças.

As pesquisas de Kramer (2002, 2003, 2005, 2009) trazem, de maneira profunda, à luz de estudos no âmbito da Sociologia da Infância, a dimensão político-pedagógica na formação de professores, ressaltando como direito de todos os professores, a partir da reflexão de sua prática, tendo como foco as necessidades formativas da criança, dentre as quais destacamos o brincar. Nesse sentido, Pedrosa (2005, 2012) atribui destaque ao brincar como fator de desenvolvimento das crianças, que precisa ser compreendido pelo professor, o que a nosso ver aponta para conteúdos que precisam ser considerados em programas de formação a favor do desenvolvimento integral da criança.

A autora (2005) ressalta a importância do brincar no desenvolvimento do ser humano através da análise de episódios de brincadeiras entre as crianças no seu grupo de brinquedo. Ressalta que o grupo de brinquedo corporifica-se como um lugar ecologicamente relevante para o estudo do desenvolvimento da criança, uma vez que revela o que ela é capaz de fazer, no sentido de atribuir papéis a si e aos outros, resolver conflitos, organizar espaços e atividades, criar enredos e cenários, possibilitando ao pesquisador compreender o papel da ludicidade na vida das crianças.

Assim consideramos que, da mesma maneira que o pesquisador, o professor, imbuído do desejo de aprofundamento, também aprende sobre o brincar pela observação da criança e, nesse sentido, a formação de professores pode mediar esses momentos, mas é necessário, como afirma Oliveira-Formosinho (2002), propiciar uma fundamentação mais sólida, e, nesse caso, cabe à universidade atuar de maneira a fomentar junto aos professores em formação o espírito de inquietude à luz de Freire (2005), para o professor buscar significar o próprio trabalho. Ou seja, a ação docente precisa ser palco de reflexão, análise e aprendizagem sobre o brincar e a ludicidade das crianças, à medida que a prática cotidiana alcançar destaque como objeto de estudo na formação do professor.

Voltando a Pedrosa (2012), ressaltamos que a formação pode ajudar os professores ao exercício do olhar, o que para a Freire (2005a) seria desenvolver a curiosidade epistemológica, buscar saber mais do que faz e expressa a criança quando brinca. Acreditamos ser fundamental ao professor conhecer a criança para organizar a sua ação docente, a partir de suas necessidades e possibilidades.

Queremos ressaltar o olhar ainda tão atual de Kishimoto (2002) nas observações pertinazes acerca da formação de professores para a educação infantil. Ela ressalta que urge pensar em modalidades de formação de professores a partir da organização da área da

infância, instituindo uma pedagogia da infância com novos pressupostos e alternativas de organização curricular que aponte para uma nova imagem de um perfil de professor de educação infantil.

Santos e Cruz (2011) referem-se à importância de se repensar o papel do lúdico a partir do reconhecimento de que grande parte dos locais de formação ainda trata o conhecimento sob uma ótica comportamentalista, reduzindo-o a uma ideia cristalizada e/ou espontaneísta, que desconsidera o seu caráter de produção histórica. Ressaltam que "[...] uma das formas de repensar os cursos de formação é introduzir na base de sua estrutura curricular um novo pilar: a formação lúdica" (p.13).

As autoras (2011), referindo-se à formação inicial, explicam que a formação lúdica tem pressupostos que ressaltam a criatividade, a sensibilidade, a afetividade como algo que nutre a alma, "[...] proporcionando aos futuros educadores vivências lúdicas, experiências corporais, que se utilizam da ação, do pensamento e da linguagem, tendo no jogo sua fonte dinamizadora "(p.14), ou, em outras palavras, a formação continuada pode ser uma continuidade dos pressupostos aliados a questões que os professores podem e desejam compartilhar em sua prática.

Para tal, é necessário pensar e viver um processo formativo que possibilite aos professores de educação infantil desenvolver o hábito da reflexão sobre o que acredita, deseja e realiza, no sentido de um autoconhecimento, para perceber suas possibilidades e limitações, de forma a buscar "[...] desbloquear suas resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do brinquedo para a vida da criança, do jovem e do adulto” (SANTOS E CRUZ, 2011, p.14).

Faz-se necessário refletir e buscar possibilidades para que, em um processo de formação de professores, o brincar e a dimensão lúdica sejam compreendidos em contextos integrados, o que implica olhar de maneira investigativa e sensível para o lócus de atuação dos professores e que neste também ocorram instigadores encontros de estudo, para motivar o professor a questionar suas crenças e de que maneira essas são direcionadas a sua prática docente.

Materializar espaços de formação continuada como lugar de discussões e de aprendizagens implica um esforço coletivo, tempo, atitude investigativa e reflexiva em um processo de avanços e recuos, sem perder de vista que a formação do professor que tem a ludicidade como inspiração e prática é mediadora de uma identidade de professor brincante. Remetendo-nos a Fortuna (2011), para tal se faz necessário refletir quem são esses

professores, suas necessidades e possibilidades no trabalho de formação junto às crianças, para reconhecer o brincar e como ele se constitui na vida da criança na sua relação com e no mundo, estimular a presença da ludicidade como algo próprio do ser humano de qualquer idade, como um valor formativo em uma racionalidade sensível.

Nessa direção, Ramos (2012, p.141) ressalta que "a formação é referida como um campo de afirmação de identidade, de elaboração de um sentido de pertencimento a um grupo e que tem um projeto político-pedagógico que dá sustentação a sua prática cotidiana [...]". Neste sentido o professor é instado a rever, de maneira contextualizada, avanços, limites, desafios e possibilidades que podem ser construídas a favor do reconhecimento de sua atuação em prol de uma educação voltada às necessidades das crianças.

Para Fortuna (2011), a formação deve suscitar mais que inquietude, inconformismo, "[...] subjetividades democráticas, capazes de estabelecer relações de autoridade partilhada mais equilibradas e menos hierarquizadas [...] (p. 294), e, continua, defendendo "[...] o componente aleatório da brincadeira, a dimensão da autonomia e mesmo sua improdutividade no âmbito da economia social ou pedagógica dos conteúdos, o que faz do brincar na sala de aula uma aposta” (FORTUNA, 2000, p.163. A nosso ver, também pelo exercício de renunciar ao controle ou à onipotência na decisão dos rumos no fazer cotidiano.

Por fim, queremos ressaltar, no tocante à formação do professor da educação infantil, também Oliveira-Formosinho (2005), que propõe a homologia dos processos de formação, para que os professores possam experimentar situações nos espaços formativos que possam ser também vividos pelas crianças na sala de aula.

Contudo, ressalta que a contribuição das formandas consiste no ponto de partida na mediação das contribuições da formadora, permitindo que a educação seja porta da profissão, no sentido da ressignificação de ideias intuitivas.

Ressaltamos que a homologia de processos requer cautela, no sentido de buscar controlar, por exemplo, a emergência de algo tão indômito como o brincar, uma vez que a ludicidade não emerge como uma decisão, pois, segundo Fortuna (2011), "[...] no tratamento meramente técnico dado ao assunto encarregar-se-ia de extinguir a própria motivação para estudá-lo" (p.68).

Refletimos que a homologia de processo formativo nos parece também uma aposta, mesmo na perspectiva epistemológica e pedagógica proposta por Oliveira-Formosinho (2005). Destacamos que como ponto relevante dessa discussão inscrevem-se os saberes do professor de educação infantil, sobre o qual passaremos a tratar a seguir:

3.3 O BRINCAR E A LUDICIDADE NO CONHECIMENTO BASE DOS SABERES