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Então, se alguém lhe propuser um amor cheio de escrúpulos, exato, tacanho, inflexível, estrito, moralista, formal, reto, regulado, estruturado e organizado, fuja! É difícil ver tudo isso com um “superego” apaixonado e não se deixar levar pela rigidez mental e afetiva que os caracteriza. Além do seu grande poder de convencimento, a cultura os exalta ao fixar modelos exemplares.

Nas sociedades desenvolvidas, as pessoas obsessivas são admiradas pela disciplina, pelo respeito à autoridade e pela capacidade ilimitada de trabalho. A maioria dos empresários aceita com satisfação que essas pessoas façam parte das suas equipes, ainda que elas não costumem ocupar cargos muito elevados. A razão é que os obsessivos, mesmo que mostrem certas vantagens na execução de tarefas concretas, têm sérias dificuldades para delegar, tomar decisões e estabelecer prioridades, aspectos imprescindíveis para qualquer executivo ágil e de alto nível. Por isso, nas presidências e vice-presidências das grandes empresas é mais comum encontrarmos a arrogância do narcisista do que a minúcia do perfeccionista extremo. A proposta afetiva do obsessivo se estrutura sobre a base de três esquemas torturantes e limitadores: “Você erra demais” (crítica/acusação), “De agora em diante, eu tomarei as rédeas” (responsabilidade ilimitada) e “Devo manter as minhas emoções sob controle” (estreitamento emocional). Em outras palavras: subestimação, golpe de Estado e escassez de ternura. Coisas muito difíceis de serem aceitas por uma mente prudente.

Se o seu companheiro ou a sua companheira cumpre os requisitos de um obsessivo-compulsivo, você será um inútil, incompetente e irresponsável até que demonstre o contrário. E, para “demonstrar”, não há outra opção que não seja a de ser perfeito. Caso encerrado. A ansiedade gerada por esse tipo de controle é tanta que algumas vítimas preferem se converter ao “obsessivismo” para evitar o fardo de uma fiscalização constante. Certa vez, enquanto eu tomava um café com uma colega, ela olhou a hora com angústia e disse: “Meu Deus, tenho que lavar os pratos antes que ele chegue!”. Quando pedi a ela que ficasse mais um pouco, não me deu opções: “Não, não posso, ele fica uma fera se não encontra tudo arrumado”. Ela pegou um táxi e saiu em disparada rumo às suas “obrigações”; só faltou colocar uma sirene de polícia no carro. A sua estratégia de sobrevivência, para evitar a reprimenda do marido e mantê-lo calmo, consistia em assumir o papel de “obsessiva secundária”, ou seja, uma obsessão subsidiária cujo fim é contribuir com as necessidades do obsessivo principal. Sem dúvida, uma escolha errada, porque as manias do homem seguirão se incrementando graças à obediência da sua companheira.

As críticas constantes e a pressão para que “tudo esteja bem” escondem uma profunda subestimação para resolver problemas. Devido a isso, as vítimas do estilo obsessivo perdem a eficiência e se tornam cada dia mais inseguras. Um jovem me dizia em sua primeira consulta: “Estou aqui para você me dizer como sou idiota, porque, segundo a minha namorada, sou o homem mais asqueroso e inútil do planeta. Ela disse tanto isso que eu acreditei”. Claro que não havia tal ineficiência crônica. O curioso é que os parceiros dos obsessivos terminam “errando por medo de errar”. O círculo vicioso é o seguinte: quanto maior for o medo de errar, mais o rendimento será afetado (sob os efeitos da ansiedade, a eficácia diminui de forma substancial), e quanto menor for o rendimento, a auto-

observação de “inutilidade” incrementará a ansiedade, baixando ainda mais o desempenho. Nessa espiral autodestrutiva, a angústia vai se apoderando do amor até destruí-lo. Os obsessivos têm esta curiosa capacidade: procurando as cotas mais altas, reduzem o amor à sua expressão mínima.

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ESPONSABILIDADE ILIMITADA

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E AGORA EM DIANTE

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EU TOMAREI AS RÉDEAS

A percepção de que o parceiro é ineficiente e improdutivo, somada à própria incapacidade de delegar, faz com que muitos indivíduos obsessivos assumam o comando e se responsabilizem diretamente por tudo que está implicado na relação: pagamentos, arrumações, balanços, administração do lar, planejamento das viagens, recreação, educação dos filhos, enfim, qualquer ação ou decisão deverá passar pelo seu filtro de excelência. Esse “golpe de Estado” a favor do alto rendimento tem, ao menos, duas consequências negativas para qualquer relação afetiva. Em primeiro lugar, se apoderar do andamento e da articulação da relação exclui de forma desrespeitosa o outro, sublinha a sua presumível inutilidade e o situa num vergonhoso segundo plano. É desnecessário dizer que esse deslocamento forçado acaba gerando frustração, raiva e ressentimento. Em segundo lugar, e isso já é um erro de cálculo do obsessivo, tomar as rédeas de “tudo” implica assumir uma responsabilidade “geral”. Isso significa que, se antes o sofrimento ocorria devido aos equívocos do parceiro, agora a obsessão estará dirigida a si mesmo. A exigência se transformará em autoexigência, a crítica em autocrítica, e o castigo em autocastigo. Prestar contas a si mesmo pode ser tão ou mais esgotante que prestar contas ao próximo.

Uma conclusão importante é que o indivíduo obsessivo, seja manifesta ou sorrateiramente, jamais entregará o controle, pois acredita que ninguém fará melhor do que ele. A obstinação e certa supervalorização pessoal o impedirão de ver a realidade das suas limitações naturais. Um homem perfeccionista ao extremo me contava sobre os “progressos obtidos” depois de ter tomado o controle do funcionamento da casa: “Não tive outra opção. Ela é tranquila demais e havia muita improvisação. Não planejava bem as coisas e a desorganização era total. Por exemplo: gastávamos muito dinheiro em comida e às vezes até ia para o lixo, então fiz um cardápio semanal com as quantidades exatas e assim consegui evitar o desperdício. Fiz o mesmo com as horas de estudo, a televisão e as brincadeiras das crianças. Tudo está planejado com perfeição. Nossa qualidade de vida está muito melhor”. A esposa não concordava muito com ele, e suponho que os filhos também não. Em uma consulta, a mulher comentou com tristeza: “Desde que ele se encarregou da casa, o dinheiro não dá para nada. A cada dia comemos pior, e as crianças parecem robôs. Acabou a alegria na minha casa...”. Lembremos que as pessoas obsessivas são muito avarentas; portanto, ceder-lhes a administração econômica levará inevitavelmente a um severo corte no orçamento.

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ONSTRIÇÃO EMOCIONAL

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EVO MANTER AS MINHAS EMOÇÕES SOB CONTROLE

Um dos principais medos que mortifica as pessoas obsessivas é que, se deixarem de exercer o controle mental sobre as suas emoções, terão problemas ou farão um papel ridículo. Esse culto à racionalidade os leva a bloquear os seus estados internos e a esfriar os sentimentos.

Entrar na mente de um indivíduo obsessivo-compulsivo é como entrar em uma armadura medieval. A personalidade

fica entrincheirada em um sem-número de imperativos que a impedem de avançar do ponto de vista emocional e de expressar afeto às pessoas que supostamente amam. Baseados num estoicismo mal compreendido, eles pensam que “viver é sofrer” e, portanto, qualquer manifestação efusiva de alegria será interpretada como sintoma de fraqueza ou de mau gosto. É claro que, frente à semelhante aparato defensivo, seus parceiros sentem-se descuidados e incapazes de alcançar um amor pleno.

Essa rigidez emocional é a principal razão pela qual a personalidade obsessivo-compulsiva apresenta dificuldades no campo sexual. O desconforto que a expressão das emoções lhe provoca, a falta de espontaneidade e o medo de perder o controle levam a uma diminuição do seu desejo sexual e a dificuldades para alcançar o clímax. É compreensível, se considerarmos que, durante o orgasmo, o tempo e o espaço se confundem loucamente (dando razão a Einstein) e as regras de conduta se perdem na mais absoluta anarquia (dando razão a Bakunin). Dito de outra forma: a vontade sexual do obsessivo quase sempre está em quarentena.

Por que nos envolvemos em uma relação